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CAPÍTULO I – Ansiedade na Performance Musical Revisão da Literatura

1.4. Tratamento

1.4.4. Medicação Betabloqueadores

Segundo a revisão bibliográfica de Burin e Osório (2017), os estudos feitos sobre medicação são mais raros e focam-se, geralmente, nos betabloqueadores, sendo por essa razão que nos iremos concentrar apenas neste tipo de substância.

Na revisão bibliográfica de Sinico e Winter (2012, pág. 60), a posição dos autores foi a seguinte:

Os beta-bloqueadores são medicamentos que atuam no controle fisiológico do organismo, diminuindo a ação da adrenalina na corrente sanguínea. Tem sido utilizado por músicos profissionais, muitas vezes sem supervisão médica, no controle da ansiedade na performance musical... embora não se conheçam resultados físicos/ psíquicos/comportamentais em longo prazo do uso recorrente de tais medicamentos. Utilização de uma droga medicamentosa, dosagem excessiva, conjuntamente com redução na expressividade na performance musical são indicadores negativos na utilização deste tratamento.

De acordo com Burin e Osório (2017), num estudo realizado no Brasil a músicos licenciados (Nascimento, 2013), 17.27% daqueles que foram entrevistados reportaram que faziam uso de betabloqueadores para controlar a ansiedade na performance musical, especialmente em performances a solo, concursos e masterclasses. As autoras explicaram que, segundo a perspetiva dos músicos acerca da qualidade, o uso desta substância favorecia uma redução no medo de exposição, autocrítica e pensamentos negativos. Contudo, Nascimento (2013) concluiu que o tratamento farmacológico para os músicos é uma opção menos viável, uma vez que os ansiolíticos podem comprometer o controlo motor, assim como os betabloqueadores podem prejudicar a performance musical. Não obstante, Burin e Osório (2017) mencionam um estudo, segundo as mesmas, importante, feito por Fishbein et al. (1988), no qual participaram 2212 músicos de orquestra, sendo que 27% desse número já tinha usado betabloqueadores, sobretudo indivíduos do sexo feminino.

Numa revisão bibliográfica realizada por Taborsky (2007), também o autor faz referência ao estudo de Fishbein et al. (1988), acrescentando que 96% dos participantes que já tinham usado betabloqueadores reportaram que a substância em causa era bem sucedida na redução de ansiedade na performance. Acrescentou ainda que os instrumentistas do grupo dos metais, segundo o estudo, tinham mais tendência para usar este tipo de

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medicação comparativamente com os outros grupos de instrumentos, e que medo do palco foi o problema mencionado com maior frequência entre os participantes.

Taborsky (2007), descreve ainda um estudo realizado por James e Savage (1984), no qual os investigadores compararam os efeitos de um tipo de betabloqueador com os efeitos de um tipo de benzodiazepina contra a ansiedade na performance e a influência que as mesmas tinham na qualidade da performance musical, numa amostra de 31 instrumentistas de cordas de universidades de Londres. Os participantes foram divididos em dois grupos: um que tomou o betabloqueador (nadolol) e outro que tomou a benzodiazepina (diazepam). Cada músico teve fazer um pequeno recital duas vezes. Para uma das atuações os participantes receberam a respetiva medicação e para a outra foi-lhes administrado um placebo. De acordo com Taborsky (2007), os autores do estudo não encontraram uma diferença significativa nos sintomas físicos observados e autoavaliados de ansiedade na performance entre a medicação e o placebo nos diferentes grupos. No entanto, verificou-se uma redução significativa na frequência cardíaca e um melhor resultado no que toca ao controlo do arco no grupo daqueles que utilizaram o betabloqueador. O mesmo não se observou naqueles que fizeram uso da benzodiazepina. Em conformidade com Kenny (2005), os performers preferem usar betabloqueadores em vez de ansiolíticos, devido à redução de impacto que estes têm em funções centrais como função cognitiva e atenção. A autora explica na sua revisão de literatura sobre tratamentos para a ansiedade na performance musical, que os betabloqueadores parecem ter maior eficácia para os músicos que reportam principalmente manifestações somáticas no que toca à sua ansiedade, dando como exemplo: palpitações, hiperventilação, tremores ou palmas suadas. No entanto, parecem ser menos eficazes para aqueles que experienciam efeitos mais cognitivos e psicológicos, nomeadamente autoestima baixa, fobias sociais, ou ansiedade generalizada.

