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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUCSP Tânia Ishikawa Mazon

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Academic year: 2019

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP

Tânia Ishikawa Mazon

Fomento público à inovação tecnológica

MESTRADO EM DIREITO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP

Tânia Ishikawa Mazon

Fomento público à inovação tecnológica

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Direito, na área de Efetividade do Direito – Núcleo de Direito Administrativo, sob orientação da Professora Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti.

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Banca Examinadora:

__________________________________

__________________________________

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, Haruo e Guaraciaba, exemplos de caráter, bondade, união, dedicação e amor à família, por todos os esforços e sacrifícios que fizeram em nome dos meus estudos.

Ao meu marido Cassiano, aos meus irmãos Danilo e Vanessa, aos meus cunhados Stelamares e Rodrigo e aos meus afilhados Lucas e André.

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AGRADECIMENTOS

À Professora Orientadora Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti, que ensina com dedicação, seriedade, sabedoria e respeito incomparáveis, com admiração e gratidão eternas.

Estimada Orientadora, não há palavras para lhe agradecer por todo o tempo que me dedicou, por todas as preciosas sugestões, críticas e revisões. Obrigada por sua generosidade, humanidade, paciência e por não me deixar esmorecer.

Ao Professor Doutor José Roberto Pimenta Oliveira, membro da banca do exame de qualificação, pelo incentivo constante, desde as primeiras aulas, valiosas críticas e sugestões ao presente trabalho.

Ao Professor Doutor Pietro de Jesús Lora Alarcón, membro da banca do exame de qualificação, pelas enriquecedoras contribuições ao presente trabalho.

Ao Professor Doutor João Fernando Gomes de Oliveira, pelo estímulo à realização do curso de Mestrado e à escolha do tema, críticas e contribuições sempre pertinentes, apoio, confiança e amizade.

Aos Professores Doutores Clovis Beznos, Ricardo Marcondes Martins, Sílvio Luís Ferreira da Rocha, Cláudio De Cicco, Alvaro de Azevedo Gonzaga e Luiz Alberto David Araújo, pelos preciosos ensinamentos ministrados no Programa de Pós-Graduação da PUC/SP.

À Professora Doutora Maria Paula Dallari Bucci, pelo incentivo à escolha do tema e disponibilização de material pertinente ao assunto investigado.

À querida amiga Carla Carolina Pires Mentone, pela amizade de todas as horas, incentivo, carinho e lealdade.

Aos estimados amigos e colegas do Curso de Mestrado da PUC/SP, em especial a Alessandra Cristina Girotto Rodrigues, Ana Claudia de Paula Albuquerque, Bruna Chimenti, Diogo Albaneze Gomes Ribeiro, Evelise Pedroso Teixeira Prado Vieira, Fabiano Zavanella, Fagner Vilas Boas, Flávio Feturessi, Francisco Sérgio Oto Souza Bonelli, Guilherme Corona Rodrigues Lima, Luís Maurício Chierighini, Maria Hermínia Penteado Pacheco e Silva Moccia, Mário Marcio Saadi Lima, Mirena Ferragut Gallo e Wilson José Vinci Junior, pelo aprendizado em equipe, solidariedade e momentos de alegria divididos ao longo de nossas jornadas.

À Maria Aparecida Pires Lopes, pela paciente e sempre cordial orientação quanto aos aspectos técnicos na elaboração de trabalhos acadêmicos.

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RESUMO

Na década de 90 do século XX o termo inovação passou a ser utilizado com frequência e a atrair a crescente atenção de formuladores de políticas públicas e do setor produtivo no Brasil. Tendo como pano de fundo o estímulo do Estado ao desenvolvimento científico, à pesquisa e à capacitação tecnológicas preconizado pelas Constituições Federal de 1988 e Paulista de 1989 e a necessidade premente de o País inovar cada vez mais, o presente estudo foi desenvolvido com o objetivo de analisar a função administrativa de fomento e, especialmente, a construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação, à luz da Lei Federal nº 10.973/2004 e da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008. Foi também examinado o papel do Direito na constituição de alianças estratégicas e de projetos cooperativos de inovação, assim como na formação de redes de pesquisa, incubadoras, parques tecnológicos, acordos de parceria e na participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada, apontando polêmicas surgidas na aplicação das leis citadas, assim como parâmetros para orientar a atuação promocional pública. Ao final, foram arroladas as conclusões obtidas ao longo do trabalho.

Palavras-chave: Fomento público. Inovação tecnológica. Alianças estratégicas. Projetos de Cooperação. Incubadoras. Parques tecnológicos.

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ABSTRACT

In the 1990s of the twentieth century the term innovation became to be used frequently and attract increasing attention of policymakers and the productive sector in Brazil.

Having as background the State's promotion of scientific development, research and technological expertise recommended by the Federal Constitution of 1988 and the São Paulo State Constitution of 1989 and the urgent need for the country to innovate more and more, this study was developed with the purpose of analyzing the administrative function of support and, in particular, the construction of specialized and cooperative environments of innovation in the light of Federal Law N° 10973/2004 and the Complementary State Law N° 1049/2008.

It was also reviewed the role of Law in developing strategic alliances and cooperative projects of innovation, as well as in the building of research networks, business incubators, technology parks, partnership agreements and minority stake of the Government in the capital of the privately held company, by highlighting controversies arising from the implementation of those laws, as well as parameters to guide public promotional activities. At the end, the findings obtained during the work were listed.

Key words: Public support. Technological Innovation. Strategic Alliances. Cooperative Projects. Business Incubator. Technological Parks.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ABC Academia Brasileira de Ciência

ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

ACS Alcântara Cyclone Space

ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade

AEB Agência Espacial Brasileira

ANDIFES Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino

ANPEI Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras

ANPROTEC Associação Nacional de Entidades Promotoras de

Empreendimentos Inovadores

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CCT Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia

CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

Ceitec Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada

CIS0 Community Innovation Sursey

CNCT Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia

CNCTI Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear

CNPEM/ABTluS Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais / Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncroton

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CONCITE Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia

CONFAP Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa

CONSECTI Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia

C&T Ciência e tecnologia

C,T&I Ciência, tecnologia e inovação

EMBRAPII Associação Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial ENCTI Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação EUROSTAT Statistical Office of the European Commnunities

FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais

FAPs Fundações de Amparo à Pesquisa

FINEP Financiadora de Estudos e Projetos

FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico FORTEC Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de

Tecnologia

FUNCET Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICT Instituição Científica e Tecnológica

ICTESP Instituição Científica e Tecnológica do Estado de São Paulo IDSM Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá IFE Instituição Federal de Ensino Superior

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INB Indústrias Nucleares Brasileiras INVESTE SÃO

PAULO

Agência Paulista de Promoção de Investimentos e Competitividade

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IPEN Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares

IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A MCT Ministério da Ciência e Tecnologia

MCTI Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação

MDIC Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

MEC Ministério da Educação

MPEG Museu Paraense Emílio Goeldi

NIT Núcleo de Inovação Tecnológica

Nuclep Nuclebrás Equipamentos Pesados

OEA Organização dos Estados Americanos

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

ONU Organização das Nações Unidas

OS Organização Social

OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PACTI Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional

PADCT Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico

PEC Proposta de Emenda Constitucional

PDP Política de Desenvolvimento Produtivo PDP Parceria para o Desenvolvimento Produtivo P,D&I Pesquisa, desenvolvimento e inovação PETROBRAS Petróleo Brasileiro S.A.

