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5.1 As mediações do fandom de Romance no Brasil

5.1.2 Mediação da tecnicidade

A mediação da tecnicidade se dá na relação entre Lógicas de Produção (LP) e Formatos Industriais (FI), sua ênfase é nas novas práticas que são geradas a partir do técnico, da tecnologia. Baseada em Girardi Júnior (2018), também vejo essa mediação como abertura para pensar a materialidade e as novas mídias. É possível pensar na parceria entre fãs e editoras como uma nova prática que surge a partir da web 2.0 que possibilita às fãs escreverem sobre suas leituras, sendo cooptadas pelas editoras, portanto, uma mediação de tecnicidade. Como isso já está retratado ao longo do texto, foco aqui em um aspecto: as capas de Romance e o colecionismo.

As capas de Romance são um dos aspectos mais importante para mercado e fandom. Um dos principais motivos é que através delas é possível identificar o subgênero do livro, sem se atentar para qualquer aspecto verbal antes do visual. Não à toa, as blogueiras fazem entrevistas em seus blogs com os modelos de capas e estes são atrações principais em convenções de Romance. Inclusive é impossível passar pelo fandom, principalmente o de época, e não saber quem é Fabio Lanzoni. O modelo italiano foi capa de 462 livros de Romance nas décadas dos anos 1980 e 1990, tendo recentemente perdido o título de modelo mais fotografado do gênero, para o norte-americano Jason Baca, com 540 capas31.

31 Informações disponíveis em: https://www.mercurynews.com/2017/06/09/the-king-lives-here-los-gatos-home-

115 Figura 10: Modelos famosos de capas de Romance

O modelo Fabio protagoniza as duas primeiras capas, cujo estilo ficaram conhecidas como “bodice ripper” (“arrancador de corpete”) e, na terceira, Jason Baca. Fonte: internet, 2019.

Acertar a capa pode ser decisivo para uma editora, pois as fãs ficam atentas e fazem reclamações se não a acham adequada, seja qual for a razão. Durante os três anos que acompanhei as páginas online das editoras, observei vários casos de reclamações e, principalmente uma tendência que ocorre devido as possibilidades da internet. Hoje é comum as editoras e blogueiras postarem em primeira mão as capas de livros que serão lançados e, em alguns casos, realizarem votações online para decidir qual capa será publicada.

O primeiro caso foi em 1 de agosto 2016. A Planeta de Livros Brasil divulgou a capa de “Desejo concedido”, de Megan Maxwell. Receberam tantas reclamações de a capa não representar bem a história de uma jovem guerreira que, no dia seguinte, a editora ofereceu outra opção escrevendo “Vocês venceram, guerreiras!” e, mesmo ainda não sendo a mais apreciada, as fãs agradeceram.

116 Figura 11: Anúncio de capa

Fonte: https://www.facebook.com/PlanetadeLivrosBrasil, 2016.

Figura 12: Capa alterada após reclamações

Fonte: https://www.facebook.com/PlanetadeLivrosBrasil, 2016.

Em abril de 2017, Diana Medeiros do blog “Meu vício em Livros” (http://www.meuvicioemlivros.com/), apresentou outro problema com capa. Porém, este não foi resolvido. A reclamação partiu da imagem da mulher da capa não corresponder à época, isto é, ela está maquiada, o vestido não acompanha a moda da época, além de a tradução do título não estar exata (ao invés de “atraída”, deveria ser “sedução de um highlander”) e ser a tradução de outro título da série.

117 Figura 13: Reclamação de capa

Fonte: https://www.facebook.com/diana.medeiros.9/posts/1390607320982414, 2017.

Porém, neste caso, a capa não foi alterada. Como me explicou um profissional entrevistado, por mais que eles tenham vontade de atender os fãs, às vezes não é possível devido ao contrato com as editoras originais.

Um terceiro caso, em 9 de junho de 2017, foi o da Globo Alt que ofereceu duas opções de capas para as leitoras votarem. Porém, nenhuma agradou. Entre as reclamações estavam que a imagem “mais estava para um romance adolescente”, a “tipografia tá muito 13 anos” e “coloca a original”. As reclamações foram tantas que a editora ofertou outras duas opções, além das duas originais, para uma nova votação 21 dias depois. A mais votada foi a quarta opção.

118 Figura 14: Votação de capa

Fonte: https://www.facebook.com/globoalt/, 2017.

São várias os casos de capas rejeitadas pelas fãs e das capas postas em votação pelas editoras quando podem. Nessas discussões pude presenciar dois lados: as blogueiras mobilizando as fãs para a votação ou crítica nas páginas das editoras, assim como acompanhei em uma entrevista a profissional em alguns momentos trabalhando e num desses acionando as blogueiras para explicarem que não era culpa da editora, pois não podiam fugir ao contrato coma editora original. Ambos os lados agiam de forma informal e íntima com seus interlocutores para cada caso. As blogueiras, quando em reclamação das capas, começavam em tom de conversa, fazendo suas próprias reclamações e após dizendo que para podermos mudar

119 algo tínhamos que comentar. Os três casos apresentados parecem isolados, mas são bastante rotineiros no universo do Romance.

Outro aspecto da mediação das tecnicidades envolve o colecionismo. Como destaca Woo (2014), culturas de fãs estão ligadas a algum objeto ou conjunto de objetos, resultando em práticas como o colecionismo. A importância da capa do livro já foi brevemente apresentada, sendo que o livro é um dos objetos mais colecionados pelas fãs. No meu questionário perdem apenas para os marcadores de páginas, eleito por 62% das respondentes.

Gráfico 26: Objetos colecionados

Fonte: Elaborado pela autora

Mas há outros objetos importante para o fandom, como protetores de capas artesanais, bottons e afins. Os brindes e prêmios dados nos encontros tornam-se criativos e aproximam as leitoras do universo de algum título. No encontro “Bate-papo Valentina – Romances Contemporâneos” (“4” no Quadro 1), por exemplo, as participantes ganharam um cupcake, feito pelas organizadoras, pois um dos livros apresentados contava a história de uma confeiteira que cozinha o doce. As capas artesanais em tecido servem para proteger o livro mas também para esconder a capa. Os marcadores, quando feitos pelas blogueiras, serve para apresentar os links do blog e suas redes sociais. Os brindes são rotineiros nos encontros de fãs, sendo que algumas fãs vão apenas pelo sorteio. Mas nem sempre a editora envia brindes ou estes chegam a tempo do evento. Portanto, as blogueiras produzem brindes elas próprias, personalizando bloquinhos, fazendo bottons, cozinhando doces, entre outras opções. Ás vezes, suas criações são sorteadas ou dadas juntas com os brindes fornecidos pelas editoras.

450 260 202 167 165 25 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 Marcadores de páginas

Livros (ex.: ter todas as capas do mesmo título) Bottons Não respondeu Itens personalizados (cardenetas, chaveiros...) Não coleciona

120 Figura 15: Objetos customizados do fandom

Capa para proteger o livro (com alça), cupcake e kit com caderneta, botton chaveiro e adesivo personalizados. Fonte: Registradas pela autora, 2016.

A prática de produzir objetos colecionáveis pelas blogueiras acontece principalmente quando as editoras e as escritoras não o cumprem a demanda. E o sorteio e recebimento de brindes relacionados aos livros e subgêneros é uma prática comum tanto no Brasil como no exterior, porém, aqui acaba contando muito com as produções das blogueiras.

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