Kenny (2005), no mesmo artigo, faz referência a Nubé (1991), a qual identificou 9 estudos que analisaram os efeitos de diversos betabloqueadores contra a ansiedade na performance musical, sendo que Kenny (2005) identificou 2 estudos adicionais, especificamente o de Berens e Ostrosky (1988) e o de Lidén e Gottfries (1974). Segundo a autora, o tamanho das amostras nos estudos em questão é, no geral, pequeno e a maioria usou participantes que não foram formalmente diagnosticados com ansiedade na performance musical. Relativamente ao nível de habilitações dos músicos utilizados, três

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dos estudos utilizaram estudantes, dois utilizaram profissionais e quatro utilizaram uma mistura dos dois. Não foi possível fazer uma meta-análise, uma vez que o tipo de fármaco, a dosagem, o tempo de administração ou a maneira como mediram os resultados foram diferentes de estudo para estudo. Kenny (2005) esclarece, contudo, que em sete dos nove estudos reportados por Nubé (1991), assim como nos dois estudos adicionais, sintomas associados a hiperatividade simpática foram consideravelmente melhorados pela medicação. No entanto, as descobertas feitas sobre os efeitos dos betabloqueadores noutras medidas de resultados forma menos conclusivas. Como exemplo, Kenny (2005) explica que em dois dos estudos atrás referidos, de James, Griffith, Pearson e Newbury (1977), e James, Burgoyne e Savage (1983), os investigadores reportaram um impacto positivo da medicação na afinação em instrumentistas de cordas, enquanto que no estudo realizado por Pearson e Simpson (1978) os autores não encontraram diferenças na afinação entre aqueles que foram medicados e os que não foram. Kenny (2005) refere ainda que os resultados foram diferentes consoante os fármacos utilizados, exemplificando com o facto dos betabloqueadores designados como propanolol e oxprenolol apresentarem uma redução na ansiedade, assim como no tremer do arco, ao contrário do nadolol, o qual não apresentou tais efeitos. Em relação aos estudos que fizeram uso, além de medidas fisiológicas, de medidas subjetivas para a avaliação dos resultados, a maioria reportou que o uso das substâncias em questão não teve qualquer efeito em medidas como perceção de performance, ansiedade-estado ou ansiedade-traço, escala de classificação de medo do palco, ou avaliação do júri da qualidade da performance.

Por fim, Kenny (2005) salienta o estudo feito por Berens e Ostrosky (1988), no qual os investigadores avaliaram o impacto do uso de bloqueadores antes de uma performance musical. A experiência foi efetuada num total de 150 instrumentistas e cantores e concluiu que este tipo de medicação não só reduzia a taquicardia, como também melhorava a qualidade da performance. No entanto, os autores alertaram para potenciais dificuldades na desabituação da substância e sintomas secundários indesejados, dentro dos quais podemos encontrar: extremidades frias, desconforto gastrointestinal, distúrbio no sono, fadiga muscular, bradicardia e hipotensão. Será importante mencionar ainda que os mesmos foram reportados em, pelo menos, 10% dos consumidores deste tipo de medicação.

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Matei e Ginsborg (2017), referem que, segundo a revisão sistemática dos diferentes tipos de intervenção para a ansiedade na performance musical realizada por Brugués (2011), o uso de betabloqueadores pode reduzir alguns sintomas fisiológicos causados pela condição em questão. No entanto, os mesmos devem ser utilizados com cautela pelos instrumentistas de sopros e pelos cantores, uma vez que podem levar ao aumento da salivação e, por conseguinte, prejudicar as suas performances.

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