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4 ANÁLISE DOS DADOS

4.2 As adaptações feitas pelas professoras e suas significações

4.2.5 Mescla de jogos e atividades

Estamos acompanhando durante a leitura deste ponto do capítulo das análises os vários subtópicos que revelam as adaptações realizadas pelas alfabetizadoras no contexto da sala de aula ao desenvolver o trabalho com os jogos didáticos do CEEL. Nesta categoria, que denominados mescla de jogos e atividades, vemos que a professora Liz nos deu exemplos de adaptação com novas modalidades de brincar. “Como o loto, né, como o loto...”. Outra docente, Lara descreveu-nos que utilizou o “troca letras” da seguinte forma:

eu peguei uma fita gomada e preguei na lousa, aí peguei as fichinhas das figuras e coloquei como se fosse baralho [faz um gesto reproduzindo a ação de emborcar as fichas] e um outro baralho na mesinha que estava na frente. Aí eu chamava de um por um. Vir pra desafiar. Aí ele pegava sem saber o que era e colocava a figura, ia lá no bolsão, e colocava e tentava formar. Se ele não conseguisse os colegas podiam ajudar. Aí assim a gente viu o baralho todinho. Aí acertou? Pode virar sua cartinha. Como se fosse um ponto pra você. (Professora Lara).

Parafraseando Kishimoto (1999) o que vai caracterizar o jogo em baralho, buraco ou troca letras, no caso dos jogos didáticos do CEEL, será a construção das regras. Aqui Lara fez uma releitura do que poderíamos interpretar como sendo um baralho da linguagem, cujo desafio neste caso era formar palavras, ou seja, ela mescla os jogos do CEEL com outros materiais de que dispõe na escola para gerar algo muito interessante que é a possibilidade de desafio. Isto acontece porque decerto a professora sabe que o desafio é a alma propulsora da atividade, o que pode revelar uma postura crítica de sua parte em relação aos próprios jogos do CEEL.

Esta ação desafiadora da professora Lara nos remete ao pensamento vigotskyano no tocante à atividade lúdica e suas regras as quais fazem do desafio a mola propulsora da aprendizagem e, principalmente, do engajamento da criança na atividade, nas relações que estabelece com seus pares, na compreensão e obediência às regras, ou seja, o despertar do desejo de aprender, fomentando assim o desenvolvimento psíquico da criança por meio da ludicidade. (VIGOTSKY, 2010).

Podemos inferir por meio da observação das ações da alfabetizadora que esse é um saber que a professora também demonstra ter construído e do qual ela desempenha muito bem. Certamente aprendeu na Universidade, nas leituras que fez, mas também com a própria experiência que ela demonstra ter, como vimos a partir de Tardif (2014). Neste exercício, remetemos ao que Therrien (2007) nos instrui sobre a gestão pedagógica da matéria quando a atividade envolve a professora que desafia, o aluno desafiado e o jogo repaginado. Outro ponto importante e que não podemos deixar de destacar é a experiência docente que vivenciou na Escola Educar SESC que, sem dúvida, está atrelada a esse empenho e capricho em seu fazer docente.

Também fazendo um novo jogo a partir de um já existente contido na caixa do CEEL, a professora Márcia foi mais além e confeccionou um jogo inspirada nas ideias do material.

Eu fiz assim algumas fichas. Não tem aquelas fichas do Paic antigas da Aprender que a gente não usa mais? Aí eu fiz botei algumas fichas aqui, e botava a ficha no outro... aí vamos lá pessoal vamos escrever, ficha número 1, o que é que vocês estão vendo aqui? Ah eu estou vendo o Saci, vamos dizer, aí eles escreviam Saci, aí depois que estivesse tudo pronto, eu botava as 8 fichas numa folha de 40 quilos, aí quando estivesse tudo pronto, eu mostrava o nome mesmo, né, pra eles... [...] Corrigindo. Tipo o “Quem escreve sou eu”. E aquele outro também do dadinho? Que diz assim, número 8, aí você vai olhar tem um dinossauro, aí você vai procurar um nome que comece igual a dinossauro... Pronto, eu já fiz também esse daí, nesse contexto. (Professora Márcia).

É muito interessante perceber que as temáticas parecem ser interessantes, quando a professora pode congregar não apenas o conteúdo de leitura e escrita ao qual se restringe o jogo, mas também pode ampliar o conhecimento e instigar a curiosidade das crianças sobre lendas folclóricas, como o saci, por exemplo, conforme descrito por ela. Também é importante analisar o fato de que Márcia está atenta a dicas de atividades e materiais antigos os quais foram fornecidos pelo pioneiro programa do PAIC e que talvez com a implantação do PNAIC tenha ficado esquecido por muitos professores. Essa também é uma demonstração autêntica de saber docente (TARDIF, 2014), e inclusive de muito bom uso do material do Programa. É provável que nem mesmo os próprios coordenadores sequer tenham dado essa sugestão, ou pensado essa ideia, já que não tiveram formação mais ampliada neste sentido dos jogos.

Constatamos com base neste subtópico que criatividade não faltou às alfabetizadoras para desenvolver o trabalho com o material do CEEL em sala de aula, oferecendo às crianças amplas possibilidades para além do próprio material, ampliando as configurações de jogo, o acervo de palavras e as formas de jogar. Aliás, a criatividade é um ponto comum entre as alfabetizadoras pesquisadas quanto ao desenvolvimento do trabalho com os jogos didáticos do CEEL. Desde a análise quanto à autonomia para uso do material até a maneira como se caracteriza esses usos e adaptações às formas de jogar. Podemos inferir que a Prefeitura de Fortaleza certamente possui um quadro de profissionais comprometidos e criativos para trabalhar a alfabetização e a ludicidade nos anos iniciais do ensino fundamental. Nossa última categoria listada que queremos analisar foi por nós denominada de adaptação com rodízio, que mostraremos a seguir.