• Nenhum resultado encontrado

A partir do momento em que se aceita a natureza instrumental do direito processual, torna-se imprescindível rever seus institutos fundamentais,

No documento planejamento estrategico. arquivo final (páginas 33-38)

a fim de adequá-los a essa nova visão. Isso porque toda a construção

científica desse ramo do Direito se deu na fase denominada autonomista,

em que, devido à necessidade de afirmação da independência do Direito

Processual, valorizou-se demasiadamente a técnica. Passou-se a conceber

o instrumento pelo instrumento, sem a necessária preocupação com os

seus objetivos, cuja identificação é feita à luz de elementos externos

ao processo [...] A técnica adotada pelo legislador, visando o adequado

desenvolvimento do método por ele criado para a solução dos litígios

(processo équo e justo), é simples meio. Em nenhum instante pode o

processualista esquecer-se de que as questões internas do processo

devem ser solucionadas de modo a favorecer os resultados pretendidos,

que são exteriores a ele (BEDAQUE, J. R. dos Santos. Direito e processo: a

influência do Direito Material sobre o processo. São Paulo: Malheiros, 5ª.

Edição, 2009, p. 15).

2 Em outra importante decisão, o supremo Tribunal Federal, pela relatoria da min. cármen Lúcia, admitiu que

decisão de Juízo Trabalhista que violara o decidido da corte suprema na Medida cautelar na Ação declaratória de constitucionalidade n. 11 (que trata do prazo para oposição de embargos na Fazenda Pública) deveria, nada obstante, ser mantida, tendo em vista razões que repousam no direito fundamental à uma jurisdição célere, plena e eficaz, invocando-se expressamente, no voto condutor, o contido no art. 5º, LXXViii, da constituição. Afora isso, o precedente também exorta o influxo do preceito da dignidade da pessoa humana, para concluir pela procedência da reclamação, de modo a se determinar o prosseguimento da marcha processual, outrora suspensa pelo próprio sTF em função da controvérsia estabelecida na Adc n. 11, ainda não julgada. o acórdão do Tribunal Pleno está assim vazado: “REcLAMAÇÃo. EMbARGos À EXEcuÇÃo TRAbALhisTA. iNTEMPEsTiVidAdE. dEscuMPRiMENTo dA AÇÃo dEcLARATÓRiA dE coNsTiTucioNALidAdE N. 11-Mc/ dF. EXEQuENTE EM idAdE AVANÇAdA. PRiNcÍPios dA JuRisdiÇÃo E dA diGNidAdE dA PEssoA huMANA. iMPossibiLidAdE dE susPENsÃo dA EXEcuÇÃo TRAbALhisTA ATÉ o JuLGAMENTo dEFiNiTiVo dA AÇÃo PARAdiGMA. PRocEssAMENTo iMEdiATo dos EMbARGos. REcLAMAÇÃo JuLGAdA PRocEdENTE. 1. A decisão que deixa de receber embargos à execução trabalhista opostos no prazo legal, afastando a aplicação do art. 1º-b da Lei n. 9.494/1997, descumpre a decisão proferida na Ação declaratória de constitucionalidade n. 11-Mc/dF. 2. A prestação jurisdicional é uma das formas de se concretizar o princípio da dignidade humana, o que torna imprescindível seja ela realizada de forma célere, plena e eficaz. Não é razoável que, diante das peculiaridades do caso e da idade avançada da exeqüente, se determine suspensão da execução trabalhista e se imponha à parte que aguarde o julgamento definitivo da ação apontada como paradigma nesta Reclamação. 3. Reclamação julgada procedente para se determinar o imediato processamento dos embargos à execução opostos pela união” (Rcl 5758, Rel. Min. cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 13/05/2009).

Assim, seja pelo influxo dos direitos fundamentais e dos valores no plano processu- al, seja pela própria característica instrumental de suas regras, creio que há muito que se (re)pensar sobre a rigidez procedimental, pois não é possível que a ordem jurídica, a despeito de observar, de forma absoluta, nessa rigidez homenagem ao devido processo legal, ofereça ao jurisdicionado, não raras vezes, a segurança à in- justiça, decorrente da manifesta ineficiência instrumental do processo.

Por certo que essa necessária releitura da noção de rigidez como corolário de segu- rança jurídica (e, por consequência, de devido processo legal) não implica desprezar a importância de uma adequada modernização das regras processuais trabalhistas. O quadro, contudo, não aponta para essa realidade no curto prazo. Não temos até em tramitação no Congresso Nacional projetos de reforma que conduzam o Processo Trabalhista à superação de pontuais bloqueios normativos que merecem ser superados, como, por exemplo: a limitação ao avanço na execução provisória; a eliminação da superfetação de atos processuais, como a citação por mandado na fase de cumprimento da sentença; a eliminação de atos ineficazes já eliminados no processo comum, como a indicação de bens pelo devedor; a introdução de meios expropriatórios mais eficazes; dentre tantos outros.

