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Na interação com o mundo, as pessoas formam modelos de si e dos objetos que interagem. Estes modelos são utilizados como suporte para a interação com o sistema informatizado, tanto para aprendizado de seu uso como projeto, assim como elementos de representação comum, constituindo-se em importante ferramenta dentro do processo proposto.

II.3.1 Modelo mental e interação

As pessoas formam modelos mentais internos de si mesmas, dos objetos e daspessoas com as quais interagem. Estes modelos fornecem meios para a compreensão das interações, sendo afetados fortemente, tanto pela natureza das interações como pelas experiências e conhecimentos anteriores. A despeito de não serem completos e precisos, são modelos úteis para orientar grande parte do comportamento humano (NORMAN, 1986).

Assim, o conceito de modelo mental é utilizado para definir uma representação mental de um sistema físico ou software, com um conjunto de associações que conectam estímulos aos resultados. É uma estrutura elaborada e rica que reflete o entendimento do projetista/usuário sobre as funções e comportamento do sistema, permitindo decidir por antecipação as ações que devem ser executadas, sendo úteis para o aprendizado, solução de problemas e para racionalizações sobre o comportamento do sistema (CARROL; OLSON ,1988).

Segundo Norman (2002), para o projeto de um sistema deve-se, primeiro, fazer com que este siga uma conceituação consistente e coerente – o modelo de projeto – e depois prover meios de modo que o usuário desenvolva um modelo mental deste sistema – o modelo mental do usuário – consistente com o modelo de projeto.

A proposta de Norman (1986) e Norman (2002) prevê três modelos mentais: de projeto, do usuário e imagem do sistema (Figura II.1):

De projeto (ou conceitual): é a conceituação que o projetista tem em mente e é criado baseado nos requisitos dos usuários, suas capacidades, conhecimentos e experiências, sendo útil para projetar o sistema e ensinar a usá-lo. Esta conceituação deve considerar também a experiência dos usuários, suas experiências e as facilidades e limitações de seus mecanismos de processamento de informações (por exemplo, limites de memória de curta duração);

Do usuário: são modelos que as pessoas têm de si próprias, dos outros, do ambiente e das coisas com as quais interagem, sendo definido como o resultado das ações dos usuários, baseadas em sua experiência e decorrentes de outras ações em outros sistemas e tarefas. É o modelo que o usuário interioriza para explicar a operação do sistema e é formado sobretudo por meio da interpretação que é feita das ações percebidas da parte visível do dispositivo ou do software;

O físico ou imagem do sistema é a estrutura concreta que foi construída (inclusive a documentação, instruções, rótulos, etc.) e que nem sempre guarda relação com o modelo mental, sendo de importância crítica, pois o projetista deve assegurar que tudo pertinente ao produto seja consistente com a operação do modelo de projeto apropriado.

Imagem do sistema (modelo físico) Modelo do usuário Modelo de projeto Projetista Usuário Documentação Sistema Projeto e aprendizado Projeto

Figura II.1 - Modelos mentais

Deste modo, o modelo conceitual é um meio para criar o mental e deve permitir ao usuário interpretar o que está acontecendo por meio da interface e documentação do sistema.

De acordo com Norman (1986), a maior facilidade da aprendizagem e da utilização dependem de um correto mapeamento entre o modelo mental e o conceitual. O modelo mental não se forma com base no modelo do projeto, e o mesmo resulta do modo como o usuário interpreta a imagem de sistema.

Assim, a tarefa do projetista é construir uma imagem adequada do sistema, compreendendo que todos os elementos com que o usuário interage ajudam a formar esta imagem, como por exemplo: botões físicos, teclados, monitores de vídeo, documentação (manuais de instrução, helps, etc.), mensagens de erro, entrada e saída de dados, facilidades de ajuda e os elementos da interface homem- máquina.

Com base nestes conceitos, Carrol e Olson (1988) sugerem três abordagens de projeto:

Modelo conceitual preconcebido. É a determinação do modelo conceitual aos usuários pelos projetistas de modo a se iniciar o projeto com um modelo preconcebido inicial e por meio de prototipação interativa buscar o modelo do usuário, dentro de um nível adequado de usabilidade;

Comunicação de um modelo ao usuário. Corresponde à criação de cenários baseados nas principais tarefas dos usuários, de modo que, passo a passo, o retorno do usuário sirva como elemento para refinar o projeto e construir outras interações. A dificuldade reside em não interromper o fluxo do aprendizado e preservar o que já foi aprendido pelo usuário;

Foco na tarefa. O conhecimento deve ser representado formal e posteriormente estudado, de modo a se transformar esta descrição na interface. Esta abordagem não é suficiente para descrever a interface (imagem do sistema), pois uma mesma descrição de comando pode ter representações visuais diferentes.

Com relação ao aprendizado, o emprego de modelos conceituais durante o treinamento oferece resultados melhores do que se fossem utilizadas apenas instruções sobre procedimentos. Estes autores afirmam que aparentemente o

modelo organiza o conhecimento para evitar confusão e facilitar o entendimento do sistema, e diversos estudos mostram que é mais fácil incorporar do que induzir um modelo.

