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MODELAÇÃO MATEMÁTICA E DE VULNERABILIDADE NO ÂMBITO DE ESTUDOS DE IMPACTE AMBIENTAL CASO DE

ESTUDO NO PLANALTO DO ESCARPÃO (ALBUFEIRA, ALGARVE)

EduardoPARALTA1 & João MEIRA2

1. ECOINTEGRAL Lda. Rua Mário Dionísio, nº 21 Paiões, 2635-473 Sintra. Email: ecointegral@gmail.com 2. VISA CONSULTORES S.A. Rua do Alto da Terrugem, nº2, 2770-012 Paço de Arcos. Email:

jmeira@visaconsultores.com

RESUMO

Os Estudos de Impacte Ambiental são ferramentas de ordenamento e licenciamento ambiental e industrial fundamentais na indústria extrativa. Em situações especificas de aquíferos cársicos vulneráveis com importância regional, no contexto do abastecimento público, estes estudos revestem-se da maior relevância pois deverão garantir a preservação do recurso hídrico e minimizar ou prever eventuais impactos negativos na qualidade e disponibilidade da água subterrânea.

No âmbito do plano de ordenamento do núcleo de pedreiras do planalto do Escarpão, em que se inclui o caso de estudo (i. e. Pedreira Secil Britas), realizou-se um extenso estudo geológico, hidrológico e hidrogeológico com recurso a ferramentas de modelação matemática de elementos finitos, mapas de risco e vulnerabilidade (DRASTIC e EPIK) e avaliação de qualidade da água subterrânea, que constitui uma abordagem exemplar e integrada de um estudo de impacte ambiental desenvolvido em zonas sensíveis do ponto de vista hidrogeológico. Desta forma, foi possível elaborar um modelo conceptual e matemático do funcionamento do setor central do Sistema Aquífero de Albufeira-Ribeira de Quarteira, correspondente à área envolvente do caso de estudo e prever, através de simulação, cenários hipotéticos de contaminação e dispersão de poluentes.

Palavras-Chave: aquífero; vulnerabilidade; modelação matemática; carso; EIA. 1. INTRODUÇÃO

O núcleo de pedreiras do planalto do Escarpão (Albufeira) no Algarve ocupa uma área de 2,1 km2 e desenvolve a sua actividade industrial desde adécada de 50 do século passado, embora com registo de exploração há mais de 200 anos, tendo sido objeto ao longo do tempo de vários estudos ambientais, no âmbito dos instrumentos de gestão do território e no âmbito do licenciamento industrial.As pedreiras abrangidas exploram calcário para fins industriais e construção (agregados) e para fins ornamentais (calçada e blocos).

As referidas pedreiras localizam-se na área de recarga preferencial do importante sistema aquífero cársico- fissurado de Albufeira-Ribeira de Quarteira.Face à sensibilidade ambiental e hidrogeológica da zona, a metodologia de análise proposta pela Comissão de Acompanhamento do Estudo de Impacte Ambiental, no âmbito da Proposta de Definição de Âmbito, foi extremamente rigorosa e abrangente relativamente aos aspectos relacionados com os Recursos Hídricos e a Qualidadade da Água do Aquífero.

Os trabalhos e estudos de campo realizaram-se durante o 2º semestre de 2015 e a Declaração de Impacte Ambiental foi emitida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve em Agosto de 2016.

2. ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO E HIDROGEOLÓGICO

O caso de estudo, correspondente à Pedreira da Secil Britas no planalto do Escarpão, insere-se numa zona de grande complexidade estratigráfica e estrutural. As formações aquíferas fundamentais são de natureza detrítico- carbonatada e calcária, datadas do Miocénico e do Jurássico superior, dando origem a um sistema poroso/cársico (livre a confinado). Entre os dois conjuntos intercalam-se formações menos permeáveis, de natureza detrítica e calco-margosa do Cretácico.

Os Calcários de Escarpão são uma unidade de natureza essencialmente calcária e dolomítica, com uma componente margosa, progressivamente importante para o topo. É constituída por calcários dolomíticos e dolomitos rosados ou amarelados, calcários compactos cremes e cinzentos. A espessura deste conjunto é superior a 650m, formando a ossatura de alguns relevos importantes e aflorando no Planalto do Escarpão, onde se apresenta carsificado (Fig.1).