E esse bloqueio normativo não será levantado facilmente. É que o processo político que envolve propostas alusivas ao mundo do trabalho expõe, frente a frente, atores sociais e políticos muito bem definidos (representantes do capital, do trabalho e do Estado, nessa última categoria também incluídos os atores judiciários, como juízes, advogados, membros do Ministério Público), com atuações bem articuladas no Par- lamento. Não raro, essas posições refletem conflitos que deságuam na falta de con- sensos, sem os quais as possibilidades de aprovação são sensivelmente reduzidas. Nem mesmo a criação da Secretaria de Reforma do Poder Judiciário, junto ao Ministério da Justiça, a quem compete uma importante articulação junto a esses atores com o fito de facilitar os consensos, tem sido garantia de avanço nessa área, pois a concessão de ferramentas mais eficazes para a tutela jurisdicional trabalhista recebe, em contrafluxo, a resistência dos discursos desenvolvimentistas e da livre iniciativa, normalmente usados como escudos para a intangibilidade patrimonial dos negócios, ainda que em desapreço a direitos sociais fundamentais da classe trabalhadora.

Quanto ao privilégio das formas, tenho que a própria crítica aqui já assinalada ao baixo teor instrumental do método processual indica a necessidade de se avançar no terreno das formalidades processuais que escapam ao razoável.

Nesse particular, já temos avanços. A autenticação de documentos oferecidos em cópia nos autos já cedeu lugar a uma mera declaração do advogado, inclusive no processo trabalhista (cf. Lei n. 11.925/2009). Mas ainda sobrevivem muitos entraves, especialmente no campo recursal, que dificultam a obtenção de uma tutela mate- rialmente justa.

Também não poderia falar de morosidade sem citar os inúmeros conflitos de com- petência pelos quais passam diversos processos em tramitação no Judiciário.

Um bom exemplo desse problema foi trazido pelo Jornal do Brasil, ainda em 2007, e tratava, especificamente, de como o conflito de competência entre a Justiça do Trabalho e a Justiça Comum em questões sobre o trabalho escravo atrasava os jul- gamentos dos casos envolvendo as denúncias dessa prática.

De acordo com a reportagem, ocasião em que não havia sequer um proprietário de terra condenado e preso pela prática, o grande problema da impunidade era do próprio “Poder Judiciário, que levou 11 anos para decidir qual das suas esferas tem competência para julgar os acusados de recorrerem ao trabalho escravo”3. O jornal,

acertadamente, referiu-se que apenas em novembro daquele ano o Supremo Tribu- nal Federal (STF) decidiria que a competência, em casos penais, era da Justiça Federal. Outro exemplo também foi noticiado pela grande imprensa. O jornal O Estado de S. Paulo, em outubro de 2009, trouxe levantamento do Conselho Nacional de Jus- tiça (CNJ), durante o esforço coletivo pela efetivação do Planejamento Estratégico para o Poder Judiciário. Disse o jornal: “o pente-fino nos arquivos ajudou numa descoberta impressionante: 5 milhões de processos estavam julgados em definitivo, mas engordavam a estatística da morosidade do Judiciário, pois ainda não haviam recebido baixa. Além desses, havia 5,2 milhões de ações anteriores à espera de jul- gamento há mais de quatro anos”4.

Exemplos como esses mostram que a morosidade, seja ela ativa ou sistêmica, denota situações que, em conflitos de relações individuais ou coletivas, consistem em entra- ves para a efetividade da prestação jurisdicional, o que acaba por ferir o princípio constitucional da duração razoável do processo, tão bem definido pela primeira etapa da Reforma do Judiciário.

2. Rumo à efetividade

Em que pesem os diversos bloqueios e entraves à efetivação da prestação jurisdi- cional, é inegável o reconhecimento da comunidade jurídica de que a jurisdição trabalhista tem revelado grande efetividade.

Exemplo disso são os números divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça em junho de 2009. De acordo com o estudo “Justiça em Números”, as menores taxas de conges- tionamento foram verificadas na Justiça do Trabalho5. A taxa medida pelo CNJ levou

em conta o total de casos novos que ingressaram na justiça, os julgados e os pendentes. Na Justiça do Trabalho, a efetividade pode ser observada de forma clara no primeiro grau, onde a entrega da tutela jurisdicional vem sendo conduzida de forma muito positiva, em especial pela existência de diversos mecanismos eletrônicos à disposi- ção do juiz do Trabalho.

