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II. Estudo Etnobotânico de Plantas Medicinais da Serra de Montemuro

2. Metodologia

Neste estudo foram incluídos os cinco concelhos pertencentes à Serra de Montemuro: Arouca, Castro Daire, Cinfães, Lamego e Resende. Dentro destes concelhos, foram selecionadas as freguesias que, segundo os próprios municípios pertencem à Serra de Montemuro, num total de 23 freguesias, sendo que 11 destas pertencem ao concelho de Castro Daire (Anexo 4). No entanto, o mapa da Serra de Montemuro da Rede Natura 2000 (Figura 17), abrange freguesias não mencionadas pelos municípios de Cinfães, Resende e Lamego. Pela dificuldade em definir os limites das aldeias que pertenciam ou não à Serra de Montemuro, foram incluídas todas as aldeias das freguesias, com exceção da freguesia de Alvarenga que, logo à partida, ficou definido que apenas as aldeias de Bustelo e Noninha faziam parte da Serra de Montemuro (Anexo 1).

Figura 17. Mapa das freguesias inseridas na Serra de Montemuro (Rede Natura 2000).32

Recorreu-se ao método de entrevistas diretas, tendo as mesmas sido realizadas em Maio de 2011. A escolha do mês deveu-se ao facto de ser o mês em que, possivelmente, mais plantas seria possível identificar/recolher. No entanto, algumas entrevistas não estruturadas já tinham sido

realizadas em Agosto de 2010. Das quatro aldeias em estudo da freguesia de Cabril, concelho de Castro Daire, em duas (Mosteiro de Cima e Tulha Nova), as entrevistas foram realizadas em Agosto de 2010.

Nem todas as aldeias das freguesias mencionadas no Anexo 4 foram visitadas, por indisponibilidade de tempo. A escolha das aldeias, dentro das freguesias, foi feita pelos acompanhantes e pelo tempo disponível aquando da visita à freguesia. No Anexo 5, constam as aldeias incluídas no estudo.

3. Resultados e Discussão

Das 98 pessoas entrevistadas (Anexo 6), maioritariamente idosos, 79% eram mulheres e apenas 21% do sexo masculino (Gráfico 1).

As entrevistas permitiram recolher informações sobre os diversos itens do inquérito etnobotânico, cujo modelo se apresenta no Anexo 7.

Gráfico 1. Género dos entrevistados por concelho.

No gráfico 2, podemos ver que a maior parte das entrevistas foram realizadas no concelho de Castro Daire (60%), o que coincide com o número de aldeias visitadas nesse concelho. Do total de 45 aldeias onde foram efetuadas entrevistas (Anexo 5), 26 foram em aldeias do concelho de Castro Daire (58%, Gráfico 3).

Gráfico 2. Percentagem de entrevistados por concelho. 11 4 13 3 48 10 4 3 1 1 0 10 20 30 40 50 N º E n tr ev is ta d os

Lamego Resende Castro Daire Cinfães Arouca Concelho Feminino Masculimo 15% 16% 60% 7% 2% Lamego Resende Castro Daire Cinfães Arouca

Gráfico 3. Percentagem de número de aldeias visitadas por concelho.

Na Serra de Montemuro e proximidades, encontrámos mulheres que sabiam as rezas e benzeduras, mas também as plantas para as diversas enfermidades. Foi com muita desconfiança que chegaram à fala connosco e apenas o consegui quando acompanhada de pessoas que elas conheciam e que tiveram a amabilidade de nos ajudar nesta difícil tarefa de recolha de saberes, num sítio onde estas práticas não são bem vistas pela comunidade local. Estas mulheres aprenderam esta arte com os seus pais ou familiares.

Infelizmente, em todas as sociedades o «saber curar» é uma forma de poder e, muitas vezes, de poder pessoal, muito eficaz. Não admira que em muitas destas aldeias, aqueles que têm esse poder, por vezes não o queiram partilhar.

Ao todo, foram mencionadas 350 plantas (Anexo 4), sendo 207 (60%) do concelho de Castro Daire (Gráfico 4).

Gráfico 4. Número de plantas mencionadas e percentagem por concelho.

76 2% 58% 11% 9% 20% Arouca Castro Daire Cinfães Lamego Resende 1; 0% 207; 60% 23; 7% 46; 13% 68; 20% Arouca Castro Daire Cinfães Lamego Resende

Das 45 aldeias incluídas no estudo, a malva foi, sem dúvida, a mais citada (9%), seguida pela cidreira (6%) e flor-de-sabugueiro (5%) (Gráfico 5). Outras plantas bastante referidas (3%) foram as plantas com o nome popular: barbas-de-milho, carqueja, nogueira, São-Roberto e urtiga (Anexo 8). Esta conclusão foi similar nos outros concelhos, exceto no concelho de Arouca, onde apenas foi recolhida a informação de uma planta, cujo nome popular é desconhecido pelos próprios. No concelho de Resende a tília foi também bastante mencionada pelos entrevistados deste concelho (Anexos 9-12).

Gráfico 5. Percentagem de referência à planta.

