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Modernidade: considerações gerais

No documento Gestão escolar : desafios dos novos tempos (páginas 92-95)

MODERNIDADE E EDUCAÇÃO

3.1. Modernidade: considerações gerais

Modernidade tardia, alta modernidade, pós-modernidade são algumas expressões que autores como Giddens193, Harvey194 e Santos195 definem o estágio da modernidade na qual estamos inseridos. É uma sociedade em constante modificação, que se transforma ao ritmo de novas configurações do conhecimento, das relações, da ciência, caracterizada pela revolução de paradigmas e valores, tecnologia, desencaixes, contradição, pressa, fugacidade. É uma época que produz paradoxos e dialeticidade, pois há abundante produção de riqueza, tecnologia, conhecimento e informação mas, paralelamente, temos uma crescente produção de pobreza, violência e insegurança.

A constituição da modernidade se dá na Europa no século XVII e sua consolidação em nível mundial adentra os séculos subseqüentes, rompendo com o modos tradicionais de vida vigentes até então, o que leva Giddens196 a identificar algumas características existentes na modernidade que a distingue dos períodos precedentes. A primeira está ligada ao ritmo das mudanças que, na condição moderna, ocorrem com uma rapidez impressionante, sendo que o motor que move esse período é a velocidade e comunicação que geram as transformações globais. A segunda característica é o alcance dessas mudanças, ou seja, à medida “que diferentes áreas do globo são postas em interconexão, ondas de transformação social penetram (...) toda a superfície da terra”197 e, a terceira, está ligada à natureza intrínseca das instituições modernas, com a gênese de formas sociais não existentes em períodos que antecedem a modernidade, tais como, uma entidade sócio-política tendo como expressão o estado-nação; a dependência da produção de fontes de energia inanimadas, firmada pelo industrialismo: e a transformação dos produtos e do trabalho assalariado em mercadoria, característica inata do capitalismo. A expansão

193

GIDDENS, A. As conseqüências da modernidade, 1991.

194 HARVEY, D. A condição pós-moderna, 2000. 195 SANTOS, B. S. Pela mão de Alice, 2005

196 GIDDENS, A. As conseqüências da modernidade,1991. 197 Id., Ibid., p. 16.

industrial, em fins do século XVIII, fortaleceu o desenvolvimento do capitalismo, e na medida em que avançou na Europa estendeu-se para o mundo inteiro. Decorrente deste processo de expansão o espaço urbano entra em um ritmo crescente e torna pleno de tensões e contradições, apontadas por Benjamim nas mudanças em termos de espaços, tempos e relações sociais geradas pelo processo de modernização nas cidades e traduzidas no fascínio humano em relação a essas novas estruturas urbanas, evidentes nas passagens parisienses do final do século XIX que, ao misturar vidro e ferro em sua arquitetura, expunham as fantasmagorias modernas.

Outro ponto a se destacar na compreensão da modernidade está posto no que Habermas198 denomina projeto de modernidade. O autor afirma que o conceito de moderno já é uma definição do final do século V, quando se empregou o termo modernus para a distinção do presente, oficialmente cristão, do passado, romano pagão. No entanto, o que Habermas denomina projeto de modernidade, se define a partir do século XVIII, vinculado ao discurso dos pensadores iluministas de emancipação pelo saber, sustentado pela confiança na capacidade da razão. O esforço desses pensadores em torno do desenvolvimento da ciência objetiva, da moralidade e de leis universais e da arte autônoma nos termos da própria lógica interna destas, é fruto da crença de que o domínio científico, as formas racionais de pensamento e de organização social, ineqüivocadamente, levariam o homem a dominar as intempéries e vontades da natureza, a se libertar do pensamento ligado a religião, mitos, superstição e das arbitrariedades do poder. “Somente por meio de tal projeto poderiam as qualidades universais, eternas e imutáveis de toda a humanidade ser reveladas”199. No projeto de modernidade a certeza fundamentada na lei divina foi substituída por outra,

“a certeza dos nossos sentidos, da observação empírica”. Acrescentada a essa certeza está a ascensão do poder europeu diante do mundo, fato que fortaleceu a suposição de que a nova perspectiva “era fundamentada sobre uma base sólida que tanto proporcionava segurança como oferecia emancipação do dogma da tradição”.200

Progresso, desmistificação e dessacralização do conhecimento e uma organização social racional sustentavam um projeto que levaria à emancipação e ao enriquecimento da vida humana. Em torno deste projeto multiplicaram-se as doutrinas de igualdade, liberdade, fé na inteligência

198 HABERMAS apud HARVEY, D. A condição pós-moderna, 2000, p. 23. 199 Id., Ibid., p. 23.

humana e na razão universal que, paralelamente, arrastavam consigo mudança, transitoriedade e fragmentação, como condições necessárias para o projeto modernizador ser realizado.