Na aplicação do conceito de modelo mental a um grupo de usuários, uma das principais metas corresponde em obter os objetivos que são comuns, conforme discutido em II.1.2.

Dentro do contexto de uma dinâmica coletiva que exige ações de cooperação, o grau e a natureza da interação de um agente e seus engajamentos dependem necessariamente de seus objetivos individuais, de suas interações, de suas crenças e dos modelos que têm de si mesmo, dos outros e de seu ambiente (ERCEAU et al., 1994).

Para estes autores, o comportamento de um grupo não é a soma dos comportamentos individuais dos agentes do grupo, e a obtenção de um estado mental coletivo se dá por meio de um engajamento partilhado entre os agentes, de modo que grupo possa agir como um agente único, descrito por um conjunto de crenças, objetivos e intenções.

Wittorski (1997), também, cita a importância de se criar as imagens operativas comuns (definidas como a representação mental que uma pessoa tem de sua tarefa), códigos e linguagens comuns em sistema de trabalho cooperativo.

II.3.2 A ergonomia das interfaces

Conforme visto no item II.3.1, a imagem mental do usuário é montada pela imagem do sistema, e o principal elemento desta imagem corresponde à interface com o usuário. É por meio da interface que a usabilidade é percebida pelo usuário, que a satisfação subjetiva será alcançada. Para os usuários, a interface, praticamente, constitui o sistema.

A interface é o resultado da interação homem-computador e é constituída de dois elementos (HIX e HARTSON, 1993):

O desenvolvimento da interação. Neste momento, é desenvolvida a comunicação com o usuário em termos das ações do operador e do funcionamento da interface, considerando-se os princípios da ergonomia,

orientações, limitações cognitivas dos usuários, projeto gráfico, estilos de interação e especificações de usabilidade. O objetivo é assegurar usabilidade, funcionalidade, desempenho e satisfação do usuário;

O desenvolvimento do software que provê esta interação. Neste momento, será implementada a interação por meio de algoritmos, linguagens de programação, estruturas de dados, e outras técnicas da tecnologia da informação. É importante ressaltar que a maior parte dos esforços de programação está no desenvolvimento desta interação, na qual este número pode chegar até a 80% desse esforço (SILVA, 1997);

No desenvolvimento da componente interação da interface, pode-se utilizar uma série de estilos, sendo definidos como uma coleção de objetos e técnicas que estão disponíveis aos projetistas da interface para o desenvolvimento da interação, incluindo, a aparência e o comportamento dos objetos da interação, vistos pelo usuário.

Scapin (1986) descreveu um conjunto de critérios para analisar/projetar a relação homem-sistema, consistentes com os estilos de interação (ver Apêndice B). Este modelo pode ser considerado como um guia aos projetistas para orientar a construção de formas mais naturais e intuitivas de interação homem-computador, por meio da melhor adequação às necessidades dos usuários, melhorias da eficácia de utilização e do aprendizado.

II.3.3 Considerações sobre modelo mental e interação e ergonomia das interfaces

Esta seção mostra que o modelo mental do usuário forma-se com base na imagem do sistema, de modo que, para se desenvolver um software que atenda às necessidades dos usuários, os projetistas devem construir uma imagem adequada do sistema para o usuário, baseado no modo como os projetistas entendem o sistema (modelo de projeto).

Nesta pesquisa, para se construir um software mais próximo possível do modelo mental do usuário foi utilizado o conceito de prototipação evolutiva (ver itens II.6.3 e II.8.3), no qual é desenvolvido um modelo inicial do sistema e por meio da

prototipação busca-se o modelo mental do usuário. Neste caso, ao contrário da aplicação de prototipação em desenvolvimento de software tradicional, o desenvolvimento do protótipo, seja não funcional ou funcional (item II.8.3), é realizado durante a aplicação das sessões de ACT, para focar, tanto os requisitos individuais como os requisitos do trabalho cooperativo (representação, item II.4.1). Na medida que as sessões de ACT vão evoluindo, o modelo mental também evolui por meio da evolução da imagem do sistema, cujos conceitos da ergonomia das interfaces e usabilidade são aplicados.

No ciclo 1, a imagem do sistema foi simulada pela prototipação em papel, cujas ações e respostas com os usuários (interações) eram apresentadas por meio de uma primeira aproximação das interfaces desenhadas em folhas de papel.

No ciclo 2, a imagem do sistema (implementação física do software) foi realizada (ver itens III.4.4 e IV.4.1), de modo a simular as respostas às ações (cliques em botões, escolha de opções, etc.) dos usuários por intermédio de interfaces gráficas pré-programadas, isto é, sem o código (software) que implementa a interação, considerando, tanto os requisitos individuais como parte dos requisitos do trabalho cooperativo.

Finalmente, no ciclo 3, utilizando como base os resultados das interações do ciclo 2, a imagem do sistema (software) é implementada totalmente, com as respostas dinâmicas às solicitações dos usuários via interface gráfica (neste caso, ocorre uma transação, isto é, a troca de dados dinâmica com o banco de dados do software), considerando, também, os requisitos associados à contextualização das atividades individuais pela compreensão das atividades realizadas por outras pessoas.