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planejamento estrategico. arquivo final

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Academic year: 2021

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Planejamento

Estratégico e

Efetividade no

Poder Judiciário

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Luciano Athayde Chaves... 2

Metas Prioritárias para 2010

Conselho Nacional de Justiça (CNJ)... 4

As metas para a execução trabalhista

Luciano Athayde Chaves e Antonio Umberto de Souza Júnior... 5

Uma nova gestão para o Poder Judiciário?

Luciano Athayde Chaves... 8

O Judiciário que queremos...

Luciano Athayde Chaves... 11

Sobre a efetividade das tutelas jurisdicionais do trabalho

Luciano Athayde Chaves... 26

Jurisdição trabalhista: bloqueios e desafios

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Apresentação

A presente seleção contém informações e textos que abordam dois temas de impor-tância para o Poder Judiciário na atualidade: a discussão a respeito do planejamen-to estratégico e das metas de nivelamenplanejamen-to, fixadas pelo Conselho Nacional de Jus-tiça (CNJ), e textos que propõem uma reflexão sobre o atual estágio de efetividade da Justiça do Trabalho.

Esses dois eixos estão conectados pelo fio da efetividade, vetor que orienta a ideia das metas, mas que também expõe a necessidade de se pensar aspectos importantes da jurisdição, como a fase de cumprimento da sentença e execução trabalhista. Nesse contexto, não podemos esquecer que os objetivos propostos pelo CNJ só se-rão alcançados quando os operadores do Direito derem a importância necessária à gestão judiciária, o que exige conhecimento de uma nova cultura que os juízes brasileiros muitas vezes sequer têm tempo para pensar. Precisamos criar uma cultura de gestão científica, de compromisso e de prestação de contas e é nesse desafio que queremos colaborar.

A Anamatra vem conferindo a devida relevância ao tema da gestão judiciária e à necessidade da participação dos magistrados na administração da Justiça, como bem delineado na Resolução nº 70 do CNJ. Nós não devemos abrir mão dessa prer-rogativa de administrar a Justiça. A Constituição Federal nos dá uma robusta ga-rantia no que se refere à administração judiciária e ainda assim ouvimos, não raro, manifestações no sentido de que não é função do juiz administrar.

O apoio da Anamatra à Resolução reflete-se, por exemplo, na preocupação da enti-dade em estruturar uma assessoria orçamentária própria para auxiliar os indicados pelas associações regionais para as comissões de gestão e de orçamento; na realiza-ção de cursos para representantes dos Tribunais Regionais do Trabalho; bem como na formação da Comissão de Estudos de Planejamento Estratégico e Metas do Judi-ciário, criada com o objetivo de permitir a melhor colaboração da Associação Nacio-nal com o Planejamento Estratégico NacioNacio-nal para o Poder Judiciário, notadamente no âmbito da Justiça do Trabalho.

A realidade da magistratura de diversos países demonstra, empiricamente, o esforço que vem sendo envidado no sentido da busca por essa autonomia administrativa e financeira que nós já dispomos, a exemplo da Argentina, da Espanha e de Portugal.

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A nossa compreensão é de que a independência judicial está intrinsecamente ligada às ideias de administração da Justiça. A governança dos juízes é uma garantia para a sociedade.

Durante o 3º Encontro Nacional do Poder Judiciário (São Paulo, 2010), a exemplo do que aconteceu em 2009 (Belo Horizonte), dez novas metas foram estabelecidas para o Poder Judiciário cumprir até o final deste ano e duas delas chamaram especial atenção da Anamatra, por atingirem a atividade-fim jurisdicional, abrangendo, inclusive, os três graus de jurisdição. Trata-se da meta que prevê o julgamento de processos distribuídos até 31 de dezembro de 2006 (nº 2) e da meta que estabelece a redução de pelo menos 10% do acervo de processos em fase de cumprimento e de execução (nº 3).

Nesse sentido, foi protocolado ao ministro Gilmar Mendes, à época presidente do CNJ, ofício pedindo a adequação dos quadros funcionais dos tribunais brasileiros. O empenho da Anamatra em prestar esse auxílio aos tribunais e aos magistrados trabalhistas explica-se pelo entendimento de que as metas só são possíveis quando se harmonizam e avançam sem prejudicar a prestação jurisdicional, bem como a qualidade de vida dos magistrados. E esse sucesso pressupõe também uma mudança de cultura e de estrutura.

Faz-se necessário a revisão da atual gestão de pessoas nos tribunais, estabelecendo uma nova logística, com o objetivo de conferir ao magistrado o apoio necessário ao desempenho da atividade jurisdicional com qualidade, eficiência e celeridade. O grande desafio a ser enfrentado é a execução do que foi planejado. A palavra-chave para o avanço é ‘participação’ e o desafio é transportar essas ideias para to-dos os juízes brasileiros.

Importante ainda é o papel das entidades de classe em levar ao CNJ feedbacks dos problemas, gargalos e dificuldades, e discutir táticas que precisam ser redefinidas a todo momento. Temos o compromisso de fazer um diagnóstico permanente entre o esforço do cumprimento das metas e a realidade de cada juiz, mesmo diante do quadro de bons resultados da Justiça do Trabalho, que têm sido conseguidos a custo de uma dedicação muito grande dos juízes do Trabalho.

Em algumas comarcas, a Justiça do Trabalho opera em seu limite na fase de conhe-cimento. Quando as metas estiverem comprometendo a qualidade de vida e a saú-de ocupacional dos magistrados, será papel das associações adotar as providências para que elas sejam ajustadas de acordo com as assimetrias do Poder Judiciário. A Anamatra almeja, com essas iniciativas, proporcionar a oportunidade dos juízes exporem suas ideias para o aperfeiçoamento da instituição judiciária e as dificulda-des encontradas para o cumprimento das metas.

Os textos aqui selecionados pretendem oferecer ao colega uma colaboração para a divulgação de saberes sobre o tema, com o objetivo final de contribuir para o aper-feiçoamento da instituição judiciária e a melhoria da prestação jurisdicional para a sociedade brasileira.

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Metas Prioritárias para 2010 fixadas

pelo Conselho Nacional de Justiça

1. Julgar quantidade igual à de processos de conhecimento distribuídos em 2010 e parcela do estoque, com acompanhamento mensal.

2. Julgar todos os processos de conhecimento distribuídos (em 1º grau, 2º grau e tribunais superiores) até 31/12/2006 e, quanto aos processos trabalhistas, eleitorais, militares e da competência do tribunal do Júri, até 31/12/2007.

3. Reduzir em pelo menos 10% o acervo de processos na fase de cumprimento ou de execução e, em 20%, o acervo de execuções fiscais (referência: acervo em 31/12/2009).

4. Lavrar e publicar todos os acórdãos em até 10 (dias) após a sessão de julgamento. 5. Implantar método de gerenciamento de rotinas (gestão de processos de trabalho) em pelo menos 50% das unidades judiciárias de 1º grau.

6. Reduzir em pelo menos 2% o consumo per capita (magistrados, servidores, ter-ceirizados e estagiários) com energia, telefone, papel, água e combustível (ano de referência: 2009).

7. Disponibilizar mensalmente a produtividade dos magistrados no portal do tri-bunal, em especial a quantidade de julgamentos com e sem resolução de mérito e homologatórios de acordos, subdivididos por competência.

8. Promover cursos de capacitação em administração judiciária, com no mínimo 40 horas, para 50% dos magistrados, priorizando-se o ensino à distância.

9. Ampliar para 2 Mbps a velocidade dos links entre o Tribunal e 100% das unidades judiciárias instaladas na Capital e, no mínimo, 20% das unidades do interior.

10. Realizar, por meio eletrônico, 90% das comunicações oficiais entre os órgãos do Poder Judiciário, inclusive cartas precatórias e de ordem.

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* Publicado no jornal Valor Econômico, edição do dia 05/04/2010.

** Juiz do Trabalho no Rio Grande do Norte e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do

Trabalho (Anamatra).

As metas para a execução trabalhista

*

PoR LuciANo AThAydE chAVEs**

O planejamento estratégico do Poder Judiciário tem sido uma das prioridades do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em especial desde o ano passado, quando o ór-gão estabeleceu metas de nivelamento a serem seguidas por todos os tribunais do país. A iniciativa de planejar colheu resultados positivos, apresentados no 3º Encon-tro Nacional do Poder Judiciário, ocorrido em fevereiro, em São Paulo.