PIB Produto Interno Bruto

PITCE Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior Pintec Pesquisa de Inovação Tecnológica

PL Projeto de lei

PLS Projeto de Lei do Senado

PND Programa Nacional de Desestatização

P&D Pesquisa e desenvolvimento

RHAE Programa de Formação de Recursos Humanos para Áreas Estratégicas

RNP Rede Nacional de Ensino e Pesquisa

RPCITec Rede Paulista de Centros de Inovação Tecnológica

RPITec Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica RPNIT Rede Paulista de Núcleos de Inovação de Inovação Tecnológica SBDC Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência

SBPC Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SIBRATEC Sistema Brasileiro de Tecnologia

SPAI Sistema Paulista de Ambientes de Inovação SPE Sociedade de propósito específico

SPTec Sistema Paulista de Parques Tecnológicos

TRIPS Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights

TCU Tribunal de Contas da União

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

1.Delimitação do objeto ... 14

2.Relevância e atualidade do debate ... 14

3.Metodologia a ser usada ... 16

PARTEI–CONSIDERAÇÕESPRELIMINARES ... 18

1ORIGEM,USODOTERMOFOMENTO,RAZÕESECONSEQUÊNCIASDA ESCASSAEXPLORAÇÃODOTEMA ... 18

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ... 25

3 NOÇÃO DO FOMENTO PÚBLICO ... 31

4 DISTINÇÕES ENTRE FOMENTO PÚBLICO, SERVIÇO PÚBLICO E PODER DE POLÍCIA... 39

5 CLASSIFICAÇÃO DOS MEIOS DE FOMENTO ... 45

5.1 Meios de fomento segundo a forma de atuação sobre a vontade dos sujeitos fomentados: classificação tradicional e sua crítica ... 45

5.2 Meios de fomento segundo o tipo de vantagens outorgadas: classificação tradicional e sua crítica... 46

5.3 Meios de fomento segundo os fins a alcançar ... 51

5.4 Classificação do fomento segundo os tipos de ponderação e seus destinatários ... 51

PARTE II – O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NO DIREITO BRASILEIRO ... 53

6. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO DE 1989 E O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ... 53

6.1 O dever constitucional do Estado de promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas ... 61

6.2 Competências dos entes federativos para a promoção de medidas de fomento à inovação tecnológica ... 67

6.3 Ciência, tecnologia, pesquisa, capacitação e autonomia tecnológicas ... 69

6.4 Inovação tecnológica ... 75

7 A IMPORTÂNCIA DA ATUAÇÃO PÚBLICA FOMENTADORA À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ... 88

7.1 Os indicadores nacionais de inovação ... 93

(13)

8 SISTEMAS DE INOVAÇÃO ... 99

9 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CONCERTADA E A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ... 111

10 O ESTÍMULO À CONSTRUÇÃO DE AMBIENTES ESPECIALIZADOS E COOPERATIVOS DE INOVAÇÃO À LUZ DA LEI FEDERAL Nº 10.973/2004 E DA LEI COMPLEMENTAR PAULISTA Nº 1.049/2008 ... 125

10.1 Alianças estratégicas e projetos de cooperação ... 130

10.2 Redes e projetos internacionais de pesquisa, incubadoras e parques tecnológicos ... 138

10.2.1 Redes e projetos internacionais de pesquisa tecnológica ... 138

10.2.2 Incubadoras ... 141

10.2.3 Parques tecnológicos ... 150

10.2.4 Fundações de apoio ... 164

10.3 Compartilhamento e permissão de utilização de laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e instalações de Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) ... 171

10.4 Participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada... 180

10.5 Acordos de parceria com Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) ... 189

11 PARÂMETROS PARA FORMULAÇÃO E CONCESSÃO DO FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA... 192

11.1 O fomento público e o princípio da legalidade ... 193

11.2 A necessária vinculação do fomento público à inovação tecnológica ao planejamento científico e tecnológico ... 194

11.3 O fomento público e os princípios da igualdade e da livre concorrência ... 198

11.4 O fomento público, a subsidiariedade e o compartilhamento de riscos ... 203

11.5 O fomento público à inovação tecnológica motivado, transparente e controlado ... 206

PARTE III - CONCLUSÃO ... 215

(14)

INTRODUÇÃO

Há um consenso nos dias de hoje sobre o papel central que a inovação deve ter na economia.

Reconhece-se que países que inovam são mais produtivos, têm economias mais eficientes e competitivas, obtendo maiores ganhos no comércio internacional. Empresas inovadoras, de igual modo, costumam ter melhor desempenho, exportar mais e pagar melhores salários.1

A inovação, todavia, não costuma surgir espontaneamente – ela exige a assunção de riscos, a realização de investimentos vultosos, impondo àqueles que a perseguem, não raras vezes, enormes fracassos.

Em razão da necessidade premente de fazer o País inovar, o fomento público à inovação tecnológica vem despertando o crescente interesse de formuladores de políticas públicas e do setor empresarial, exigindo, também cada vez mais, maior atenção por parte dos estudiosos do Direito Administrativo.

1. Delimitação do objeto

O presente trabalho objetiva analisar o fomento público à inovação tecnológica no Direito Brasileiro e, em especial, o estímulo à construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação à luz da Lei Federal nº 10.973/2004 e da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008, assim como os principais parâmetros para o exercício da função pública promocional.

2. Relevância e atualidade do debate

Somente em 2011 os dispêndios em atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) no Estado de São Paulo, realizados pelos governos federal e estadual e por empresas do setor privado foram de R$ 21,8 bilhões, correspondendo a 1,61% do Produto Interno Bruto (PIB) do Estado. No Brasil, o valor atingiu R$ 47,2 bilhões ou 1,14% do PIB do País.2

Nos dias atuais, defende-se a ampliação de investimentos públicos e de estímulos aos investimentos do setor privado em atividades de P&D, a fim de que o investimento total

1 Imperativo da inovação.

Folha de São Paulo, São Paulo, 05 dez. 2013. Opinião, p. A2.

(15)

brasileiro na área possa alcançar, o mais rapidamente possível, patamares mais próximos dos padrões dos países desenvolvidos.3

A grandiosidade dos indicadores econômicos citados demonstra, por si só, a necessidade de expansão da matéria para além dos estudos de economistas, administradores, engenheiros e sociólogos.

