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Molhabilidade e Transferência de calor na solidificação

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3. Molhabilidade e Transferência de calor na solidificação

A seleção de uma liga de soldagem para a montagem de componentes microeletrônicos em uma placa de circuito impresso é baseada na comparação das propriedades desta liga com as tradicionais do sistema Sn-Pb (ZHANG, 2009). Abtew e Selvaduray (ABTEW, 2000) citam que as principais propriedades das ligas Sn-Pb são: temperatura liquidus ou eutética, molhabilidade, propriedades térmicas e elétricas, comportamento a corrosão e custo. Dentre todas essas características, o grau de molhabilidade entre a liga e o substrato, caracterizado através de medidas de ângulo de contato (θ), é um dos mais investigados e reportados na literatura (ARENAS, 2004; RIZVI, 2007; ZHANG, 2010). Em relação à aplicação dos materiais de interface térmica (TIM), isto não é diferente, posto que uma das principais preocupações estão vinculadas à capacidade do material molhar e preencher a topografia das superfícies de contato entre a CPU e o dissipador de calor.

Durante a molhabilidade sobre a superfície do substrato, quando a liga reage com o substrato há a formação de uma ou mais camadas de IMCs (Intermetallic Compound ou composto intermetálico). É desejável que a camada formada pelos IMCs seja de pequena espessura e ao mesmo tempo com boa ligação metalúrgica. Uma região com excesso de IMC, além de ter um efeito deletério sobre a resistência da junta de solda, pode funcionar como uma resistência à passagem de fluxo de calor. Neste sentido, o conhecimento sobre as interações entre a liga TIM e o substrato e seus efeitos sobre a interface torna-se essencial para obtenção de uma junta de solda de alta qualidade.

Estas reações na interface dependem fundamentalmente da movimentação de átomos por difusão, que por sua vez depende do tempo de solidificação (LEE, 2015). Outro fenômeno comum na interação liga/substrato é a dissolução do substrato quando em contato com a liga fundida. Elementos de liga do substrato podem mudar a composição química da liga, formando fases não previstas.

Nota-se que o substrato desempenha um papel fundamental na qualidade das juntas térmicas em componentes eletrônicos. Os principais substratos utilizados são ouro (Au), platina (Pt), paládio (Pd), níquel (Ni), Fe-42% Ni (INVAR) e especialmente o cobre (Cu) (KIM, 2003).

Em resumo, para haver uma boa ligação metalúrgica, o molhamento deve ocorrer entre a liga e o substrato. Por definição, molhamento é uma medida da capacidade de um material, geralmente líquido, se espalhar sobre um substrato sólido (ABTEW, 2000). No decorrer desta experiência de molhabilidade, os átomos da gota que se localizam na interface encontram-se

coesos aos átomos do núcleo da gota, porém não aos átomos logo à frente da superfície. Apoiados nisto, os átomos da interface apresentam um excesso de energia que dão origem a energias de superfície que definem o ângulo de contato. Sua quantificação é medida pelo ângulo de contato formado entre a linha da base da gota (γSA- γSL) e a tangente,

correspondente ao ponto (γLA), mostrado na Figura 2.8, de forma que um ângulo de contato

alto está associado a uma baixa molhabilidade e um ângulo de contato baixo está associado a uma alta molhabilidade.

Figura 2.8 Representação de um metal líquido sobre uma superfície sólida destacando as

energias de superfície e o ângulo de contato (adaptado de Evans, 2007).

Poucos estudos têm sido desenvolvidos nos últimos anos considerando reações de interface e ângulos de contato entre ligas do sistema Bi-Sb e substratos metálicos. Uma busca na literatura especializada permite verificar que são inexistentes estudos sobre o efeito da concentração de Sb superiores a 5% em ligas do sistema Bi-Sb. Adicionalmente, o estudo da influência de diferentes substratos sobre a eficiência de transferência de calor na interface liga/substrato em ligas do sistema Bi-Sb são tarefas ainda a serem realizadas.

Nahavandi e coautores (2014A) analisaram o ângulo de contato de ligas Bi-(1,5; 2,5 e 5)%Sb contra substrato de Cu, conforme representação esquemática da Figura 2.9. Estas comparações, na Figura 2.9 (b), revelam que maiores ângulos de contato estão associados a maiores concentrações de Sb e quantidades de refusões de uma mesma gota. O aumento do ângulo de contato está associado à formação do intermetálico Cu3Sb, Figura 2.10(a),

resultante de ligação metalúrgica, visto que na liga com melhor molhabilidade (Bi-1,5%Sb), mostrada na Figura 2.10(b), ocorre apenas ligação mecânica.

Figura 2.9 (a) Método utilizado para quantificar o ângulo de contato; (b) comparação do

ângulo de contato após diferentes números de refusões (adaptado de NAHAVANDI, 2014A).

