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NOVAS INFORMAÇÕES SOBRE A INTERAÇÃO ENTRE A PESCA E OS GOLFINHOS NO LITORAL NORTE DO ESPÍRITO SANTO

MATERIAL E MÉTODOS

ÁREA DE ESTUDO

O estudo foi realizado no extremo norte do estado do Espírito Santo. No litoral dos municípios de Conceição da Barra e São Mateus (Figura 1).

O estado do Espírito Santo é caracterizado por um clima tropical, quente e úmido, possuindo o período chuvoso durante o verão, onde recebe aporte de chuvas tropicais. A estação seca se dá entre o período de outono e inverno, onde podem ocorrer precipitações frontais de descargas devidas à chegada de frentes frias vindas de sul (Martin et al., 1996).

Tanto em frequência quanto em intensidade, o regime de ventos na costa capixaba é dominado pelos derivados dos quadrantes leste-nordeste e sudeste, respectivamente. Sendo relacionados aos alísios os de quadrante leste-nordeste, nos quais se sobrepõem durante a maior parte do ano, enquanto os de quadrante sudeste estão associados às massas polares oriundas de sul que atingindo a costa do estado periodicamente (Albino, 1999; Albino et al., 2001).

Os sistemas de ventos conduzem o comportamento das ondas, as quais vêm de dois âmbitos principais: Nordeste (NE) – Leste (E), predominante na maior parte do ano, e o Sudeste (SE) – Leste (E), ondas mais energéticas. As ondas possuem uma altura significativa de 0,6 a 0,9 m aproximadamente, sendo raras as ocorrências de ondas superiores a 1,5 m. Quanto ao período, as ondas apresentam períodos de 5 a 6,5s, podendo atingir um máximo de 9,5s (Albino, 1999).

O litoral do estado do Espírito Santo apresenta marés semidiurnas, com período de aproximadamente 12 horas e amplitudes variando de 1,10 a 1,50 m, condizendo este litoral num regime de micromaré (< 2m) (DHN, 2014).

Quanto aos aspectos geomorfológicos, a costa do estado apresenta afloramentos e promontórios cristalinos, tabuleiros da Formação Barreiras e planícies costeiras, que associadas à presença de grandes bacias hidrográficas ou mesmo desembocaduras de pequenos rios, podem influenciar na configuração da paisagem do litoral (Ortiz, 2010).

O município de Conceição da Barra possui uma área de 1.187,766 km², tem sua posição marcada pelas coordenadas 18º53’56”S de latitude e 39º43’56”W de longitude (IBGE, 2013). Já o município de São Mateus possui uma área de 2.338,726 km² tem sua posição marcada pelas coordenadas 18º42’58”S de latitude e 39º51’21”W de longitude (IBGE, 2013).

O litoral da área de estudo é caracterizado por uma plataforma com largura média de 230 km (Asmus et al., 1971) e aproximadamente 72 km de extensão, apresentando uma costa caracterizada por planícies costeiras estreitas associadas às desembocaduras dos rios Itaúnas e São Mateus.

Figura 01: Área de estudo evidenciando os pontos de encalhes dos cetáceos no litoral no norte do estado do Espírito Santo. Pontos rosas: Pontoporia blainvillei; Pontos verdes: Sotalia guianensis e Ponto azul: Peponocephala electra.

COLETA DE DADOS

Monitoramentos são realizados diariamente pelo Projeto Tamar e o CTA - Meio Ambiente nas praias de Conceição da Barra e São Mateus. Durante o estudo sempre que os encalhes foram registrados, um profissional da ONG ou da Empresa entrava em contato conosco para que fossem realizadas visitas ao local para obtenção de dados.

Durante a visita ao local de cada encalhe foram coletados os seguintes dados: data, biometria do animal, localização exata com GPS, identificação da espécie, sexo e maturidade sexual. Além de verificar a existência de marcas de aparatos de pesca, obter registros fotográficos e coleta de material biológico para análises futuras.

