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CAPÍTULO 1. CONTEXTUALIZAÇÃO, ESTADO DA ARTE,

1.4 Metodologia

Tal como referi na Introdução, este estudo adota os referenciais metodológicos do estudo de caso, envolvendo “o estudo intensivo e detalhado de uma entidade bem definida” (Coutinho 2011, 293): a OPGB. Assim, o estudo compreende a instituição (enquanto uma “realidade” construída, objetivada e mantida por um conjunto de indivíduos) e as ações que gera. Compreende também, como não podia deixar de ser, os indivíduos músicos, nomeadamente os seus percursos individuais na música e as suas expectativas.

O projeto tem na etnografia musical o seu principal aporte metodológico. Definida por Seeger (1992) como disciplina essencialmente ligada à maneira como as pessoas fazem música, a etnografia parte do pressuposto de que toda a prática sonora pode ser alvo de descrição verbal. Dessa maneira, as etnografias podem conter tanto descrições detalhadas como declarações gerais sobre práticas sonoras, baseadas em experiência pessoal ou em trabalho de campo (ibid). O projeto também se baseia na ideia, exposta por Seeger no mesmo texto, de que o que habitualmente chamamos “música” se constitui na verdade como um sistema de comunicação, assim como a linguagem, a dança e outros meios. Sendo assim, “diferentes comunidades terão diferentes ideias de

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como distinguir entre diversas formas de sons humanamente organizados” (Seeger 1992, 239).

Aplicada ao meu objeto de pesquisa, a etnografia musical permite entender os diferentes olhares sobre o bandolim em Portugal a partir da atuação da OPGB. A partir de entrevistas semiestruturadascom os integrantes da orquestra, os maestros convidados, o diretor artístico e o biógrafo que detém todos os registros a respeito do conjunto e com a minha experiência enquanto observadora participante e, inclusive, investigadora- música, pretendo entender como se constroem diferentes discursos sobre as atividades da orquestra. Realizei ainda entrevistas a Flávio Pinho e Luís Sá, bandolinistas no Ensemble de Plectros Carlos Seixas e na Orquestra de Bandolins de Esmoriz, respectivamente.

Um outro aspecto importante a ser discutido como questão metodológica, diz respeito à minha posição frente ao objeto a ser estudado.

Vários fatores me levam a optar por realizar uma etnografia a partir da minha experiência como bandolinista da orquestra no contexto da pesquisa de campo. A meu ver, isto possibilita uma maior aproximação com as pessoas e com as situações de pesquisa. Além disso, vejo a inserção nesta prática como uma maneira de alargar meus conhecimentos sobre o bandolim, em relação a aspectos técnicos, de repertório e principalmente vivenciar as aprendizagens e as relações dentro da mesma. Na verdade, o papel de investigadora-músico obrigou-me a aproximar-me do nível performativo dos músicos com os quais cheguei a tocar em palco. A técnica de bandolim que eu aprendera – centrada no bandolim do Brasil – apresentava-se insuficiente e desajustada à pratica do bandolim dentro da orquestra em estudo. Para ultrapassar este problema inscrevi-me no curso livre de bandolim no Conservatório de Música do Porto, leccionado por António Vieira, exatamente o fundador e diretor artístico da OPGB. Esta exigência colocada pelo terreno de investigação proporcionou uma maior aproximação à realidade em estudo porque foi aí, enquanto aluna de António Vieira, que pude aperceber-me das múltiplas interligações entre a prática musical na OPGB e a formação especializada de músicos, um assunto que irei explorar nos capítulos seguintes.

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perspectivas delineadas por Wong (2008) em suas teorizações sobre o investigador- músico e a autoetnografia. Na sua óptica, o investigador-músico aproxima-se da realidade em estudo por desenvolver sua pesquisa através do desempenho. Segundo Jeff Titon (2008), o trabalho de campo, visto anteriormente como observação e coleta, ao longo dos anos passou a ser encarado como experiência e compreensão e teria sua ênfase nas relações humanas (Cooley e Barz 2008). Desta forma a minha participação em campo como investigador-músico possibilita como dito por Barz, “we claimed that by actively taking part in a society’s music-cultural practices, the ethnomusicologist had the potential for uniquely and truly participatory participation-observation” (Cooley e Barz 2008, 4) uma maior inserção em meu estudo.

Em relação à autoetnografia, a autora reflete que seria um método no qual o participante se coloca no centro da investigação no sentido que ele próprio detém um pouco de experiência ou ligação com o contexto estudado. A dificuldade de tentar relatar uma prática na qual eu estou inserida envolve várias questões como: descrever as relações daquela prática como uma performer, relatar as experiências baseadas na subjetividade dos participantes e por último, sair desse ambiente e através de uma outra subjetividade, agora como investigadora de posse de uma visão crítica, escrever sobre tal prática (2008).

I want to try to convey the vibrancy and the critical effects of taiko in all its particularities, and to reflect on my own process of telling, testimony, and cultural critique. These two things are inextricably linked in performative ethnography. I can’t tell you about taiko in Southern California without telling you about how and why I’m telling you about it, and I can’t reflect on ethnography without doing it. (Wong 2008, 78).

Ainda segundo Wong, atingir um público específico como o leitor em geral e ainda assim me sentir satisfeita como pesquisadora e performer são fatores fundamentais que devem ser atingidos através desse processo (2008). Da mesma forma, a autora salienta o fato de que a performance dentro desse processo etnográfico não pode ser vista sob um olhar apenas descritivo. Deve-se levar em consideração motivações políticas e ideológicas presentes nessas práticas em relação ao grupo social ao qual pertencem e seus efeitos no mundo.

Delineadas as linhas metodológicas do trabalho, as etapas realizadas foram: a revisão bibliográfica sobre o tema proposto; a pesquisa em periódicos locais da área de

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atividade da OPGB; a pesquisa no acervo da orquestra; o trabalho de campo. Relativamente a este último, destaco, mais uma vez, a minha participação como bandolinista em ensaios e em performances públicas, a observação de eventos organizados pela OPGB, a frequência do curso de bandolim no Conservatório de Música do Porto, a manutenção de conversas informais e a realização de entrevistas ao diretor artístico, a oito elementos, ao ‘biógrafo’ responsável pelo acervo da instituição, e a dois maestros da OPGB. Foram ainda coletados alguns dados sobre a orquestra através de contato informal (telefone, e-mails, redes sociais, YouTube, Facebook, etc.).

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CAPÍTULO 2. UMA MICRO-SOCIEDADE EM TORNO DA ATIVIDADE