No balanço do esforço de efetividade judicial de 2009, a Justiça do Trabalho apre-sentou números expressivos. Na mais polêmica das metas de 2009, que estabelecia o julgamento de todos os processos distribuídos até dezembro de 2005, a Justiça do Trabalho ficou à frente do índice global de 58,79%. Nos 1º e 2º graus, o índice de sucesso foi de 93%, o que equivaleu a 98.364 processos julgados até fevereiro deste ano. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) também mostrou resultado positivo, com 50.828 processos julgados até 31 de dezembro de 2009, o que representou um percentual de 91%.

Agora, temos novas metas de nivelamento e uma delas merece especial atenção. Será uma das prioridades do Poder Judiciário em 2010 reduzir, em pelo menos 10%, o acervo de processo na fase de cumprimento ou de execução e, em 20%, o acervo de execuções fiscais.

Trata-se de uma importante inovação no conjunto de metas, pois não se busca ape-nas dinamizar o julgamento das causas, com aptidão para apontar para a sociedade que as sentenças proferidas pelos magistrados serão, efetivamente, cumpridas e não teremos apenas uma proclamação de direitos.

Mas, para se alcançar essa meta prioritária, precisamos implementar várias mudan-ças. Primeiro, é necessário oferecer ao corpo da magistratura trabalhista as con-dições para se dedicar com mais vagar à execução, máxime porque também está presente, para 2010, meta de julgamento de processos (desta feita até 2007). Não

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podemos esquecer, ainda, que muitas são as realidades na Justiça do Trabalho brasi-leira, regionalizada em 24 tribunais. Em alguns tribunais regionais, as metas devem ser flexibilizadas, sob pena de esgotamento físico e psicológico dos magistrados. O desafio aqui é avançar na execução com a mesma produtividade que a Justiça do Trabalho tem apresentado na primeira parte da caminhada processual, representa-da pela instrução e coleta representa-das provas até a sentença.

Para isso, defendemos um amplo debate institucional, a fim de que essas metas se harmonizem e avancem, sem prejuízo, por suposto, de uma prestação jurisdicional de qualidade e da própria qualidade de vida dos juízes, que hoje já apresentam tra-balho em intensidade elevada e preocupantes níveis de stress ocupacional.

Nesse processo, é também indispensável uma revisão da atual estrutura e gestão de pessoas. Sem a logística e o pessoal necessários, prejudica-se, e muito, qualquer expectativa de avanço na execução. Por isso, preocupa a magistratura do Trabalho a não inclusão - no rol das metas para 2010 - de proposta de concentração de, pelo menos, 75% da força de trabalho na atividade-fim do Poder Judiciário. Fixada ape-nas como recomendação, essa providência é fundamental para se lograr qualquer êxito junto aos órgãos jurisdicionais, pois não é possível eficiência no cumprimento da sentença sem o necessário apoio de pessoal.

Essa nova meta é, portanto, um grande desafio para os juízes trabalhistas. A pala-vra-chave para a prestação jurisdicional eficaz e de qualidade é equilíbrio, sob pena de termos uma celeridade contraproducente e inerte. Decisões conferidas rapida-mente, mas sem a sua efetivação num prazo razoável. Precisamos, definitivarapida-mente, sanar esse desequilíbrio na cadência da marcha processual.

Estatísticas do Conselho Nacional de Justiça ilustram essa necessária mudança cultu-ral. O relatório “Justiça em Números”, referente ao ano de 2008, mostra que a Jus-tiça do Trabalho, na fase de conhecimento, apresenta índices de congestionamento inferiores aos obtidos na fase de execução: são 34,1% contra 59,6%. E estamos falando de um universo de seis milhões de processos que foram julgados naquele ano, incluindo os casos pendentes dos anos anteriores.

Há de se reconhecer que, historicamente, há um vanguardismo cultural que impul-siona a execução na Justiça do Trabalho, fato esse explicado pelo privilégio do cré-dito trabalhista. O instituto do ofício da execução, descrito no artigo 878 da Conso-lidação das Leis do Trabalho (CLT) - “a execução poderá ser promovida por qualquer interessado, ou ´ex officio´, pelo próprio juiz ou presidente ou tribunal competen-te” - também é outro ponto de destaque na construção desse protagonismo”. O juiz do Trabalho dispõe hoje de diversas ferramentas eletrônicas, em especial o Bacenjud, para o auxílio à efetivação da execução. A penhora eletrônica é, sem dú-vida, uma grande aliada da magistratura trabalhista, mas, isoladamente, não tem logrado êxito em todos os casos. Isso porque os devedores têm se dedicado sobre-maneira a buscar mecanismos para ocultar os seus patrimônios da Justiça. Exemplo disso é a profusão no uso dos chamados “laranjas”.

A mudança no Código de Processo Civil (CPC) é outro ponto que merece um melhor aprofundamento. Se as mudanças do código deram maior visibilidade à questão da execução, o mesmo não pode ser dito da compreensão efetiva de que essas melho-rias podem e devem, subsidiariamente, ser observadas pelo processo do trabalho.

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Situação semelhante aplica-se às mudanças da Teoria Geral do Processo. O processo trabalhista não é uma ilha isolada e pode se comunicar com outras fontes do pro-cesso e caminhar para a construção da jurisprudência. E essa mudança de conduta é uma alternativa para as dificuldades que os projetos de reforma do processo traba-lhista enviados ao Congresso Nacional têm em sua tramitação.

É necessário também um avanço com relação à incorporação dos direitos funda-mentais no campo processual. A Constituição Federal, lei maior de nosso país, deve ser o nosso grande referencial. Princípios como o do acesso à Justiça e o da duração razoável do processo devem ser considerados em seu potencial normativo e confor-mador da ordem procedimental infraconstitucional.

O momento exige uma mudança de paradigma, que signifique um maior aprofun-damento dos operadores de direito com questões fundamentais que fazem sim do processo mais complexo, porém mais efetivo e que concretiza os direitos pleiteados à Justiça. O bom juiz tem o dever de usar todas ferramentas à sua disposição para dar uma resposta efetiva à sociedade. Precisamos combater o formalismo, o lega-lismo, pensarmos de forma progressista, termos um cuidadoso novo olhar para a execução trabalhista. A Justiça do Trabalho agradece e a sociedade também.

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Uma nova gestão para o Poder

Judiciário?

*

PoR LuciANo AThAydE chAVEs E ANToNio uMbERTo dE souzA JúNioR**

O Brasil vive momentos de construção de uma democracia de alta intensidade, su-perando processos históricos de rupturas institucionais e constitucionais. A partici-pação da sociedade nas decisões políticas e a ocupartici-pação dos espaços públicos rumam, ainda que com alguns percalços, para um sistema político forte e representativo. Os Poderes da República, dentre eles o Judiciário, certamente sairão fortalecidos do processo político que vivenciamos, mormente porque interessa ao país e aos brasi-leiros a consolidação das instituições republicanas. A recente estabilidade institucio-nal e até econômica para tanto contribuem.

Focando o Poder Judiciário, legitimado pela Constituição Federal para a solução dos conflitos e pacificação da sociedade, é imperioso destacar que o seu fortalecimento passa, necessariamente, pela credibilidade que constrói junto à população brasilei-ra. Nesse cenário, e respondendo ao anseio social, a magistratura já responde com a necessária celeridade que deve mover a prolação das suas decisões. Também é mo-tivo de atenção da sociedade a existência de controles técnicos de revisão (recursos e outras formas de impugnação) e, em certas circunstâncias, pela disponibilidade de diversas vias de apuração de responsabilidade funcional (processos disciplinares, ações penais e processos de impeachment).

Mas a construção do Judiciário republicano importa também na ampliação do grau de democracia interna, relacionado com a dinâmica da gestão administra-tiva do Poder Judiciário, aspecto pouco visível aos olhos menos atentos. Tais as-pectos vinculam-se especialmente à necessária observância dos princípios cons-titucionais da moralidade administrativa e da publicidade, inerentes a toda a Administração Pública.

* Publicado no jornal Valor Econômico, edição do dia 10/9/2009.

** Luciano Athayde chaves e Antonio umberto de souza Júnior são, respectivamente, juízes do trabalho no Rio Grande do Norte e no distrito Federal, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e ex-conselheiro do conselho Nacional de Justiça.

