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Modelo Constitutivo Hiperbólico

Modelo Constitutivo Hiperbólico

3.1

Considerações Iniciais

Quando se fala em modelo constitutivo de um solo, pretende-se na verdade estabelecer uma relação matemática que represente o comportamento dos materiais envolvidos.

A escolha de um determinado modelo constitutivo depende do que se pretende simular do comportamento dos materiais.

Para análise do comportamento tensão-deformação da barragem da UHE Nova Ponte, foi adotado o modelo hiperbólico. Este modelo foi escolhido por simular a não- linearidade do comportamento tensão-deformação do solo e a sua dependência do nível de tensões. Além disso, os ensaios triaxiais disponíveis permitiam a obtenção dos parâmetros necessários à sua definição.

A grande vantagem do modelo hiperbólico é a sua simplicidade. As relações tensão- deformação são baseadas em análise incremental não-linear, sendo que em cada incremento o comportamento é considerado linear. Além disso, os parâmetros envolvidos têm significado físico, o que facilita os estudos paramétricos.

O modelo hiperbólico apresenta como limitações a incapacidade de prever a dilatância, não simular o comportamento frágil dos materiais (perda de resistência com a continuidade das deformações após a ruptura) e não considerar a influência da tensão principal intermediária

3.2

Descrição do Modelo

No modelo constitutivo desenvolvido por Duncan e Chang (1970), é admitida uma variação hiperbólica entre tensão desviadora e deformação, tentando reproduzir as características de não-linearidade e de dependência do nível de tensões para o comportamento do solo.

De acordo com o modelo, as curvas tensão-deformação dos solos são representadas pela função hiperbólica proposta por Kondner (1963) da forma:

(σ1-σ3) = ε / (a +bε) (3.1) onde

σ1 e σ3 são as tensões principais maior e menor, respectivamente; ε é a deformação axial;

a e b são constantes determinadas experimentalmente.

O parâmetro a está associado ao módulo de deformabilidade inicial Ei e b está associado ao valor da tensão desviadora na condição última (σ1-σ3)ult.

A equação (3.1) pode ser reescrita da forma:

ε / (σ1-σ3) = a +bε (3.2)

Assim, através da elaboração de curvas transformadas do tipo ε/(σ1-σ3) versus ε, pode- se obter os valores de a e b. O gráfico resultante é uma reta, cujo intercepto e inclinação representam os parâmetros a e b, respectivamente.

Na Figura 3.1, são apresentadas as curvas tensão-deformação hiperbólica e transformada. Através deste gráfico, é possível visualizar o significado físico dos parâmetros a e b.

ε1 σ1 - σ3 ( kP a) ( σ1 - σ3 ) ult Ei 1 Curva Hiperbólica ε1 ε1 /( σ1 -σ3 ) b = 1/( σ1 - σ3) ult a = 1/Ei 1 b a Curva Transformada

Figura 3.1 – Curvas Tensão-Deformação

Para um melhor ajuste da curva teórica à curva do ensaio, Duncan e Chang (1970) propõem a utilização de apenas dois pontos da curva tensão-deformação de ensaio. Segundo os autores, seriam utilizados apenas os pontos correspondentes a 70% e 95% da tensão desviadora mobilizada.

Neste trabalho, foi feita uma comparação entre o ajuste obtido utilizando-se todos os pontos do ensaio e apenas os dois pontos sugeridos.

A tensão desviadora na ruptura (σ1-σ3)rup e a tensão desviadora assintótica (σ1-σ3)ult são correlacionadas pelo fator de ruptura Rf. Este fator representa o quanto a curva tensão- deformação do solo se afasta da hipérbole. O valor de Rf é dado pela expressão:

Rf = (σ1-σ3)rup / (σ1-σ3)ult (3.3)

Duncan e Chang (1970) indicam que o valor de Rf é independente de σ3, para um determinado tipo de solo. Entretanto, Castro (1996) observou um pequeno acréscimo no valor de Rf com o aumento da tensão confinante σ3.

Reescrevendo-se a equação (3.1) com os valores de a = 1/Ei e b = 1/(σ1-σ3)ult, obtem-se:

(σ1-σ3) = ε / [(1/Ei +ε Rf /(σ1-σ3)rup] (3.4)

O aumento da rigidez com a tensão confinante, verificada experimentalmente para a maioria dos solos, é considerada através da expressão empírica proposta por Janbu (1963):

Ei = K pa (σ3 / pa)n (3.5) onde

Ei é o módulo de deformabilidade inicial;

pa é a pressão atmosférica, expressa nas unidades de Ei e σ3; K e n são constantes adimensionais.

Os valores de K e n podem ser obtidos através de uma série de ensaios, plotando-se os valores de log (Ei/pa) versus log (σ3/pa) e ajustando-se uma reta aos pontos obtidos.