Figura 2.10 Liga Bi-5%Sb em contato com substrato de cobre: ligação metalúrgica (a) e

ligação mecânica (b) (adaptado de NAHAVANDI, 2014).

Já Yan e coautores (2009) investigaram o efeito da adição de 0,5%, 1,5%, 3% e 5% Cu sobre a molhabilidade da liga Bi-5%Sb solidificada sobre substrato de Cu. Devido à formação dos compostos intermetálicos Cu2Sb e Cu11Sb2, é observada uma melhora na molhabilidade

para as ligas com teores de até 1,5% Cu. Segundo os autores, a piora na molhabilidade para teores superiores a 1,5% Cu é atribuída ao crescimento excessivo dos compostos intermetálicos (Cu2Sb/ Cu11Sb2) formados nas interfaces liga/substrato.

Até aqui a molhabilidade é tratada como uma propriedade vinculada à transferência de massa. Entretanto, a mesma também é uma propriedade relacionada à transferência de calor. No que lhe diz respeito, o fluxo de calor é transferido através de mecanismos que contribuem diretamente no tipo de microestrutura formada na interface liga/substrato (CHEUNG, 2009).

Os mecanismos de transferência de calor que ocorrem na interface liga/substrato são quantificados pelo coeficiente de transferência de calor, h, através de uma função do tipo potência que correlaciona hcom o tempo (h=at-m). Esta tem ganhado força nos últimos anos como um método alternativo para avaliar a molhabilidade de uma liga sobre um substrato (SANTOS, 2016).

Silva (et al., 2015) têm estudado o efeito de diferentes composições de (0 ~ 0,1%) Ni sobre a molhabilidade e o coeficiente de transferência de calor da liga Sn-0,7%Cu solidificada sobre substrato de Cu. Segundo os autores, a liga com adição de 0,05%Ni está associada a um menor ângulo de contato e maior coeficiente de transferência de calor quando comparada às ligas binárias com ou sem adição de 0,1% Ni. Baseado em outros estudos, os autores afirmam que a inexistência de uma tendência crescente ou decrescente de molhabilidade com adição de Ni está associada a um ponto de máxima fluidez para a liga com adição de 0,05% Ni.

Um estudo semelhante ao anterior foi realizado por Santos et al. (et al., 2016) para ligas de soldagem de alta temperatura Zn-Sn (10, 20, 30 e 40% Sn) em um dispositivo de solidificação direcional ascendente, porém utilizando um substrato de aço AISI 1020. Os dados térmicos experimentais coletados durante a solidificação são usados para determinar o coeficiente de transferência de calor, permitindo que uma tendência de molhabilidade seja estabelecida. Para validar o comportamento de molhabilidade indicado pelos valores de h, ângulos de contato (θ) da liga/substrato são medidos sobre substrato de aço AISI 1020 em um goniômetro. Santos (et al., 2016) informam que os pares h e θ indicam melhoras na molhabilidade com a diminuição da concentração de Sn na liga. Segundo os autores, esta tendência é controlada pela fluidez das ligas.

Recentemente experimentos de solidificação direcional acompanhados de modelagem matemática, ensaios de molhabilidade e avaliações de reações de interface foram realizados por Soares et al. (et al., 2020) para a liga Sn-0,7%Cu sobre três diferentes tipos de substratos. Os autores informam que a combinação destas análises permite o entendimento dos mecanismos que afetam a eficiência de transferência de calor entre esta liga e os substratos de

Cu, Ni e aço AISI 1020. Para cada condição são determinados: os ângulos de molhabilidade; a integridade e natureza das reações de interface; e o coeficiente de transferência de calor (h), conforme esquema da Figura 2.11. Embora o cobre tenha uma condutividade maior que o níquel, os autores mostram que a ocorrência de vazios, conforme mostrados na Figura 2.12, na interface de contato liga/substrato (Cu) pode diminuir o coeficiente de transferência de calor, h, e consequentemente a molhabilidade. Por outro lado, uma camada de IMC (Intermetallic Compound ou composto intermetálico) estável e ausente de vazios é observada para o par liga/substrato (Ni). Isto ocorre devido à supressão de uma contração térmica indesejável do intermetálico Cu6Sn5 na presença de Ni. Consequentemente, os autores

observam que um baixo valor de ângulo de contato associado ao alto coeficiente de transferência de calor, h, garante uma melhor molhabilidade na seguinte sequência crescente, a saber: aço, cobre e níquel.

Figura 2.11 Representação esquemática da metodologia empregada para avaliar o

comportamento da liga Sn-0,7%Cu sobre diferentes tipos de substratos (adapatado de SOARES, 2020).

Figura 2.12 Perfis de h em companhia das interações de interface da liga Sn-0,7% Cu com

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