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A gerência dos recursos humanos e materiais do Judiciário passou, ao longo do tem-po e até então, ao largo de qualquer preocupação democrática. A sua face visível revelava-se apenas no modo de escolha dos membros da mesa diretora dos tribunais, periodicamente eleitos para mandatos bienais irrenováveis, ainda que não contem-ple, como seria de desejar, a eleição pelo conjunto da magistratura a eles vinculada. É necessário, portanto, assegurar maior participação do coletivo dos juízes em todos os matizes administrativas, imprimindo total transparência à atuação administrati-va, financeira e orçamentária dos tribunais. Sem falar na necessária publicidade dos atos e operações realizados pelos tribunais, a permitir o controle dos gastos pela so-ciedade civil, observada a administrativa e financeira assegurada pela Constituição aos tribunais brasileiros.

Alguns passos, contudo, vem sendo dados no processo de transformação do Poder Judiciário, na direção de uma nova institucionalização, para usar expressão cunhada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes.

Merece destaque, e aplausos da sociedade, a recente determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão administrativo de cúpula do Judiciário, no sentido de que os tribunais devam garantir “a participação efetiva de serventuários e de magistrados de primeiro e segundo graus, indicados pelas respectivas entidades de classe, na elaboração e na execução de suas propostas orçamentárias e planejamen-tos estratégicos” (Resolução CNJ nº 70/2009, art. 2º, § 4º).

Fruto de opinião consensual retirada dos vários encontros regionais realizados pelo CNJ com os tribunais no ano de 2008, a medida visa a maior democratização das decisões administrativas e financeiras através do engajamento dos magistrados e servidores na melhoria da qualidade de gerência e planejamento das Cortes de Jus-tiça brasileiras. Toda a programação quanto à execução dos orçamentos e dos pla-nejamentos de médio e longo prazos dos tribunais passará pelos representantes dos magistrados e dos servidores e por eles será acompanhada. Integrados formal-mente às instâncias deliberativas dos tribunais, as cúpulas terão que repartir com a comunidade administrada as decisões de onde e como devem ser gastos os recursos públicos. Destaque-se que os representantes da magistratura serão indicados pelas respectivas associações, legítimas interlocutoras dos juízes.

Além de aproximar os gestores dos tribunais de suas bases, a medida propicia o cons-tante fluxo de informações acerca das necessidades dos órgãos que compõem cada cor-te de justiça e das eventuais dificuldades ou limitações da direção, abrindo espaço para o incremento do grau de eficiência e economicidade na gestão pública dos tribunais. Também merece destaque outra medida do CNJ. Inspirado no dever de publicidade e na recém-aprovada Lei Complementar nº 131/2009, que aperfeiçoou a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, o Conselho, por meio da Resolução nº 79, tornou compulsória a exibição, em caráter permanente e em local de fácil acesso nos sítios dos tribunais na internet, de todos os dados relativos aos gastos e receitas do Judi-ciário, inclusive com a discriminação pormenorizada das rubricas dos pagamentos e os dados identificadores das pessoas e empresas que prestem serviço ou entreguem produtos nesse Poder.

Não é preciso assinalar a importância da transparência, reflexo do princípio consti-tucional da publicidade, como instrumento de apoio à participação de juízes, servi-dores e da sociedade em geral na gestão dos tribunais.

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Porém, para que a perspectiva democratizante aberta pelo cenário normativo aqui desenhado efetivamente transforme a realidade de nossos tribunais, é essencial que se dê vida a tais comandos. Sim, porque é necessária vontade política dos atores para que tais resoluções venham, de fato, a ser concretizadas no âmbito do Judiciá-rio e a produzir os frutos almejados.

Por certo que tais medidas encontram resistência por parte de alguns segmentos. Amalgado em práticas não democráticas, a mudança de postura do Judiciário exige, antes de mais nada, compromisso institucional dos gestores, sem falar ser necessário o empenho e criatividade dos mesmos. As boas intenções e os compromissos não implementados não passarão, parafraseando Ferdinand Lassale, de “nada mais que um pedaço de papel” e não surtirão o esperado efeito de contribuir para um Poder cada vez mais eficiente e confiável.

Aceitando o desafio descortinado, o ator do Poder Judiciário tem a obrigação ins-titucional e consins-titucional de promover a sua democratização, a sua abertura para a sociedade, posturas que, com certeza, contribuição para a sua maior legitimação.

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O Judiciário que queremos...

*

Reflexões sobre o planejamento estratégico do Poder Judiciário

Luciano Athayde Chaves**

Alice - Você poderia me dizer, por favor, que caminho

devo seguir para sair daqui?

Gato - Isto depende bastante de onde você quer chegar

[...].

Alice - Eu não me importo muito com isso [...].

Gato - Então não importa muito que caminho você irá

tomar.

(Alice no País das Maravilhas) 1. Introdução

Na obra de Lewis Carrol, a menina Alice está perdida diante de uma encruzilhada e tem à sua frente a única criatura que lhe é sincera, entre ironias e brincadeiras, num mundo sabidamente louco e confuso.

Nos apontamentos que fez esse clássico de Carrol, Martin Gardner sugere que a cena tenha sido tirada do Talmud1: “se você não sabe aonde está indo, então

qual-quer estrada o levará lá”.2

* Agradeço ao colega bráulio Gabriel Gusmão, presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho do Paraná – Amatra iX (gestão 2008/2010), pelas valiosas contribuições e sugestões ao presente texto.

** Juiz do Trabalho da 21ª Região (RN), Mestre em ciências sociais pela universidade do Rio Grande do Norte. Professor de direito Processual do Trabalho e de hermenêutica e Teoria da Argumentação Jurídica da universidade Federal do Rio Grande do Norte. Membro do instituto brasileiro de direito Processual. Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (2009-2011). E-mail: luciano@anamatra.org.br.

1 o Talmude ou Talmud (em hebraico: תַּלְמוּד) é um registro das discussões rabínicas que pertencem à lei,

ética, costumes e história do judaísmo. É um texto central para o judaísmo rabínico, perdendo em importância apenas para a bíblia hebraica (cf. www.wikipedia.org).

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Vivemos num mundo realmente confuso e assimétrico, talvez, em muitos aspectos, semelhante ao País de Alice. Um mundo de relações sociais hipercomplexificadas, que frequentemente demanda soluções novas em relação às quais não temos cami-nhos já percorridos ou experiências conhecidas.

As instituições públicas, inseridas de forma inexorável nesse contexto, também são diariamente desafiadas a encontrar novos meios e veios para cumprir suas missões, num ambiente societal em constante transformação.

O Judiciário do Brasil tem 70 milhões de processos em andamento, numa aproxima-da proporção de um para caaproxima-da três brasileiros!

Isso nos faz os maiores, senão o maior, dos litigantes do mundo e em nada lembra a imagem que possuímos de nós mesmos, como um povo tranquilo, pacífico e cordato. A cada ano, exibimos com entusiasmo impressionantes números de casos resolvidos, centenas, milhares.

O valor a esses resultados é refletido nas expectativas depositadas nos responsáveis pela solução dos conflitos.

O padrão do bom juiz, num olhar pelo menos majoritário, é o daquele que está com o trabalho em dia, que consegue resolver o maior número de casos possíveis, con-ciliador, que profere despachos, sentenças e votos aos cântaros, numa verdadeira linha de produção.

E a ideia de trabalho em dia supõe, quase sempre, prazos razoáveis na fase de conhe-cimento, olvidando que a jurisdição sugere a entrega integral da tutela material, que somente faz algum sentido para o jurisdicionado quando presentes os efeitos concre-tos da atuação do Poder Judiciário (a satisfação de uma obrigação de pagar, a entrega da coisa objeto do litígio, a desconstituição de uma relação jurídica, etc.).3

O tempo judiciário não é cíclico, ele é contínuo, embora nos pareça renovado a cada ano judiciário ou a cada biênio de alteração nas cúpulas dos tribunais, quando uma nova leva de administradores é chamada para “encontrar o caminho certo”.

Aproveitando a metáfora de Carrol, podemos nos valer do gato, como uma espécie de oráculo, e buscar, mercê de sua provocação, a saída para uma situação que insiste em nos incomodar, apesar das melhorias no sistema judiciário nas últimas décadas.

