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CAPÍTULO 2: APRENDIZAGEM E CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS EM AULAS

2.3 A C ONSTRUÇÃO DO S ENTIDO E A C ONCEPTUALIZAÇÃO

2.3.1 A teoria dos espaços mentais por Fauconnier

2.3.1.5 Mesclagem (Blending)

A mesclagem, tal como concebe Salomão (2002), é vista como uma inovação no campo da investigação linguística, postulada a partir da teoria dos espaços mentais desenvolvida por Fauconnier (1994, 1997) e Fauconnier; Turner (1996). Integrada conceptualmente por uma rede de domínios, resultante das projeções entre bases de conhecimentos culturais que produzem um espaço-mescla, denominado domínio mescla ou domínio emergente.

Nos termos de Rodrigues-Leite (2004), a mesclagem não trata apenas da projeção entre domínios, mas da criação de um domínio emergente. A mesclagem, assim concebida, constitui-se num processo cognitivo que explica a construção dos sentidos negociados, criados localmente para atender as intenções comunicativas dos falantes num dado evento comunicativo.

A teoria dos espaços mentais configura a mesclagem a partir da conexão de quatro espaços, envolvidos na projeção conceptual entre domínios conceptuais estruturados conforme descrito abaixo14:

Espaços deinputs (domínio-fonte e domínio alvo) que identifica elementos de um domínio (a) por meio de sua contraparte no outro (a’), de maneira a obter um espaço-mescla.

AE – aula na escola (ambiente escolar - presencial) AI – aula na Internet (ambiente telemático - virtual) AV – aula virtual

Figura 3 – Inputs 1 e 2

14Os diagramas utilizados foram transportados de FAUCONNIER (1997, p.150-51).

Os inputs 1 e 2, também conhecidos por espaços influentes, organizam o conhecimento parcialmente, relacionando as contrapartes dos inputs por meio do princípio de identidade ou por meio da projeção, Rodrigues-Leite (2004, p.73) diz que na projeção seletiva nem todos os elementos de um input são projetados na mescla, isto é, não é necessário que os inputs representem uma estrutura estática, única, precisa, pois se trata de uma estrutura parcial, cuja mescla resulta das contrapartes como na categoria tempo síncrono/assíncrono, ou melhor, síncrono e não-síncrono, característica essa fundamental no mapeamento dos inputs para criação do espaço-mescla “aula virtual” em contrapartida a “aula presencial” ou não- presencial.

Espaço genérico – que reflete estruturas comuns e abstratas dos doisinputs

Figura 4 – Espaço Genérico

No espaço genérico, temos a síntese da parte comum dosinputs1 e 2. Fora o suporte físico, que faz uma diferença fundamental, a aula, quer seja no ambiente escolar, quer seja no ambiente virtual compartilha algumas características, visto que a língua apresenta-se num continuum que vai do menos ao mais formal. Ainda assim, vemos que a parte comum apresenta suas peculiaridades possibilitadas pelo suporte.

AULA

AI AE

É também neste ponto que professor e alunos compartilham o conhecimento comum que eles têm sobre o conceito aula e o suporte que a veicula, e assim, a mesclagem surge como fruto de um conhecimento compartilhado ou socialmente produzido e culturalmente disponibilizados.

• Espaço ou domínio mescla – projeção parcial dos inputs1 e 2

Figura 5 – Domínio-mescla

A mesclagem é fundamentalmente uma criação cognitiva resultante das projeções parciais dos domínios (fonte e alvo) inputs 1 e 2 com a finalidade de formar novos conceitos ou criar conceitos para atender uma demanda localmente situada.

O caráter criativo da mesclagem configura-se pelo surgimento de uma nova estrutura que não busca uma semelhança com os inputs, mas uma relação por meio do princípio de identidade. Dessa relação surge, de maneira criativa, uma estrutura emergente, resultante do conhecimento socialmente partilhado, pois do domínio mescla, produzido cognitivamente a partir de dois inputs, surge um novo espaço, que além de manter características das projeções, apresenta uma nova estrutura emergente, uma nova criação.

Essa nova estrutura emergente é formada a partir de domínios cognitivos estáveis como um MCI, constritivos dos domínios locais que ativados a partir da semiose linguística ativam as projeções de esquemas usando um esquema geral

AE AI

(abstrato) para estruturar uma situação no contexto; como no caso dado, por exemplo, pela necessidade de se criar uma nova modalidade de aula, tal como, aula virtual para atender a demanda de um evento local.

• Estrutura emergente – nova estrutura que surge a partir da contraparte dos inputs1 e 2.

Figura 6 - Estrutura Emergente

Nomear uma aula de virtual, a partir de sua contraparte, aula presencial, não é algo tão simples assim, pois estamos diante de inferências complexas, cuja “armação cognitiva” envolve desde conhecimentos individuais a conhecimentos socialmente produzidos e culturalmente disponibilizados. Além disso, professor e alunos envolvidos cognitivamente numa aula virtual, certamente compreendem, além das intenções comunicativas, os objetivos e objetos que fazem parte das cenas de atenção conjunta, instauradas na realização do evento local, isto é, da aula quer

AE

AULA

AV

seja presencial ou virtual.

Portanto, professor e alunos conscientes de suas intenções comunicativas, quando falam ou pensam ativam estruturas estáveis MCI’s representados pelos inputs 1 e 2; essas estruturas parciais ativam uma espécie de frame que estruturam cognitivamente características de uma aula no ambiente escolar (input 1), e a partir disso estabelecem cognitivamente características estruturais de uma aula na “Internet” (input 2). Tudo isso ocorre numa complexa dinâmica emergente, tal como alude Rodrigues-Leite (2004, p.76) ao referir-se à construção das formas simples como certas construções gramaticais, do mesmo modo ocorre com certas construções lexicais quando essas formas ativam um mundo imaginativo, desencadeando, dessa forma, a construção dos sentidos por meio das operações básicas efetuadas na mesclagem conceptual. Tais operações são apontadas pelo autor como a chave para a construção do sentido cotidiano e para a criatividade humana.

Essas operações básicas são apresentadas por Fauconnier ; Turner (2002, p.6) como exclusividade humana que dizem respeito à capacidade imaginativa, as quais envolvem:

Identidade – permite reconhecer a equivalência, a uniformidade, ou a oposição, a diferença. Não são pontos de partida primitivos, nem cognitivos, nem neurobiológicos, nem evolucionários. Dependem de elaborado trabalho imaginativo.

Integração – é o processo de busca de identidade e oposição que ocorre nas redes de integração conceptual, tem estrutura elaborada, propriedades dinâmicas e restrições operacionais.

Imaginação – Operação crucial às duas anteriores. O cérebro executa simulações imaginativas mesmo sem estímulo externo. Graças à imaginação sonhos e fantasias operam do mesmo modo que outras construções mais simples de sentido

Com isso, Rodrigues-Leite (2004) conclui que as pessoas pensam diferentes, embora haja habilidades cognitivas altamente universais que atravessam as categorias de sexo, cultura, idade e nível social. E isso, é possível graças às operações mentais básicas de identidade, uniformidade e diferença; enquadres, analogias, metáforas ativados pela criatividade humana de produzir novas significações e conceptualizações, impulsionada pela abundante fonte de sentidos a mesclagem conceptual.

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