Fig. 1 – Enquadramento geológico do Sistema Aquífero Albufeira-Ribeira de Quarteira (M6), com indicação da área de intervenção. J3EA – Calcários do Escarpão (jurássico sup.). Adaptado de Manuppella et al. (1992).

A precipitação média anual na massa de água subterrânea situa-se nos 680mm. A recarga ocorre por infiltração direta em toda a área aflorante. A recarga preferencial situa-se a Norte, por infiltração direta no planalto do Escarpão, cuja topografia aplanada e presença de formas epicársicas abundantes (dolinas, sumidouros e vales secos) é favorável a uma recarga importante. A taxa de recarga na área onde afloram as formações jurássicas (que corresponde a cerca de 50% da área da massa de água subterrânea) é significativamente superior àquela que caracteriza a zona Sul da massa de água subterrânea Albufeira-Ribeira de Quarteira, onde a presença de formações argilosas dificulta a infiltração de água da chuva. Especificamente para a área do planalto do Escarpão, a recarga média calculada foi de 500 a 600 mm/ano, correspondente aproximadamente a 70 a 90% da precipitação média anual na região (Oliveira, 2003).

Existem vários pontos de descarga do sistema com comportamento perene, nomeadamente em Olhos de Água (Albufeira), encontrando-se alguns na praia e outros no mar, com um caudal de várias dezenas de litro por segundo e na ribeira de Quarteira (Almeida et al., 2000; Reis 2007; Fernandeset al., 2015).

3. MODELAÇÃO MATEMÁTICA

A modelação matemática foi desenvolvida com o softwareVisual Modflow® que integra os módulos de modelação de escoamento Modflow e de rastreio de partículas Modpath, para referir apenas as funcionalidades utilizadas no presente estudo.

A área abrangida pelo modelo matemático é bastante superior à área de intervenção do projeto, tendo-se simulado as condições hidrogeológicas para uma área com cerca de 26 km2, correspondendo a 2600 células com dimensão de 100 x 100 m de lado (2206 células ativas e 394 inativas). A modelação foi realizada em regime de equilíbrio para o modelo de escoamento e em regime transitório para o modelo de rastreio de partículas. Os resultados das simulações do modelo matemático de escoamento e rastreio de partículas, indicam que, no caso improvável, de derrames acidentais de solutos conservativos, o tempo de percurso da frente da pluma de contaminação até à zona de Patã de Cima varia entre 70 dias e 20 anos, em função do desenvolvimento da carsificação, modelado com recurso ao parâmetro porosidade efetiva.

As captações de água subterrânea para abastecimento público mais próximas, encontram-se a 700m para sul do limite da área de intervenção e a 1500m para sul da lagoa da escavaçãomais profunda, não estando na direção mais crítica da dispersão de uma hipotética contaminação, que se dirige para Patã de Cima (Fig. 2).

(a) (b)

Fig. 2–Trajetória das partículas contaminantes para uma porosidade efetiva de 20%(a) e 0,2% (b).

4. VULNERABILIDADE À POLUIÇÃO

No setor do planalto da Quinta do Escarpão onde se localiza a área de intervenção, a vulnerabilidade das águas subterrâneas à poluição, considerando uma metodologia qualitativa, baseada no índice EPPNA, pode ser classificada como tendo risco alto (V1), porque estamos na presença de aquíferos em rochas carbonatadas de elevada carsificação.

A abordagem à vulnerabilidade pode ser desenvolvida também aplicando uma ferramenta de avaliação da poluição mais específica para sistemas cársicos, conceptualizada no método EPIK (Doerfliger & Zwahlen, 1997).

Este índice considera a geologia cársica dos aquíferos, a geomorfologia e as características hidrogeológicas. O índice é construído com base nos seguintes parâmetros: epicarso (E), cobertura de proteção (P), condições de infiltração (I) e grau de desenvolvimento da rede cársica (K).

O resultado obtido com a média ponderada dos parâmetros referidos no Índice EPIK, para o planalto do Escarpão, considerando opções conservativas/defensivas para o aquífero, apontam para uma área de vulnerabilidade alta a muito alta, verificando-se que, a área de intervenção do projeto, corresponde precisamente a área de muito alta vulnerabilidade (Fig. 3).

Fig. 3 – Mapa final do Índice EPIK na área do planalto do Escarpão.