3 Tenho, já de algum tempo, realçado os problemas desse quadro de prestígio demasiado à ideia de jurisdição

como apenas a declaração de direitos. Em outro texto, assinalei: “tenho insistido, já de algum tempo, quanto aos

dissabores causados no sistema processual pelo fenômeno do “mito da cognição”, que ainda insiste em predominar nas práticas judiciárias. Por “mito da cognição” entendo a demasiada ênfase na fase de conhecimento dos feitos (audiências, sentenças, etc.), que também visa a atender às expectativas institucionais de prazos e otimização de pautas de audiência projetadas pelas corregedorias, sem se estabelecer, contudo, um equilíbrio de atuação do juiz do Trabalho na fase de cumprimento da sentença. A par dessa circunstância, temos um verdadeiro paradoxo: os novos processos e os novos clientes da Justiça recebem, em geral, uma boa (e merecida!) atenção. Tanto que os prazos médios para sentença de primeiro grau apresentam bons números na maioria das regiões trabalhistas. Os processos já julgados e em fase de execução forçada, porém, têm sua análise e impulso muitas vezes comprometidos pela falta de tempo do juiz para neles atuar, já que os prazos na fase de conhecimento são mais curtos. Disso resulta o seguinte: quem já teve um crédito reconhecido em seu favor e ainda não satisfeito por quem de direito, deve aguardar ainda mais, enquanto novos feitos ocupam a centralidade da atuação judicial”

(chAVEs, Luciano Athayde. Estudos de direito processual do trabalho. são Paulo: LTr, 2009, p. 256). sobre o mesmo assunto, consultar, ainda, chAVEs, Luciano Athayde. A recente reforma no processo civil e seus reflexos

(15)

Talvez possamos pensar diferente, propor uma nova caminhada.

Num ambiente em que a efetividade de direitos é tão importante quanto a sua con-quista, é fundamental planejar e administrar os problemas da Justiça, procurando implementar uma visão moderna do “governo dos juízes”, de modo a construir um Poder Judiciário acessível, célere e justo.

Não raro ouvimos críticas a essa “governança” do Judiciário, em grande parte cen-tradas na ideia de que os magistrados brasileiros não são bons gestores e que sua função, no cenário republicano, não seria essa.

O interessante é notar que, em muitos países (como Espanha, Argentina e França), onde é encargo do Poder Executivo gerir a máquina judiciária, cresce a demanda dos magistrados por uma independência em relação aos outros poderes. O senti-mento é o de que o atrelasenti-mento do Judiciário a outro poder, ainda que na área administrativa, compromete em grande medida seu desempenho e, em última ins-tância, seus próprios predicamentos.

No Brasil, onde o Judiciário goza de um forte estatuto constitucional que robustece sua independência administrativa, financeira e orçamentária, ainda sobrevive uma leitura de que a gestão judiciária não seria um problema dos juízes.

Por isso, desde logo, creio ser apropriado assentar uma nota metodológica para o enfrentamento dos bloqueios para uma justiça melhor: cabe aos juízes, com apoio da comunidade jurídica e em harmonia dos outros Poderes4, identificá-los e pensar

na formulação e execução de soluções.

2. Resolvendo problemas, além dos processos

Antes de olharmos para o futuro que podemos e devemos imaginar, nossa própria história recente poderá nos indicar o caminho que não deve ser seguido.

Durante os últimos anos, os tribunais brasileiros têm dado mostra de grande capa-cidade de resolução dos processos.

Os números são impressionantes, como indicam os relatórios dos últimos anos do Programa Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça5.

Se os administradores do Judiciário fossem um CEO6 de uma grande corporação

prestadora de serviço, estariam esfregando as mãos contentes, pois a tendência é de aumento da demanda por mais decisões.

4 Exemplo dessa harmonia está na relação entre os tribunais brasileiros e a secretaria da Reforma do Poder

Judiciário, vinculada ao Ministério da Justiça, órgão que, nos últimos anos, tem realizado um grande esforço para concretizar reformas processuais e sugerir ferramentas de acesso à justiça. Foi no âmbito dessa relação interpoderes que tiveram lugar os dois Pactos de Estado em favor de um Judiciário Rápido e Republicano, por meio dos quais muitos projetos de lei chegaram à aprovação perante o congresso Nacional, inclusive o da grande reforma do código de Processo civil brasileiro de 2005 e 2006.

5 disponível em: www.cnj.jus.br. Acesso em: 20/07/2009. A propósito, trata-se de um programa dos mais

importantes, pois a existência de estatísticas e números confiáveis sobre o funcionamento do Judiciário brasileiro é uma importante ferramenta para a concepção e o desenvolvimento de projetos de gestão, conquanto não seja elemento que, por si só, possa definir as políticas de governo do Judiciário.

6 Chief executive officer (“diretor-executivo” ou “diretor-geral”, em português), mais conhecido como cEo, é um

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A realidade, entretanto, não é essa.

Aumento de demandas pode indicar muitas coisas, mas jamais pode ser associado ao êxito dos serviços prestados, normalmente uma consequência da fidelidade da clien-tela, numa organização empresarial que objetiva o lucro, o que não sucede aqui. O recrudescimento da demanda é fenômeno dos mais complexos, e seu exame não cabe nos propósitos do presente texto. Nada obstante, creio ser possível assinalar que esse fenômeno tem causas sistêmicas (burocracia, formalismo, etc.) e decor-rentes do comportamento dos atores sociais (falta de observância da legislação nas relações sociais, aproveitamento da morosidade para dilação no cumprimento das obrigações, dentre outras).7

Precisamos nos preparar para a caminhada na busca de uma excelência na gestão judiciária. Ter a consciência de que somos um único Poder Judiciário. Estarmos co-nectados ao mundo, sermos transparentes e “organizar a casa”.

As 10 metas para o Judiciário, fixadas pelo Conselho Nacional de Justiça e Tribunais Brasileiros, a partir do II Encontro do Poder Judiciário (Belo Horizonte, fev. 2009), mostram que ainda estamos na primeira etapa de uma longa jornada.

Do contrário, para ficarmos apenas no caso da Meta 2 (julgamento de todos os pro-cessos distribuídos até dezembro de 2005), seria possível imaginar que em 2014, ano da Copa do Mundo de Futebol no Brasil, a meta número 2 será julgarmos todos os processos de 2009?

O pensador português Boaventura de Sousa Santos, ao falar sobre a criação do Observatório da Justiça no Brasil, menciona estar interessado não apenas na quanti-dade e na velociquanti-dade dos processos, mas na qualiquanti-dade das decisões e se os cidadãos sentiram-se bem e se tiveram dificuldade de acesso ao tribunal.8

Nesse sentido, o primeiro aspecto a considerar é descobrir qual Judiciário queremos, quando falamos em qualidade e eficácia das decisões, por exemplo, com decisões de qualidade, com potencial efetivamente pacificador e pedagógico, etc.

Nosso objetivo é pura e simplesmente continuar resolvendo processos ou podemos desejar mais? Podemos almejar também eficácia e qualidade nas decisões? O que significa isso?

Como agentes de um Poder estatal, o Judiciário e seus órgãos e os próprios magis-trados estão sujeitos, obrigados e compelidos ao cumprimento dos objetivos funda-mentais da República Federativa do Brasil, nos termos do art. 3º da Constituição da República.

Em última medida, as pretensões deduzidas em juízo por pessoas e instituições estão impregnadas do espírito contido nestes objetivos: liberdade, justiça, solidariedade, desenvolvimento nacional, erradicação da pobreza e marginalização, redução de

7 Aproveito-me, neste ponto, do método oferecido por boaventura de sousa santos para qualificar as causas da

morosidade judiciária. Para maiores detalhes do método, cf. sANTos, boaventura de sousa. Para uma revolução

democrática da justiça. são Paulo: cortez, 2007.

8 A apresentação foi feita no Ministério da Justiça, cuja secretaria de Reforma do Poder Judiciário é parceira na

implementação do modelo de ‘observatório’ já em funcionamento na universidade de coimbra, sob a coordenação do Professor boaventura de sousa santos. cf., sobre esse assunto, a matéria está disponível em: www.agenciabrasil. gov.br/noticias/2009/02/03/materia.2009-02-03.0316125551/view. Acesso em 20.07.2009.

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desigualdades sociais e regionais, promoção do bem comum, sem preconceitos e discriminação.

Todavia, o mito do princípio da inércia processual impregnou o juiz brasileiro, cris-talizando uma situação que, em alguns momentos, parece retirar-lhe a condição de cidadão e agente do Estado.

Como ‘guardiões’ 9 e realizadores das promessas do Estado de Direito os juízes

po-deriam e podem realizar mais.

