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Antes de adentrar o presente tópico é necessário realizar alguns importantes adendos, a fim de não confundir possíveis correlações feitas pelo prezado leitor. Ressalto que os encontros ocorridos ao longo da pesquisa possuem ritmos e temporalidades divergentes. Por força das circunstâncias, eventuais impedimentos e adiamentos relacionados ao campo empírico, alguns personagens e interlocutores só puderam ser entrevistados ou mesmo reconhecidos em ocasiões descontínuas e inseridos em situações e conjunturas diferenciadas: o que impossibilita seguir uma linearidade mais rigorosa.

Como dito na introdução, no capítulo II farei a devida exposição dos meus primeiros passos nos sertões da Pedra; contexto em que, de fato, ainda não conhecia pessoalmente os familiares de Elitonio, com os quais pude estabelecer contatos regulares ao longo do trabalho de campo: Dona Virgínia (mãe); Seu João, (pai); Leila (irmã); Liana (irmã); Elias (irmão); e Hélio (irmão).

Por outro lado, mostra-se imprescindível introduzir aqui três importantes interlocutores. Primeiramente o Seu Anísio, agricultor e morador nativo do sertão da Pedra, que me recebeu em sua casa com um grande sorriso no rosto, um almoço delicioso preparado por sua esposa e uma ótima disposição e humor em conversar a respeito de assuntos tão sérios e delicados. Por inúmeras razões que serão explicitadas com maior riqueza de detalhes no terceiro capítulo – buscando, portanto, respeitar alguma linearidade narrativa na trama –, é

importante enfatizar que conheci o Seu Anísio somente nos últimos momentos cruciais da pesquisa, por força das diferentes circunstâncias envolvidas. Por conseguinte, apresento ainda o Arnaldo, afilhado de Seu Anísio, que é também um velho amigo dos tempos em que residi na cidade de Groaíras, de 2001 a 2002.

E, por fim, utilizo ainda um breve relato de Elias, o irmão mais velho de Elitonio, entrevistado no sertão da Pedra no dia 28 de fevereiro de 2016. Ressalta-se que os depoimentos serão utilizados também como uma forma de elucidar as práticas e a organização dos primeiros grandes bandos formados naqueles sertões, explicitando ainda a relação dos jovens com a “cidade maravilhosa”, de modo que não irei me deter aqui em aspectos que possam escapar aos elementos considerados mais pertinentes.

Nascido no Estado do Rio de Janeiro, Arnaldo foi criado no famoso Complexo do

Alemão, e como ele mesmo diz bem humorado: “Nasci foi com a bandidagem já na porta de

casa!” Ressalto que em seus depoimentos, o interlocutor fará algumas breves referências às visitas que eu já havia realizado aos sertões da Pedra, considerando o contexto das entrevistas de Arnaldo, realizadas em Sobral no dia 27 de fevereiro de 2016.

De todo modo, o relato não distorce ou diminui o valor do que poderá ser tratado em capítulos posteriores. Ao contrário, é uma forma de abordar uma época mais específica e introdutória do contexto social, familiar e afetivo pesquisado: algo que possa gerar alguma familiaridade prévia com a atmosfera humana do referido sertão. Nesse sentido, Arnaldo – que é artista, professor, ator de teatro e também sociólogo –, veio embora para o Ceará ainda “moleque”, juntamente com sua mãe, que é groairense. Chegando ao Ceará, após sofrerem muitas dificuldades no Rio de Janeiro, a família foi morar em Groaíras, como ele mesmo relata:

ARNALDO: Cara, eu nasci em Duque de Caxias, Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, certo? Uma área, uma área extremamente violenta... Que é uma área pobre do Rio... Eu não sou carioca, eu sou fluminense... Filho de nordestina com um cara, um promissor vagabundo. É, filho de um militar que através dos filhos não teve uma continuidade de estrutura... E morei em várias cidades e lugares do Rio de Janeiro até os treze anos de idade... Dentre eles eu morei no Complexo do Alemão. Que é aquele morro que vez em quando passa na televisão e tal, em cadeia nacional. Onde teve aquela invasão que... Acho que foi em 2008 ou em 2009, 201051, por aí... Ouve aquele processo de pacificação no Rio e tal. E teve um momento que foi muito forte, que foi a invasão da tropa lá no Complexo do Alemão, foi ao vivo, um tiroteio ao vivo, uns bandidos correndo, não sei se tu se lembra a Globo mostrando isso... Globo, Fantástico, os bandidos correndo, a polícia atrás, helicóptero, enfim... Pra gerar ocupação, que se eu não me engano era pra Copa do Mundo de 2014 [...]

