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CAPÍTULO III A APROPRIAÇÃO DA PERSPECTIVA ONTOLÓGICA NA

3.1. Metodologia da pesquisa de campo: grupo focal e sua aplicabilidade na pesquisa

CRÍTICA

Para realização da pesquisa empírica utilizaremos a técnica de grupo focal. Devemos deixar claro que a escolha dessa técnica não foi aleatória, consideramos que o grupo focal seria mais adequado devido ao fato de querermos desvendar com profundidade dados qualitativos (como os alunos se apropriam da perspectiva ontológica e como visualizam a incorporação desta perspectiva por parte da categoria profissional, levando em conta os elementos históricos, ético-políticos e teóricos que fundamentam o trabalho do assistente social) e, neste sentido, as elaborações em grupo, tensionadas e fomentadas pela fala do outro, apresentam, em nossa compreensão, uma maior riqueza de dados. Considerando os objetivos de nossa pesquisa, entendemos que a aplicação de um questionário aos entrevistados não seria

capaz de apreender a complexidade de nosso objeto de pesquisa, da mesma forma, avaliamos que as entrevistas individuais poderiam se tornar mecanizadas e, neste sentido, correríamos sérios riscos do entrevistado responder o que nós pesquisadores queríamos ouvir, escamoteando a realidade dos dados. Nesse sentido, elegemos o grupo focal por considerarmos o caráter dinâmico dessa técnica para o levantamento de dados qualitativos. Reconhecemos o grupo focal como uma técnica capaz de investigar nosso objeto de pesquisa em sua complexidade, zelando pela veracidade das informações passadas pelos entrevistados, através do debate em grupo, no qual os sujeitos sintam-se a vontade para expor sua compreensão sobre os temas que desejamos abordar:

A principal característica da técnica de Grupos Focais reside no fato de ela trabalhar com a reflexão expressa através da “fala” dos participantes, permitindo que eles apresentem, simultaneamente, seus conceitos, impressões e concepções sobre determinado tema. Em decorrência, as informações produzidas ou aprofundadas são de cunho essencialmente qualitativo. (NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002, p.5)

Definindo nossa escolha para a realização da pesquisa qualitativa, podemos dizer que o grupo focal é, para as ciências sociais aplicadas:

(...) uma técnica de Pesquisa na qual o Pesquisador reúne, num mesmo local e durante um certo período, uma determinada quantidade de pessoas que fazem parte do público-alvo de suas investigações, tendo como objetivo coletar, a partir do diálogo e do debate com e entre eles, informações acerca de um tema específico. (NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002, p.5)

Nesse sentido, consideramos que o grupo focal seja a técnica mais adequada para alcançarmos nosso objetivo, pois permite-nos, a partir do debate em grupo, orientado por um roteiro30 preestabelecido, apreender a real compreensão dos estudantes acerca das categorias, princípios e fundamentos ontológicos que perpassam a formação profissional e como visualizam sua possibilidade de materialização no trabalho profissional de forma a fortalecer o projeto profissional crítico do Serviço Social. Assim, o grupo focal se adéqua a nossa pesquisa, por suas finalidades, que:

Sinteticamente, e considerando as ponderações apresentadas, as situações propícias para a aplicação da técnica de GF são aquelas nas quais os objetivos da Pesquisa, para serem atingidos, requisitam o levantamento, através de debate, das impressões, visões e concepções de mundo de seu público-alvo. (NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002, p.7)

30 Anexo I.

Com base nestes apontamentos, acreditamos que o grupo focal nos possibilitará retomar os debates travados ao longo deste trabalho, através de um roteiro para condução do grupo que leva em conta os fundamentos ontológicos do projeto profissional crítico articulados ao desenvolvimento da profissão no interior da sociedade brasileira. Em outras palavras, pretendemos que o uso da técnica de grupo focal possibilite que os alunos, que se dispuseram a participar dessa pesquisa, exponham sua compreensão acerca das mediações existentes entre a incorporação da abordagem ontológica pela categoria profissional atrelada ao movimento da sociedade brasileira, levando em conta os fundamentos teóricos, ético- políticos e históricos do trabalho profissional, assim como, sua contribuição para: o rompimento com o conservadorismo profissional; a decodificação de valores e categorias que norteiam esse rompimento (liberdade, práxis, capacidades humano-genéricas).