Na medida em que as expectativas criadas não puderam se realizar plenamente surgiram a frustração e o niilismo. Giddens evidenciou essa crítica ao afirmar:

(...) as sementes de niilismo estavam no pensamento iluminista desde o início. Se a esfera da razão está inteiramente desagrilhoada, nenhum acontecimento pode se basear em um fundamento inquestionado, por que mesmo as noções mais firmemente apoiadas só podem ser vistas como válidas “em princípio” ou até “ulterior consideração”. De outro modo elas reincidiram no dogma e se separariam da própria esfera da razão que determina qual validez está em primeiro lugar.201

O pensamento iluminista e o projeto de modernidade ganhou uma pleiade de críticos202 tais como Horkheimer e Adorno que ao denunciarem toda barbárie do século XX deixavam antever o arrefecimento das expectativas e promessas do projeto moderno e lançavam a suspeita de que “o projeto do Iluminismo estava fadado a voltar-se contra si mesmo e transformar a busca da emancipação humana num sistema de opressão universal em nome da libertação humana.”203 Edmund Burke e Malthus demonstravam seu desconforto e dúvidas diante do otimismo do iluminismo.

Já no século XX o posicionamento de dois críticos, com argumentação diferenciada, ganha força. Max Weber definiu a modernidade como processo racionalizador da sociedade capitalista e produtor de fortes alterações culturais, que provocaram o “desencantamento com o mundo” e a desunificação da ciência, moral e arte, que autonomizaram-se cada vez mais. Daí resulta uma configuração social marcada pelo progresso técnico-científico e pela racionalização cultural, que abrange a estrutura econômica, do direito, da administração e da arte, onde os sentidos se encontram perdidos e o homem aprisionado em “uma jaula de ferro da racionalidade burocrática da qual não há como escapar”. Nietzsche mergulhou “no outro lado da formulação de Baudelaire para mostrar que o moderno não era senão uma energia vital, a vontade de viver e de poder, nadando num mar da desordem, anarquia, destruição, alienação individual e desespero”204. Para ele a essência imutável e eterna do ser humano encontrava representação na figura mítica de Dionísio: ser a um tempo só “destrutivamente criativo” e “criativamente destrutivo”.

201 Id., Ibid., p. 54.

202 HARVEY, D. A condição pós-moderna, 2000, p. 23-25. 203 Id., Ibid., p. 23.

Cabe aqui a reflexão de que o projeto de modernidade se sustenta na destruição de boa parte do que viera antes, dessa forma:

Ora, ao se tornar sinônimo de “novo”, o conceito de “moderno” assume uma dimensão essencial para nossa compreensão de “modernidade”, mas, ao mesmo tempo, uma dinâmica interna que ameaça implodir sua relação com o tempo. Com efeito, o novo está, por definição destinado a se transformar no seu contrário, no não-novo, no obsoleto e moderno, conseqüentemente, designa um espaço de atualidade cada vez mais restrito, em outras palavra, o moderno fica rapidamente antigo, a linha de demarcação entre os dois conceito,outrora tão clara, está cada vez mais fluida. Ao se definir pela novidade, a modernidade adquire uma característica que, ao mesmo tempo, a constitui e a destrói. Talvez assistamos hoje, com a famosa temática da “pós-modernidade”, ao resultado lógico desse processo de autodevoração, dessa interpretação fundante e dissolvente do antigo pelo moderno, do moderno pelo antigo.205

São estas condições que emprestam à modernidade seu caráter de fugicidade e efemeridade e que levam Harvey a concluir que na modernidade fica difícil a preservação de todo sentido de continuidade histórica, pois esse período “não apenas envolve uma implacável ruptura com todas e quaisquer condições históricas precedentes, como é caracterizada por um interminável processo de rupturas e fragmentações internas inerentes”206.

Acreditamos que é no embate modernidade e o estágio da modernidade em que estamos mergulhados, que estão as contribuições para compor nosso pensamento no presente trabalho, no sentido nos situarmos enquanto sujeitos desse processo, na abertura para a construção de outras subjetividades e de outras possibilidades a partir das contradições, dialeticidades e ambigüidades e, especialmente, das frustrações surgidas pelo que não se cumpriu do projeto de modernidade.

3.2. Benjamim e Bermam: a gênese da modernidade na metrópole e o estilhaçamento do

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