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CAPÍTULO III – PROPOSTA DIDÁCTICA: MICRORGANISMOS E

1. F UNDAMENTAÇÃO CIENTÍFICA

1.1. Fermentação e actividade enzimática

1.1.1. Microrganismos fermentativos

Os alimentos que consumimos, raramente estão estéreis, ou seja, contêm microrganismos (seres de reduzidas dimensões). A sua presença nos alimentos pode ter diferentes efeitos: causar degradação, provocar doenças alimentares ou originar alterações benéficas nas suas propriedades, transformando-os. Neste último caso, os microrganismos têm um papel importante na produção de alimentos, através de um processo que se designa fermentação (Adams & Moss, 2008). A estes novos alimentos, resultantes da acção fermentativa de determinados microrganismos, dá-se a designação de alimentos fermentados. Estes foram descobertos muito tempo antes do conhecimento científico sobre microrganismos e dos efeitos da sua actividade. Originalmente, a relevância das alterações provocadas por microrganismos terá estado relacionada com o facto de permitirem aumentar o tempo de conservação do alimento e o tornarem mais seguro para consumo. Actualmente, outros métodos de produção e conservação de alimentos permitem obter produtos alimentares tão ou mais seguros e duradouros que os alimentos fermentados; embora isso não tenha diminuído o seu consumo. Os alimentos fermentados são, maioritariamente, produzidos por bactérias ácido-lácticas e fungos, principalmente leveduras (Adams & Moss, 2008). Tanto as bactérias ácido-lácticas como os fungos conseguem crescer em ambientes com valores de pH baixos, com reduzida actividade da água (aw) e, em alguns casos, em condições anaeróbicas. Seguidamente, apresenta-se uma descrição mais pormenorizada destes dois tipos de organismos.

1.1.1.1. Leveduras

As leveduras pertencem ao reino Fungi, que compreende organismos eucariontes, maioritariamente multicelulares, heterotróficos e com parede celular composta por quitina (Purves, Sadava, Orians & Heller, 2003). Os fungos possuem, ainda, uma nutrição por absorção, através da produção de enzimas digestivas que quebram as moléculas dos seus alimentos, que são posteriormente absorvidas. Existem fungos unicelulares em todos os filos deste reino, e aqueles que, com esta característica, pertencem aos filos Zygomycota, Ascomycota e Basidiomycota são chamados de leveduras. As leveduras apresentam, maioritariamente, reprodução assexuada, por gemulação, ou, no caso de Schizosaccharomyces, por fissão binária; há ainda casos de leveduras com reprodução sexuada (Purves et al., 2003; Adams &

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Moss, 2008). A maioria das leveduras consegue crescer em condições de anaerobiose, produzindo energia através de um processo fermentativo. Contudo, a maior parte destas leveduras capazes de crescer em condições de anaerobiose, cresce de modo mais eficiente em condições de aerobiose, uma vez que, nestas condições, as exigências nutricionais são mais baixas (Adams & Moss, 2008). Apesar de serem conhecidas diversas leveduras, apenas algumas são utilizadas na produção de alimentos fermentados. A levedura mais frequentemente encontrada em bebidas fermentadas e alimentos à base de frutas e vegetais é a Saccharomyces cerevisiae. Todas as estirpes desta espécie têm a capacidade de fermentar a glucose, e algumas de fermentar a sacarose, maltose e rafinose. Contudo, nenhuma possui a capacidade de fermentar a lactose (Adams & Moss, 2008). Existem, ainda, outras espécies de leveduras que são comumente isoladas de diversos alimentos fermentados, tais como Schizosaccharomyces pombe, Kluyveromyces marxianus, Candida kefir, Zygosaccharomyces rouxii e Saccharomycopsis fibuligera.

1.1.1.2. Bactérias ácido-lácticas

As bactérias ácido-lácticas pertencem ao domínio Bacteria, sendo organismos procariontes, unicelulares, com forma de cocos ou bacilos, gram-positivos, com uma espessa camada de peptidoglicano na sua parede celular, e que não formam esporos (Purves et al., 2003; Adams & Moss, 2008). A maior parte das bactérias ácido- lácticas são anaeróbias aerotolerantes, assim como catalase e oxidase negativas. Estes organismos obtêm energia a partir da fermentação de hidratos de carbono, que origina ácido láctico (Adams & Moss, 2008). Os principais géneros de bactérias ácido-lácticas são Lactobacillus, Lactococcus, Streptococcus, Leuconostoc e Pediococcus; alguns autores consideram, também, o género Bifidobacterium como pertencente a este grupo (Adams & Moss, 2008). Dentro do género Lactobacillus, as espécies L. plantarum, L. casei, L. brevis, L. fermentum, L. bulgaricus e L. kefir, são as mais comummente associadas a alimentos fermentados; destacam-se, ainda, as espécies Streptococcus thermophilus e Pediococcus pentosaceus. As bactérias pertencentes aos géneros Streptoccus, Pediococcus e, algumas ao género, Lactobacillus são homolácticas (glucose  ácido láctico); enquanto as bactérias pertences ao género Bifidobacterium e Leuconostoc são heterolácticas (glucose  ácido láctico + ácido acético (etanol) + dióxido de carbono) (Lee, 2009). As bactérias ácido-lácticas são, também, responsáveis pela melhoria da qualidade e da segurança

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dos alimentos onde se encontram incluídas, devido às suas propriedades antimicrobianas e probióticas.

As bactérias ácido-lácticas possuem a capacidade de inibir o crescimento de outros microrganismos. O principal factor envolvido nesta inibição é a produção de ácido láctico e, em alguns casos, ácido acético, que leva a uma diminuição do pH do meio (Adams & Moss, 2008). Muitos microrganismos não conseguem crescer em condições de baixo pH, sendo por isso inibidos na presença destas bactérias. Para além desta alteração de pH, muitas bactérias ácido-lácticas produzem péptidos, bacteriocinas, que inibem o crescimento de outras bactérias. As bacteriocinas são especialmente activas contra bactérias gram-positivas, sendo a nisina (produzida por certas estirpes de Lactococcus lactis) a mais comummente utilizada na indústria alimentar (Adams & Moss, 2008). Muitas das bactérias ácido-lácticas são designadas de probióticas, termo que foi tornado popular por R. Fuller em 1989 (Ouwehand, Salminem & Isolauri, 2002). Actualmente os probióticos são definidos como organismos vivos que, após ingestão numa certa quantidade, conferem ao hospedeiro benefícios de saúde (Ouwehand et al., 2002), como a inibição de agentes patogénicos entéricos, alívio de prisão de ventre e de diarreias, estimulação do sistema imune, redução do colesterol, entre outros (Adams & Moss, 2008). Contudo, para uma determina estirpe bacteriana ser considera probiótica, tem que completar uma série de critérios, tais como (Saarela, Mogensen, Fondén, Mättö & Mattila-Sandholm, 2000; Ouwehand et al., 2002): i) ser de origem humana; ii) sobreviver à passagem pelo tracto intestinal; iii) aderir às células da mucosa intestinal; iv) possuir boas propriedades tecnológicas; v) ser segura, tanto para uso clinico como alimentar; vi) ter efeitos benéficos comprovados na saúde do seu hospedeiro; e vii) produzir substâncias antimicrobianas.