Não no sentido de mais trabalho ou mais processos, mas de pensar diferente, na busca de solucionar também os problemas causadores das demandas.

No caso da Justiça do Trabalho, os problemas são conhecidos e também suas conse-quências.

Considerando a afirmação de que as decisões do Poder Judiciário moldam o com-portamento dos cidadãos, qual é então o comcom-portamento que nossas decisões estão impondo?

Qual a razão do contínuo aumento das demandas e por que nossas decisões não provocam a redução dos conflitos?

Um exemplo.

No dia-a-dia das manchetes dos periódicos e fazendo parte das estatísticas oficiais, temos o trabalho informal, um eufemismo para a ilegalidade nas relações de tra-balho. Esse fenômeno socioeconômico produz um exército de trabalhadores à mar-gem da seguridade social, torna desleal a concorrência de mercado fundada na livre iniciativa, igualmente inserida no texto da Constituição, bem como expõe a clara desigualdade social existente no País, a partir da consolidação de um abismo social entre os “trabalhadores formais e informais”.

Para melhor exemplificar tal condição, podemos mencionar dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), uma fundação pública federal vinculada à Se-cretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

Seu relatório semestral sobre o mercado de trabalho, conjuntura e análise10 mede

oficialmente o “nível de informalidade” ou de “trabalhadores sem carteira assina-da”, que corresponde a 38,1% do nível de ocupação no Brasil e associa a melhoria da “formalização” ao crescimento econômico do país.

Nesse compasso, seria possível indagar como a Justiça do Trabalho, reconhecida-mente célere, pode contribuir para que a eficácia de suas decisões compreenda tam-bém medidas que contribuam para redução da ilegalidade nas relações de trabalho e na melhoria das condições de saúde e segurança no ambiente de trabalho?

Voltando à metáfora do início do texto, parece-me que o primeiro passo é escolher um caminho e ele pode muito bem considerar a hipótese de que o Judiciário tam-bém esteja preocupado em resolver o problema e não apenas o processo.

9 cf. GARAPoN, Antonie. O juiz e a democracia: o guardião das promessas. Tradução de Maria Luiza de carvalho.

Rio de Janeiro: Revan, 2001.

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3. Conhecimento de suas próprias entranhas

Para saber aonde se quer chegar é preciso descobrir o que se deseja e o desejo im-plica em autoconhecimento.

Projetos do Conselho Nacional de Justiça têm buscado compreender a realidade do Judiciário brasileiro, seus números e suas práticas. Além disso, para os casos mais severos, há notícias de trabalhos realizados pela Corregedoria Nacional de Justiça, investigando in loco a realidade de determinada instituição.

O presente texto é escrito a partir do olhar da Justiça do Trabalho e, nesse parti-cular, não se observam projetos buscando conhecer as origens de suas demandas e práticas que tenham buscado a solução desses problemas ou mesmo o resultado provocado por suas decisões.

O Judiciário que queremos deve olhar a si mesmo sob dois aspectos:

Para dentro do aparelho estatal, como um dos pilares do Estado. Enxergando a si mesmo como um produtor de demandas que precisa administrar os próprios com-promissos, tais como gastos e aumento de pessoal;

Para fora, como administrador da Justiça, observando quais os efeitos que suas de-cisões provocam externamente. Quais as mudanças concretas e como essa “política judiciária” é vista. Qual é o efetivo resultado das decisões que proferimos e quais são os efeitos desejados.

Conhecer e reconhecer a própria estrutura implica em saber o custo do Judiciário para o Estado, não apenas do ponto de vista econômico, mas os recursos e energias despen-didos para a solução dos processos e, como ousamos propor, também dos problemas. As administrações dos Tribunais precisam olhar para fora e indagar a respeito dos efeitos de suas decisões na vida dos trabalhadores e empregadores, quais as efetivas mudanças e como esta “política judiciária” é vista.

Há necessidade de se saber qual é o efetivo resultado das decisões que proferimos, ou seja, o alcance para além das partes envolvidas no litígio solucionado.

Assim, uma primeira proposta deveria ser a adaptação da marcha até agora realiza-da e caminhar no sentido de também saber as origens ou causas dos conflitos, como eles têm sido resolvidos e quais os resultados das decisões proferidas, do ponto de vista da coletividade originária.

A segunda proposta, igualmente importante na busca por autoconhecimento da Instituição, reside na necessidade de ajustar a própria estrutura, para que não atue como um fim em si mesma, mas para alcance dos objetivos e missão a que se propõe. Como é possível levar toda uma Instituição para o melhor caminho quando diversos de seus principais atores são alijados do processo decisório?

4. O magistrado como gestor judiciário

Lara Cristina de Alencar Selem, em sua obra Gestão Judiciária Estratégica, define o gestor judiciário como aquele responsável por “exercer todas as atribuições inerentes à função jurisdicional, bem como as administrativas referentes aos serviços conexos

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ou auxiliares da Justiça, que estejam a ele vinculados, bem como os servidores que lhe sejam diretamente subordinados” (SELEM, Lara Cristina de Alencar. Gestão Judiciária Estratégica: o Judiciário em busca da eficiência. Natal: Esmarn, 2004, p.29).

Sob esse aspecto, a autora define outras atribuições desse gestor, que vão além das responsabilidades jurisdicionais e administrativas determinadas por lei. Gestão ge-ral, de atendimento ao cliente, de pessoas, de tecnologia e sistemas, de infraestru-tura e da qualidade judiciária são algumas das atribuições atribuídas por Lara Selem ao encargo do gestor judiciário, em nosso caso o magistrado, com o imprescindível apoio do corpo funcional.

Tendo o magistrado sob sua responsabilidade todas essas tarefas, e sendo ele auxi-liado por uma equipe, não restam dúvidas de que todos esses atores precisam estar inseridos no planejamento estratégico de forma efetiva e democrática.

Assim como define Selem, “o gestor será o grande líder que levará a equipe da Uni-dade Judiciária sob sua responsabiliUni-dade a realizar seu maior intento. Sem ele, toda e qualquer iniciativa de implementação de melhorias e modernização da Gestão Judiciária sucumbirá” (2004, p.34).

Desse modo, temos que compreender o papel do juiz em sua dupla dimensão, na pers-pectiva dinâmica da atuação do Poder Judiciário. Como julgador e como gestor. Ambas as tarefas se entrelaçam e se completam, ainda que reconheça que a visão da maioria dos atores é de que essa dupla dimensão implica em disfunção institucional, já que o papel do juiz seria, apenas, o de distribuir justiça, em sentido estrito e endoprocesssual. Definitivamente, não compartilho dessa leitura limitada da atuação do magistrado perante a estrutura e o funcionamento do Judiciário. Não enxergo essa disfunção e me recuso a admitir que se pode exercer os predicamentos da magistratura, com liberdade e independência, sem uma gestão participativa e baseada na ideia de um governo dos juízes, e de todos eles, respeitadas as atribuições de cada um e as tare-fas reservadas pela lei e pelos regulamentos e regimentos.

5. Democracia interna, gestão e controle

Um Estado Democrático pressupõe a ampla participação da sociedade nos negócios e nos espaços públicos, bem como o fortalecimento do sistema político vigente, o que resulta, via de regra, em instituições fortes e republicanas.

Porém, esse é um processo ainda em curso e que expõe diversos pontos de melhoria em nossa democracia, inclusive no Judiciário. Um desses pontos é a questão da legi-timidade democrática dos agentes de poder.

Por certo, não nos referimos aqui à falta de legitimidade dos juízes em exercerem suas funções de acordo com o modelo profissional vigente em nosso país.

Como tem destacado a literatura jurídico-constitucional, a soberania estatal das deci-sões de índole jurisdicional encontra sua legitimidade na própria Constituição; no de-ver indeclinável de fundamentação coerente de todas as decisões; pela existência de controles técnicos de revisão (recursos e outras formas de impugnação); e, em certas circunstâncias, pela disponibilidade de diversas vias de apuração de responsabilidade funcional (processos disciplinares, ações penais e processos de impeachment).

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Falamos, sim, do ainda presente déficit democrático relacionado com a dinâmica da gestão administrativa do Poder Judiciário, aspecto pouco visível, a julgar pelo silêncio em torno do tema, raramente quebrado.

