• Nenhum resultado encontrado

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 Função-objetivo das corporações

2.3.1 Maximização da riqueza dos acionistas

Também conhecida com a “teoria dos shareholders”, o objetivo de maximização da riqueza dos acionistas se desenvolveu a partir das teorias econômica e financeira. Quanto à primeira, os principais trabalhos sobre a teoria da firma, como os de Alchian e Demsetz (1972), Jensen e Mecking (1976) e Fama e Jensen (1983), defendem que os proprietários são os detentores dos direitos residuais e as decisões da empresa devem ser orientadas pelos seus interesses.

Sob essa ótica, a corporação é entendida como uma entidade maximizadora do valor para os acionistas, as relações contratuais são enfatizadas e as leis têm a função de promover a liberdade contratual, a qual é garantida pela (o): “mão invisível”, competitividade dos

1SMITH, A. The wealth of nations, 1776. Edited by Edwin Cannan, 1904. Reprint. New York: Modern Library,

1937.

produtos e da mão-de-obra, e mercado de controle corporativo (SUNDARAM; INKPEN, 2004). Dessa maneira, os princípios da livre empresa propostos por Adam Smith1, no qual o empresário, ao perseguir seu próprio benefício, é guiado por uma “mão invisível” e proporciona automaticamente a realização dos objetivos da sociedade, são um dos pilares da teoria dos shareholders (ASSAF NETO, 2010).

Ademais, a maximização da riqueza dos proprietários utiliza a hierarquia de recebimentos das empresas como argumento a seu favor. Pois, os acionistas só serão remunerados depois que todas as obrigações da companhia forem cumpridas, como os pagamentos: aos fornecedores; aos empregados (salários); de juros e amortizações aos credores; e de impostos ao governo (TSE, 2011). Nessa visão, os acionistas são os

stakeholders que estão expostos ao maior risco e possuem menos direitos legais em relação à

firma.

Comumente a administração financeira também se orienta pelos princípios da livre empresa e tem como propósito a criação de valor para os acionistas (DAMODARAN, 2001; BREALEY; MYRES, 2003; GITMAN, 2004). De acordo com Koller, Goedhart e Wessels (2005), o valor operacional da companhia é igual a soma dos valores presentes de seus fluxos de caixa livres futuros, como formalizado pela Equação (1):

Valor da Empresa =

(1)

Em que:

FCF: Free Cash Flow (Fluxo de Caixa Livre);

WACC: Weighted Average Cost of Capital (Custo Médio Ponderado de Capital);

Nesse modelo de fluxo de caixa descontado, os administradores podem incrementar o valor da firma, ceteris paribus, por meio do aumento da soma dos fluxos de caixa futuros e/ou pela diminuição do custo de capital. Para aumentar o valor da empresa também é fundamental a mitigação dos custos de agência. Estes podem surgir: do conflito entre gestores e credores, quando os primeiros tentam abaixar o custo do capital de terceiros; ou do conflito entre gestores e acionistas diante de decisões sobre possíveis aquisições que podem aumentar as receitas da empresa e, teoricamente, o valor de seus fluxos de caixa futuros. (TSE, 2011).

Entre os trabalhos que defendem a teoria dos shareholders, deve-se ressaltar o de Jensen (2001). Para o autor, a questão essencial do debate sobre a função-objetivo das organizações encontra-se na opção das mesmas por um único objetivo ou por múltiplos objetivos. Conforme Jensen (2001), quando a firma opta por esse último ela permanece sem objetivo, pois não seria possível maximizar mais de uma dimensão e, assim, os gestores não estariam aptos para tomar decisões corretas diante de critérios que não são claros.

Como exemplo, Jensen (2001) utiliza uma situação na qual o administrador enfrenta um trade-off entre o aumento dos lucros da firma ou o incremento de sua participação no mercado, esboçada na Figura 2.2. Nela, se a empresa adotar múltiplos objetivos, como os de aumentar o lucro e o market share, os gestores tomariam decisões embasadas em critérios subjetivos e, provavelmente, não maximizariam os lucros nem a participação no mercado.

Figura 2.2 − Conflitos de escolhas na presença de múltiplos objetivos Fonte: Jensen (2001, p. 10).

Sundaram e Inkpen (2004, p. 353) formularam cinco argumentos a favor da primazia da teoria dos shareholders:

1. O objetivo de maximizar o valor dos proprietários favorece os stakeholders;

2. Maximizar o valor dos acionistas cria incentivos apropriados para os gestores assumirem riscos empresariais;

Lucro Máximo

Participação de mercado máxima

3. Adotar mais de uma função-objetivo tornará a administração da empresa difícil, senão impossível;

4. É mais fácil para os stakeholders se tornarem acionistas do que o inverso;

5. No caso de não cumprimento dos contratos, os stakeholders (não proprietários) usufruem de maior proteção contratual e do sistema legal do que os acionistas.

O primeiro argumento é fundamentado pela suposição de que ao maximizar o valor dos proprietários, maximiza-se o valor global da firma. Para os autores, só os detentores dos direitos residuais (acionistas) buscam a valorização da companhia, visto que as demais partes interessadas não possuem motivações para incrementar o valor da firma acima do ponto em que as suas obrigações sejam asseguradas. Assim, para os credores não importa se a empresa tem um desempenho bom ou excelente e, dessa maneira, eles podem considerar excessivamente arriscados projetos que aumentariam o valor da empresa.

Sundaram e Inkpen (2004) justificam o segundo argumento pela afirmação de que a gestão voltada para os stakeholders diminui os incentivos para a empresa assumir riscos. Para os autores, os acionistas se preocupam com o risco sistemático (não diversificável) dos fluxos de caixa da empresa, uma vez que eles já possuem portfólios bem diversificados, que mitigam o risco não sistemático. Todavia, os demais stakeholders e os gestores são mais avessos a riscos e preocupam-se com risco total da companhia. Nesse sentido, a adoção da função- objetivo que equilibra os interesses de todas as partes, pode culminar com a não aprovação de projetos de investimento relativamente mais arriscados (como novos mercados, produtos e tecnologias), que sustentam a competitividade da corporação e representam oportunidades de crescimento.

A terceira proposição é baseada no artigo de Jensen (2001). Para os autores não é possível administrar os interesses de múltiplos grupos, haja vista que as ambições desses participantes são muitos diferentes. Nas palavras de Sundaram e Inkpen (2004, p. 355):

In summary, it is not possible to manage on behalf of multiple constituencies when their goals are in conflict. Even if it were possible to do so, it may not be socially desirable to allow managers the unfettered freedom to do so. Shareholder value, on the other hand, is a single-valued metric that is also observable and measurable.

O quarto argumento refere-se ao fato de que os credores, fornecedores, consumidores e os empregados, mediante a compra de ações, poderem se tornar acionistas da empresa, sendo que o inverso é muito complexo. Por fim, Sundaram e Inkpen (2004) justificam a

quinta alegação ao afirmarem que as demais partes interessadas possuem contratos apenas explícitos com a empresa, o que possibilita que elas recorram ao poder judiciário a qualquer momento. Já os acionistas, além dos contratos explícitos, também têm contratos implícitos com a firma referentes a seus direitos residuais sobre o fluxo de caixa líquido.