Na Figura 3.2 é ilustrado o gráfico de variação do módulo de deformabilidade inicial com a tensão confinante.

log(σ3/pa) lo g( Ei /p a) 1 log K n 0

Figura 3.2 - Determinação dos Parâmetros Hiperbólicos K e n

O valor de (σ1-σ3)rup é obtido através do critério de ruptura de Mohr-Coulomb, utilizando a expressão:

(σ1-σ3) rup = 2 (c cos φ + σ3 sen φ ) / (1 – sen φ ) (3.6) onde

c representa o intercepto de coesão do material; φ é o ângulo de atrito interno.

Para solos granulares, principalmente enrocamentos, as envoltórias de resistência são notadamente não lineares. O valor do ângulo de atrito φ diminui com o aumento da tensão confinante, conforme mostrado na Figura 3.3. Observa-se que a variação do ângulo de atrito φ é mais marcante para baixas tensões confinantes.

Figura 3.3 – Variação do Ângulo de Atrito Interno com a Tensão Confinante (Marachi et al, 1969)

Plotando-se os valores de φ versus log (σ3/pa), conforme mostrado na Figura 3.4, obtem- se:

φ = φ0 - ∆φ . log (σ3/ pa) (3.7)

onde

φ0 é o ângulo de atrito para σ3 igual a pa;

∆φ é a variação do ângulo de atrito com a tensão confinante σ3.

log (σ3/pa) Â ng ul o de a tr ito 1 0

Figura 3.4 – Determinação dos Valores de φ0 e ∆φ φ0

O módulo de deformabilidade tangente Et é dado pela inclinação da curva tensão- deformação. Diferenciando-se a equação (3.1) em relação a ε vem:

Et = ∂ (σ1-σ3)/ ∂ε = (1/Ei) / [(1/Ei) + ε/(σ1-σ3) ult )]2 (3.8)

Nesta expressão, Et é função tanto da deformação quanto da tensão desviadora. Desta maneira, fica dependente do estado de referência assumido. O estado de deformação nula (ε = 0) é escolhido arbitrariamente, ao passo que o estado de tensão desviadora nula [(σ1-σ3) = 0] pode ser definido com exatidão. Assim, é comum expressar Et somente em função de tensões, eliminando ε da equação. Além disso, os valores de tensão podem ser mais facilmente calculados que os valores de deformação.

A deformação ε é eliminada da equação (3.8) reescrevendo-se a equação (3.4) como:

ε = (σ1-σ3) / Ei . {1 – [Rf . (σ1-σ3)/ (σ1-σ3) rup ]} (3.9)

Substituindo as expressões (3.3), (3.5), (3.6) e (3.9) na equação (3.8), obtem-se:

Et = {1 – [Rf (1-sen φ ) (σ1-σ3) / 2 (c cos φ + σ3 sen φ)]}2 K pa (σ3 / pa)n (3.10)

Esta expressão é utilizada para calcular o valor do módulo de deformabilidade tangente para qualquer incremento de tensão, desde que conhecidos os valores de K, n, c, φ e Rf. Pode ser empregada para análises em termos de tensões totais ou efetivas, para qualquer condição de tensões iniciais.

De maneira simplificada, o módulo de deformabilidade tangente pode ser escrito da forma:

Et = Ei [1 – Rf S ]2 (3.11) onde

O comportamento não-elástico do solo é representado pela utilização de módulos de deformabilidade diferentes no carregamento e no descarregamento/recarregamento. Admite-se que o ciclo de descarregamento/recarregamento seja elástico.

O módulo de deformabilidade durante o descarregamento/recarregamento é dado pela expressão:

Eur = Kur pa (σ3 / pa)n (3.13)

O valor de Kur é da ordem de 2,5 vezes o valor de K. O valor de n é considerado único para as duas fases.

No modelo inicialmente proposto por Duncan e Chang (1970), o valor do coeficiente de Poisson (ν) era considerado constante, independente do nível de tensão. Era considerado um valor médio para ν, calculado pela expressão:

ν = [1- (εvol/ε1)] / 2 (3.14)

Duncan (1980) fez uma nova proposição de variação do coeficiente de Poisson. Neste caso, considerou o coeficiente de deformação volumétrica B independente do nível de tensão, mas variável com a tensão confinante.

De acordo com a teoria da elasticidade, B é dado pela fórmula:

B = σoct / ε v = (∆σ1 + ∆σ2 + ∆σ3 ) / 3ε v (3.15)

B = Kb pa (σ3 / pa)m (3.16) onde

Kb e m são parâmetros adimensionais.