É importante referir que alguns dos entrevistados não sabiam ler nem escrever. Por isso, não raras vezes, foi impossível confirmar com eles a maneira correta de escrever o nome popular de algumas plantas. A pronúncia foi outra dificuldade encontrada na escrita correta do nome popular. Por outro lado, de aldeia para aldeia, também se verificou uma grande variação no nome popular de algumas plantas. Temos como exemplo, o caso dos nomes populares: alfavaca-da-cobra/alfaveca- da-cobra e magaça/margaça/magarça. A planta com o nome popular poupilos também tem como nome popular copilos em algumas aldeias dos concelhos. No entanto, este não foi referido ou fui induzida em erro, pois tinha como conceito formado o nome “poupilos”. Como se pode constatar, o nome popular varia entre aldeias e concelhos, como diferentes palavras são utilizadas nos diversos concelhos para designar as mesmas coisas da vida do dia-a-dia. Por exemplo, “mijacões” ou

3% 3% 6% 5% 9% 3% 3% 3% 65% Barbas-de-milho Carqueja Cidreira Flor-de-sabugueiro Malva Nogueira São-Roberto Urtiga Outros

“carbúnculos”, são palavras populares utilizadas na Serra para designar furúnculos.

Apesar do contacto prévio com as Juntas de Freguesia, os entrevistados não tinham sido informados e fomos encontrá-los nos trabalhos do campo (Maio é o mês de semear a batata, milho, etc.) ou, nalguns casos, não encontrámos a pessoa pretendida, pois a lameira onde se encontrava era distante, ou tinha saído para qualquer lado e não foi possível um novo contacto.

As entrevistas realizadas foram feitas nas ruas das aldeias, a grupos de três (raro) e duas pessoas ou individualmente, à medida que também era identificada a planta em questão. A identificação nem sempre era possível, pois por razões de mobilidade ou indisponibilidade do próprio, distância, ou simplesmente por ainda não ser a época própria, a colheita e/ou identificação não foi realizada. Tendo em conta todos estes fatores, para além do fato de a recolha ter sido efetuada num único mês e numa única visita à aldeia, muitos dos questionários estão incompletos. Muitas vezes o entrevistado só mencionou a planta e o seu uso medicinal, sem mencionar o modo de preparação, colheita, etc., porque o próprio acabava por controlar a entrevista e eu passava apenas a ter o papel de ouvinte. No que respeita ao modo de preparação da planta medicinal, o cozimentoé o mais citado e raramente a infusão é referida.

No gráfico 6, podemos ver as indicações terapêuticas onde foram referidas mais plantas: feridas, estômago, furúnculos, fígado, diarreia e problemas de bexiga todas com mais de dez plantas mencionadas (Anexo 13).

Gráfico 6. Indicações terapêuticas com maior número de plantas mencionadas.

78 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 Bexiga Colesterol Coração Desinfectante Diarreia Dor de cabeça Estômago Feridas Fígado Furúnculos Hipertensão Infeções Rins In d ic ão t er ap êu ti ca Nº de Plantas

A tentativa de identificação do nome científico (Anexo 14), foi efetuada com base no nome popular, fotografia da planta e planta recolhida, por comparação com livros de campo (Pinto et al., 2010; Fernandes e Carvalho, 2003) e com a base de dados “online” da Flora Digital de Portugal do Jardim Botânico da UTAD33. Verificou-se a existência duma grande variedade de famílias,

predominando a família Lamiaceae (Anexo 14).

De modo a confirmar posteriormente a sua correta identificação todas as plantas colhidas na Serra de Montemuro foram colocadas num herbário (Figura 18), organizado em nove volumes. Está assim dado o primeiro passo para a elaboração de um compêndio onde irão constar todas as plantas medicinais utilizadas na medicina popular da Serra de Montemuro.

Figura 18. Exemplar do herbário.

Do inquérito etnobotânico efetuado e da pesquisa bibliográfica referente às plantas mencionadas, verificou-se que algumas delas (Tabela 7) não se encontram referidas na literatura, tanto no que respeita a estudos fitoquímicos como a aplicações terapêuticas.

Tabela 7. Plantas utilizadas na medicina popular da Serra de Montemuro a exigirem um estudo

aprofundado.

Nome popular Nome científico Indicação

terapêutica

Parte utilizada

Alecrim-das-paredes Phagnalon saxatile (L.) Cass. Bexiga e rins Parte aérea

Bonefes Viola riviniana Rchb. Febres intestinais Flor

Diabelha; Erva-

abelha Plantago coronopus L.

Diarreira; garganta inflamada; alergias

Toda a planta ou parte aérea

Fento Pteridum aquilinum (L.) Kuhn Ácido úrico Raiz

Grama Arrhenatherum elatius (L.) P.

Beauv. ex J. Presl & C. Presl Cancro Raiz

Lírio Iris germanica L. Queimaduras Rizoma

Maia-branca; Giesta- branca; Chamiça- branca

Cytisus multiflorus (L'Hér)

Sweet

Diabetes; fígado, rins Flor

Nêveda Calamintha Baetica Boiss. &

Reut.

Inflamação da bexiga Parte aérea

Poupilos Umbilicus prostata (Loisel.)

Griseb Queimaduras; pisado dos olhos (fumo) Folha

Sargacinha Lithodora prostrata (Loisel.)

Griseb.

Colesterol Toda a planta ou parte aérea

Há assim, um manancial de oportunidades de estudo que interessa concretizar num futuro próximo, sob pena de se perder uma riqueza natural da Serra de Montemuro que poderá trazer valor acrescentado à sua população e também ao país.

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