51 “Começa a invasão no Complexo do Alemão 28/11/2010”. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FINOQwgIj88>. Acesso em: 25 de maio de 2016.

Então eu morei naquele morro, no Complexo do Alemão... Com a minha mãe, uma irmã, e nessa época minha mãe já era solteira separada do meu pai. Eu morava na casa de uma tia, morava na casa de outra tia, primo... E assim a gente ia... Até a minha mãe conseguir alugar uma casa e tal. Mas eu sou cria dali também, do Rio de Janeiro, do Complexo do Alemão... [...]

E algumas vez na minha infância, Paulo, eu vim pro Ceará... Nessas vindas pro Ceará na minha infância foi onde eu tive contato com a família do rapaz que tu pesquisa, do Elitonio, né? A Dona Virgínia, o Seu João, etc etc... Nesse período, nessas vindas que eu vinha pro Ceará, na infância, fazia amizade com a galera dali daquela área ali, daquela região do meu avô e da minha avó, que tinha esses meninos aí, os filhos da Dona Virgínia, que a gente brincava de bola, na beira do rio, nos campinhos e tal... Rolava todo tipo de brincadeira! Tinha banda de... Banda de... Lembrei disso agora ó! Banda de forró, a gente tocava nas noite! Banda de forró! A gente fazia umas bandinha de lata e tal! A galera ia tocar... A galera do Seu João, pai de Elitonio, tem uma galera metida com arte, né? Com música, não sei se tu se ligou deles lá! Inclusive o Seu João era uma figura que tinha uma sanfona e tal, rolava uns forró na casa dele, onde é a casa daquela filha que a gente foi visitar e tal... Então a galera tinha um tino pra música, né? Então a gente fazia uma banda de forró, aí eu pegava uns prato véi e ficava batendo, enfim! Coisa de menino, debaixo de oiticica, com uma lamparina! Lamparina! Olha! Lamparina! Olha a rumação! (Risos) Uma lamparina, as meninazinha réa ali perto! Menino réi frescando de tocar forró! Aí voltava pro Rio de Janeiro! Pá! Cultura extremamente diferente e tal! [...]

Na adolescência, quando eu cheguei com treze anos lá (na Pedra), aí eu não tive mais contato com os meninos não... Com a turma da família da Dona Virgínia... Com treze anos, quando vim de vez, né. Quando eu vim morar de vez aqui no Ceará, eu morava em Groaíras, no caso, com a minha mãe. Aí eu ia pro sertão e tal... Nessas idas pro sertão eu conheci a irmã do Cícero... É que, na verdade a gente se chama até de primo, né, Paulo? Que a mãe do Cícero, a senhora Cândida Josias, é madrinha da minha mãe, aquelas história de madrinha de fogo, né? Aquelas coisa de fogueira de antigamente e tal52.Vizinha da minha vó, né, enfim... Daquela região ali, e a gente, eu e a irmã do Cícero, se tratava de primo, pá, num sei o quê, essa brincadeira, forrozinho e pá, a gente se amassava... Aí tivemo um rolo, né? Ela é aquela figura que eu te falei, né? Aquela figura do sertão, do interior do início da década de 2000. Tô falando de 2000, 2001 isso... Mas ela era uma figura muito descolada. Uma menina já pra frente da época dela ali, né? Se ela queria ficar, ela queria ficar! Se ela quisesse, enfim, fazer o que ela tinha que fazer, ela fazia e sem se importar com a galera. Eu tive uns ficas com ela, tive uns rolos com ela que durou muito tempo, sabe? Tipo, depois parava, a gente parava... Coisa de fica, de fica, sempre que a gente se via a gente ficava... Acho que até 2008 ainda, ainda rolou um fica assim entre eu e ela... Às vezes ela com companheiro, eu com companheira, mas vez ou outra ainda rolava alguma coisa quando a gente se via ou quando nós estávamos solteiros e tal... (Sobral, 27 de fevereiro de 2016).