Relativamente ao método DRASTIC, o valor da vulnerabilidade para as formações calcárias carsificadas do Jurássico superior do planalto do Escarpão, em situação de topografia natural situa-se nos 180, o que equivale a um sistema de vulnerabilidade elevada. Os valores obtidos são concordantes com os índices publicados pelos especialistas (Lobo Ferreira et al., 1995) para a área do Escarpão, que se situam entre 160 e 179 (vulnerabilidade elevada).

No entanto, a área de implantação da pedreira será sempre aquela que apresenta um maior grau de sensibilidade hidrogeológica. Em particular, nas áreas de escavação, a remoção da cobertura geológica e a exumação pontual

do nível freático (lagoa da pedreira), potenciam a vulnerabilidade do sistema, pelo que a vulnerabilidade à poluição das águas subterrâneas nesse local é máxima (índice DRASTIC 226).

Salienta-se que a metodologia utilizada apresenta algum grau de incerteza, seja por alguma subjetividade na valorização de cada um dos parâmetros, seja pela imprevisibilidade resultante da elevada heterogeneidade própria do meio cársico.

5. CONCLUSÕES

No âmbito do plano de ordenamento do núcleo de pedreiras do planalto do Escarpão, os estudos realizados permitiram caraterizar rigorosamente, através de ferramentas de modelação matemática e índices de vulnerabilidade, o modelo hidrogeológico conceptual e prever cenários de hipotéticas situações de contaminação.

As abordagens utilizadas, apesar de complexas e dispendiosas ao nível de tempo e recursos financeiros, são indispensáveis para realizar estudos de impacte ambiental credíveis, em zonas sensíveis do ponto de vista hidrogeológico, nomeadamente aquíferos cársicos.

AGRADECIMENTOS

Os autores manifestam o seu agradecimento à Secil Britas S. A., nomeadamente ao Eng. Franclim Venda, pela sua disponibilidade e colaboração em todas as fases dos estudos e trabalhos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Almeida, C., Mendonça, J. L., Barbosa, C.& Gomes, A. J. (2000) – Sistemas Aquíferos de Portugal Continental. Instituto da Água, I. P. Lisboa.

Doerfliger & Zwahlen (1997) - EPIK - A new method for outlining of protection areas in karstic environment. In Gunnay G, Jonshon AI (eds) - International Symposium and Field seminar on karst waters and environmental impacts, Antalya, Turkey, Balkema, Rotterdam, pp. 117 -123.

Fernandes, J.; Almeida, C.; De Plaen, J.; Melo,T.; Stigter,T.; Leitão, F.; Range,P. & Carrara, G. (2015) - Descargas de água subterrânea na plataforma algarvia: o caso do Sistema Aquífero Albufeira-Ribeira de Quarteira. Atas do X Congresso Ibérico de Geoquímica, Lisboa, LNEG, 19 a 23 de Outubro de 2015, pp. 331-334.

Lobo Ferreira, J.P.; Oliveira, M.M.; Moinante, M.J.; Theves, T. & Diamantino, C. (1995) - Estudo de Avaliação da Vulnerabilidade da Capacidade de Recepção das Águas e Zonas Costeiras em Portugal. Meios Receptores e Suas Características: Meios Subterrâneos. Relatório Específico R3.3 e 237/95-GIAS, Setembro de 1995.

Manuppella, G., Oliveira, J. T., Pais, J. & Dias, R. P. (1992) - Carta Geológica da Região do Algarve, escala 1:100 000, Notícia Explicativa, Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa,15 pág.

Oliveira, M. (2003) – Cálculo da recarga dos sistemas aquíferos de Quarteira e de Albufeira-Ribeira de Quarteira recorrendo a uma actualização do modelo de balanço hidrico sequencial diário que utiliza o coeficiente cultural dual na estimativa da evapotranspiração real. Jornadas Luso-Espanholas sobre Águas Subterrâneas no Sul da Península Ibérica. APRH. Faro, 23 a 27 de Junho de 2003, 10 pp.

Reis, E. (2007) - Contribuição para o cálculo do balanco hídrico dos principais sistemas aquíferos do Algarve. Algarve, Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, Comissão Coordenadora e Desenvolvimento Regional, 41pp.

MODELAÇÃO NUMÉRICA DA GESTÃO DE RECARGA DE