2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.4 Governança corporativa
2.4.3 Sistemas de governança corporativa pelo mundo
As características do sistema financeiro no qual as empresas operam influenciam o modelo de governança corporativa adotado por elas. Segundo Johnson et al. (2010), em geral, os sistemas financeiros podem ser classificados em quatro diferentes tipos, que não são mutuamente excludentes, isto é, existem países cujo sistema financeiro pode ser classificado em mais de uma categoria. O primeiro (market-based financial system) tem nos mercados a sua fonte primária de captação de recursos, há o predomínio do financiamento por meio de capital próprio (via ações), de estruturas de propriedades pulverizadas, de mercados de controle corporativo ativos e de mercados de mão de obra flexíveis. Ele pode ser encontrado nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Austrália.
Há também o sistema financeiro focado em bancos (bank-based financial system), os quais representam a principal fonte de capital na economia. Nele, o financiamento de longo prazo ocorre, em sua maioria, por capital de terceiros (debt), com o endividamento das companhias. A estrutura de propriedade é caracterizada por blocos de acionistas
controladores, os mercados de controle corporativo não são atuantes e os mercados de trabalho são rígidos. Em países como Japão, Alemanha e Áustria pode-se observar esse sistema
O terceiro tipo é centrado em famílias tradicionais (family-centred financial system), mesmo que os financiamentos ocorram por meio do mercado acionário e dos bancos. Nos países onde há o predomínio desse sistema, a maioria das firmas é controlada por um único acionista que representa, em geral, famílias tradicionais. Dessa maneira, essas famílias controlam a maioria do capital na economia. Esse modelo predomina no sudeste da Ásia, como na Coréia do Sul.
Por fim, a última categoria é o sistema financeiro de economias emergentes (financial
system of emerging economy), como no caso do Brasil, da China e da Índia. Nele, a
concentração da estrutura de propriedade e os mecanismos informais surgem como alternativas para combaterem a incipiência dos modelos de governança. Nesses países, os sistemas financeiros baseados em bancos, mercados ou famílias perdem espaço para os governos, oligarcas e grandes corporações. No entanto, de acordo com Johnson et al. (2010), com o passar do tempo os sistemas financeiros devem migrar para sistemas focados em famílias, bancos e/ou mercados.
Em geral, podem-se dividir os sistemas de governança corporativa em duas categorias: o modelo baseado no mercado (market-based model); e o modelo baseado no controle (control-based model) (BAI et al., 2004). O primeiro modelo é encontrado nos Estados Unidos e no Reino Unido e se caracteriza por: conselhos de administração independentes; estruturas de propriedade dispersas; transparência na divulgação de informações; mercados ativos de aquisições hostis; e infraestrutura legal bem desenvolvida. Já o segundo sistema de governança é observado comumente em economias emergentes e na Europa, onde predominam: conselhos que não são independentes (geralmente tomados por membros da diretoria executiva); estruturas de propriedade concentradas; transparência limitada na divulgação de informações; mercados de controle corporativo quase inexistentes; e famílias tradicionais ou bancos extremamente influentes (BAI et al., 2004). Contudo, essa classificação é muito simplista, sendo que algumas peculiaridades dos diversos modelos de governança espalhados pelo mundo encontram-se no Quadro 2.3.
Entre os diversos sistemas de governança corporativa existentes no mundo, os mais eficazes são aqueles que oferecem maior segurança aos seus financiadores quanto ao retorno de seus investimentos, conseguindo atrair um grande volume de recursos para a corporação. Shleifer e Vishny (1997) descreveram algumas formas pelas quais as companhias podem ter
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PAULA. G. M. Governança corporativa no Brasil e México: estrutura patrimonial, práticas e políticas
públicas. Uberlândia, UFU, 2003.
4
NAUGTHON, A. Corporate governance: an international perspective. Southcoast: Griffith University, 2002.
acesso a fontes de financiamento. A primeira delas decorre da reputação dos gestores no mercado de capitais ou de expectativas excessivamente otimistas dos investidores sobre o retorno de seus investimentos em certos momentos esporádicos.
Características definidoras Modelo anglo-saxão Modelo alemão Modelo japonês Modelo latino- europeu Modelo latino- americano Financiamento
predominante Equity Debt Debt Indefinida Debt
Propriedade e
controle Dispersão Concentração
Concentração com cruzamentos Concentração Familiar concentrado Propriedade e gestão
Separadas Sobrepostas Sobrepostas Sobrepostas Sobrepostas
Conflitos de agência Acionistas- direção Credores- acionistas Credores- acionistas Majoritários- minoritários Majoritários- minoritários Proteção legal a minoritários
Forte Baixa ênfase Baixa ênfase Fraca Fraca
Conselho de Administração Atuantes, foco em direitos Atuantes, foco em operações Atuantes, foco em estratégia Pressões para maior eficácia Vínculos com gestão Liquidez da participação acionária
Muito Alta Baixa Em evolução Baixa
Especulativa e oscilante
Forças de controle mais atuantes
Externas Internas Internas
Internas migrando para Externas Internas Governança corporativa Estabelecida Adesão crescente Ênfase crescente
Ênfase em alta Embrionária
Abrangência dos modelos de governança
Baixa Alta Alta Mediana Em transição
Quadro 2.3 − Comparação entre os modelos de governança corporativa
Fonte: Elaborado por Andrade e Rossetti (2006, p. 336) baseado em Paula (2003)3; Naugthon (2002)4; Becht,
Bolton e Röell (2002).
Todavia, para captar recursos, em geral, as organizações têm que conceder poderes aos investidores. Nesse sentido, Shleifer e Vishny (1997) apontaram a proteção legal aos investidores contra a expropriação de suas riquezas (por parte dos executivos e acionistas controladores), como um dos mecanismos de governança empresarial capaz de possibilitar o acesso a esses fundos. Na ausência de leis que protejam os interesses dos financiadores, a
concentração na estrutura de propriedade, por meio de grandes acionistas, poderia mitigar os custos de agência, com um monitoramento mais efetivo sobre os gestores. Porém, os proprietários com grandes participações também poderiam expropriar a riqueza dos demais acionistas aos buscarem os benefícios privados do controle.
Ainda de acordo com Shleifer e Vishny (1997), a concentração na estrutura de propriedade e a proteção legal são mecanismos complementares de governança corporativa. Modelos de governança considerados eficientes como o norte-americano, o japonês e o alemão combinam uma proteção legal eficaz com alguns grandes acionistas. Contudo, ao mesmo tempo, os autores reconheceram que ainda não há evidências suficientes que apontam qual é o melhor sistema de governança corporativa.