Inicialmente prevemos a realização de dois grupos, com duração máxima de duas horas, cada um contendo sete estudantes do Curso de Serviço Social da UFF de Rio das Ostras, que foram escolhidas de acordo com os seguintes critérios31: a) um aluno que participa do movimento estudantil; b) um aluno que trabalha; c) um aluno que realize iniciação científica; d) um aluno que participe de movimentos sociais; e) dois alunos que tenham participação religiosa sistemática no protestantismo32; f) um aluno que seja egresso de alguma Universidade privada (presencial ou à distância).

A diversidade dos componentes do grupo, visa identificar se a inserção sócio-cultural dos participantes da pesquisa tem alguma influência na forma de apreensão da abordagem ontológica do ser social, do mesmo modo, pretende assegurar a representatividade da diversidade de inserção sócio-cultural que se apresenta no curso de Serviço Social de Rio das Ostras. Para a realização do grupo focal, elaboramos o termo de consentimento livre e esclarecido33, visando coletar a autorização para o uso das informações e, assegurar aos

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Os critérios que estabelecemos levam em conta a peculiaridade de nosso objeto de pesquisa, isto é, como desejamos identificar como os estudantes vêm se apropriando da perspectiva ontológica em sua formação e como visualizam as mediações existentes entre a emersão desta perspectiva no interior da profissão, com a hegemonização do projeto profissional crítico e os movimentos da sociedade brasileira, estabelecemos como critério central, sob o qual todos os outros seriam estabelecidos, a seleção de alunos do 4° período (por já terem cursado a disciplina de Ética e Serviço Social, na qual aprofunda-se o debate ontológico e estarem começando a cursar o estágio supervisionado), do 7° e 8° (por já estarem próximos da conclusão do curso, terem cursado a disciplina de estágio e disporem de um arcabouço teórico com mais recurso e amadurecimento).

32 Escolhemos a religião protestante pelo seu avanço no interior da sociedade brasileira, impregnando a política nacional com uma ideologia extremamente conservadora no que se refere ao avanço de direitos para as minorias sociais (gays, usuários de drogas, mulheres que praticam aborto, etc.). Esse fluxo do pensamento religioso perpassa a categoria profissional e se acirra pelo lastro histórico deste pensamento para profissão.

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entrevistados, clareza acerca do: objetivo da pesquisa; uso da gravação; sigilo na análise e divulgação dos dados.

A nosso ver, o grupo focal permite, ainda, assegurar que o levantamento e a análise dos dados possam levar em consideração a heterogeneidade presente na realidade social e profissional, uma vez que a perspectiva teórico-metodológica de nossa pesquisa procura desvelar os reais conflitos que perpassam a formação profissional. Assim, avaliamos que a heterogeneidade na composição dos grupos focais será favorável para um debate plural, que reflita a diversidade social e cultural dos estudantes de Serviço Social, contribuindo para que os indivíduos sintam-se a vontade ao expor sua visão sobre as categorias e fundamentos ontológicos, despreocupados em “acertar” o que o pesquisador deseja ouvir – o ambiente propício a deixar os sujeitos pesquisados a vontade é essencial para o debate crítico que pretendemos assegurar com nossa pesquisa.

Para operacionalização do grupo focal trabalharemos com uma equipe reduzida, por não dispormos de recursos financeiros, nem de uma equipe de pesquisa, assim, o grupo será operacionalizado por duas pessoas, com as seguintes funções: 1) uma pessoa que realize a função de relator, operador de gravação e também absorva a função de observador34; b) o pesquisador, que durante o grupo será o mediador35 e, depois, terá a função de analisar o material coletado no grupo.

A perspectiva teórico-metodológica que orientou a elaboração do roteiro do grupo focal e conduzirá a análise dos dados obtidos através desta técnica, pauta-se na teoria social crítica, por: acreditarmos que esta tendência é capaz de compreender e transformar a realidade na direção da emancipação humana; ser hegemônica na formação profissional e nas instituições representativas da categoria profissional dos assistentes sociais; orientar a análise

34 Para elucidar as tarefas acumuladas, devemos ter claro que o relator deve anotar as falas, nomeando os indivíduos, estar atento a linguagem não verbal, expressa através de gestos e movimentos corporais; o observador deve estar atento a condução do grupo, sua relação com o mediador e a relação individual entre os participantes; o operador de gravação deve preparar o equipamento disponível para gravação e assegurar seu funcionamento ao longo do grupo.