É fato que a inovação costuma exigir investimentos de alta monta. Todavia, ela exige mais do que isto, estando diretamente relacionada à robustez do sistema de inovação4 existente, à sua capacidade de articulação com o processo produtivo e o setor empresarial. Vale dizer, ela depende do quadro jurídico-institucional vigente, na medida em que este pode favorecer, ou não, as condições para o investimento produtivo e inovador.5

Objetivando incentivar o desenvolvimento da inovação no País têm sido criadas iniciativas como o Movimento Brasil Competitivo6 e a Mobilização Empresarial pela Inovação,7 assim como estimulados debates em torno da necessidade de mudanças no vigente arcabouço legal atinente à matéria.

Nesse sentido, a atualidade do tema pode ser corroborada pelas discussões relacionadas à proposta de instituição de um código nacional de ciência, tecnologia e inovação (C,T&I). Encontra-se, de igual sorte, em tramitação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 290/2013, que busca atualizar o tratamento das atividades de C,T&I.8

3 Conforme a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2012-2015, no ano de 2011, o

dispêndio brasileiro em atividades de P&D era inferior aos de todos os países avançados, aos de outros membros dos BRICs e aos de outras economias de menor dimensão, como a Itália, Espanha, Coreia, Portugal e Cingapura. (MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 45).

4 Conforme explica Gilberto Bercovici, fala-se em “sistemas de inovação” ao se referir às condições

institucionais e jurídicas complexas necessárias à inovação. (BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 916, p 267-295, fev. 2012, p.289).

5 PORTO, Claudio; GIAMBIAGI, Fabio; BELFORT-SANTOS, Andréa. O Brasil em transição: panorama atual

e tendências futuras 2011-2022. In: GIAMBIAGI, Fábio; PORTO, Claudio (Org.). 2022: Propostas para um

Brasil melhor no ano do bicentenário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 3-33, p. 13.

6 Criado em novembro de 2001, o Movimento Brasil Competitivo é reconhecido como uma Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), que busca contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira, por meio do aumento da competitividade do país. Disponível em: <http://www.mbc.org.br/mbc/novo/index.php?option=conteudo&Itemid=20&Itemid=20. Acesso em: 07 ago. 2014.

7 A Mobilização Empresarial pela Inovação surgiu em 2008 com o propósito de reforçar o desenvolvimento

científico, tecnológico e de inovação no País e de mudar o foco do mundo empresarial. Tem por objetivo incorporar e aprimorar a gestão da inovação nas empresas brasileiras, além de ampliar os instrumentos públicos que buscam a inovação no país. Disponível em: <http://www.inovacaonaindustria.com.br/portal/mei. Acesso: em 07 ago. 2014.

8 A proposta do aludido código originou-se na própria comunidade científica, por meio do Fórum de Secretários

(16)

Apesar de o fomento à inovação tecnológica estar intrinsecamente relacionado à atuação do Estado, compreendendo matérias, dentre outras, pertinentes à concessão de subvenções e benefícios fiscais, à celebração de licitações, contratações públicas e parcerias e colaborações entre os setores público e privado, são bastante escassos os trabalhos do Direito Administrativo sobre o assunto.

Em verdade, abordar inovação tecnológica no meio acadêmico jurídico não é algo usual. A inovação e, em especial, a inovação tecnológica, envolve complexos e numerosos aspectos multidisciplinares,9 aos quais a área jurídica não está habituada, o que, talvez, ajude a explicar o porquê do distanciamento entre os estudiosos e operadores do Direito e os estudiosos e operadores da inovação.

Espera-se demonstrar que os desafios impostos cotidianamente pela inovação tecnológica estão a exigir, mais do que uma mera aproximação, um efetivo e urgente estreitamento de laços com o Direito Administrativo, tarefa certamente instigante, por todos os motivos expostos e que, certamente, muito poderá contribuir para o avanço do desenvolvimento nacional.

3. Metodologia a ser usada

Não obstante a multidisciplinaridade do tema proposto, o enfoque da presente dissertação será jurídico, dogmático, construído a partir do vigente direito positivado brasileiro.10-11

tendo sido analisado pelas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania e de Assuntos Econômicos. Por sua vez, o PL nº 2.177/11 foi aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, aguardando apreciação pelo Plenário. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/inovacao/projeto-de-lei-codigo-ciencia-tecnologia-e-inovacao.aspx. Acesso em: 02 ago. 2014. A PEC 290/2013 foi aprovada na Câmara dos Deputados, em segundo turno, por unanimidade, tendo seguido para a apreciação pelo Senado. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=586251. Acesso em: 01 ago. 2014.

9 Nesse sentido, pondera Glauco Arbix que a compreensão dos mecanismos mais sutis da inovação exige intenso tratamento multidisciplinar: “Como processo, é alimentada – e se alimenta – de insumos originados em diversas áreas; como produto, provoca impactos em campos distintos. Seus determinantes profundos fincam raízes em distintas esferas da vida social; e o seu desenvolvimento se desdobra em múltiplas dimensões. Estudos recentes em países avançados mostram que se trata de um processo essencialmente colaborativo e comunicativo, fruto de um fluxo contínuo de informação entre empresários, engenheiros, cientistas e usuários, mas também entre instituições que facilitam – ou dificultam – a interação com o seu entorno produtivo e o

ambiente social.” (ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São

Paulo: Papagaio, 2007. p. 30).

10 Sobre o enfoque dogmático, ensina Ricardo Marcondes Martins que há duas formas de se proceder à

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As abordagens não jurídicas, apesar de relevantes, terão natureza complementar, com o propósito de melhor elucidar as variadas interfaces do assunto.

O estudo será realizado com base em análise normativa e doutrinária.

Sempre que possível, será efetuado exame de jurisprudência, sendo de todo oportuno esclarecer, desde logo, que, em razão, provavelmente, da Lei Federal nº 10.973/2004 e da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 estarem em vigor há pouco tempo, ter havido a identificação de poucos julgados relacionados à pesquisa.

O trabalho versará, na Parte I, sobre a origem, o uso da palavra fomento, as possíveis razões e consequências da escassa exploração do tema; a evolução histórica e a noção do fomento público; suas distinções em relação ao serviço público e ao poder de polícia, assim como a classificação de seus meios.

Na Parte II, o trabalho analisará a relação entre as vigentes Constituições Federal e Paulista e o fomento público à inovação tecnológica. Para uma melhor contextualização do assunto, serão tecidas considerações sobre as noções de ciência, tecnologia, pesquisa, capacitação, autonomia e inovação tecnológicas. Serão abordados a importância da atuação pública fomentadora à C,T&I, assim como os sistemas de inovação, incluindo alguns indicadores nacionais e paulistas. Serão, ainda, investigados os instrumentos previstos na Lei Federal nº 10.973/2004 e na Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 para o estímulo à construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação, quais sejam as alianças estratégicas e os projetos de cooperação; as redes de pesquisa; as incubadoras; os parques tecnológicos; o compartilhamento e a permissão de utilização de laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e instalações de Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs), a participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada e os acordos de parceria. Por fim, serão estudados os principais parâmetros para a legítima utilização dos instrumentos da ação promocional pública.