Um olhar mais distante poderia até conceber, à luz do sistema de recrutamento dos magistrados, que uma baixa abertura de participação no governo dos tribunais fos-se corolário das próprias características que cercam a carreira dos juízes e a escolha de seus dirigentes, as quais, em regra geral, combinam, em dosagens diferentes, merecimento e antiguidade, não necessariamente nessa ordem.

Contudo, sendo a jurisdição expressão do poder político, também o Poder Judiciário há de observar princípios constitucionais inerentes a toda a Administração Pública. Até hoje, “a gerência dos recursos humanos e materiais do Judiciário prossegue, em regra, passando ao largo de qualquer preocupação democrática. Essa só tem sua face visível no modo de escolha dos membros da mesa diretora dos tribunais, perio-dicamente eleitos para mandatos bienais irrenováveis” (CHAVES, Luciano Athayde; SOUZA JUNIOR, Antonio Umberto. Uma nova gestão para o Poder Judiciário. Valor Econômico, 10.09.2009).

Mas, mesmo em relação a essa escolha dos dirigentes dos tribunais, pelas regras do jogo vigentes, a partir do próprio texto de nossa Constituição e, em especial, da Lei Orgânica da Magistratura, trata-se de eleição com reduzido universo de eleitores (desembargadores, nos tribunais estaduais e regionais, e ministros, nos tribunais superiores) e com uma ínfima porção de candidatos elegíveis, definida segundo a baliza única da antiguidade no posto.

Sem adentrar na hipótese, plenamente possível, de deliberarem os tribunais pela autonomia normativa constitucionalmente conferida, pela abertura dos processos de escolha de seus dirigentes, soa razoável ponderar que tal limitação da legitimi-dade democrática no processo de eleição para os cargos de direção pode ser, em alguma dimensão, compensada pela legitimação democrática no exercício do poder confiado a tais autoridades.

Para alcançar tal compensação, um método mais adequado consiste em assegurar maior participação do coletivo dos juízes em todos os matizes administrativos, im-primindo total transparência à atuação administrativa, financeira e orçamentária dos tribunais: a publicidade dos atos e operações realizados pelos tribunais permite que os contribuintes e usuários da Justiça saibam onde estão sendo aplicados os recursos humanos e materiais por eles financiados, facilita o controle pelas diversas instituições (conselhos, Ministério Público, tribunais de contas, sociedade civil orga-nizada) e aproxima juízes e servidores da Administração.

O outro meio extremamente útil e eficaz consiste na criação de colegiados plurais de que participem magistrados de todos os níveis da carreira e servidores.

Também é importante a criação de mecanismos que permeiem e assimilem as su-gestões e críticas de outros atores importantes para a Justiça, como advogados, ju-risdicionados, universidades e outros segmentos interessados em um Judiciário mais rápido, sério e efetivo.

E não podemos desprezar a importância da autonomia administrativa e financeira assegurada pela Constituição aos tribunais brasileiros. Em muitos países, como já

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assinalei no início deste texto, em que essa autonomia não é assegurada ao Poder Judiciário, constitui agenda para os juízes a luta para conquistá-la. No Brasil, não raro se ouvem vozes contra essa autonomia, como se ela não fosse uma face da in-dependência da atividade judicante.

A transparência e a participação na Administração Pública exalam do texto original da Constituição de 1988 e tiveram tal aroma reforçado nas sucessivas mudanças pa-trocinadas pelo Congresso Nacional. Somente para ilustrar, recorde-se a abolição das sessões administrativas secretas, decretada pela Emenda Constitucional nº 45/ 2004. Nessa perspectiva democratizante há de ser valorizada, comemorada e levada mui-to a sério a determinação do Conselho Nacional de Justiça, órgão administrativo de cúpula do Judiciário (subsumido apenas ao controle do Supremo Tribunal Federal), no sentido de que os tribunais devam garantir “a participação efetiva de serven-tuários e de magistrados de primeiro e segundo graus, indicados pelas respectivas entidades de classe, na elaboração e na execução de suas propostas orçamentárias e planejamentos estratégicos” (Resolução CNJ nº 70/2009, art. 2º, § 4º).

O poder normativo primário dos atos do Conselho Nacional de Justiça confere à regra o caráter de obrigatoriedade imediata. A novidade, em verdade, traduz “opinião consensual retirada dos vários encontros regionais de tribunais que aquele órgão pro-moveu em 2008” (CHAVES; SOUZA JUNIOR, 2009) na busca de um modelo ideal de planejamento estratégico no Poder Judiciário: em todas as reuniões, concluíram os participantes (dirigentes, magistrados, entidades de classe) que a audiência e o enga-jamento dos magistrados e servidores são requisitos imprescindíveis para o êxito da ideia de melhoria na qualidade de gerência e planejamento dos tribunais brasileiros. Assim, doravante, tanto a programação quanto a execução dos orçamentos e dos planejamentos de médio e longo prazos dos tribunais deverão ser acompanhadas, no mínimo, por representantes dos magistrados e servidores formalmente integra-dos a instâncias deliberativas das cortes.

Além de aproximar os gestores dos tribunais de suas bases, a medida propicia o cons-tante fluxo de informações acerca das necessidades dos órgãos que compõem cada cor-te de justiça e das eventuais dificuldades ou limitações da direção, abrindo espaço para o incremento do grau de eficiência e economicidade na gestão pública dos tribunais. Outra determinação recente complementa esse verdadeiro “pacote” democratizan-te implantado pelo Conselho Nacional de Justiça: inspirado no dever de publicidade e na recém-aprovada Lei Complementar nº 131/2009, que aperfeiçoou a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal.

O CNJ, por meio da Resolução nº 79, tornou compulsória a exibição, em caráter permanente e em local de fácil acesso nos sítios dos tribunais na internet, de todos os dados relativos aos gastos e receitas do Judiciário, inclusive com a discriminação pormenorizada das rubricas dos pagamentos e os dados identificadores das pessoas e empresas que prestem serviço ou entreguem produtos nesse Poder.

Não é preciso assinalar a importância da transparência como instrumento de apoio à participação de juízes, servidores e da sociedade em geral na gestão dos tribunais. Esses são aspectos de um tormentoso, mas necessário, processo de transformação do Po-der Judiciário, na direção de uma nova institucionalização, para usar uma expressão do

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Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, em recente encontro com associações de magistrados no Conselho Nacional de Justiça, em julho de 2009. Porém, para que a perspectiva democratizante aberta pelo cenário normativo aqui desenhado efetivamente transforme a realidade de nossos tribunais, é essencial que se dê vida a tais comandos.

É buscando trilhar esse caminho que todos nós queremos, no tocante à gestão judi-ciária, que o Conselho de Representantes da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que congrega os 24 presidentes das Associações Regionais de Magistrados (Amatras) em todo o Brasil, deliberou, no dia 1º de julho de 2009, apoio às medidas de fortalecimento, transparência e participação nos pro-cessos de administração das estruturas do Poder Judiciário.

Nesse propósito, a Anamatra vem implementando ações que vão ao encontro da Resolução nº 70 do CNJ, entre elas:

a) a busca da pronta efetividade do disposto no art. 2º, § 4º da Resolução n. 70/09, que garante a concreta e ampla participação de magistrados indicados por sua as-sociação de classe no processo de elaboração do planejamento estratégico dos tri-bunais; bem como da elaboração e execução dos orçamentos dos órgãos do Poder Judiciário do Trabalho;

b) a estruturação de uma assessoria técnica especializada para se dedicar ao estudo do orçamento da Justiça do Trabalho, com a contratação de um especialista na área, que tem a importante missão de subsidiar de forma técnica o acompanhamento do orçamento por parte das Associações Regionais e dos tribunais;

c) o oferecimento de novos cursos de planejamento e gestão orçamentária, de modo a qualificar a participação dos juízes de primeiro e segundo graus indicados pelas associações nos processos de planejamento e execução dos orçamentos.

Afora isso, a Anamatra está compilando e acompanhando o desenvolvimento des-ses processos de renovação administrativa, de cariz participativo, pretendo entre-gar ao Conselho Nacional de Justiça relatórios periódicos dos avanços e eventuais bloqueios, tudo no escopo de tornar realidade as propostas contidas nas referidas resoluções.

Eis o desafio que ora se descortina diante dos atores do Poder Judiciário. E ele somente será vencido na medida da vontade presente nessa busca por uma nova gestão do Judiciário.

6. Os Conselhos Superiores e o planejamento estratégico

A composição democrática e plural do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Con-selho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), respeitando também a vontade de seus representados, significaria um avanço na efetivação do planejamento estratégico para os tribunais.

