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Capítulo II Turismo de Base Comunitária

2.2. Enquadramento do Turismo de Base Comunitária

2.2.2. Modelo de Desenvolvimento de Turismo de Base Comunitária

Um dos obstáculos ao turismo de base comunitária são as estruturas de poder tradicionais que promovem um poder desequilibrado (Giampiccoli & Kalis, 2012). Blackstock (2005) defende que é necessário desmantelar as barreiras impostas à participação comunitária, assim como é necessário permitir respostas coletivas aos problemas que surjam no seio local. Para tal, deve existir apoio por parte dos governos, do setor privado e de organizações não- governamentais, para que a comunidade local se torne num participante ativo (Kayat, 2014). Nessa sequência, salientando a importância da comunidade para a indústria do turismo, Okazaki (2008) apresenta um modelo de Turismo de Base Comunitária que tem como base o modelo Ladder of citizien participation de Arnstein (1969) e o Evolutionary model of

tourism partnerships de Selin & Chavez (1995).

No modelo apresentado pelo autor, encontram-se incluídos aspetos como a participação, redistribuição de poder, processo de colaboração e capital social. Este modelo tem como intuito apoiar a avaliação da participação de uma comunidade no processo de planeamento em turismo, e ajudar a compreender as ações necessárias a tomar para que o envolvimento comunitário no turismo aumente.

Antes de se analisar o modelo elaborado por Okazaki (2008), é necessário analisar os dois modelos originais e distintos nos quais este modelo final se baseia.

Ladder of citizien participation de Arnstein (1969)

O Ladder of citizien participation de Arnstein (1969) é um modelo que apresenta três categorias nas quais se encontram distribuídos oito degraus que são considerados os níveis de participação (Figura 2). Através deste modelo é possível identificar o nível de participação de uma comunidade na indústria do turismo, assim como é possível definir quais as ações a tomar para que a participação comunitária aumente.

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Figura 2 - Oito degraus da escada da participação cidadã

Fonte: Arnstein (1969)

As três categorias denominam-se por Nonparticipation (não-participação), Tokenism1 e

Citizen Power (poder dos cidadãos). A categoria na base da escada é a categoria Nonparticipation que é composta pelos primeiros dois degraus: Manipulação e Terapia. A

categoria acima – Tokenism – é composta por três degraus: Informação, Consultoria e Aplacação. Por fim, a categoria Citizen Power integra os últimos três degraus da escada que são Parceria, Poder Delegado e, no topo da escada, Controlo Cidadão. Os degraus que compõem esta escada que avalia o grau de participação de uma comunidade nos processos de planeamento e de tomada de decisão encontram-se descritos na Tabela 1 abaixo.

1 Denomina-se por tokenism uma ação simbólica que tem como intuito ocultar discriminação relativamente a um grupo minoritário, mantendo uma falsa aparência de integração desse grupo quando na realidade se pretende manter estruturas de poder com base na dominação (Direito Administrativo, n.d.).

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Tabela 1 - Descrição dos oito degraus da escada da participação de Arnstein (1969).

Oito degraus da escada da participação Descrição

1. Manipulação

Verifica-se uma participação ilusória e distorcida pelos detentores de poder. As pessoas encontram-se envolvidas em programas, porém estes podem não ter sido discutidos com as pessoas.

2. Terapia

Continua-se a verificar um envolvimento disfarçado onde os valores e atitudes dos cidadãos são ajustados de acordo com os interesses dos elementos da sociedade que têm maior poder.

3. Informação

Corresponde ao primeiro passo para o envolvimento dos cidadãos uma vez que estes são informados relativamente aos seus direitos, responsabilidades e opções. Canal de informação de uma direção apenas: de oficiais para cidadãos.

4. Consultoria

Verifica-se um encorajamento para que os cidadãos expressem opiniões que serão recolhidas através de questionários, reuniões e auscultação pública. Apenas combinado com outros modos de participação é que se verifica total envolvimento da comunidade.

5. Aplacação

Verifica-se uma integração de alguns cidadãos em placares de funções públicas, assim como a permissão dos cidadãos participarem no planeamento, porém as decisões finais continuam a ser tomadas pelos que detém poder.

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Oito degraus da escada da participação Descrição

6. Parceria

Verifica-se uma redistribuição do poder e responsabilidade pelos cidadãos através de negociação. A comunidade participa nos processos de planeamento e de tomada de decisão.

7. Poder Delegado

Verifica-se a aquisição de poder superior por parte dos cidadãos através de negociações. A comunidade apresenta poder dominante nos processos de tomada de decisão.

8. Controlo Cidadão

Verifica-se total (mas não absoluto) controlo e maior poder por parte dos cidadãos no que diz respeito à política e gestão.

Fonte: elaborado com base em Arnstein (1969)

Evolutionary model of tourism partnerships de Selin & Chavez (1995)

Selin & Chavez (1995) desenvolveu um modelo que procurava avaliar as parcerias e os processos que ocorrem quando se verifica este tipo de interação. Este modelo denomina-se por Evolutionary model of tourism partnerships e consiste em cinco processos como se verifica na

Figura 3: antecedentes, definição de problema, definição de direção, estruturação e resultados.

