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CAPÍTULO 2. OS ESTUDANTES DA ECSH E A INTEGRAÇÃO I&E: UM

2.2. METODOLOGIA: ANÁLISE QUALITATIVA BASEADA EM FOCUS-GRUPO

Uma das hipóteses orientadoras do trabalho é a da existência de perspetivas diferentes sobre o ensino e a investigação tanto entre ciclos – fases diferentes da aprendizagem (Visser-Wijnveen, 2015) e motivações diferentes – como entre cursos – em geral, tradições disciplinares diferentes no que diz respeito ao próprio conceito e prática da investigação (Robertson & Blackler, 2006, citados por Healey & Jenkins, 2009) e, em

concreto, histórias particulares da formação de licenciaturas, mestrados e doutoramentos no ISCTE-IUL.

Esta hipótese tem consequências, desde logo, para a constituição da amostra de indivíduos a entrevistar/inquirir e para a construção dos instrumentos da recolha de informação.

Neste caso optou-se pela recolha de informação através de focus-grupos (à frente FG) isto é, de grupos de discussão sobre um conjunto de temáticas definidas previamente pela equipa de investigação, como a seguir se apresenta.

2.2.1. Participantes

Nos focus-grupos participaram 24 estudantes da Escola de Ciências Sociais e Humanas (ECSH) do ISCTE-IUL, oriundos do 1ºciclo (3º ano), do 2ºciclo (2º ano) e do 3º ciclo (2º ano), dos cursos de Psicologia, Antropologia e Economia.

De referir que, apesar do convite para a participação no presente estudo ter sido feito a todos os estudantes dos respetivos ciclos/anos da ECSH e de terem sido desenvolvidas várias estratégias de apelo à participação dos estudantes – por email, através de apelo à participação por docentes do curso nas aulas respetivas, por contacto direto da equipa de investigação em aulas do curso – a sua adesão ao projeto foi bastante limitada conduzindo à constituição de uma amostra de pequena dimensão. Este número reduzido de participantes, sobre o qual voltaremos a falar nas observações metodológicas, para além de outras explicações possíveis, mais ou menos pragmáticas (tempo, disponibilidade ou falta de apetência/experiência para participação em debates sobre a vida universitária), foram um primeiro indício da falta de visibilidade/pertinência da questão da investigação e da sua integração no ensino.

Os participantes foram distribuídos por cinco focus-grupos estratificados por ciclo e curso de forma a criar grupos homogéneos onde cada um pudesse exprimir-se a partir de uma experiência próxima da dos restantes participantes (ver tabela 2). No entanto, dado o número reduzido de participantes no 2º e 3º ciclos dos cursos de psicologia e antropologia, optou-se neste caso pela constituição de grupos por ciclo onde participaram elementos dos dois cursos. A especificidade dos cursos próprios do Departamento de Economia Política da ECSH – cursos de 2º ciclo, temáticos3 – conduziu à opção de um FG exclusivo, apesar do

número reduzido de participantes.

3 Estavam em funcionamento no ano letivo 2014-15 os seguintes mestrados: Psicologia Comunitária e Proteção de Menores (2 participantes no FG), Psicologia das Emoções, Psicologia das Relações Interculturais (1 participante no FG), Psicologia Social da Saúde, Psicologia Social e das Organizações.

Tabela 2. Dados sobre focus-grupos realizados com estudantes.

Ciclo, curso e ano participantes N de realização Data de contactados/forma N de estudantes de contacto Orientador 1º ciclo de Antropologia, 3º ano 6 04 de novembro de 2014 Aproximadamente 30 / E-mail (12) e contacto direto em aula MJC 1º ciclo de Psicologia, 3º ano 4 12 de novembro de 2014 Aproximadamente 30 / E-mail e contacto direto em aula MJC 2º ciclo de Antropologia4 e de Psicologia5, 2º ano 7 06 de novembro de 2014

34 / E-mail e contacto dos próprios docentes em aula/seminário MJC 2º ciclo de Economia, 2º ano 3 13 de novembro de 2014 16 / E-mail e contactos dos próprios docentes via representantes dos estudantes MJC 3º ciclo de Antropologia e de Psicologia, 2º ou mais 4 05 de novembro de 2014 66 / E-mail MM Total 24 Aproximadamente 176

Uma última nota relativa ao número de participantes nos FG: a “amostra” não sendo, obviamente, estatisticamente representativa é no entanto significativa da diversidade de perspetivas dos estudantes sobre a questão estudada. Apesar deste facto e do facto de para algumas temáticas ter sido possível “saturar a informação”, vale a pena insistir em que se trata de um primeiro estudo exploratório que não entra sistematicamente na especificidade de cada curso/ciclo, o que mereceria ser aprofundado no futuro.

2.2.2. Recolha da informação

De forma a podermos comparar as respostas obtidas nos diferentes FG, a discussão dos grupos foi conduzida através de um guião de entrevista semiestruturado.

Foram construídos três guiões, um para cada ciclo de estudos (Anexo A, página 271). Há itens comuns nos três guiões e também itens específicos para cada ciclo.

O guião dos FG do 1º e 2º ciclo são semelhantes e centram-se sobretudo nas experiências pedagógicas de aprendizagem e no lugar da investigação nesta experiência.

4 Estava em funcionamento no ano letivo 2014-15 o Mestrado em Antropologia (4 participantes no FG). 5 Estavam em funcionamento no ano letivo 2014-15 os seguintes mestrados: Direito das Empresas, Economia e Políticas Públicas, Economia Monetária e Financeira, Economia Social e Solidária (um participante no FG), Estudos de Desenvolvimento (um participante no FG), Estudos do Ambiente e da Sustentabilidade, Políticas de Desenvolvimento dos Recursos Humanos (um participante no FG).