À luz da gestão democrática e das definições do CNJ sobre a participação de diver-sos atores no planejamento estratégico, a Anamatra lança o debate, primeiramen-te, sobre o papel do CSJT como agente democratizador do Judiciário Trabalhista e como ator fundamental do planejamento estratégico da justiça especializada.

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Sob esse aspecto, e, em consonância com as definições da Resolução nº 70 do CNJ, há de se analisar as consequências da ausência dos juízes de primeiro grau na for-mação do CSJT.

Ainda que se tenha assegurado assento e voz à Anamatra (Resolução CSJT n. 1/2005), aspecto que tem contribuído para uma maior interlocução entre o conjunto da ma-gistratura do Trabalho e o Conselho, parece-me que a própria Constituição estampa a necessidade de simetria com a arquitetura da composição do CNJ, onde está pre-sente a participação de todos os níveis da carreira da judicatura.

É dizer: se a Constituição deixou expressa que a composição do CNJ deveria ser assim, é razoável interpretar que a faculdade temporária de se regulamentar o fun-cionamento do CSJT também deveria observar semelhantes critérios.

Os aspectos negativos dessa composição foram detalhados em documento enca-minhado ainda em 2005, logo após a publicação da Resolução Administrativa nº 1064/05, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), com a regulamentação do CSJT. No documento, a Anamatra criticou o sistema “excessivamente hierarquizado que implica na concentração do aparelhamento dos serviços judiciários nas cúpulas ad-ministrativas, cujo acesso, na prática, não permite uma abertura democrática”.11

Por essa razão, a Anamatra já apresentou ao CSJT uma proposta de anteprojeto de lei de sua regulamentação legal, exigida constitucionalmente (art. 111-A, § 2º, inciso II, CF c/c art. 6º da Emenda n. 45/04), prevendo a participação de magistra-dos de tomagistra-dos os níveis em sua bancada, notadamente por entender ser essencial a representação de todas as instâncias da magistratura trabalhista na elaboração de políticas estratégicas e de planejamento dos tribunais.

Especialmente após a Emenda 45/2004, que alargou a competência da Justiça do Trabalho, houve mudanças no ambiente forense que precisam ser relatadas e pen-sadas por todos.

Não obstante a composição do CSJT, a Anamatra vem lançando o seu olhar também quanto à indicação dos representantes da Justiça do Trabalho no CNJ, prerrogativa conferida ao Tribunal Superior do Trabalho.

Para tanto, desde 2007 elabora lista tríplice com nomes de juízes de 1º e 2º graus, feita a partir de uma eleição entre seus mais de 3.500 associados. A lista, encami-nhada ao TST, tem como objetivo sensibilizar o Tribunal quanto à importância da participação majoritária dos magistrados do Trabalho na escolha de seus represen-tantes no CNJ.

Trata-se de preocupação que decorre de uma difícil constatação: somente os juízes não podem participar, de forma coletiva, dessas indicações, o que não sucede com o Ministério Público e com os representantes da Ordem dos Advogados, como bem sintetizou Cláudio Montesso, ex-presidente da Anamatra, em texto sobre o assunto, do qual extraio a seguinte passagem:

Curiosamente, no CNJ, somente a magistratura não escolhe seus representantes,

o mesmo não ocorrendo com o Ministério Público, que decide, inclusive, os seus

integrantes do correspondente conselho daquela instituição. Os advogados

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escolhem seus representantes por meio de votação dos membros do Conselho

Federal da OAB. Os representantes do Senado e da Câmara, como representantes

do parlamento, estão legitimados como representantes do povo. Mesmo os

tribunais superiores escolhem seus representantes com o voto de seus pares.

Mas à magistratura de todo o país tal direito é negado.

Não se argumente que a escolha pelo conjunto da magistratura resultaria na

representação de interesses meramente corporativos. Trata-se de um argumento

preconceituoso. Afinal, não se imputa aos outros conselheiros, escolhidos pelos

seus pares, a mesma pecha. Não se acusam os representantes do Ministério

Público, da OAB e do Congresso de defender interesses de seus eleitores. Além

do mais, as associações de magistrados têm mostrado, por sua atuação social e

política, que é possível conciliar interesses de classe com os interesses do país. O

mesmo se pode esperar de eventuais escolhidos (MONTESSO, Cláudio José. O CNJ

e a democratização do Judiciário. Correio Braziliense. 14.4.2009).

Essa preocupação me parece procedente, pois uma escolha mais ampla e democrá-tica dos membros dos conselhos poderia ser uma eficaz ferramenta de participação dos magistrados em torno dos temas de gestão e de planejamento, pois haveria um saudável debate prévio de ideias e de propostas, reforçando o engajamento de to-dos numa seara que hoje não tem despertado o interesse geral da categoria.

De mais a mais, num regime democrático, é de se supor que essa participação deve ter lugar em todas as instituições.

Trata-se, portanto, de uma crítica ao sistema de escolha, jamais em relação aos co-legas indicados para as três composições do CNJ até aqui, os quais demonstraram e demonstram todas as qualidades para a função, e cujas contribuições estão a mere-cer todo nosso apoio.

7. A participação de magistrados na administração dos tribunais: uma leitura do potencial contido no art. 9º da Resolução nº 72 do Conselho Nacional de Justiça

Ainda dentro de todo esse contexto de uma tomada de posição em favor de uma gestão mais eficiente e participativa, como um dos elementos centrais de um plane-jamento estratégico para o Poder Judiciário, está o exame da ampliação dos atores dos tribunais dedicados à atividade administrativa.

Tradicionalmente, tem prevalecido entre nós a ideia de que a função judicante so-mente excepciona a atividade administrativa no que se refere aos magistrados elei-tos para cargos de direção. Na maioria dos tribunais, isso significa dizer: presidente, vice-presidente e corregedor.

Contudo, pelas especificidades de atribuições, não podemos afirmar que o corre-gedor exerce propriamente atividades administrativas nos tribunais. Resta, assim, o presidente e o vice. Nossas tradições, porém, apontam para a conclusão de que a participação do vice-presidente não ultrapassa, em boa parte dos casos, às

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substitui-ções legais, ainda que não se ignore a sinergia afirmada em alguns casos, em que, por vontade da mesa diretora, prevalece a atuação comum nos temas mais impor-tantes pelos membros dirigentes.

Assim, é de diagnosticar que a função administrativa dos tribunais é tarefa afeta, basicamente, ao presidente do tribunal, com o apoio dos servidores ocupantes de cargos de direção.

Esse modelo, todavia, vem se mostrando cada dia mais ineficiente. É que planejar e executar projetos envolvendo a magistratura e o ofício judicante não é missão das mais fáceis. E mais: não costumam ter sucesso o diálogo e o engajamento os juízes. Por outro lado, a forma de ser da atividade jurisdicional nem sempre permite que o corpo funcional de apoio à direção do tribunal consiga desenvolver adequadamen-te um trabalho de inadequadamen-terlocução institucional entre a presidência e os demais juízes, especialmente os de primeiro grau, que são em maior número e, não raro, apresen-tam maiores pontos de tensão administrativa.

Certamente em função desse quadro, muitos tribunais passaram a experimentar um outro modelo, por meio do qual se convoca juízes de primeira instância para atu-arem, em forma de auxílio, com o presidente do tribunal, colaborando com a ins-tituição no planejamento e execução dos projetos aprovados pelo órgão, além da atuação como interlocutores entre os diversos atores judicantes, máxime em razão do pouco tempo disponível da presidência para desempenhar essa tarefa.

Essas experiências se mostraram tão exitosas que hoje fazem parte do cotidiano de muitos tribunais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior Eleitoral.

O mesmo sucede com o próprio Conselho Nacional de Justiça, cuja função de se-cretário-geral é exercida, na forma do regimento interno, por um juiz-auxiliar da presidência do CNJ.12

Por isso, o CNJ adotou, na Resolução nº 72/09, regulamentação sobre a matéria, com efeitos sobre todo o Poder Judiciário:

Art. 9º. A Presidência dos Tribunais, excepcionalmente e observados os

critérios desta Resolução, poderá convocar, observados os critérios desta

resolução, até dois (2) juízes para auxilio aos trabalhos da Presidência e

até dois (2) para a Vice-presidência, respectivamente.

§ 1º. Nos Tribunais com mais de trezentos (300) juízes, a convocação de que

trata o caput em numero acima do limite estabelecido deverá ser justificada

e submetida ao controle e referendo do Conselho Nacional de Justiça.