A conclusão será, finalmente, apresentada na Parte III.

ensinar, doutrinar, possibilitar uma decisão e orientar uma ação. O enfoque da Ciência do Direito é sempre dogmático, pois alguns conceitos são tomados como indiscutíveis, dentre eles, por exemplo, a supremacia da Constituição num sistema que adota o modelo constitucionalista, tal como o sistema jurídico brasileiro. (PIRES, Luis Manuel Fonseca; MARTINS, Ricardo Marcondes. Um diálogo sobre a justiça: a justiça

arquetípica e a justiça deôntica. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 48-49).

11 Segundo José Rodrigo Rodriguez, a dogmática jurídica vem sendo tratada como o inimigo a ser combatido

pelos agentes modernizadores das instituições, sejam eles pesquisadores ou agentes públicos. O pensamento dogmático, equivocadamente, tem sido estigmatizado como o principal responsável pelo atraso das instituições latino-americanas em relação ao centro do capitalismo, sendo necessário revalorizá-lo, incorporando-o ao debate sobre o desenvolvimento (RODRIGUEZ, José Rodrigo. Dogmática jurídica e desenvolvimento. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.) Fragmentos para um dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São

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PARTEI–CONSIDERAÇÕESPRELIMINARES

1 ORIGEM, USO DO TERMO FOMENTO, RAZÕES E CONSEQUÊNCIAS DA

ESCASSAEXPLORAÇÃODOTEMA

Foi o espanhol Luis Jordana de Pozas quem, em meados do século XX, reivindicou para o termo fomento um significado técnico concreto, caracterizando-o, ao lado do poder de polícia e do serviço público, como uma das atividades administrativas destinadas à satisfação de necessidades públicas.12

Até então, na Europa continental, distinguia-se exclusivamente entre atividade de ordenação ou limitação, por um lado, e prestação de serviço público, por outro, tendo essa formulação tripartite constituído uma novidade.13

De fato, o estudo formulado por Jordana de Pozas sistematizou, com originalidade, a ação promocional, não mais como um fim em si mesmo do Estado, contribuindo sobremaneira para a atual concepção da atividade administrativa de fomento.14

Segundo a tradição administrativa, o fomento é a ação consistente em proteger, estimular, auxiliar ou fomentar atividades particulares mediante as quais se satisfazem necessidades ou conveniências de caráter geral.15

A palavra fomento origina-se do latim fomentum, contração de fovimentum, que significa aquecer, acalentar ou abrigar. No idioma espanhol, em sentido denotativo, significa dar calor para vivificar, vigorar e, em sentido figurado, estimular, promover ou proteger algo. Trata-se de uma só palavra que consegue reunir uma rica variedade de formas, tais como promover, ajudar, auxiliar, proteger, melhorar, desenvolver, estimular, premiar etc.16

Na língua portuguesa fomentar significa, dentre outras acepções, cercar de cuidados para criar ou fazer crescer, estimular; promover os meios para o desenvolvimento de (algo), estimular, promover, desenvolver.17-18

12 MALJAR, Daniel Edgardo.

Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires:

Hammurabi, 1998, p. 276.

13 DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In:

Servicio público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003. p. 413-422, p. 413.

14 HIGA, Alberto Kenji. A construção do conceito da atividade de fomento.

Revista Direito Mackenzie. São

Paulo, v.5, n. 1, p.10-36, 2011, p.12.

15 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo.

Revista de Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 49.

16 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo.

Revista de Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 49.

17 FOMENTAR. In: DICIONÁRIO Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004, p. 1.367. 18 Quanto ao uso das palavras na língua portuguesa, Ricardo Marcondes Martins observa: “Pertencem ao

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A ideia geral do fomento público, ou seja, aquele realizado pela Administração Pública,19 pelo menos a princípio, não é difícil de indicar: “trata-se de auxiliar o desenvolvimento e o exercício de uma atividade privada, que se supõe de interesse público, com meios públicos”.20

Apesar de haver elementos comuns entre as diversas noções sobre o fomento público, existem divergências doutrinárias a respeito da utilização do termo “fomento”.

Enquanto alguns autores dão preferência para o uso de expressões como “ajudas públicas” ou “recompensas públicas”, outros preferem, ainda, falar em “estímulos positivos”.21

Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras” (Regulação administrativa à luz da constituição federal. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 268). A palavra “fomentar” consta do Vocabulário em

questão, não sendo um neologismo.

19 Salienta José Vicente Santos de Mendonça que mesmo as entidades integrantes da Administração Pública

dotadas de personalidade jurídica de direito privado realizam fomento público. Ressalta que, no Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Petróleo Brasileiro S.A (Petrobras) e a Caixa Econômica Federal S.A. são, em volume de recursos, as maiores entidades fomentadoras da Administração Federal (Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p.

118)

20 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 118.

21 Destacando a polêmica acerca da denominação “fomento”, José Vicente Santos de Mendonça esclarece: “Afirma-se que a palavra “fomento” já carrearia uma escolha, ainda que implícita, por uma das possíveis definições para o instituto: a que destaca a importância da persuasividade como elemento definitório central da

atuação. Em substituição, alguns autores propõem ‘atividade administrativa dispensadora de ajudas e recompensas” ou, apenas ‘ajudas públicas’. Reconhecemos que tais autores possuem razão em suas críticas, e, até, que as denominações alternativas são melhores do que o tradicional ‘fomento’. Só que vamos ficar com ‘fomento’ mesmo, pela consagração do termo e facilidade na comunicação da ideia. Se a questão fosse maior do que a da evitação de sutilezas, talvez os novos termos vencessem a inércia em favor da denominação clássica – mas não é o caso” (Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público

democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p.

115-176, 2010, p. 118). Segundo Ricardo Rivero Ortega: “Ante la vaguedad del término fomento, parte de nuestra

doctrina propone, como sucede con la policía, una reconsideración conceptual, sustituyendo la vieja idea por otra más expressiva y circunscrita a la concreta actividad de ayuda y recompensa de la iniciativa privada. Esta propuesta es plausible, pues permite hacer énfasis en aquellas herramientas jurídicas más características del fomento (destacadamente, las subvenciones y otras ayudas económicas) cuya incidencia sobre el

funcionamiento de los mercados, que pueden perturbar, es más que notable.” (Derecho Administrativo Económico. 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p. 166). Também para Ignacio M. De La Riva, “[...] para

dotar a la figura de un perfil jurídico consistente es preciso abandonar la finalidad (de promoción o protección) y la técnica (persuasiva) como elementos definitorios y pasar a prestar atención a la constitución estructural del concepto. Esta intuición de poner el acento en la estructura interna de la figura como camino metodológico para alcanzar su consolidación definitiva ha sido enunciada por um sector de la doctrina española, encabezado por Martinez López-Muñiz y por Fernández Farreres, cada uno con matices próprios. El primero de dichos autores es quien postula, además, el abandono de la voz fomento – dada su irremediable connotación teleológica – y su sustitución por la de ayudas públicas, expresión esta última que, por cierto, ya resultaba de

uso frequente en las normas y em la doctrina europeas.” (DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento:

necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio público, polícia y fomento: jornadas organizadas por

la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 417). De acordo com

Marcos Juruena Villela Souto, a expressão “estímulos positivos” é bem mais ampla que a de fomento, nela

(20)

Neste trabalho, opta-se pela utilização da expressão “fomento público” porque, além dele constar, de forma literal, no texto constitucional (é bem verdade que o texto constitucional menciona outras expressões, tais como “incentivo” e “estímulo”), possui um sentido bastante amplo, que comporta variadas formas de apoio. Além disso, “fomento público” é a expressão consagrada nas áreas da C,T&I, ao contrário das expressões “ajudas públicas”, “recompensas públicas” e “estímulos positivos.”