Entre esses mecanismos está o sistema eletrônico de bloqueio de ativos do Banco Central (BacenJud) e, mais recentemente, o Renajud, sistema no qual os magistra- dos acessam as informações do Registro Nacional de Veículos (Renavam), podendo registrar a penhora de automóveis para o pagamento de dívidas trabalhistas, bem como impedir a sua transferência, circulação e licenciamento.

Mas, para contribuir para que essa efetividade perpetue cada vez mais, gostaria de lançar algumas reflexões que julgo poderem contribuir para diminuir com os

3 cf. Jornal do brasil, Rio de janeiro, 01/05/2007. 4 cf. Jornal O Estado de São Paulo, são Paulo, 19/10/2009.

5 cf. disponível em: www.cnj.jus.br. Acesso em: 13/11/2009. Vale ressaltar que a iniciativa do cNJ com o “Justiça

em Números” é louvável. A partir de estatísticas confiáveis, contribui-se sobremaneira para se definir políticas de governo do Judiciário.

bloqueios e entraves à entrega jurisdicional. Em outras palavras, são reflexões de enfrentamento do que denomino de “pontos de estrangulamento” da jurisdição trabalhista.

Na seara da morosidade ativa, acredito ser necessário, em um primeiro momento, um maior rigor no exame dos atos processuais pelas partes, de modo a oferecer, por meio do escopo pedagógico da jurisdição, limites de eticidade. Isso talvez reduza a prática, por exemplo, das impugnações meramente procrastinatórias, contribuindo para um processo mais célere e instrumental.

Os arts. 14, 17 e 600 do Código de Processo Civil estampam a possibilidade de apli- cação do chamado contempt of court nas hipóteses de lesão à ordem jurídico-pro- cessual por ato da parte que apresenta deficiência no espírito de colaboração com o Judiciário e com a tramitação razoável do processo. Aplicar tal instituto, porém, é o grande desafio que demanda toda a sociedade.

Registro também a necessidade de um maior rigor quando ao recebimento de em- bargos e agravo de petição na fase de execução forçada da sentença. Exemplo dessa necessidade também pode ser notada no “Justiça em Números”, que traz a Justiça do Trabalho como a que possui maior taxa de recorribilidade, em torno de 50%. A coletivização das tutelas, e a consequente sinergia entre o Ministério Público e o Judiciário, também contribuiria sobremaneira para a efetividade da prestação juris- dicional, como bem inserto no art. 7º da Lei da Ação Civil Pública, que estabelece: “se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis”.

Ainda quanto à morosidade ativa, clamo por uma maior observância, por parte do juiz, das condições socioeconômicas nas propostas de conciliação. Essa conduta de confronto dos quadros tem por objetivo final evitar a tramitação, infrutífera, de um processo pelas vias ordinárias.

Observo ainda a necessidade de um equilíbrio do juiz quanto à divisão de sua carga de trabalho – novos processos e decisões em fase de execução. A realidade em que vivemos é aquela em que a efetividade pode ser bem observada na fase de conhe- cimento, mas não da mesma forma na fase de execução.

Essa prática, comum na prestação jurisdicional trabalhista, e sobre a qual já me re- feri acima, que costumo denominar de “mito da cognição”6.

Ainda nessa seara da efetividade, é necessário que pensemos no desenvolvimento de instrumentos mais modernos e ágeis, que emprestem uma maior efetividade ao cumprimento das sentenças.

Dou como exemplos a desnecessidade do mandado de citação para o cumprimento das decisões judiciais, e o manejo de instrumentos expropriatórios diversos da hasta pública para fazer a satisfação do crédito obrigacional devido à parte vitoriosa na demanda. Ambos os instrumentos (a citação e a expropriação) são tratados de forma muito mais adequada, razoável e compatível com o atual espírito constitucional (como

6 cf., sobre esse tema, chAVEs, Luciano Athayde. “o processo de execução e o desafio da efetividade processual”.

estabelece o preceito da duração razoável do processo, art. 5º, LVXXVIII, CF), em estatutos como a Lei 9.099/95 e o reformado Código de Processo Civil, em especial após o advento das Leis n. 11.232/05 e 11.382/2006.

Nos relatos dos Juízos trabalhistas que já adotam essas técnicas, mediante o eficaz método do diálogo das fontes, percebe-se uma animadora renovação no princípio da colaboração das partes com a solução rápida dos litígios, inclusive – e principal- mente – no incremento dos casos de cumprimento voluntário das decisões, aspecto que até aqui se apresentava – à luz do Direito Comparado – inexplicavelmente bai- xo na experiência jurisdicional brasileira.

