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Capítulo II –Modelos de Análise Organizacional e de Decisão da Escola Privada

1.2. Modelo político

Os modelos políticos constituíram-se na sequência de profundas alterações a que estiveram sujeitas as teorias organizacionais e administrativas, na perspetiva de entender as organizações dominadas pelas características da divergência e da incerteza e que consistiu na inversão dos pressupostos dominantes e inerentes aos modelos clássicos, tais como a racionalidade e a previsibilidade organizacional. Estes modelos recusaram a conceção homogénea, racional e consensual da organização e avançaram para uma visão da realidade organizacional onde a homogeneidade cede o Iugar à heterogeneidade e a harmonia é substituída pelo caos.

“As organizações, concebidas como miniaturas dos sistemas políticos globais, são percepcionadas, a semelhança destes, como realidades sociais complexas onde os actores, situados no centro das contendas e em função de interesses individuais ou grupais, estabelecem estratégias, mobilizam poderes e influências, desencadeiam situações de conflito, de coligação e de negociação tendo em conta a consecução dos seus objectivos” (Costa, 1996, p.78).

A aplicação do modelo político à escola nem sempre será evidente, pois enquanto organização é controlada centralmente pelo Estado, não deixando grande margem de autonomia

Políticas e Racionalidades na Escolha da Escola Privada 69 e de espaço de intervenção dos indivíduos que dela fazem parte, “devido aos efeitos de socialização para a conformidade, indispensável e funcional num sistema centralizado”(Lima, 1998, p.66), mas, claramente, carateriza a heterogeneidade dos diversos atores educativos na aplicação de interesses divergentes, numa linha de conflitualidade na intervenção educativa.

O modelo político assume a diversidade e a contradição entre os objetivos dos diferentes atores organizacionais que se degladiam por defenderem interesses e pontos de vista divergentes e, neste sentido, toda a organização é entendida como uma arena. O comportamento humano influi na organização que é composta por atores políticos, participantes e dotados de vontade própria de lutar pelos seus interesses.

A escola como organização é considerada um sistema político que apela à aplicação de características essenciais deste modelo na presença do conflito, na negociação de interesses e na busca de consensos, pois a grande diversidade de crenças e interesses dos seus membros origina a tentativa de cada um deles defender o seu ponto de vista, numa luta de poder e de influência políticas, mas como um fenómeno natural e não perturbador da vida organizacional. As escolas são espaços de “disputa ideológica”, lugares onde confluem influências interpessoais, compromissos e negociações, numa “micropolítica” própria e que se distancia do conceito mais clássico e característico das organizações (Ball, 1987).

Estêvão enfatiza esta dimensão quando afirma que “a actividade política é uma dimensão essencial das organizações, a par do reconhecimento de que a autoridade formal é apenas uma das fontes de poder e de que os conflitos são normais e se constituem em factores significantes da promoção de mudanças”(1998 a) p. 184).

Surge com maior frequência em situações em que o poder de decisão está relativamente distribuído (fraca centralização) por grupos de interesses. Nesta concepção, o critério primário não é a decisão “certa” mas uma decisão que seja aceitável para todos os elementos e para os grupos que representam, numa negociação e outros modos de resolução de conflitos, perseguindo os consensos possíveis. A tomada de decisão é encarada como um reflexo das relações internas de poder onde os diferentes actores procuram controlar as variáveis críticas para a redução da incerteza na organização.

Os modelos políticos partem de pressuposto que nas organizações a política e as decisões emergem por um processo de negociação e regateio, onde o conflito é perspetivado como um fenómeno natural e o poder decorre das coligações dominantes em vez de ser um

70 Políticas e Racionalidades na Escolha da Escola Privada exclusivo de líderes formais. O modelo político põe em realce o caráter endémico do conflito e considera mesmo que o líder pode retirar o seu prestígio da defesa de interesses particulares e não se concentrar na totalidade do sistema. Assim, este modelo realça as organizações educativas como arenas de luta e liberdade e quer a estrutura da organização como a definição de objetivos obedece a um processo conflitual, onde a marca dos processos decisórios é política na determinação da agenda organizacional e nas metas prioritárias definidas pelos grupos dominantes. Sá (1997) reforça esta ideia quando refere a estrutura das organizações como “campos de batalha”onde são travados duros combates e onde os derrotados de hoje podem ser os vencedores de amanhã, numa lógica de correlação de forças, num espaço de competição onde cada ator social usa, estrategicamente, a sua força e liberdade, mas preservando o controlo das “áreas de incerteza”. Para além desta luta e distância entre os objetivos e os interesses individuais ou coletivos, qualquer contexto organizacional exige sempre um mínimo de consenso (para além de todos os dicensos) que permita a integração, articulação e operacionalização de medidas que garantam um mínimo exigível de eficácia organizacional. Em toda a interação há um jogo de forças onde cada um dos atores sociais mobiliza a liberdade, poder e ideologias que irão exercer a sua força, na procura de uma estabilidade organizacional que a fará ter “vida própria” e prosseguir o seu percurso.

São várias as metáforas usadas por vários autores para as organizações, desde “sistemas políticos”, como “contextos sociais atravessados por relações de poder”, ou “arenas políticas”que albergam uma grande complexidade de indivíduos e grupos, tendo estes diferentes metas, valores, crenças, perceções da realidade que se (des)encontram na luta pelo poder e destroem o mito do one best way (Estêvão, 1998).

Neste modelo os processos de tomada de decisão desenham-se como processos de negociação complexa, sendo necessário aos atores mobilizar estratégias dos seus recursos de poder, com o objetivo de influenciarem as decisões e converterem, efetivamente, os seus valores e as suas metas.

A organização é encarada como um espaço de confrontação, onde cada indivíduo ou grupo tem os seus interesses e utiliza a sua margem de liberdade, estrategicamente, com vista à sua defesa. O palco das organizações é um espaço mobilizador das forças de poder, entre os interesses divergentes, num clima de disputa permanente.

“Mecanismos burocráticos e políticos podem, então ser desencadeados com o objectivo de procurar respostas que satisfaçam os interesses em conflito, tentando manter a ordem

Políticas e Racionalidades na Escolha da Escola Privada 71 dentro de limites admissíveis, ou seja, dentro de padrões que não comprometam a coesão estrutural nem a funcionalidade da organização” (Silva, 2010, p. 102).

Nesta linha, o poder é assumido como uma dimensão essencial da organização, sendo determinante nas estratégias de tomada de decisão dos atores organizacionais, reflexo do resultado de negociações e de lutas internas entre diversos interesses, senso assim, o locus, por excelência, de manifestação de poder.

A aplicação do modelo político às organizações educativas privadas, em particular, consiste na visão sistémica da realidade organizacional dos processos internos, desde os trâmites da comunicação, ao reconhecimento da autoridade, ainda na passagem da informação e na linha de interação entre os membros da organização. Na realidade pluridimensional, característica da escola, o conflito existente entre os diferentes grupos de atores é próprio e os processos de decisão, essencialmente políticos, onde se negoceiam margens de liderança, de influência de poder, na mediação de responsabilidades, resultam na reorganização de poder partilhado entre os diversos atores na organização educativa.