Não obstante as divergências de nomenclatura, o fomento é um instituto, sem dúvida alguma, consagrado pelo direito positivo pátrio.

Nessa senda, a Constituição Brasileira, em seu artigo 3º, elege, dentre outros, como objetivos fundamentais da República, garantir o desenvolvimento nacional, além de reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos.

Dispõe, ainda, em seu artigo 174, que o Estado, enquanto agente normativo e regulador da atividade econômica, exercerá, na forma da lei, além das funções de fiscalização e planejamento, a função de incentivo.22

A figura do Estado fomentador, portanto, encontra guarida na Lei Maior.

Ademais, tanto a Constituição Federal como a Constituição do Estado de São Paulo, apesar de não aludirem de modo textual à palavra “inovação”, prescrevem, respectivamente, em seus artigos 218 e seguintes e 268 e seguintes, o dever específico de o Estado promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas; de apoiar a formação de recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia, assim como de estimular as empresas que invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento de seus recursos humanos. Não há como negar o alto potencial de vinculação dessas atividades à inovação.

No plano infraconstitucional, o fomento público à inovação tecnológica vem recebendo, cada vez mais, merecido destaque, conforme se demonstrará adiante, na Parte II, deste trabalho.

Não obstante isso, a ação administrativa de fomento tem sido examinada superficialmente, sem se dedicar maior atenção à sua singularidade e à caracterização dos atos

Marcos Juruena Villela Souto. Estímulos positivos. In: CARDOZO, José Eduardo Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito administrativo econômico. São

Paulo: Atlas, 2011, p. 741-769, p. 741).

22 Confira-se: “Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na

forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor

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pelos quais se efetiva, ao contrário, do poder de polícia e do serviço público, que têm sido objeto de múltiplos estudos.23

José Vicente Santos de Mendonça, a esse propósito, constata que o fomento não é um dos campeões de audiência nas monografias e nas teses de Direito. Explica que características próprias da atividade, como a voluntariedade e a discricionariedade, fizeram e fazem com que a sua plena juridicização seja longa e difícil, enfatizando: “O Direito tradicional, acostumado a lidar com obrigações, deveres e sanções negativas, mostra-se pouco à vontade com situações em que tais elementos não aparecem de modo evidente”.24

Nessa mesma vereda, Rafael Munhoz de Mello anota que, entre os modos de intervenção estatal na ordem econômica, o fomento é o que recebe menos atenção da doutrina, apesar de sua importância econômica e de sua ampla utilização nas mais variadas esferas da Administração Pública. Esclarece que esse desinteresse tem reflexo na jurisprudência, que registra pouquíssimos casos em que o tema foi enfrentado com profundidade.25

Célia Cunha Mello, após alertar para o fato de a experiência jurídica em matéria de fomento público ser bastante reduzida, também sublinha que a jurisprudência é quase inexistente, destacando, ademais, que tanto no Brasil como no exterior a legislação existente vem sendo constituída de forma aleatória, sem tratamento normativo sistematizado, podendo o injustificado desinteresse para com o tema comprometer o próprio desenvolvimento socioeconômico do País.26

Em estudo acerca da contratação de fomento, Marçal Justen Filho e Eduardo Ferreira Jordão refletem que a escassa exploração do tema, no Brasil, tende a produzir uma de duas consequências negativas: “ou leva à subutilização da valiosa técnica consensual para o fomento de atividades de relevante interesse coletivo ou faz com que estas contratações sejam utilizadas em situações que não as autorizam”.27

23 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo.

Revista de Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 43.

24 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 121.

25 MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p.263.

26 MELLO, Célia Cunha.

O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. xii.

27 JUSTEN FILHO, Marçal; JORDÃO, Eduardo Ferreira. A contratação administrativa destinada ao fomento de

(22)

Também para Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, o fomento, apesar de ser uma forma de intervenção estatal no domínio econômico muito polêmica, é a forma menos estudada pelos especialistas. Ressalta que a atividade estatal de fomento envolve a busca de uma infinidade de objetivos e prevê sua veiculação por outro sem número de instrumentos, pressupondo um campo inesgotável de alternativas e soluções, tão variadas quanto múltiplos são os seus móveis.28

Merece, porém, destaque o estudo de Norberto Bobbio sobre o tema do fomento, e mais especificamente, da função promocional do Direito e das sanções positivas.

Segundo Bobbio o fomento está relacionado à função social do Direito, tema que nunca recebeu muita atenção. O escasso interesse pela função social do Direito na teoria geral do direito dominante estaria associado ao relevo que os grandes teóricos, de Jhering a Kelsen, deram ao Direito como instrumento específico, cuja especificidade não deriva dos fins a que serve, mas do modo pelo qual os fins, quaisquer que sejam, são perseguidos e alcançados.29

O diagnóstico, enfim, tanto de autores brasileiros, como de autores estrangeiros, é de que o tratamento doutrinário (e, também, o jurisprudencial) atribuído ao tema, por várias razões, não tem sido proporcional à sua relevância política, econômica e social.

O fomento público, outrossim, vem sendo apontado como a atividade administrativa mais resistente ao influxo do Direito, arrolando, Ignacio M. De La Riva, cinco causas para tal situação: a) a problemática jurídica vai além do binômio autoridade-liberdade que tipifica, normalmente, o conflito que se enfrenta no Direito Público. Sendo a atividade de favorecimento, a dificuldade está em assegurar que o benefício concedido a uns não ocorra em detrimento àquilo que, justamente, corresponda aos demais; b) no fomento, a linha demarcatória entre o jurídico e o meta-jurídico não é tão clara, sobressaindo-se os aspectos não jurídicos, como os políticos e econômicos; c) isto cria, no fomento, um amplo espaço para a discricionariedade, terreno este que, por muito tempo, ficou livre de ataduras jurídicas; d) há, também, dificuldades metodológicas: no fomento confluem diversos ramos do Direito (constitucional, concorrencial, penal, internacional etc.); 5) há na ação promocional uma

28 MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. O fomento como instrumento de intervenção estatal na

ordem econômica. Revista de Direito Público da Economia- RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez.

