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2.3 Qualidades materiais da Luz

2.3.1 Modelagem

As diferentes posições de entrada da luz definirão uma modelagem específica para cada espaço. Entenda-se como modelagem a distribuição da luz, de que maneira ela incide nas superfícies criando claros, menos claros e sombras, o que irá definir nossa percepção do ambiente tridimensional.

Fonte de luz distante, não visível no campo visual, o sol, num dia de céu claro, sem nuvens, emite uma luz direcional onde os raios incidem paralelos criando fortes contrastes de luz e sombra conforme a hora do dia e seus ângulos de incidência. A luz solar também é distribuída pela abóbada celeste que espalha a luz em todas as direções e, especialmente, em dias encobertos cria uma atmosfera de luz difusa, praticamente sem sombras. Percebemos claramente esta modelagem na arquitetura e paisagem, com seus efeitos distintos.

2.3.1.1 Contrastes

Para ver com clareza os objetos e superfícies iluminadas em três dimensões, é necessária a contrapartida da luz, ou seja, a sombra. Através da relação entre luz e sombra nós somos capazes de determinar a forma da arquitetura pela maneira pela qual espaços e superfícies são revelados. O grau de luz e sombra não só informa a maneira como nós vemos, mas também a forma e expressão do nosso meio. Trabalhar com luz requer um entendimento de como manter a sombra. A sombra, como a luz, tem suas qualidades materiais como quantidade, direção e foco. Na luz natural isto muda em perfeita harmonia com o movimento do sol. Num ambiente iluminado artificialmente, enquanto um contraste de luz e sombra pode ser planejado, isto é em geral resultado do efeito de múltiplas fontes.

O contraste entre luz e sombra é uma qualidade da luz extremamente importante que permite maior acuidade visual. Percebemos com mais clareza quando o contraste entre a figura e fundo é mais evidente. Especialmente numa tarefa, isto pode contribuir para aumentar conforto e produtividade. O contraste é a história da luz e de sua contrapartida, o escuro. Podemos determinar a forma da arquitetura pela maneira como espaço e superfícies aparecem. A gradação de luz e sombra não informa apenas a maneira como vemos, mas também a atmosfera e expressão de nosso meio. A sombra - como a luz - tem qualidade, quantidade, direção e foco. Na luz natural isto muda em perfeita harmonia com o movimento do sol. Na luz artificial, o contraste entre luz e sombra pode ser controlado. É importante compreender e trabalhar com os contrastes, pois respondemos o tempo todo a eles e, neste sentido, nossas reações e emoções podem ser estimuladas.

Ambientes de onde a luz provém de mais de uma direção apresentam uma distribuição mais equilibrada das luminâncias nas superfícies. O que é significativo para a percepção são as luminâncias, pois o que percebemos é a luz refletida destas superfícies, variáveis em função das cores e refletâncias dos materiais. Na sala abaixo podemos observar as diferenças de distribuição da luz lateral de uma janela comum. À esquerda, a iluminação resultou em contrastes maiores que 1/5 no campo visual imediato e maior que 1/30 no campo periférico, com relação ao brilho da janela e o fundo da sala. O contraste nestas condições causa ofuscamento e desconforto. Na situação intermediária percebemos melhor uniformidade na iluminação da sala e contrastes entre a mesa e o fundo da sala, menores que 1/10. Na situação da direita, com a prateleira de luz, o alcance da distribuição da luz no fundo da sala aumenta em quatro vezes. O contraste da sala resultou menor que ½, praticamente uniforme para o olhar. A profundidade e espessura na captação de luz da envoltória criam maior alcance do facho luminoso que irá atingir o fundo da sala.

Figura 22: Distribuição das luminâncias em um ambiente com entrada de luz em várias direções. Contrastes de 1/10 no campo de visão geral com de brilhos no campo visual periférico.

Fonte: FONTONOYANT, Marc. Daylight performance of buildings. Lyon, European commission, 1999.

Figuras 25,26 e 27: Iluminação lateral , iluminação lateral com janela alta e à direita com prateleira de luz. Fonte: FONTONOYANT, Marc. Daylight performance of buildings. Lyon, European commission, 1999.

Conforme a posição do usuário no ambiente e contrastes excessivos existe possibilidade de ofuscamento. Entretanto, conforme a atividade desenvolvida, certo nível de brilho no campo visual pode ser estimulante e provocar resposta emocional. Na imagem abaixo, na igreja de Ronchamp, o local onde fica a Nossa Senhora apresenta uma luminância de 3221 cd muito acima das demais, assim como as aberturas mais brilhantes, atraindo olhar e intensificando os efeitos de captação e direção da luz simbólica.

A distribuição das luminâncias é importante variável a ser considerada como ponto de partida para elaboração do projeto que considere os aspectos de percepção visual a partir dos contrastes e qualidades obtidas. Para percebermos um contraste, e ele causar destaque sem impressão de uniformidade, este precisará ser, no mínimo, de duas vezes maior que o seu entorno, embora não seja ainda perceptível conscientemente.

