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Meios de fomento segundo o tipo de vantagens outorgadas: classificação tradicional e sua

PARTE I – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

5.2 Meios de fomento segundo o tipo de vantagens outorgadas: classificação tradicional e sua

A partir da classificação de Jordana de Pozas, os meios de fomento, em relação ao tipo de vantagens que outorgam, podem ser divididos em honoríficos, econômicos e jurídicos.121

Segundo o autor, são honoríficos os meios que compreendem distinções e recompensas concedidas como reconhecimento público de um ato ou conduta exemplar, tais como condecorações, tratamentos, títulos, uso de emblemas ou símbolos, troféus, diplomas etc. Ainda que envolvam, às vezes, vantagens de caráter jurídico ou econômico, estas são acessórias, sendo mais relevante o enaltecimento social do beneficiado. Por sua vez, são meios econômicos todos aqueles que, de modo direto, autorizam o recebimento de valores ou

118GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

304.

119 A esse respeito, a autora exemplifica: “[...] a hipótese prevista no inciso II, do artigo 182 da Constituição da

República, não constitui hipótese de meio negativo de fomento, visto que se identifica nessa norma constitucional o caráter coativo e não meramente persuasivo. Ela poderia ser considerada medida de fomento se o texto constitucional recorresse apenas aos meios negativos que utilizam técnicas persuasivas, o que ocorreria, por exemplo, caso a Carta Magna facultasse ao Poder Público municipal conceder ao proprietário do solo urbano edificado uma redução, ainda que progressiva, do imposto predial urbano, vantagem que não seria aproveitada pelo proprietário do imóvel não edificado, promovendo, assim, o adequado aproveitamento do solo urbano” (MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 90).

120 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 146.

121 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

dispensam um pagamento que seria obrigatório, tal como ocorre nas subvenções,122 prêmios em dinheiro, antecipações e empréstimos, isenções e demais privilégios de caráter fiscal. Finalmente, são meios de fomento jurídico os que outorgam condições privilegiadas, que, de modo indireto, representam vantagens econômicas ou de seguridade.123

A propósito da classificação proposta por Jordana de Pozas, Fernando Garrido Falla consigna, quanto aos meios honoríficos, que não há impedimento ao uso de medidas que signifiquem um estímulo ao sentimento de honra dos administrados, não podendo ser adotadas, evidentemente, medidas que sejam incompatíveis com o regime político estabelecido.124

Antes da Revolução Francesa de 1789, o uso de distinções honoríficas era frequente, situação que foi alterada substancialmente após esta, quando chegaram a ser suprimidas. É fato, porém, que tais distinções subsistiram, aceitando-se que, sem o sentido de privilégio supralegal e de conotação social, são compatíveis com os regimes mais liberais e democráticos.125

No entanto, seria duvidoso considerar como fomento público a outorga de honras, títulos ou troféus a pessoas que já prestaram um serviço ou atividade, ainda que o Estado reconheça, posteriormente, ter havido por meio destes o atendimento do interesse público. A crítica é que se não houve persuasão, não houve atuação estatal indireta e, portanto, não houve fomento.126

Na mesma senda, para José Vicente Santos de Mendonça, a construção em comento é artificial, e somente num sentido muitíssimo lato é que o potencial de honrarias poderia conduzir ao conceito de fomento público.127

José Roberto Pimenta Oliveira considera que os meios honoríficos são admissíveis apenas quando o seu uso for compatível com a forma de governo republicana e a sua

122 Anota Ricardo Rivero Ortega, “hay que reconecer que la técnica administrativa del fomento por excelência, o

de la actividad administrativa dispensadora de ayudas públicas, es la subvención. (Derecho Administrativo

Económico. 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p. 167). No mesmo sentido, para Roberto Dromi:

“Dentro de los médios económicos se formulan diversas clasificaciones, pero todas ellas giran en torno a la columna del fomento: la subvención.” (Derecho administrativo, 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p. 725).

123 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p.53.

124 GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

306.

125COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso de derecho

administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 709.

126 MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 94.

127 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 147.

disciplina normativa prévia for a causa efetiva do desempenho da atividade fomentada, com o alcance dos objetivos administrativos.128

Especificamente quanto aos meios econômicos, Garrido Falla menciona que podem ser de caráter real, quando envolvem o uso de bens públicos, ou, ainda, quando incluem o uso gratuito de serviços técnicos129 prestados pela Administração, e de caráter financeiro, quando pertinentes a desembolsos econômicos em favor de particulares ou à liberação de obrigações fiscais.130

As vantagens financeiras se classificam em auxílios diretos e indiretos. São diretos quando constituídos por desembolsos efetivos de dinheiro do erário público a favor de particulares ou de outros entes administrativos, como antecipações, prêmios, subsídios e subvenções. E indiretos, quando não significam um desembolso imediato, uma transferência imediata de recursos aos particulares, como isenções e desonerações fiscais e admissões temporárias.131

O benefício pecuniário direto mais utilizado é a subvenção, figura típica do fomento, por meio da qual o Estado transfere dinheiro aos particulares a fundo perdido, sem expectativa de reavê-lo, para que estes o empreguem nas atividades que o Estado quer incentivar.132

Conforme lembra Rafael Munhoz de Mello, no ordenamento jurídico pátrio, a subvenção está disciplinada, superficialmente, na Lei nº 4.320/1964 e no Decreto nº 93.872/1986, ao lado do auxílio e da contribuição. A subvenção trata de uma transferência corrente, realizada para cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas, enquanto o auxílio e a contribuição são repasses classificados como transferência de capital para investimentos ou inversões financeiras. O auxílio deve estar previsto na lei de orçamento, a contribuição, em lei especial.133

128 OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 524.

129 Quanto à utilização gratuita de serviços técnicos fornecidos pela Administração, Daniel Edgardo Maljar

ressalta que esse exemplo não foi feliz. Se a atividade é da Administração, que atua diretamente, ela não poderia estar incluída no fomento (MALJAR, Daniel Edgardo. Intervencion del Estado en la prestacion de

servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 289).