2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=70679. Acesso em: 14 jul. 2013. (documento não paginado).

29 BOBBIO, Norberto.

Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

(23)

enorme diversidade de técnicas específicas, marcada por uma dispersão conceitual, fruto, em boa medida, da ausência de sistematização no ordenamento positivo.30

Nos dias atuais, não há mais espaço para que motivos, tais como os apontados por De La Riva, justifiquem a resistência do fomento público ao Direito. Ao contrário disso, é sabido que a maior parte das agendas das sociedades contemporâneas envolve, não raras vezes, debates que excedem a dicotomia liberdade-autoridade; e que compreendem, ao mesmo tempo, a tomada de decisões guiadas sobretudo por diretrizes econômicas e políticas. Hoje, discricionariedade não mais se confunde com arbitrariedade; as pautas político-sociais são todas multidisciplinares. Não mais se sustenta, portanto, qualquer tentativa de fazer crer que o fomento público possa estar, por alguma razão, fora do campo de incidência do Direito e, mais especificamente, dos princípios do regime jurídico administrativo. De igual forma, a resistência do Direito em analisar o tema de forma mais sistemática também não pode mais ser admitida.

Felizmente, a situação de escassa juridicização da atividade de fomento tem sido revertida, podendo ser citado como um caso paradigmático deste fenômeno o da Comunidade Europeia, em que a regulação da matéria passou a ser peça relevante do sistema, imprescindível à concretização da aspiração de formação de um mercado comum.31

No Brasil, a Lei Federal nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004 prescreve diversos meios e instrumentos de fomento à inovação.

A recente Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, que estabelece o regime jurídico das parcerias voluntárias entre a Administração Pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, define diretrizes para a política de fomento e de colaboração com organizações da sociedade civil e, ainda, institui o termo de colaboração e o termo de

30 DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In:

Servicio público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 415.

31 Segundo De La Riva: “La piedra angular del régimen de las ayudas de Estado del Derecho comunitario

europeo reposa sobre el Artículo 87.1 del Tratado de la Comunidad Europea, según el cual ‘salvo que el

presente Tratado disponga otra cosa, serán compatibles (sic) com el mercado común, en la medida en que afecten a los intercambios comerciales entre Estados miembro, las ayudas otorgadas por los Estados o mediante fondos estatales, bajo cualquier forma, que falseen o amenacen falsear la competencia, favoreciendo

a determinadas empresas o producciones.’ Los apartados 2 y 3 del mismo precepto introducen excepciones a la

regla antedicha, mientras que los Artículos 88 y 89 del Tratado proporcionan ciertos elementos de naturaleza adjetiva que completan el régimen. A partir de las disposiciones citadas, lós órganos comunitarios han elaborado una profusa normativa de desarrollo a través del dictado de numerosas comunicaciones, directrices y reglamentos que abordan los aspectos más variados de las ayudas de Estado. Los tribunales de la propia CEE,

por su parte, han contribuido a consolidar el sistema mediante una prolífica jurisprudencia en la materia.” (DE

LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

(24)
(25)

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, as instituições jurídicas estão intimamente vinculadas às relações dinâmicas entre o Estado e a sociedade, existentes no momento histórico em que se desenvolvem. As circunstâncias ideológicas, políticas, sociais e econômicas que vão se apresentando nas distintas épocas e nos distintos países resultam na transformação das instituições. Nesse sentido, as transformações das instituições jurídicas devem ser consideradas exigências da realidade, necessárias à sua própria sobrevivência.32

Assim como o serviço público e o poder de polícia, o fomento administrativo é um instituto multifacetado e dinâmico. A inovação, por sua vez, também envolve uma acepção móvel, “que acompanha a evolução das sociedades e se desenvolve num invólucro de incerteza”.33

A evolução do tema fomento público, como não poderia deixar de ser, ocorre conforme os limites ideológicos da atividade do Estado, bem como de sua intervenção na vida privada e no domínio econômico, em cada período da história.34-35

Com efeito, consoante Luis Jordana de Pozas, a persuasão exercida pelo governante sobre o ânimo dos governados, sem o uso da força, existiu em todas as épocas, constituindo um dos principais capítulos da política.36

Também para Célia Cunha Mello, interferências policiais, aduaneiras, fiscais, entre outras, sempre existiram, com maior ou menor intensidade, conhecendo a interferência estatal vários graus.37

Ainda que se possa falar em precedentes da atividade promocional em épocas bastante remotas, as raízes do fomento, enquanto instrumento de política econômica, remontam aos séculos XVII e XVIII.38

32 GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti.

O serviço público e a constituição brasileira de 1988. São Paulo:

Malheiros, 2003, p. 14.

33 ARBIX, Glauco.

Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007, p. 29.

34 MELLO, Célia Cunha.

O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 17.

35 A respeito da vinculação entre Estado de Direito e concepção política, Celso Antônio Bandeira de Mello, invocando as lições de Afonso Rodrigues Queiró, registra: “[...] as bases ideológicas do Direito Administrativo

são as que resultam das fontes inspiradoras do Estado de Direito, e neste se estampa a confluência de duas vertentes de pensamento: a de Rousseau e a de Montesquieu”. E mais adiante: “[...] o Estado de Direito é

exatamente um modelo de organização social que absorve para o mundo das normas, para o mundo jurídico, uma concepção política e a traduz em preceitos concebidos expressamente para a montagem de um esquema

de controle do Poder.” (Curso de direito administrativo, 29. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2012, p.

48-49).

36 JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo.

Revista de Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 47.

37 MELLO, Célia Cunha.

(26)

Segundo Villar Palasí, o emprego das técnicas promocionais, no que se refere, pelo menos, à construção de obras públicas, já ocorria na Idade Média. Na Espanha, no memorial da construção da ponte de Zaragoza, de 1336, havia uma súplica de subvenção dirigida ao Rei. Antes disso, a construção do cais da cidade também havia sido subsidiada. Em Castilla, costumava-se conceder esporadicamente subvenções para as obras realizadas pelos Municípios, com recursos de fundos procedentes de multas. Em 1579 e em 1585 receberam subvenção, respectivamente, a construção do Canal Imperial de Aragão e o projeto de canalização da Cidade de Toledo.39-40

No século XVI, Pedro de Valencia (1555 a 1620) escrevia sobre “prêmios y apremios” para aludir aos mecanismos que o Rei possuía a fim de que seus súditos agissem como convinha, supostamente, ao bem público. Mas são nos escritos da época do despotismo ilustrado em que surge, positivamente, a função do fomento do Estado em relação a obras de interesse público. Esta finalidade foi prevista na legislação, com caráter geral,41 desde o início do século XVIII, tendo o espírito do fomento animado a criação, em 1705, da Real Junta de Comércio; da Instrução dos Intendentes, ditada por Felipe V, em 1718, e da Nova Ordem dos Intendentes Corregedores, ditada por Fernando VI, em 1749. Toda a ideologia política do século XVIII foi favorável a uma intervenção de fomento destinada a combater as causas da decadência econômica e comercial espanhola.42-43-44

38 SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso.

Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

2009, v. II, p. 351.