Os dados de encalhes foram complementados pela Organização Consciência Ambiental (Instituto ORCA). O ORCA é um dos órgãos que realizam o atendimento a cetáceos encalhados nas praias do Espírito Santo, bem como, que auxiliam na destinação desses animais mortos. De todos os dados registrados, 18 foram coletados nas praias e 11 foram cedidos pelo Instituto ORCA.

Confirmações a respeito da maturidade sexual foram obtidas após a realização de necrópsias, realizadas pelo Instituto ORCA, ou com base na literatura científica. Para a espécie

Sotalia guianensis machos com comprimentos totais entre 170 e 175 cm e fêmeas com

comprimentos totais entre 164 e 169 cm foram considerados maturos sexualmente (Rosas e Monteiro-Filho, 2002). Para Pontoporia blainvillei foram considerados maturos machos com comprimentos totais 120 a 150 cm e fêmeas com comprimentos totais entre 130 a 170 cm. Já para Pepocephala electra foram considerados maturos indivíduos com comprimento total de 210 a 260 cm (Lodi e Borobia, 2013).

ANÁLISE DOS DADOS

Os dados foram reunidos em uma tabela e analisados durante os meses e estação do ano levando-se em consideração espécie registrada, sexo, a biometria (comprimento total), e maturidade (infante/juvenil e adulto) (Tabela 01).

Para se avaliar o grau de significância dos resultados, foi empregado o teste não paramétrico de Mann-Whitney ao nível de 0,05 de significância (Zar, 1984) do pacote STATISTICA Versão 5 ®.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Vinte e nove encalhes de pequenos cetáceos foram registrados durante o período de agosto de 2010 a outubro de 2013 ao longo do litoral norte do Espírito Santo, sendo eles nove em

Conceição da Barra e 20 em São Mateus (Figura 1). Dentre os encalhes registrados, 25 eram da espécie Sotalia guianensis (86 %), três da Pontoporia blainvillei (10 %) e uma Peponocephala

electra (4%) (Tabela 01).

Tabela 01: Dados de Encalhes de pequenos cetáceos no período de Agosto de 2010 a Outubro de 2013

Ano Data Local Espécie Sexo Biometria

(CT) Maturidade 2010 25/ago Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis fêmea 1,26 Infanto/juvenil

2010 08/nov Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD _ DD

2010 29/dez Praia de Guriri - São Mateus Pontoporia blainvillei DD _ DD

2011 03/jan Praia de Guriri - São Mateus Pontoporia blainvillei DD _ DD

2011 11/jan Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis Macho 1,54 Infanto/juvenil

2011 17/jan Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD _ DD

2011 24/fev Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD _ DD

2011 18/abr Praia de Guriri - São Mateus Pontoporia blainvillei Macho 0,6 Infanto/juvenil 2011 24/abr Campo Grande - São Mateus Peponocephala electra fêmea 2,5 Adulto

2011 12/ago Itaúnas - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD

2011 17/set Itaúnas - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD

2011 21/out Praia da Bugia - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD

2011 23/out Itaúnas - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD

2011 03/dez Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis Macho 1,8 Adulto

2012 09/jan Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD 1,92 Adulto

2012 04/out Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD 1,88 Adulto

2012 12/nov Praia da Bugia - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD 2012 19/nov Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis macho 1,91 Adulto 2012 19/nov Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis macho 1,79 Adulto 2012 19/nov Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis macho 1,77 Adulto 2012 19/nov Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis femea 1,66 Adulto

2013 08/fev Praia Dois - Conceição da Barra Sotalia guianensis DD _ DD

2013 21/fev Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD _ DD

2013 17/abr Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD 1,55 Infanto/juvenil 2013 05/mai Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis femea 1,6 Infanto/juvenil 2013 29/jun Foz do Rio - Conceição da Barra Sotalia guianensis macho 1,91 Adulto 2013 05/ago Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD 0,915 Infanto/juvenil

2013 05/out Praia de Guriri - São Mateus Sotalia guianensis DD _ DD

*CT (Comprimento Total): Comprimento desde o extremo da maxila até a reentrância central da cauda

A distribuição dos encalhes na área monitorada pode estar relacionada a diversos fatores de influência como a topografia do fundo, vento, correntes oceânicas, ressurgências e eventos sazonais (Leeney et al., 2008), assim como do tamanho e do peso da carcaça e do local onde ocorreu a morte do indivíduo (Norman et al., 2004).