35 “A função-chave da técnica. É responsável pelo início, pela motivação, pelo desenvolvimento e pela conclusão dos debates, sendo a única que neles deve intervir e que pode interagir com os participantes. A qualidade dos dados e das informações levantados no GF está intimamente vinculada a seu desempenho, que se traduz (a) no favorecimento da integração dos participantes; (b) na garantia de oportunidades equânimes a todos; (c) no controle do tempo de fala de cada participante e de duração do GF; (d) no incentivo e/ou arrefecimento dos debates; (e) na valorização da diversidade de opiniões; (f) no respeito à forma de falar dos participantes; e (g) na abstinência de posturas influenciadoras e formadoras de opinião.” (NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002, p.7)

teórica de algumas categorias, situadas neste campo teórico, a serem aprofundadas na pesquisa empírica.

Nesse sentido, a metodologia utilizada para a realização da pesquisa, tem por objetivo aliar a pesquisa bibliográfica à pesquisa de campo. Ou seja, o grupo focal, por ser uma técnica, possibilita ao pesquisador atribuir-lhe a finalidade que deseja. No nosso caso, atribuímos um caráter teórico-metodológico, ao roteiro do grupo, pautado na teoria social crítica, uma vez que os dados que desejamos aprofundar situam-se nesse campo teórico. Portanto, entendemos que é o direcionamento teórico-metodológico que atribuímos à técnica que a determina e não a técnica que determina a direção teórica. Nesse sentido, acreditamos que ao atribuirmos a esta técnica um caráter teórico-metodológico situado na teoria social crítica, pretendemos apreender, através dos debates em grupo, as formas de consciência presentes nos futuros assistentes sociais, que expressam formas de compreensão da realidade, que, de acordo com a perspectiva teórica que partilhamos, são determinadas pelas relações sociais dos sujeitos, por sua inserção sócio-cultural na realidade. A partir do estabelecimento de finalidades, coerentes com o marxismo, para utilização da técnica de grupo focal, queremos afastar toda e qualquer utilização desta técnica para fins extremamente conservadores e dominadores36.

Utilizaremos os seguintes procedimentos para analisar os dados obtidos através dos grupos focais: a) problematização das falas dos sujeitos pesquisados - que expressam sua real compreensão acerca das categorias e fundamentos ontológicos – frente às contribuições de Marx, Lukács, Kosik e outros teóricos da tradição marxista, buscando, desta forma, identificar os limites de apropriação desta perspectiva teórica; b) recorreremos às categorias de historicidade, totalidade e mediação, visando articular os debates realizados nos grupos focais aos debates teóricos do primeiro capítulo. Ou seja, utilizaremos estas categorias como base para retomar o debate dos capítulos anteriores de forma articulada, para desvelarmos os significados e impactos dos dados obtidos no grupo para: a totalidade do projeto profissional crítico; realizarmos um balanço do avanço do conservadorismo para a profissão, levando em consideração a historicidade do ser social e, portanto, as possibilidades históricas concretas de ampliação do acesso as conquistas humano-genéricas; a utilização da mediação, como

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Lembremos que o Grupo Focal é uma técnica que nasce no Marketing e é utilizada para apreender a subjetividade das pessoas, para, a partir daí, utilizá-la para produzir propagandas, divulgações de nomes de empresas, comerciais que estimulem o consumo.

categoria fundamental de análise, para mensurar o quanto os estudantes de Serviço Social do PURO articulam os debates travados na formação profissional.

Tendo em vista a técnica que será utilizada, aliada a perspectiva teórico-metodológica que atribui-lhe significado e possibilita-nos pensar sua utilização de forma coesa com a teoria social crítica, cumpre debruçarmo-nos sobre a análise dos dados obtidos nos grupos focais.

3.2. A APROPRIAÇÃO DA ONTOLOGIA DO SER SOCIAL POR PARTE DE

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