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Metáfora e Metonímia em Jakobson

No documento O nome próprio é um 1 / (páginas 104-107)

Foi Roman Jakobson quem relacionou os mecanismos inconscientes, descritos por Freud, com os processos da metáfora e da metonímia, segundo ele, os dois pólos fiindamentais de toda a linguagem. Jakobson aproxima o deslocamento da metonímia, pois há aí uma ligação de contigüidade, enquanto na metáfora está presente a associação por semelhança.

Lacan introduz a questão da metáfora e da metonímia em seu Seminário III, a partir da leitura de um texto de Jakobson que trata das perturbações afásicas*”. Diz Lacan sobre a descrição e classificação das afasias, que estas devem ser revistas a partir

“...da oposição entre, por um lado, as relações de similaridade, ou de substituição, ou de escolha, e também as de seleção ou de concorrência, em suma, de tudo o que é da ordem do sinônimo, e por outro lado, as relações de contigüidade, de alinhamento, de articulação significante, de coordenação sintática.”*^

O que Jakobson analisa é a afasia, que é uma perturbação da linguagem. Assinala que, para que se possa descrevê-la ou classificá-la, é necessário que se identifique quais aspectos da linguagem estão envolvidos nesta desordem. Por outro lado, o estudo das afasias esclarece pontos que possibilitam um estudo mais aprofundado da linguagem.

Para falar, o sujeito primeiro seleciona certas entidades lingüísticas e as combina em graus mais altos de complexidade. Seleciona palavras, combina em frases, elabora enunciados. Esta seleção não é feita de forma completamente livre e sim, a partir de seu repertório lexical e daquele a quem se fala, pois é necessário um código comum entre os participantes.

Segundo Jakobson, o signo lingüístico implica em dois modos de arranjo: a combinação e a seleção. A combinação aponta que “Todo signo é composto de signos constituintes e/ou aparece em combinação com outros signos.”*^ Revelam-se, assim, unidades mais simples e unidades mais complexas. O agrupamento efetivo de unidades lingüísticas

Jakobson apresentou seu trabalho sobre afasias numa conferência a antropólogos e lingüistas, na Universidade de Indiana, entre 21 e 30 de julho de 1952 .

LACAN, J. As Psicoses (1955-56). Op. cit. p. 250.

remete a uma unidade superior, onde combinação e contextura (relação com o contexto) são partes de uma mesma operação.

A seleção aponta para a substituição entre termos alternativos, termos que eqüivalem num aspecto e diferem em outro. Nesta operação estão envolvidas seleção e substituição.

Jakobson alega que Saussure descrevera que a combinação baseia-se em dois ou mais termos dentro de uma série efetiva, associada à mensagem, enquanto a seleção e a substituição referem-se às entidades associadas ao código, mas não à mensagem. “O destinatário percebe que o enunciado dado (mensagem) é uma combinação de partes constitutivas (frases, palavras, fonemas, etc.) selecionadas do repertório de todas as partes constituintes possíveis (código).”*^ Assim, os constituintes de um contexto apresentam um estatuto de contigüidade, em termos de combinação, enquanto num grupo de substituição o que está envolvido é a similaridade. Os constituintes de uma mensagem estão ligados ao código por uma relação interna, via seleção, e à mensagem por uma relação externa, via combinação.

Assim, os distúrbios de linguagem podem ocorrer em relação à capacidade do sujeito de combinar e selecionar as unidades lingüísticas. Jakobson classifica as afasias em um primeiro caso, onde a deficiência principal reside na seleção e substituição (metáfora), com combinação e contextura relativamente estáveis, e um outro caso, em que a deficiência está relacionada á combinação e à contextura (metonímia), com seleção e substituição relativamente estáveis.

Na deficiência de seleção, chamada de distúrbio de similaridade, o contexto aparece como fator importante. O afásico, frente a fragmentos de palavras ou frase, consegue completá-las, com facilidade. A linguagem apresenta-se reativa, com possibilidades de continuar um diálogo, respondendo a um interlocutor real ou imaginário. Sua dificuldade está em iniciar um diálogo, em compreender ou entender um discurso fechado, como é exemplo o monólogo. As frases aparecem como seqüências elípticas, passíveis de serem completadas a partir de frases anteriormente ditas. Determinadas palavras, palavras-chaves, podem ser eliminadas ou trocadas por substitutos anafóricos. Somente a estrutura e os elos de comunicação persistem. Neste tipo de afasia o sujeito não consegue passar de uma palavra a

seus sinônimos ou a equivalentes ou a expressões equivalentes em outras línguas. Nesta afasia a contigüidade permanece integra, sendo assim, o afásico tenderá a guiar-se pela contigüidade espacial ou temporal, o paciente utiliza-se de metonímias.

“Tais metonímias podem ser caracterizadas como projeções da linha de um contexto habitual sobre a linha de substituição e seleção; um signo (garfo, por exemplo), que aparece ordinariamente ao mesmo tempo que outro signo (faca, por exemplo) pode ser utilizado no lugar deste signo.”*'*

O distúrbio de contigüidade implica na perda de capacidade de combinar entidades lingüísticas mais simples em mais complexas. O que ocorre é a diminuição da extensão e variedade das frases, as regras sintáticas se perdem, surgindo um estilo chamado telegráfico. As palavras que menos dependem do contexto persistem. O paciente usa de similitudes de natureza metafórica, embora não ocorra aí transferência deliberada de sentido. Exemplo: ao invés de dizer luz de gás, o afásico diz fogo.

A partir destas considerações, Jakobson argumenta que para que ocorra o desenvolvimento de um discurso, a partir de um tema, o sujeito pode passar deste tema a outro por similaridade ou por contigüidade, pois estão incluídos o processo metafórico (por similaridade) e o processo metonímico (por contigüidade). Na afasia, um destes dois processos está comprometido.

As relações de similaridade e de contigüidade podem ter cada uma dois aspectos: posicionai e semântico. Assim sendo, a linguagem apresenta uma diversidade de combinações possíveis.

Segundo Jakobson, na “arte da linguagem” é marcante o papel da metáfora e metonímia. Exemplifica ele: nas canções líricas russas predominam as construções metafóricas, enquanto na epopéia heróica estão os processos metonímicos. Isto também se estende por outros sistemas de signos, como o cinema e a pintura, ou seja, os dois procedimentos, metonímico e metafórico, estão manifestos em todos os processos simbólicos.

É Jakobson quem chama a atenção que numa investigação da estrutura dos sonhos deve-se levar em consideração “...se os símbolos e as seqüências temporais usadas se baseiam na contiguidade (‘transferência’ metonímica e ‘condensação’ sinedóquica de Freud) ou na similaridade (‘identificação’e ‘simbolismo’ freudianos)”.*^

No documento O nome próprio é um 1 / (páginas 104-107)