O nível de iluminação geral e contrastes dependerão de cada projeto, sabendo-se que para destaque temos o seguinte:

2:1 Perceptível (subliminar)

5:1 Perceptível com a área se misturando ao entorno;

10:1 Claramente perceptível com visão do foco e áreas do entorno; 50:1 Dramático com sensação de isolamento

Figuras 28/29: Igreja de Notre Dame Du Haut, Ronchamp, Le Corbusier

Com iluminação artificial apenas no período noturno é mais fácil obter uniformidade, pois a dificuldade maior é conseguir menores contrastes no espaço entre a luz solar e a artificial durante o dia. Para ambientes de trabalho, a norma alemã DIN, para iluminação de interiores, recomenda uma uniformidade de luminâncias de 3/1: entre a tarefa visual e entorno imediato, 5/1 entre a tarefa e entorno remoto; e 10/1 entre a tarefa e o entorno periférico. O campo visual é considerado em três aberturas: entorno imediato: 30°, entorno remoto: 60° e entorno periférico: 90°.

Adaptação

O órgão da visão é capaz de adaptar-se às mudanças quantitativas e qualitativas da iluminação. Na adaptação quantitativa o órgão se acomoda à intensidade de iluminação. “Graças à adaptação o homem está capacitado a orientar-se ao fim de um breve período, tanto num quarto escuro iluminado por uma simples vela como numa região nevada de uma montanha alta a plena luz do sol. A capacidade de adaptação comporta, segundo Siegfried Röscher, mais de 1:20.000. Razão pela qual o homem é capaz de reconhecer e diferenciar relativamente bem as cores mesmo embaixo de qualidades de luz muito diferentes.”6

Para a adaptação qualitativa: a retina tem três tipos diferentes de receptores: os cones, cada um dos quais é sensível para distintas áreas do espectro. Esta adaptação acontece quando estes três receptores denominados cones se adaptam as suas respectivas áreas espectrais. Os cones da retina não vêm cores, são apenas coletores das radiações que, através das vias nervosas, atingem o cérebro. A sensação de cor só nasce no cérebro.

6

KÜPPERS, Harold. Fundamentos de la teoria de los colores. Ed. Gustavo Gili AS. México, 1992, pág. 16 Figuras 30/31/32: Contrastes de 5/1, 10/1 e 50/1

Alguns projetos tiraram partido deste efeito do ofuscamento momentâneo causado no processo de adaptação quantitativa, como, por exemplo, a catedral de Brasília. A adaptação de um ambiente externo muito claro para um escuro do túnel de acesso causa uma reação de parar e se reorientar, até ver novamente que existe luz no final, um novo contraste ao entrar no espaço, revela um ambiente iluminado, divino, com anjos pendurados num céu de vitral, como numa visão. Estes contrastes criam impactos emocionais, pois é certo que nossa percepção reage aos contrastes, mas exceto em situações com este propósito, o ofuscamento é um fator dispersivo e de desconforto.

2.3.1.2 Direção da luz

A direção da luz e sua forma ou desenho pode ser observada e percebida pelas variedades e contrastes de intensidade e cor no ambiente. A figura seguinte mostra o mesmo espaço com variações de intensidade, aparência de cor e desenho. À esquerda a luz zenital provém de um céu encoberto no meio do dia. Á direita, a luz direcional de um céu claro cria um desenho de luz pela entrada da radiação direta. A luz refletida do piso valoriza indiretamente a escultura na parede,

Figuras 33/34: Vista do acesso subterrâneo e do espaço interno da Catedral de Brasília, Oscar Niemeyer. Fonte: www. geocities.com

Figuras 35/36: Galeria de arte: luz difusa à esquerda e luz direcional, à direita. Fonte: MILLET, Marietta S. Light revealing architecture. NY, Van Nostrand Reinhold, 1996.

2.3.2 Orientação e movimento

Somos seres atraídos pela luz. Luz e movimento são os dois elementos que mais chamam a nossa atenção. A tendência é seguir a luz através dos caminhos, pois os pontos mais brilhantes de luz nos atraem. Então se desejamos sugerir uma direção de movimento, a luz precisa ser mais brilhante.

O movimento é estimulado pela luz, com ritmos que provocam variações, podendo definir paradas e locais de contemplação. O movimento da luz é um processo linear, em que tempo e espaço se encontram. Vemos o mundo em movimento com luzes e sombras que se modificam com a luz natural que vai revelando a passagem do dia. A luz artificial também pode se movimentar. Este movimento não implica necessariamente uma mudança de direção física da luz, mas a habilidade de variar, alterando a percepção do ambiente ao longo do dia.

Figuras 38/39: Circulação durante o dia e à noite, onde a luz intercepta as estruturas criando ritmo estimulante. A solução de luz artificial recriou o momento do dia 5000K, diferenciando com a aparência de cor da fonte de 2700K.

Fonte: MILLET, Marietta S. Light revealing architecture. NY, Van Nostrand Reinhold, 1996. Figura 37: A luz ritmada cria movimento e indica o percurso a seguir.

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