Refira-se desde já que é no 2º ciclo onde há maior heterogeneidade de situações curriculares: em psicologia, o 2º ciclo é obrigatório para a conclusão de grau que dá acesso à profissão, e os estudantes podem optar por um entre vários cursos disciplinares associados a áreas de intervenção diferentes (ver nota 3); em antropologia há um mestrado de fileira, não obrigatório, com especializações(ver nota 4); em economia não há obrigatoriedade de frequência do 2º ciclo e existem vários mestrados temáticos (ver nota 5).

O guião do 3º ciclo centra-se sobretudo nas motivações para a investigação, na experiência de investigação e na avaliação da relação entre ensino e investigação ao longo do percurso académico.

Os guiões foram construídos sobre duas dimensões principais: por um lado, o que considerámos serem fatores potencialmente explicativos das diferenças de perspetiva dos estudantes sobre a relação entre ensino e investigação e, por outro lado, as suas perspetivas sobre esta relação entre ensino e investigação.

No primeiro caso – fatores potencialmente explicativos das diferenças de perspetiva sobre a relação entre ensino e investigação – considerámos as seguintes sub-dimensões organizadoras do guião:

i. Critérios e motivações para escolha do curso no ISCTE-IUL ii. Motivação dos estudantes para a investigação.

iii. Conceções de “processo de aprendizagem” e de “investigação”

No segundo caso – “relação entre ensino e investigação” – considerámos as seguintes sub-dimensões:

i. O conceito de integração da investigação no ensino – as vantagens e desvantagens desta integração

ii. Práticas de integração I&E no ISCTE-IUL - relação entre investigação e ensino percecionada/vivida no ISCTE-IUL

iii. A avaliação desta relação: Fatores limitadores da integração I&E

iv. Fatores promotores da integração I&E e sugestões/propostas a implementar no ISCTE-IUL

2.2.3. Tratamento e análise da informação

A discussão de cada FG foi gravada em imagem e em áudio, e posteriormente integralmente transcrita.

Uma perspetiva inicial de tratamento quantitativo dos dados – análise de correspondências múltiplas dos indicadores de categorias de sentido – foi abandonada: primeiro pelo número reduzido de participantes de cada ciclo, curso, depois pela forma pouco

estruturada como decorreram as discussões. Frases incompletas, linguagem gestual e “onomatopaica”, interrupções entre participantes, derivas do debate para temas laterais, etc. – não permitiam uma codificação minimamente fiável e rigorosa para fins de tratamento quantitativo/frequencial.

Assim, o texto da discussão acabou por ser submetido a uma análise de conteúdo “qualitativa” que conheceu várias etapas.

Num primeiro momento foi realizada uma análise “temática” orientada pelos itens do guião de entrevista: nesta fase, identificaram-se as partes do debate que relevam de um mesmo tema e constituíram-se corpus de texto para cada tema (dadas as características dos debates e nomeadamente o entrosamento de temas, partes do debate poderiam ser classificadas em mais do que um tema). Numa segunda fase, cada um destes corpus, organizados por ciclo e curso, foi submetido a uma análise categorial identificando-se categorias de conteúdo e classificando as unidades de sentido nessas categorias. Numa terceira fase, as categorias registadas em cada tema foram comparadas entre ciclos e cursos identificando-se as que eram comuns ou específicas a cada curso e/ou ciclo. Por fim a análise baseou-se no estabelecimento de relações de sentido entre categorias num mesmo tema, e entre temas, procurando-se configurações típicas passíveis de serem associadas a determinados ciclos, ou cursos, ou comuns a ciclos e cursos.

Tratou-se assim de uma análise dedutiva (os grandes temas definidos pelos guiões das entrevistas) e indutiva (a construção de categorias a partir dos sentidos das falas no debate entre participantes nos FG) que permitiu uma construção progressiva de um sistema de relações entre categorias que permite dar conta do conjunto dos discursos dos participantes.

Em seguida apresentam-se os resultados desta análise, que se assume como exploratória, em particular no que diz respeito à interpretação que é apresentada sobre a relação entre, por um lado, as conceções dos estudantes sobre o que é a investigação assim como as suas motivações para a frequência de um determinado ciclo/curso e, por outro, a sua perspetiva sobre a relação entre investigação e ensino.

Dado o carácter exploratório deste trabalho e dadas as características da informação recolhida, particularmente o seu valor intrínseco enquanto construção de um discurso reflexivo dos estudantes sobre as suas experiências de aprendizagem na universidade, optámos, na apresentação dos resultados, por dar a conhecer estes discursos de forma tão integrada quanto possível. Assim, no início de cada ponto, será apresentado uma tabela com extratos destas discussões, tabelas que resultam da análise temática realizada6.

6 Nestas tabelas o debate não aparece na sua integralidade, tendo sido “limpo” de referências específicas a pessoas ou instituições, de trechos que se repetiam nas intervenções de diferentes participantes ou de um mesmo participante e também de palavras, expressões ou frases características da oralidade e que não acrescentavam sentido aos discursos.

A apresentação destes discursos dos estudantes tem dois objetivos específicos: o de dar a possibilidade ao leitor de conhecer “por dentro” a forma e o conteúdo do debate e dele tirar as suas próprias interpretações e o de fundamentar a interpretação que aqui será apresentada. Espera-se que do confronto entre as interpretações dos leitores e a interpretação dos redatores deste texto se possam abrir novos debates sobre as questões aqui tratadas.

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