130 GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

307.

131 GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II p.

308.

132 MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 270.

133 MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 271.

A Administração Pública fomentadora não transfere apenas dinheiro a fundo perdido aos particulares, concedendo, também, empréstimos por entes ligados ao Estado, como os do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com juros inferiores aos praticados por outras instituições financeiras públicas e privadas do mercado.134

Finalmente, quanto aos meios jurídicos (como por exemplo, a imposição obrigatória no mercado de um produto para favorecer a indústria nacional e a proibição de importar certos produtos), Garrido Falla os rejeita, a princípio, por constituírem uma atividade administrativa por via de coação.135

Nesse particular, André Luiz Freire, alegando ser possível sustentar a existência de meios jurídicos de fomento, lembra que há casos, todavia, em que a Administração apenas confere uma situação privilegiada a determinadas pessoas, sem usar a coação (casos, por exemplo, das microempresas e empresas de pequeno porte, que possuem direito de preferência em licitações públicas e das dispensas de licitação para a contratação de associação de pessoas portadoras de deficiência para a prestação de serviços).136

Na mesma toada, Rafael Munhoz de Mello anota que os meios jurídicos de fomento têm por característica a concessão de um status jurídico excepcional e privilegiado a certos indivíduos ou categorias de particulares que o Estado deseja proteger ou incentivar. Cita como exemplos as organizações sociais (Lei nº 9.637/1998) e as organizações da sociedade civil de interesse público (Lei nº 9.790/1999), títulos que asseguram certos privilégios, inserindo as entidades qualificadas num regime jurídico específico.137

A propósito desta específica classificação, Juan Alfonso Santamaría Pastor sustenta que a qualificação de medidas como meios jurídicos é errônea, haja vista que sua finalidade e conteúdo material são econômicos. Sustenta, outrossim, que quase nenhuma dessas medidas

134 MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 271.

135 Vale mencionar que Fernando Garrido Falla, apesar de rejeitar, a princípio, os meios de fomento jurídico,

esclarece que as dispensas podem assim ser consideradas. Dá como exemplo o caso em que, para favorecer o desenvolvimento de uma cidade em uma determinada direção, aumenta-se, nessa zona, o limite sobre a altura máxima dos edifícios, contido nas leis municipais de construção. (GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de

derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p. 315).

136 FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.175.

137 MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 269.

persegue, em verdade, fins de autêntico estímulo da iniciativa privada, constituindo técnicas obsoletas usadas para reduzir o custo de obras públicas.138

José Vicente Santos de Mendonça concorda com a primeira crítica apresentada por Santamaría Pastor, vez que tudo na matéria, a seu entender, é, no fundo, econômico.139-140 Quanto às demais críticas daquele autor, pondera o seguinte:

Quanto a estarem ultrapassados, isso não se aplica ao Brasil, país em que, mais e mais, imagina-se que a criação de externalidades econômicas juridicamente bem-intencionadas seja a solução para diversos males. Quanto a não perseguirem realmente fins de auxílio a atividades privadas de interesse público, não é comentário com o qual se concorde por inteiro: em alguns casos – como na cessão de servidores às Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, o caráter de ‘fomento a atividades privadas de interesse público’ é, até, bastante destacado. A análise é caso a caso 141. Há que se dizer que uma parte da doutrina menciona, ainda, a existência de meios psicológicos de fomento, consistentes, basicamente, em propaganda pela Administração aos administrados, sendo estes, todavia, bastante criticados, uma vez que na propaganda não existe estímulo no sentido de vantagem ou ajuda.142

Ao contrário desse entendimento, Célia Cunha Mello constata que os meios de comunicação em massa, não raras vezes, traduzem vantagens muito superiores aos estímulos de natureza econômica, podendo ser admitidos, entretanto, somente quando o Estado,

138 SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 360.

139 José Vicente Santos de Mendonça defende que os meios de fomento público são, usualmente, os creditícios e

os econômicos propriamente ditos (subvenção) e que os meios reais podem ser tidos como tais por exceção. Entende que os meios fiscais não são meios de fomento e sim medidas gerais de política econômica. Ressalva que a doutrina brasileira, em sua maioria, ao falar de fomento, inclui, tradicionalmente, os benefícios fiscais dentro da categoria. (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 148).

140 Em sentido contrário, Sílvio Luís Ferreira da Rocha anota que a classificação dos meios de fomento em

honoríficos, econômicos e jurídicos não é correta, “pois se a atribuição das vantagens honoríficas e econômicas está prevista em normas, essa espécie de fomento não deixa de ser jurídica.” (ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 35).

141 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 148.

142 A crítica é feita, por exemplo, por Pellisé Prats, Daniel Edgardo Maljar (MALJAR, Daniel Edgardo.

Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 286) e

Héctor Jorge Escola (COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso

de derecho administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 710). Também para José Vicente

Santos de Mendonça, uma simples sugestão de consumo, contida numa campanha publicitária, é vaga demais para ser qualificada como um estímulo juridicamente relevante. Ainda segundo o autor: “É curioso notar, ainda, que, a se considerar os meios psicológicos como meios legítimos de fomento público, eles incidem, a partir do Poder Público, sobre o mercado consumidor, com vistas a incentivar as empresas privadas. O esquema tradicional de fomento – pensemos na subvenção – importa ajudar diretamente as empresas, mas não seu público-alvo.” (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 147).

acenando com medidas psicológicas, estimula os sujeitos fomentados a fazerem aquilo que convém ao Poder Público.143

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