Não se diga que essa convocação implica prejuízo jurisdicional. Dentro de certas balizas, como apontadas pelo dispositivo acima, o auxílio pode melhorar, e muito, o desempenho administrativo da estrutura judiciária, trazendo ganhos gerais sobre a atividade jurisdicional.

12 Aliás, é voz corrente na comunidade jurídica que essa função, exercida por um juiz, mostra-se uma dos traços

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Isso porque a melhoria das rotinas, dos fluxos de trabalho, dos sistemas informatiza-dos, da distribuição dos servidores, do regime de plantão dos juízes, da distribuição dos feitos, dentre outros aspectos, é fator de racionalização geral da atividade do Poder Judiciário, com potencial para encurtar prazos e emprestar maior efetividade aos processos.

Não é por acaso que, em muitos lugares, a experiência de convocação teve como motivo principal agregar os conhecimentos de juízes em áreas de gestão de tecno-logias da informação (TI) para viabilizar o desenvolvimento de ferramentas eletrô-nicas apropriadas para o uso dos magistrados, tarefa que simplesmente não poderia ser apenas confiada a técnicos, pois esses não conseguiriam harmonizar os recursos tecnológicos aos limites e exigências legais para o desenvolvimento de um processo judicial em espaço totalmente virtualizado.

Logo, creio que esse passo dado pela Resolução nº 72 é digno de nota e rompe com diversos e vetustos paradigmas, realçando o caráter participativo do planejamento estratégico do Poder Judiciário.

A mesma Resolução estendeu a possibilidade de convocação também às corregedorias:

Art. 9º...

§ 2º. A Corregedoria-Geral junto aos Tribunais poderá solicitar a convocação

de juízes de primeiro grau em auxílio aos seus trabalhos correicionais,

sendo um (1) para cada cem (100) juízes efetivos em exercício no Estado

ou região sob sua jurisdição, devendo ser expressamente justificada e

submetida ao referendo do CNJ quando exceder de 6 juízes.

Essa convocação pode ser especialmente útil para permitir uma atuação da correge-doria mais próxima dos juízes, o que nem sempre é possível em razão das diversas atribuições apenas do corregedor.

Ademais, pela própria natureza das atividades correicionais, algumas questões so-mente podem ser enfrentadas por juízes, em razão dos predicamentos que cercam a função. Logo, esse auxílio tem potencial capacidade de reduzir conflitos e tensões intrainstitucionais. Por outro lado, aproveitando-se da experiência presente dos juí-zes auxiliares, a padronização de alguns procedimentos pode ser realizada de forma mais ágil, porquanto eles podem atuar como interlocutores entre o corregedor e o corpo de magistrados, ajudando na construção de consensos e na efetiva implemen-tação de práticas procedimentais mais eficazes.

O campo, enfim, é vasto para a construção de um Poder Judiciário que substituta a hierarquização que imobiliza pela participação que dinamiza e melhora a prestação dos serviços jurisdicionais, tudo dentro do espírito de garantir ao cidadão uma jus-tiça mais acessível, célere e substancialmente justa.

Nessa mesma quadra, vejo também a necessidade de se repensar o papel dos juízes-diretores de foro na Justiça do Trabalho. Em geral, essa função não é desempenhada com o potencial que poderia ter, notadamente dentro de um espírito de descentra-lização administrativa, que teria, dentre outras tantos aspectos positivos, o condão de preparar, progressivamente, o magistrado para o desempenho de outras funções administrativas dentro do próprio tribunal, como a presidência mais adiante.

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Na maioria dos tribunais que conheço, não é assegurado ao juiz-diretor de foro qualquer margem de autonomia orçamentária ou administrativa, sendo presente muita concentração de encargos na própria presidência do tribunal ou na diretoria-geral e administrativa, essas últimas exercidas por servidores.

Há casos em que o diretor-geral do tribunal recebe delegação da presidência para nomear servidores para funções comissionadas, conceder diárias e férias, etc., e o diretor do foro não pode desempenhar nenhuma dessas tarefas.

A meu juízo, cuida-se de uma inversão hierárquica que se atrita com a ideia de go-verno dos juízes.

O resultado dessa disfunção institucional é o afastamento e o descomprometimento dos juízes com as questões administrativas, implicando na existência de um ‘arquipélago de juízes’, no lugar de um continente integrado e participativo do corpo de magistrados. É de se lembrar que só muito recentemente foi assegurado, de forma nacional, a indicação do diretor de secretaria pelo juiz titular de Vara. Como se poderia pensar em planejamento estratégico nessa época?

Creio, portanto, que fortalecer o papel dos juízes-diretores de foro é um fator de desenvolvimento institucional, na medida em que descentraliza a administração, trazendo o administrador para mais próximo dos problemas. Além disso, como assi-nalei, é aspecto que pode contribuir para o aprimoramento de uma cultura adminis-trativa no seio dos magistrados, que vão, ainda no primeiro grau, familiarizando-se com temas como orçamento público, licitações, regime jurídico dos servidores, etc.

8. Conclusão

As propostas até agora adotadas pela Justiça do Trabalho buscam a eficiência judiciá-ria e não consideram adotar um caminho que possa reconhecer nas suas ações a possi-bilidade de transformação social, na esteira dos objetivos fundamentais da República. Enquanto a marcha continuar, o rumo que tomamos não é importante, pois não refletimos a respeito dele.

Esse primeiro aspecto implica em buscar caminhos que levem a solução, não apenas dos processos judiciais, mas dos problemas neles encontrados. É dever da justiça exercer seu escopo pedagógico, lançando luzes nas situações “litigiogênicas”, isto é, geradoras de conflitos, de litígios judiciais.

Essa busca pressupõe o autoconhecimento da instituição e a constatação de que al-guns dos seus principais atores estão alijados da tomada de decisões, como é o caso da maior porção dos juízes.

O modelo gerencial da administração dos tribunais é um simulacro do modelo da competência funcional no processo judiciário, mas não confere ao juiz de primeiro grau um papel decisório ou de gestão.

O governo dos juízes, previsto na Constituição brasileira, é fundamental na susten-tação do projeto de mudanças.

Assim, o Judiciário que queremos deve ser aquele que saiba qual o caminho deve seguir: “Comece pelo começo, siga até chegar ao fim e então, pare” (Lewis Carroll).

(28)

Sobre a efetividade das tutelas

jurisdicionais do trabalho

*

LUCiANO AthAyde ChAveS**

“Para uma revolução democrática da justiça, não basta a rapidez. É necessária,acima de tudo, uma justiça cidadã”1

1. Morosidade como entrave à efetividade

A efetividade dos direitos compreende um fenômeno multidimensional.

Num esforço para uma síntese, creio ser possível compreendê-lo a partir de, pelo menos, dois planos.

O primeiro diz respeito ao plano da eficácia dos direitos – os fundamentais e so-ciais em particular – pela simples observância por parte dos atores soso-ciais. É dizer: o cumprimento voluntário e não judicializado dos direitos, em decorrência de um desenvolvimento sociocultural que viabilize tal nível de internalização – tanto no plano individual como coletivo – de direitos e deveres, de modo que se verifique uma baixa taxa de litigiosidade.

Esse quadro aponta uma das características das democracias de alta intensidade, institucionalizada por meio de um Estado de Direito forte e presente, onde a parti-cipação do Poder Judiciário, no cenário político, deveria estar reservada a temas de maior relevância, com alto grau de complexidade.

* Texto elaborado como contribuição científica ao III Simpósio Nacional de Direito do Trabalho, realizado em

Angra dos Reis, Rio de Janeiro, entre os dias 25 a 27 de março de 2010, sob a coordenação dos Ministros do Tribunal superior do Trabalho ives Gandra Martins Filho e Maurício Godinho delgado, com apoio da Anamatra. iN: MARTiNs FiLho, ives Gandra et ali (coords.). A efetividade do direito e do processo do trabalho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 285 a 299.

** Juiz do Trabalho da 21ª Região (RN). Mestre em ciências sociais pela universidade Federal do Rio Grande do

Norte. Professor de Direito Processual do Trabalho e de Hermenêutica e Teoria da Argumentação Jurídica da universidade Federal do Rio Grande do Norte. Membro do instituto brasileiro de direito Processual. Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (2009-2011). E-mail: luciano@anamatra.org.br.

Referências

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