52 “Até poucos anos atrás era comum as pessoas se tornarem padrinhos, madrinhas, afilhadas ou afilhados, ou mesmo primos e primas de fogueira. Para tanto, aqueles que, por vontade mútua, desejavam tornar-se padrinho e afilhado de fogueira, realizavam um pequeno ritual na noite da festa de um dos santos juninos (Santo Antônio, São João ou São Pedro). Diante da fogueira, padrinho e afilhado davam-se as mãos e proferiam a seguinte fórmula: ‘Santo Antônio disse, São Pedro confirmou que você há de ser meu padrinho, que São João mandou’. Em seguida, o padrinho repetia a fórmula, substituindo então a palavra ‘padrinho’ por ‘afilhado’. Ditas estas juras, ambos davam duas voltas de mãos dadas ao redor da fogueira para selar o compromisso, exclamando: ‘Viva a São João! Viva a Santo Antônio! Viva a São Pedro! Viva a nós, meu padrinho! Viva a nós, meu afilhado!’. Já os padrinhos e madrinhas de apresentação, geralmente jovens muito próximos da mãe e da criança, eram aqueles que, no dia do batismo, tinham a função de levar nos braços o pagão até à igreja e apresentá-lo aos futuros padrinhos de batismo” (MAIA, 2008, em nota de rodapé, p. 59, grifos da autora).

No relato de Arnaldo é possível delinear elementos interessantes. Por um lado, a miséria e dureza vivenciada na grande metrópole e, de outro lado, a ludicidade da infância frequentando os sertões cearenses: conhecendo e convivendo diretamente com os garotos que faziam parte de um mesmo círculo afetivo e familiar – incluindo Elitonio (seus irmãos e irmãs), Cícero e Luciano.

Foi essas diferentes culturas que eu transitei. Cultura do Estado do Rio de Janeiro, cultura do Estado do Ceará! É... E culturas de convívio também entre famílias... É... Eu tenho muitas mães, saca? Eu tenho mãe-tia, eu tenho tia de Duque de Caxias, tia do Complexo do Alemão... Cada uma ajudaram a minha mãe a me criar, até a minha mãe depois encontrar um outro cara, né? Com o Marcos (padrasto) eu tinha já três ou quatro anos de idade! Então de um até dois, três anos, eu fui criado por muitas pessoas, né? Minha mãe não tinha casa, não tinha onde ficar, não tinha como pagar aluguel... E a gente ficava de favor na casa de um, na casa de outro, né? Eu considero, Paulo, que isso foi fundamental pra minha escolha profissional, saca velho? Ou seja, eu vim fazer sociologia, né? Como algo que vinha de dentro de mim... Não era, não foi uma coisa assim pensada racionalmente não: “Vou ser a partir de agora cientista social” Não! Foi algo que foi o caminho, sabe? As escolhas foram percorrendo pra isso... Mas eu digo que isso já foi lá na minha base, na infância, saca? O fato da sociologia me permitir a estudar culturas, o fato da sociologia me permitir a estudar educação, o fato da sociologia me permitir a estudar política... Enfim, não ser uma única coisa: ou seja, tudo que eu fui na infância, né? Eu não fui uma única coisa: eu fui um carioca, eu fui um cearense, né? Eu fui filho de um promissor vagabundo, eu fui filho de mãe solteira, parentes, putas! Eu fui filho de padrastos, filho de muitas mães, né? E aí, em cada casa era um costume diferente, saca? E por isso essa minha facilidade de adentrar em vários espaços, de conviver e tal... E isso foi essencial pra sociologia... (Sobral, 27 de fev. de 2016).

O Seu Anísio, por sua vez, é alguém que sempre acompanhou de perto o crescimento dos garotos, assim como as façanhas dos conterrâneos que mais tarde se tornaram “famosos” pelas estripulias criminais e perseguições da polícia. Como ele mesmo relata, inicialmente a respeito de Luciano – o que possibilita retomar as questões referentes às suas supostas práticas criminais e relação com a formação dos bandos armados:

SEU ANÍSIO: O Luciano dava pra ver a maldade dele, né? Ele também começou assim com coisa pequena... Arrebentando uma casinha aqui e aculá da região. [...] A gente tem bomba no rio, motor, ele ia lá e dava um prego de qualquer jeito, né? Enchia de areia, essas coisas, pra num funcionar mais!Aí ele começou assim fazendo essas sem vergonhiça, né? Aí daí foi piorando [...] Nego não bota bomba dentro do ri pra puxar água? Ele ia lá, tinha motor, o motor ele enchia de areia aí... Porra, não funcionava nunca mais! [...] Só mesmo pra fazer o mal! Só pra fazer o mal! Não era outra coisa! [...] O Luciano era o pior... Mas fora! Aqui não! Quando ele ficou na fama mesmo do vagabundo ele não fazia mais nada aqui na região não! [...] Ele começou na traquinagem, da traquinagem ele virou o bandidão mermo! E depois que ele virou o bandido, pronto! [...] E ele respeitava todo mundo, não assaltava! E não tinha assalto por aqui depois, quando ele tava vivo... Num tinha assalto não! Ele começou assim nesses roubim que eu falei: arrebentando uma casa... Teve um bocado deles aí que até desistiu, né? Por causa que as negrada ia descobrindo! Aí ficou só ele mesmo, desses mais velho... [...] O Fernando do Zé Cosmo... Tu chegou a conhecer o Nando? (falando com Arnaldo) Começou junto com ele também.

Arrebentando casa, mas aí ele desistiu, né? Foi preso! Pegou muita peia da polícia ainda uns dia! Aí desistiu... Foi pro Ri de janeiro aí véve trabalhando por lá... Véve no Rio de Janeiro, trabalhando... Teve outro também, o menino do Baixim, também andou arrebentando uma casa do Adão, que faz festa lá em cima! Que fica perto de Malhada Grande. Arrebentaram a casa dele lá, que ele vendia gasolina, pegaram um montão de gasolina dele! O fi do Baixim tava no mei também... Mas também desistiu, né? Véve no Rio de Janeiro trabalhando! Aqui e acolá ele vem passear por aqui. (Pedra, 28 de fevereiro de 2016).

Não apenas por ter supostamente influenciado Elitonio a enveredar no meio criminal – informação que parece bastante consensual entre todos os meus interlocutores –, Luciano é um personagem que desde o início me despertou imensa curiosidade, e sobre o qual pude ouvir estórias e boatos instigantes, narrados por pessoas com as quais pude multiplicar e experimentar reflexões e perspectivas (CASTRO, 2002) em viagens realizadas ao sertão. Luciano do Cariré é considerado por muitos como uma espécie de “tutor” da carreira criminal do jovem Elitonio e também de Cícero: sendo colocado inclusive como detentor de determinada malícia ou “intenções maléficas” (DOUGLAS, 2014, p. 77).

Todavia, existem pistas de que Elitonio teria sido convencido pelo primo Cícero53, outro filho legítimo do sertão, que já havia ingressado no “meio” criminal (“o lado errado”). Sendo muito jovem, Elitonio “pegou o bando andando”, supostamente aos 18 anos de idade. Nesse contexto, a fama de Luciano já era largamente difundida em toda a região Noroeste do Estado e microrregião de Sobral. Todavia, mesmo com a pouca idade, o rapaz da Pedra ficou conhecido por suas audaciosas façanhas contra agentes policiais.

SEU ANÍSIO: O Cícero é primo do Elitonio! Porque é que o Elitonio foi pro lado errado? Por causa do Cícero, foi o Cícero que tirou ele, foi o Cícero que tirou ele... Porque o Cícero já era mais velho também, né? Já tava no meio... Aí através dele, Elitonio, um garotin novo... Talvez uns dezessete anos, dezoito anos... Aí começou a andar no meio, né? [...] Eu me lembro que o primeiro, o primeiro... (Pensando) Ele andou fazendo uns assalto, a polícia tava atrás dele... A polícia chegou a pegar ele ali perto da casa do Afrânio Zezo, né? O finado Afrânio Zezo... Ali do outro lado do rio... [...] A polícia pegou ele, o Elitonio! Ele novim, num tinha vinte ano ainda não! No começo logo! A polícia pegou ele... Parece que deu uma bobeira, né? Foram botar ele na viatura... Botou ele na viatura e não fechou a viatura na hora, né? E nem ele tava algemado! Ele foi e saiu correndo! (Risos) Aí a polícia meteu tiro! Mas não pegou nenhum nele! Até que eu saí de casa, ele tarra escondido aqui... Num tem esse campo aqui? (Apontando) Tava aqui nesse campo aqui... Esse depois da casa da Liduína! Passou a tarde todinha por aí! E a polícia de Groaíra andando atrás dele por lá, né? E ele do lado de cá... (Risos) Novim, cara! No começo, foi no começo mermo da coisa! (Pedra, 28 de fev. de 2016).

53 “O anômalo, o elemento preferencial da matilha, não tem nada a ver com o indivíduo preferido, doméstico e psicanalítico” (DELEUZE E GUATTARI, 1997a, p. 26-27).