39 PALASÍ, Villar apud GARRIDO FALLA, Fernando.

Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid:

Tecnos. 1992, v. II, p. 301.

40Em relação ao destaque dado à matéria pelo Direito Espanhol, segundo Juan Carlos Cassagne, “En Francia, la

doctrina no se ha ocupado mayormente de lós diferentes tipos de clasificación de la actividad administrativa,

incluyendo la actividad de fomento dentro del concepto amplio de intervencionismo económico.” (Derecho administrativo. 7. ed. atual. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, t. II, p. 345). No mesmo diapasão, Daniel

Edgardo Maljar observa que a doutrina espanhola tem se ocupado quase exclusivamente da matéria. (Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 270). A

noção de fomento nasceu na Espanha, país que até hoje possui um Ministério do Fomento. (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p.

120).

41 Conforme ressalva Santamaría Pastor, uma coisa, todavia, era o fomento como um objetivo geral e outra, as

medidas concretas e específicas que possuíam esta particular natureza. O objetivo geral de fomento, para o autor, foi perseguido com a adoção de medidas de reforma estrutural (que em si mesmas não eram de fomento), como o aumento de terras postas para cultivo, a eliminação de alfândegas interiores, a liberdade de circulação de mercadorias nacionais no interior do reino e uma incipiente política de construção de obras públicas, principalmente canais e estradas. (Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 351).

42 GARRIDO FALLA, Fernando.

Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, v. II, 1992, p.

301-302.

43 Importante ponderar que, no regime absolutista, a própria existência de uma atividade de fomento pode ser

(27)

Todavia, no século XVIII, a concepção da atividade de fomento identificava-se com a ideia de poder de polícia. A polícia era toda atividade desenvolvida pelo Estado, toda a atividade que competia ao príncipe. Dividia-se em polícia de bem-estar e polícia de ordem – o fomento estava vinculado à polícia de bem-estar.45-46

Segundo Fernando Garrido Falla a conexão entre as técnicas de fomento com o Estado de Direito47 ocorreu efetivamente no século XIX. Na Espanha, no Decreto Real de 30 de maio

absolutista de fomento. (MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del

Rey, 2003, p. 18).

44 De acordo com Santamaría Pastor, na vigência do absolutismo, França e Inglaterra, em primeiro lugar, e

depois, os outros Estados europeus, empreenderam ações tendentes a introduzir mudanças estruturais em seus sistemas econômicos. Essas mudanças foram impulsionadas pelo mercantilismo, teoria baseada na hipótese de que a riqueza de um país devia ser medida pela quantidade de metais preciosos em circulação em seu território. Fazia-se necessário conservar e aumentar ao máximo possível a quantidade de metais e, consequentemente, fomentar a produção interior, para reduzir as importações, e limitar as compras no exterior de produtos manufaturados. Visando ao incremento da riqueza que o mercantilismo perseguia, foram introduzidas mudanças em aspectos básicos da estrutura social, tal como o regime de exploração de terras, a existência de fronteiras e alfândegas e a rigidez de determinadas atividades econômicas. Tais alterações constituíram as principais propostas das primeiras teorias econômicas liberais, que começaram a ser postas em prática pelos monarcas ilustrados já no século XVIII, antes mesmo da Revolução Francesa. (Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel, 2009, v. II, p. 351).

45 MALJAR, Daniel Edgardo.

Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires:

Hammurabi, 1998, p. 272.

46 Na esteira de Baena de Alcázar, segundo Célia Cunha Mello, a ideia primitiva de fomento, “aparece

compreendida dentro do Poder de Polícia, utilizado para designar toda atividade que competia ao príncipe. O Poder de Polícia (ius politiae) era dividido em: Polícia de Ordem (atividade restritiva e proibitiva) e Polícia do Bem-estar ou da Prosperidade (atividade incentivadora), sendo esta última a idéia que se identifica com a atividade de fomento. No século XIX, processou-se uma inversão dessa situação, à medida que os critérios liberais foram amplamente instalados. Isso porque a mentalidade liberal rejeitava o emprego do termo

“polícia”, em face da idéia limitadora e restritiva que nele se encontrava arraigada. Assim, a palavra “fomento”

passou a ser empregada, principalmente, na Espanha, para designar todas as atividades antes incluídas na polícia. Acrescente-se que o desejo de impulsionar o progresso econômico por meios indiretos aproximava os ideais liberais das técnicas de fomento, apesar da antipatia pela intervenção estatal. Por isso, Villar Palasí

afirma que o fomento é resultado de amplo critério liberal.” (O fomento da administração pública. Belo

Horizonte: Del Rey, 2003, p. 23-24).

47 Também de acordo com Célia Cunha Mello, a atividade administrativa de fomento só pode ser concebida a partir do momento em que haja a submissão de toda organização estatal ao ‘império’ da lei. A aparição da

administração personificada (diferenciação entre o Estado e o príncipe) e a primazia da lei surgem, apenas, com o advento do Estado de Direito (O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.

18). No mesmo sentido, Alberto Shinji Higa (A construção do conceito da atividade de fomento. Revista Direito Mackenzie. São Paulo, v.5, n. 1, p.10-36, 2011, p.12). Tais entendimentos corroboram a conhecida

lição de Celso Antônio Bandeira de Mello de que: “O Direito Administrativo nasce com o Estado de Direito. Nada semelhante àquilo que chamamos de Direito Administrativo existia no período histórico que precede a submissão do Estado à ordem jurídica. Antes disso, nas relações entre o Poder, encarnado na pessoa do soberano, e os membros da sociedade, então súditos – e não cidadãos -, vigoravam ideias que bem se sintetizam em certas máximas clássicas, de todos conhecidas, quais as de que quod principi placuit leges habet

vogorem: ‘o que agrada ao príncipe tem força de lei’. Ou, ainda: ‘o próprio da soberania é impor-se a todos

sem compensação’; ou, mesmo: ‘o rei não pode errar’. O advento do Estado de Direito promoveu profunda

subversão nestas ideias políticas, que eram juridicamente aceitas. Ao afirmar a submissão do Estado, isto é, do Poder, ao Direito e ao regular a ação dos governantes nas relações com os administrados, fundando, assim, o Direito Administrativo, este último veio a trazer, em antítese ao período histórico precedente – o do Estado de Polícia – justamente a disciplina do Poder, sua contenção e a inauguração dos direitos dos, já agora, administrados – não mais súditos. Em suma: o Direito Administrativo nasce com o Estado de Direito, porque é

o Direito que regula o comportamento da Administração.” (Curso de direito administrativo, 29. ed. rev. ampl.