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Figura 3 - Modelo evolucionário das parcerias em turismo.

Fonte: Elaborado com base em Selin & Chavez (1995)

Diversos são os catalisadores de parcerias como as crises, a intervenção de intermediários, um mandato, o facto de existir uma visão comum, uma forte liderança que permite que os vários interesses se encontrem, e os incentivos existentes.

A evolução de natureza cíclica das parcerias é constituída pelas seguintes três fases: • Configuração do

problema:

os stakeholders apreciam a interdependência e percebem que a solução dos problemas necessita de esforço conjunto, porém tal não é suficiente para que uma parceria se inicie uma vez que os proveitos resultantes da parceria apresentam um peso bastante relevante para a concretização da mesma.

• Configuração da direção:

os stakeholders estabelecem os objetivos e regras que permitem examinar os problemas.

• Estruturação: as interações entre os stakeholders sãos geridas de forma sistemática e o grau de formalização diverge de parceria para parceria.

Antecedentes • Crise • Corretor • Mandato • Visão Comum • Redes existentes • Liderança • Incentivos Configuração do problema •Reconhecer a interdependência •Consenso sobre os stakeholders legítimos •Definição de problema comum •Benefícios percebidos para os stakeholders Configuração da direção •Estabelecer objetivos •Definir regras •Pesquisa de informação conjunta •Explorar opções •Organizar sub- grupos Estruturação •Formalizar relações •Atribuir funções •Elaborar tarefas •Projetar sistemas para monitorizar e controlar Resultados •Programas •Impactos •Benefícios derivados

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Uma vez que uma parceria é estabelecida, surgem resultados. Os resultados mais comuns são os programáticos que, segundo o estudo de Selin & Chavez (1995), podem ser centros de visita, brochuras e trilhos interpretativos, por exemplo. Resultados menos tangíveis podem ser a melhoria das relações nos grupos comunitários e o reconhecimento de um bom trabalho.

Posteriormente, a parceria sofre uma reavaliação cíclica que, caso uma parceria se encontre em prosperidade, pode resultar num alargamento do foco, porém, caso se verifique uma perda de interesse por parte dos parceiros, pode resultar na extinção da parceria.

Modelo de Turismo de Base Comunitária de Okazaki (2008)

O modelo de Okazaki (2008) é um gráfico de duas dimensões que, no eixo horizontal, inclui os processos de parceria de Selin & Chavez (1995) e a ponte do capital social e, no eixo vertical, inclui os níveis de participação da comunidade e de redistribuição do poder segundo o modelo de Arnstein (1969) e a ligação do capital social (Figura 4).

Figura 4 - Um modelo de turismo de base comunitária. Fonte: Okazaki, 2008

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No eixo horizontal, as cinco fases do processo de colaboração repetem-se progressivamente devido à natureza cíclica do processo. Contudo, pode-se saltar algumas dessas fases caso o processo envolva resolver um problema que já tenha surgido anteriormente (Okazaki, 2008; Selin & Chavez, 1995).

A curva de inclinação ascendente do gráfico é influenciada por cinco proposições que Okazaki (2008) enumera. A primeira diz que quando se verifica uma promoção da participação comunitária, a redistribuição do poder é facilitada. A segunda diz que se o processo de colaboração não continua, a participação comunitária e os progressos de redistribuição do poder também não têm futuro. A terceira diz que se não existir progressos ao nível da participação e da redistribuição do poder, não ser verificará promoção da colaboração. A quarta diz que as diferenças verificadas no poder irão debilitar colaborações. Por fim, a quinta diz que o capital social é gradualmente estabelecido no processo e este contribui para o aumento da sustentabilidade ao criar sinergias não só dentro da comunidade, mas também entre a comunidade e outros stakeholders no turismo.

A forma do gráfico encontra-se dependente não só de fatores internos, mas também de fatores externos. A fase de desenvolvimento do turismo, as conjunturas económica, política, sociocultural e ambiental, a disponibilidade de recursos e o acesso aos mesmos, o nível de apoio dos residentes no desenvolvimento do turismo, a existência de conflitos e a existência de facilitadores de diálogo na comunidade são fatores que influenciam o gráfico.

A curva determina a interseção entre os eixos vertical e horizontal e, uma vez que a curva indique que a comunidade atingiu o degrau Parceria que se encontra no eixo vertical, existem três caminhos que se verificarão nas comunidades e que são ilustrados pelo modelo na Figura 4. Quando se verifica uma concordância entre os stakeholders em prosseguir com a participação comunitária e com a redistribuição do poder pela comunidade, a curva do gráfico ascenderá (a). A curva ficará estagnada (b), caso se verifique que os stakeholders se encontram satisfeitos com o nível de participação atingido e com a redistribuição do poder realizada. Se outros stakeholders rejeitarem o poder atribuído à comunidade, ou se a comunidade se encontrar internamente dividida, a curva mover-se-á de forma descendente (c).

Assim, este modelo permite conhecer o nível de envolvimento de uma comunidade no turismo e determinar as iniciativas que poderão beneficiar o turismo de base comunitária.

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Okazaki (2008) ainda afirma que a aplicabilidade e a utilidade deste modelo em fases de desenvolvimento turístico mais avançadas encontram-se indeterminadas.