Os valores de Kb e m podem ser obtidos através de uma série de ensaios, plotando-se os valores de log (B/pa) versus log (σ3/pa) e ajustando-se uma reta aos pontos obtidos.

Na Figura 3.5 é ilustrada a obtenção dos valores de Kb e m.

log(σ3/pa) lo g( B /p a) 1 log Kb m 0

Figura 3.5 - Determinação dos Parâmetros Hiperbólicos Kb e m

O módulo volumétrico B tende a subestimar o coeficiente de Poisson ν a baixos níveis de tensão (Duncan et al, 1984). Desta forma, o modelo hiperbólico utilizado no presente trabalho assume as seguintes hipóteses:

Bmin ≥ (Et/3) . [(2-sen φ) / sen φ] para φ > 2,3o (3.17)

Bmin = 17 Et para φ ≤ 2,3o (3.18)

Quando φ ≤ 2,3o, o coeficiente de Poisson é igual a 0,49, valor apropriado para solos saturados sob condições não drenadas. Para φ > 2,3o, o coeficiente de Poisson assume o valor maior ou igual a [(1- sen φ) / (2- sen φ)].

3.3

Determinação dos Parâmetros Hiperbólicos dos Enrocamentos

Dada a dificuldade de realização de ensaios triaxiais com amostras de enrocamento, Saboya Jr. e Byrne (1993) desenvolveram uma metodologia para determinação dos parâmetros hiperbólicos destes materiais, baseada nas suas características físicas.

Na Tabela 3.1, são apresentados parâmetros hiperbólicos típicos de enrocamentos, segundo levantamento feito por Saboya Jr. (1993). Os dados publicados foram obtidos a partir de ensaios de laboratório com amostras de enrocamento.

Tabela 3.1 - Parâmetros Hiperbólicos Típicos dos Enrocamentos (Saboya Jr.,1993) Refs. Cu K n m Kb Dr (%) D60 (cm) Obs. Marsal

(1973) 18 534 0,37 0,14 283 --- 20 Basalto são sub-angular

Signer

(1973) 4,7 450 0,35 --- --- 82 5,0 Basalto são sub-angular

Signer (1973) 5,0 400 0,51 --- --- 100 2,0 Basalto sub-angular Marsal et al (*) 52 540 0,43 0,34 135 70 4,7 Conglomerado sub- angular Marsal et al (*) 84 690 0,45 0,22 170 85 2,1 Pedregulho sub- angular Marsal et al (*) 5,5 340 0,28 0,18 52 90 9,3 Diorito angular Marsal (*) 19 450 0,37 0,18 255 95 1,9 Basalto angular Sharnon (*) 2,5 410 0,21 0,00 175 90 1,5 Basalto triturado Becker et al (*) 6,8 330 0,46 0,45 110 90 2,0 Arenito angular (*) Ref.: Duncan et al (1980)

A compressibilidade de materiais granulares depende principalmente da quebra de grãos sob a ação das forças de contato. Por sua vez, o valor destas forças depende do número de contatos entre grãos e consequentemente, do arranjo das partículas. Assim, é possível

estimar a compressibilidade dos enrocamentos a partir de suas características físicas, tais como coeficiente de uniformidade Cu, forma, tamanho dos grãos e porosidade.

Os dados apresentados na Tabela 3.1 indicam que K e Kb aumentam com o coeficiente de uniformidade, como mostrado na Figura 3.6. As envoltórias indicadas são dadas pelas equações: Enrocamento Sub-Angular K = 57 ln (Cu) + 376 (3.19) Kb = 18,3 ln (Cu) + 180 (3.20) Enrocamento Angular K = 57 ln (Cu) + 298 (3.21) Kb = 18,3 ln (Cu) + 114 (3.22) Enrocamento Triturado K = 57 ln (Cu) + 200 (3.23) Kb = 18,3 ln (Cu) + 58 (3.24)

Figura 3.6 – Determinação dos Parâmetros K e Kb dos Enrocamentos (Saboya Jr. e Byrne, 1993)

Rammamurthy e Gupta (1980) mostraram que os parâmetros hiperbólicos K e n variam consideravelmente com o tamanho máximo dos grãos. Como é prática comum remover as partículas maiores nos ensaios de laboratório devido às limitações dos equipamentos, é necessário corrigir os parâmetros obtidos para se levar em conta o tamanho real dos grãos no protótipo. O fator de correção depende do diâmetro relativo, definido como a relação entre o diâmetro máximo das partículas no campo e o diâmetro máximo da amostra ensaiada. Da mesma maneira, são definidos os parâmetros hiperbólicos relativos K* e n* como:

K* = Kcampo / Klab (3.25)

n* = ncampo / nlab (3.26)

Os parâmetros hiperbólicos relativos refletem a influência do tamanho dos grãos na compressiblidade dos enrocamentos, como mostrado nas Figuras 3.7 e 3.8. Nota-se que os materiais de campo são mais compressíveis e mais dependentes da tensão confinante que os materiais de laboratório. Esse conceito é muito importante quando se analisa o comportamento tensão-deformação de uma barragem a partir de parâmetros obtidos em ensaios de laboratório.