O predomínio de encalhes da espécie Sotalia guianensis esta relacionada às características da espécie como tamanho, abundância e hábitos costeiros. E provavelmente ocorreu devido à predominância da espécie na área de monitoramento, confirmada através de visualizações da espécie nas praias de Conceição da Barra e Guriri durante todo o ano. È importante ressaltar que não foi o primeiro registro de Peponocephala electra no estado do Espírito Santo (Gasparini e Sazima, 2006).

Dos animais encalhados, foi possível a identificação do sexo em somente 12 indivíduos, devido ao estado de decomposição da carcaça, ausência do órgão sexual ou impossibilidade de realizar a necrópsia e/ou biometria. Mas a maioria dos animais foi encaminhada a órgãos responsáveis para futuras análises. Dos animais identificados apenas três eram fêmeas.

Entre os botos cinza a média do comprimento total foi de 165 cm. Dos 15 golfinhos com o comprimento total registrado, 10 seriam adultos (66,66%) e cinco seriam infanto/juvenil (33,33%). Entre os adultos o comprimento total apresentou uma média de 187 cm e entre os infanto/juvenis, 117 cm.

Alguns estudos ao longo da costa brasileira apresentaram o mesmo padrão de identificação com a maioria de registros de encalhes para machos. Os autores sugerem tal fato a uma possível segregação entre sexos e idade (maturação sexual) (López et. al., 2002; Spinelli et. al., 2002; Silva e Siqueira, 2003; Medeiros, 2006). Segundo Rosso-Londoño (2010), o maior número de encalhes de indivíduos adultos pode estar relacionado com o transporte das carcaças, já que quanto maior o indivíduo mais resistente à decomposição e tem mais possibilidade de alcançar à costa. Outra possibilidade é o cuidado parental que já foi descrito para o boto cinza (Rautenberg e Monteiro-Filho, 2008), o que indica que os filhotes estão constantemente resguardados pelos adultos, diminuindo o risco de filhotes e jovens apresentarem interações com embarcações de turismo ou pesca, colocando em risco a sua sobrevivência.

A média de comprimentos para indivíduos adultos de Sotalia guianensis é de 170 cm (Da Silva e Best, 1996). O presente estudo apresentou valor um pouco menor (165 cm), o que pode ser explicado pela existência de variações geográficas para as espécies ao longo de sua distribuição no litoral brasileiro (Da Silva e Best, 1996).

Quando comparados os registros de encalhes de pequenos cetáceos ao longo dos meses coletados, os dados apresentaram uma relação significativa com p < 0,05. O que pode estar relacionado aos pequenos picos de encalhes dos meses próximos ao verão (Figura 2), onde há uma intensificação na atividade pesqueira da região devido ao turismo (Gárcia-Prado e Freitas, 2008).

Figura 02: Número de encalhes por mês com as diferentes espécies registradas.

Cox et al. (1998) e López et al. (2002) afirmaram em seus estudos ter um aumento de encalhes registrados em específicos períodos do ano relacionado às condições climáticas. E evidenciam o período do verão onde a atividade recreativa na linha costeira é mais intensa. Estudos realizados ao longo do litoral brasileiro apresentaram o mesmo padrão. Dapper (2002) mostra que a primavera e o verão são as estações que apresentam os maiores índices de capturas acidentais por unidade de esforço, além de um elevado número absoluto. Ferreira (2005) ao estudar os encalhes observou que as maiores taxas ocorreram nos meses de novembro, dezembro e janeiro. Menezes (2005) apresentou resultados semelhantes com o verão apresentando maior índice de encalhes seguido pela primavera.

Dos 29 espécimes encontrados encalhados, oito possuíam marcas de redes, ferimentos ou cortes, seis não puderam ser avaliados devido ao grau avançado de decomposição e 15 não apresentavam marcas visíveis (Figura 03).

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