Supostamente seduzido pelas promessas de Luciano, de dinheiro fácil, fama e respeito local, Elitonio, ainda aos 17 anos, acabou assumindo uma posição de apoio dentro do bando (“a turma” ou “o meio”), conjuntamente com o primo Cícero, que acompanhava Luciano há tempo indeterminado, provavelmente desde o bando de Edvar do Sangradouro. Cícero, que começou roubando animais de criação na região – que seria conhecido como “ladrão de galinha” –, é visto com menor projeção se comparado aos outros dois conterrâneos – e certamente com mais “repugnância” por sua fama de “estuprador”. Nunca tendo saído dos sertões nem para o Rio de Janeiro, destino comum de quase todos os jovens da Pedra, Cícero é conhecido ainda por ser forte trabalhador braçal. Como afirma Seu Anísio: “não abria pra serviço nenhum!” O rapaz possui ainda a fama de ser marruá, bruto que “não sabe nem pilotar uma moto” 54. Todavia, é o único remanescente do bando que ainda se encontra vivo

“enfurnado nos mato”. Segundo Seu Anísio e Arnaldo:

ARNALDO: Ele (o Cícero) é Marruá Marruá! No sentido de... Aquele caboclo mermo do sertão! Ele é do sertão mesmo! Caboclo do sertão que nunca teve contato com outro canto, né?

SEU ANÍSIO: É! Ele nunca saiu fora não, ele toda vida viveu aqui... O lugar mais longe que ele foi é pra Fortaleza! [...] Ele começou com coisa pouca, né? Coisinha pequena: uma galinha, um bode, carneiro... Teve carneiro meu que ele levou! Depois ele bebendo, eu perguntando a ele, ele foi e me disse: “Não, Anísio, foi eu que levei mesmo, mas mandado de outra pessoa!” (Risos) Ele mesmo falava pra mim! Ele tomando umas eu fui e perguntei. “Não, Anísio, vou negar pra ti não, foi eu mermo que levei o teu carneiro, mas foi outra pessoa que mandou pegar o carneiro!” (Risos) Era o ladrão de galinha, de criação! [...] O Elitonio já foi pra negócio de assalto, que os outros menino já tavam já... Já tavam bem experiente na coisa, né? O Cícero e o finado Luciano. Eles sempre viviam juntos, podiam não ser muito amigo, mas tavam junto direto, né? [...]

O Cícero começou roubando galinha e bode! O Cícero tinha um tio que gostava de roubar bode, né? O Cícero começou assim, pegando bode... Então, o Cícero pegava bode pra levar pro Cardoso ti dele, né? Até o carneiro meu que ele pegou, o Cícero pegou e disse: “Foi o Cardoso que mandou eu vir pegar aqui...” Só que ele deixou de mão... Ele viu que todo mundo tava querendo matar ele, né? Quando ele viu se fechando, aí ele foi e parou! E todo mundo: “Sumiu um bicho! É o Cardoso!” Corria na casa dele! Aí todo mundo botou pressão! Eu mermo fui um que disse a ele: “Oia, no dia que sumir um bicho meu agora, Cardoso! Eu me encontrar contigo aí no meio do caminho eu num vô falar nada não! Eu só faço meter o ferro em ti! Eu sei que foi tu que roubou!” O Cardoso ti do Cícero! Eu falei foi na cara dele! E todo mundo que sumia um bicho corria na casa dele! Aí ele viu que o negócio tarra se fechando pra ele, ele foi e deixou de mão! Hoje é um cabra trabalhador o Cardoso!

ARNALDO (intervém): O meu questionamento, Paulo, é o quê que traz, o quê que atrai! E aí existe uma coisa que eu tô pensando aqui agora no sentido organizacional! O Cícero, tu vê que todo mundo ó... Meu primo disse isso (sobre o Cícero): “Arnaldo, é trabalhador!” Cabra Marruá Marruá, matutão do sertão, mas trabalhador, né? Quem é o cérebro da parada? LUCIANO! Ele (Luciano) precisa de

um inteligente: “Sou eu que articulo tudo, agora eu preciso de um bicho doido! Um cabra que não abre pra nada! Venha cá, Cícero, vamo tomar uma aqui, vamo conversar!”

SEU ANÍSIO (retoma): Exatamente! O Cícero é um que não tinha medo de nada!