Figura 3.7 – Determinação da Constante Relativa K* (Rammamurthy e Gupta, 1980)

Figura 3.8 – Determinação da Constante Relativa n* (Rammamurthy e Gupta, 1980)

O parâmetro Kb pode ser estimado da mesma forma que K.

É também possível calcular ou aferir os parâmetros de deformação volumétrica Kb e m durante a construção, medindo-se a tensão vertical e o recalque em um ponto correspondente à condição de compressão confinada (sem deformação lateral). A partir dos valores obtidos durante o lançamento das primeiras camadas de enrocamento, determina-se a equação:

εv = a (σv) b (3.27)

onde

εv é a deformação vertical específica; σv é a tensão vertical;

a e b são parâmetros de ajuste da curva

Os módulos de deformação de campo secante Ms e tangente M são definidos pelas equações:

M = ∂σv / ∂ εv = σv(1-b) / ba (3.29)

A partir destas expressões conclui-se que:

M = Ms / b (3.30)

Considerando que o módulo de deformação de campo M obedeça a uma relação exponencial com a tensão vertical tem-se:

M = K´m pa (σv /pa)m = Km pa (σ3 / pa) m (3.31) onde

m = 1 – b (3.32)

Uma vez determinado o valor de m, o valor de n pode ser calculado pela relação n = 2m, conforme sugerido por Byrne et al (1987) para areias. No caso de enrocamento, devido ao efeito de quebra de grãos, os autores sugerem que esta relação seja da ordem de n = 1,5 a 1,8 m. Igualando (3.29) e (3.31), tem-se:

K´m pa = (pa)m / ba (3.33)

Considerando σ3 = K0 . σ1 e σ1 = σv, Km fica definido como:

Km = K´m / K0m = (pa)m / ba K0m pa (3.34)

Segundo Byrne et al (1987), os módulos de deformação volumétrica B e de campo M são relacionados por:

B = M (1 + 2 K0) / 3 (3.35)

Kb = Km (1 + 2 K0 ) /3

No caso da barragem da UHE Nova Ponte, a inexistência de células de pressão instaladas no enrocamento impede a utilização desta metodologia para cálculo ou aferição do módulo de deformação volumétrica, uma vez que os valores da tensão vertical teriam que ser estimados. Da mesma maneira, a configuração do maciço de enrocamento dificulta a definição de um ponto correspondente à condição de deformação lateral nula.

Quanto aos parâmetros de resistência, por se tratar de material essencialmente granular, o enrocamento não apresenta coesão. Os parâmetros φ e ∆φ são definidos a partir da metodologia proposta por Barton e Kjaernsli (1981). Os autores estenderam a teoria da resistência de juntas em maciços rochosos para materiais granulares. A teoria é uma aproximação empírica, baseada na resistência e na rugosidade do contato. A resistência do grão de enrocamento é determinada através do ensaio de compressão simples da partícula rochosa. A determinação de φ é dada pela expressão:

φ = R log (S/σn) + φb (3.36)

onde

R é a rugosidade equivalente; S é a resistência equivalente; σn é a tensão normal;

φb é o ângulo de atrito mineral x mineral.

O valor da resistência equivalente é baseado na resistência à compressão simples da partícula rochosa e no tipo de análise (estado plano de tensão ou estado plano de deformação). A resistência equivalente é dada pelo gráfico apresentado na Figura 3.9.

Figura 3.9 – Determinação da Resistência Equivalente (Barton e Kjaernsli, 1981)

Para determinação da rugosidade equivalente deve-se conhecer a forma das partículas do enrocamento e sua porosidade. De posse destas informações, a rugosidade equivalente é obtida através do ábaco apresentado na Figura 3.10. Fazendo-se variar σn na equação (3.36) pode-se construir uma curva como mostrada na Figura 3.4 que fornece o valor de ∆φ.

Figura 3.10 – Determinação da Rugosidade Equivalente (Barton e Kjaernsli, 1981)

Os valores de S e φb podem ser determinados através do ensaio da caixa inclinada, que é executado em escala natural no campo. O procedimento deste ensaio é descrito com detalhe por Barton e Kjaernsli (1981). Com os valores obtidos no ensaio da caixa inclinada, pode-se retrocalcular R a partir da equação (3.36). Desta maneira, os erros na estimativa de S e φb são automaticamente compensados pelo valor retrocalculado de R.

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