Quanto aos entraves da denominada morosidade sistêmica, primeiramente preci- samos aperfeiçoar, pelas vias legislativas, o Processo do Trabalho. Não que essa seja a única forma de progresso do Direito Processual trabalhista. Em Karl Larenz po- demos nos apoiar para dizer dos progressos em curso – e muitos deles silenciosos -, com base na ideia de desenvolvimento aberto do Direito, no caso o processual labo- ral, seja ele imanente à lei ou superador dessa, nos limites e nas hipóteses admitidas pela metodologia do Direito.

Também é necessário, nesse movimento, buscar a preservação do protagonismo da jurisdição social (em função da natureza privilegiada da tutela), aliado a uma reno- vação do processo trabalhista, tornando-o mais célere e efetivo.

Aqui, louvo a iniciativa da Secretária da Reforma do Judiciário, no âmbito do Minis- tério da Justiça, pela criação de uma comissão que reunindo diversos atores sociais, jurídicos e políticos, entre eles representantes da Anamatra, “visando o aprimora- mento e modernização da legislação material e processual do trabalho”7.

A referida Comissão tem se reunido periodicamente com o objetivo comum de apre- sentar ao Poder Executivo anteprojetos de lei que preencham lacunas na legislação trabalhista e que proponham melhorias no subsistema procedimental do trabalho. Destaco, entre esses anteprojetos em estudo, o que dispõe sobre a reforma da exe- cução trabalhista, a assistência jurídica gratuita, o aprimoramento das regras de in- terposição do agravo de instrumento e a possibilidade de tramitação mais célere dos casos envolvendo matéria de direito ou que tenha o Poder Público no pólo passivo. Ainda que saibamos das dificuldades do processo político de aprovação dessas pro- postas, a sua construção já é motivo de grande relevo. É que, quando temos am- bientes políticos mais propícios a esses avanços, não raro nos faltam boas propostas. Pensá-las já é, ao meu sentir, um importante progresso para todos que atuam na área trabalhista.

Também devemos considerar, e tenho repetido isso em algumas oportunidades, a possibilidade e necessidade do aproveitamento das inovações da Teoria Geral do Processo, levadas a efeito no Código de Processo Civil, naquilo que não contrarie os princípios fundamentais do Direito Processual do Trabalho.

Como já assinalei neste texto, precisamos possibilitar que os subsistemas processuais dialoguem entre si e com a Teoria Geral do Processo, pois constituem um só espírito instrumental do processo.

Nesse novo ambiente, “a segurança jurídica deixa de ser estática, para conviver com um direito mais flexível e menos rígido (...) não se cuida mais de um genérico direito ao processo, assentado em direitos estáticos (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Os direitos fundamentais à efetividade e à segurança em perspectiva dinâmica. Revista de Processo, n. 155, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p.21).

Outros exemplos, além dos já assinalados neste texto, podem nos auxiliar na de- monstração desse diálogo. Refiro-me, agora, à possibilidade de aplicação de dis- positivos do Código de Processo Civil que dispõem sobre a execução provisória (art. 475-O), que apresenta avanços significativos em relação ao tratamento dado ao instituto pela vetusta redação do art. 899 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. São regras mais próximas do princípio do resultado, que devem orientar o aplicador do Direito do Trabalho, máxime quando autoriza a liberação de crédito ao exequente, ainda que dentro de certos e aceitáveis parâmetros.

Como já tive oportunidade de afirmar, “na Justiça do Trabalho, “[...] as normas do Código, que deverão ser adotadas por supletividade, dão um alento à jurisdição executiva, que poderá avançar um pouco mais” (CHAVES, Luciano Athayde. A Re- cente Reforma do Processo Comum: reflexos no Direito Judiciário do Trabalho. São Paulo: LTr, 2006, p.48).

Por fim, devemos pensar em um avanço mais efetivo no que tange o conhecimento da metodologia do Direito e da natureza do processo judicial (Benjamim Cardozo), em especial no que diz respeito à observância dos direitos fundamentais, uma vez que “a supremacia do direito fundamental, hoje reconhecida de forma praticamen- te unânime pela doutrina e pela jurisprudência, acarreta inúmeras consequências no domínio no processo de natureza civil”(OLIVEIRA, 2008, p.12).

Ainda sobre os direitos fundamentais, destaco enunciado aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho (Brasília, 2007), promovido pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho:

DIREITOS FUNDAMENTAIS. INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO. Os direitos

No documento planejamento estrategico. arquivo final (páginas 33-38)