(28)

de 1817 previa-se a realização de vultosos gastos em benefício da agricultura, artes e comércio. Em 1832 ocorreu a criação do Ministério do Fomento e, em 1833, seu primeiro titular, Don Francisco Javier De Burgos, editou a Instrucción a los Subdelegados de Fomento. Na ideologia de De Burgos a atividade de fomento era uma consequência lógica da nova postura da Administração Pública frente ao problema da prosperidade nacional. As doutrinas de laissez faire tinham dado lugar a uma fé na onipresença da Administração, da qual somente resultariam benefícios.48

Como se nota, a atividade promocional pública está relacionada com a aparição do moderno Estado Social de Direito que, indo além da simples garantia da ordem pública, procurava satisfazer a uma série de necessidades e exigências da comunidade de interesse público. Entendia-se que estas podiam ser adequadamente realizadas por meio da atividade privada protegida e estimulada pela Administração.49

Com o advento do Estado Social, o uso de técnicas promocionais passou a ser uma constante na legislação, passando a ser criadas, inclusive, medidas dirigidas a estimular as atividades econômicas de setores industriais específicos.

Nesses termos, conforme apontado por Santamaría Pastor, transcorrido o primeiro terço do século XX, o fomento começou a ser empregado de modo sistemático nos países europeus como elemento básico da política global de desenvolvimento e com tripla finalidade: a) de um lado, o incremento da produção industrial e agrária, objetivando a criação de riqueza e de emprego e a reconstrução dos danos ocasionados pelas guerras civis e pela Segunda Guerra Mundial; b) de outro, o sustento de empresas e setores econômicos de importância estratégica ou de forte impacto social, porém em fase de declínio ou de baixa produtividade; c) por último, o estímulo de atividades culturais e sociais e de prestação de serviços sociais, caracterizados por escassa rentabilidade empresarial.50

Segundo Pastor, na segunda metade do século XX, houve um desenvolvimento sem precedentes na atividade de fomento: a) a atividade pública de promoção se estendeu à imensa maioria dos setores econômicos e aos setores cultural e social; causando uma generalização das medidas de fomento, baseada na hipótese de que tudo que não é negativo tem utilidade pública e pode ser fomentado; b) as políticas de promoção não cresceram apenas em extensão material, mas também em intensidade. Por essa razão, em muitos países europeus, diversos

48 GARRIDO FALLA, Fernando.

Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

302.

49COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo.

Curso de derecho administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 706.

50 SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso.

Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

(29)

setores econômicos passaram a ser sustentados quase exclusivamente por meio de subvenções públicas (agricultura, mineração, construção naval, cinema e teatro); c) o incremento das políticas de fomento teve grande repercussão financeira. Em razão do desordenado crescimento da atividade de promoção da vida econômica, somado à crise financeira do Estado Social e ao auge das políticas macroeconômicas neoliberais, houve reação às políticas promocionais, o que gerou uma crise de legitimidade do instituto.51

Norberto Bobbio evidenciou a importância do fomento para o direito positivo da segunda metade do século XX, na medida em que este deixou de se circunscrever ao proibir e ao permitir, passando também a prestigiar o promover e o estimular.52

Em verdade, a adequação da teoria geral do Direito às transformações da sociedade contemporânea e ao crescimento do Estado Social exige a compreensão da ação promocional do Estado.

Nesse sentido, segundo Mario Losano, uma teoria do Direito que considere o ordenamento jurídico apenas do ponto de vista de sua função tradicional puramente protetora e repressiva é incompleta.53

Conforme Bobbio, o uso frequente de técnicas de encorajamento no Estado contemporâneo fez surgir o ordenamento jurídico com função promocional, devendo ser abandonada a imagem tradicional do Direito como ordenamento apenas protetor-repressivo. No ordenamento jurídico protetivo-repressivo interessam, sobretudo, os comportamentos socialmente não desejados, sendo o seu fim precípuo impedi-los o máximo possível. No ordenamento promocional importam, principalmente, os comportamentos socialmente desejáveis, sendo seu fim levar sua concretização até mesmo aos mais recalcitrantes.54

51 SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso.

Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

2009, v. II, p. 354.

52 LAFER, Celso. Apresentação à edição brasileira. In: BOBBIO, Norberto.

Da estrutura à função: novos estudos

de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. LII.

53 Para Mário G. Losano, o predomínio da teoria pura do direito teve por efeito que os estudos de teoria geral do

direito foram orientados, por um longo período, mais em direção à análise da estrutura dos ordenamentos

jurídicos do que a análise de sua função: “o positivista Kelsen distanciara-se explicitamente do problema da função do direito. Os pontos de partida de Hans Kelsen – relativismo ético, irracionalidade dos valores, neutralidade da ciência – levavam-no a evitar ocupar-se dos fins que o direito pode perseguir: para ele, o direito é uma técnica para o controle social que persegue o fim que vez por vez a ele é assinalado por quem detém o poder coercitivo, ou seja, pelo Estado. Conseqüentemente, na progressiva construção de sua teoria pura do direito, Kelsen concentrara-se cada vez mais na estrutura do ordenamento, ao mesmo tempo em que reduzia ao

mínimo qualquer referência à sua finalidade.” (LOSANO, Mário G. Prefácio. In: BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia Versiani; revisão técnica

de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. XLIII).

54 BOBBIO, Norberto.

Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

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Enquanto a técnica das sanções negativas é a mais adequada para exercer a função protetiva-repressiva (protetiva em relação aos atos conformes e repressiva em relação aos atos desviantes), a função promocional implica o uso de sanções positivas, que dão vida a uma técnica de estímulo aos atos considerados socialmente úteis, em lugar da repressão de atos considerados socialmente nocivos.55

No Brasil, especialmente a partir da década de 1990, os instrumentos e técnicas de fomento multiplicaram-se, assim como os relatos de abusos cometidos na atividade promocional pública. Os veículos de comunicação noticiam, frequentemente, a malversação de recursos e bens públicos por entidades do terceiro setor, fundações de apoio, empresas privadas etc.

Urge tentar estabelecer, pois, parâmetros para a legítima utilização do fomento público, afastando-se as práticas que possam resultar na perda de credibilidade por parte da sociedade em relação à capacidade de promoção de mudanças detida pelo instituto.

A atividade promocional pública é um instrumento com grande potencial transformador da sociedade e do desenvolvimento do País. Deve ser tratada com máxima seriedade e transparência, a fim de que os objetivos por ela buscados efetivamente se realizem.

Com efeito, sob a ótica da análise funcional da sociedade, enquanto as medidas de desencorajamento são usadas predominantemente com o objetivo de conservação social, as medidas de encorajamento são usadas com o objetivo da mudança.56

O fomento público à inovação tecnológica presta-se a essa mudança, propondo novas formas de analisar a dicotomia público-privado, assim como novos paradigmas para o debate sobre empreendedorismo privado inovador e intervenção estatal.

O fomento público à inovação tecnológica, sem dúvida alguma, pode e deve ser instrumento transformador da capacidade e da autonomia tecnológicas do País, tornando-o mais competitivo e mais desenvolvido em todas as dimensões.

55 BOBBIO, Norberto.

Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 24.

56 BOBBIO, Norberto.

Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Referências

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