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Monitorização de cães submetidos a tratamento com doxorrubicina

Em Medicina Veterinária não existem critérios definidos que impossibilitem o início da terapia com DOX, ficando este aspeto ao critério do Médico Veterinário. Ratterree et al.

(2012) consideram prudente não iniciar DOX em cães que manifestam arritmias ou

alterações de condução na avaliação cardíaca pré-quimioterapia, como complexos prematuros ventriculares a ritmo bigémino ou trigémino e taquicardia ventricular ou supraventricular. Da mesma forma, animais com FE menor do que 20%, insuficiência valvular grave ou CM não deverão, segundo os mesmos autores, ser submetidos a tratamento com DOX. Desta forma, o procedimento ideal, antes de ser iniciado o tratamento com DOX, inclui a avaliação da estrutura e função cardíacas. Desta forma, seria possível a identificação de animais de risco, bem como o acompanhamento da função cardíaca do animal, sendo possível determinar o limite de segurança de administração de DOX, já que a sensibilidade ao fármaco varia consoante o animal (Jurcut et al., 2008; Ratterree et al., 2012; Withrow et al., 2013). Neste sentido, os exames complementares mais frequentemente realizados são o ECG e a ecocardiografia (Esquema 1). De realçar que, caso seja detetada arritmia no ECG, poderá ser benéfica a realização de exame Holter (Ratterree et al., 2012). O exame físico é, também, considerado importante, devendo ser realizado, quer antes de ser iniciado o tratamento, como antes de cada sessão, para detetar qualquer alteração, como sopro, arritmias, ou défice de pulso. Num estudo realizado por Ratterree et al. (2012) três cães desenvolveram sopro ao longo do decorrer do tratamento, dois com DC de 60 mg/m2 e um com 90mg/m2.

Como foi anteriormente mencionado, torna-se essencial a monitorização dos animais que são submetidos a tratamento que inclua o uso de DOX, dado que a cardiotoxicidade poderá surgir em qualquer fase do tratamento. De mencionar que ainda não foram criadas

guidelines relativas à avaliação e acompanhamento de cães submetidos a terapia com DOX,

quer a nível de exames complementares a realizar, como ao momento em que os mesmos deverão ser realizados (Gallay-Lepoutre et al., 2016). Ratterree et al. (2012) e Gallay- Lepoutre et al. (2016) consideram que os métodos de controlo atualmente utilizados podem ter valor preditivo insuficiente para a deteção de cardiotoxicidade precoce.

As técnicas não-invasivas são, efetivamente, as mais rotineiramente utilizadas na prática clínica, para a avaliação da potencial cardiotoxicidade da DOX. Entre elas consideram-se a radiografia de tórax, a ecocardiografia e o ECG (Ratterree et al., 2012). Como foi anteriormente referido, a ecocardiografia é considerada pouco sensível na deteção de alterações precoces a nível da função miocárdica, não indicando se os animais irão desenvolver CM induzida por DOX, ou quando esta poderá ocorrer (Mauldin et al. 1992; Ratterree et al., 2012). De salientar que a IC poderá ocorrer mesmo quando é preservada a função sistólica (Jurcut et al., 2008; Gallay-Lepoutre et al., 2016). A lesão ao nível dos miócitos cardíacos precede as alterações funcionais. Deste modo, a alteração dos parâmetros ecocardiográficos poderá ocorrer em fases mais tardias (Ewer e Ewer, 2009). De salientar que as alterações hemodinâmicas poderão, também, ser responsáveis pelas alterações ao nível dos parâmetros da função sistólica (Gillings et al., 2009). Assim, uma vez que a FE e FEVE são influenciadas pela pré-carga e pós-carga, tornam-se parâmetros menos específicos na quantificação da função sistólica (Sousa et al., 2014). Deste modo, os resultados obtidos devem ser interpretados cuidadosamente, de acordo com o estado clínico do animal, dadas as intercorrências, que são frequentes em animais submetidos a tratamento quimioterápico (i.e. febre, anemia, septicemia ou insuficiência renal) (Nascimento e Martins, 2005). Depreende-se, assim, a importância da primeira avaliação e do acompanhamento do animal, já que nos permite ter a perceção se a diminuição da contratilidade é progressiva, com o decorrer do tratamento, o que sugere cardiotoxicidade, ou se se trata de uma queda brusca após valores normais, que poderá ter origem noutros fatores (Steinherz et al., 1992).

Souza e Camacho (2006) defendem que a ecocardiografia poderá ser eficaz na deteção da diminuição progressiva da contratilidade e CM secundária a DOX. Deste modo, Nelson e Couto (2009) e Tilley et al. (2008) recomendam a realização de ecocardiografia, antes de cada sessão de quimioterapia com DOX, após ser atingida a DC de 90mg/m2 (Esquema 1). Caso o animal tenha doença valvular degenerativa, doença cardíaca congénita ou CMD, será recomendada a realização de ecocardiografia antes de cada sessão de quimioterapia (Ratterree et al., 2012).

Caso seja reportada intolerância ao exercício, por parte do proprietário, ou seja detetada arritmia ao exame físico, a ecocardiografia deverá ser realizada, independentemente da DC implicada. Torna-se importante referir que, quando a FE diminui abaixo dos 25%, está recomendado cessar a terapia com DOX (Silva e Camacho, 2005).

Ratterree et al. (2012) consideram essencial a conjugação da ecocardiografia com o ECG. Efetivamente, os mesmos autores estimam que, através da realização dos exames complementares anteriormente mencionados, antes de ser iniciado o tratamento, seria

possível detetar alterações cardíacas preexistentes, que contraindicariam a administração de DOX em cerca de 10% dos cães.

Tilley et al. (2008) recomendam a realização de ECG antes de cada sessão de quimioterapia com DOX. Caso sejam verificadas arritmias os autores defendem a descontinuação do fármaco (Esquema 1).

DeFrancesco et al. (2002) defendem que as troponinas I e T têm potencial para deteção da lesão cardíaca subclínica. Deste modo, a determinação da sua concentração permite uma intervenção precoce, antes de ser verificada uma lesão cardíaca clinicamente relevante. Assim, segundo os autores, estes biomarcadores devem ser monitorizados durante o tratamento com DOX. Contudo, não existem recomendações no que concerne ao momento ideal para medição dos destes biomarcadores, já que a perda de cardiomiócitos continua a decorrer, mesmo depois da administração do fármaco. Com base nos resultados de um estudo, realizado pelos mesmos autores, o momento mais indicado para a avaliação dos valores de troponina T seria cerca de 2 a 3 semanas após a administração do fármaco. Os autores sugerem que a medição seja feita após cada dose, quando atingida a DC de 90mg/m2. A concentração de troponina T mais alta, registada no estudo, ocorreu 2 semanas após a última sessão de quimioterapia, correspondente a DC de 180mg/m2. Seis semanas após a última administração de DOX, o cão desenvolveu arritmia ventricular. É importante destacar que o animal, apesar de apresentar níveis séricos de troponina T elevados, não manifestou alterações compatíveis com cardiotoxicidade, quer no ECG, como na ecocardiografia, quando realizado o controlo (DC de 90 e 150 mg/m2). Desta forma, torna-se percetível quer a necessidade de seguimento do animal com controlos regulares, mesmo após o término da quimioterapia, como o benefício da associação de vários exames complementares para deteção da cardiotoxicidade em fase precoce (Esquema 1) (DeFrancesco et al. 2002).

Os intervalos ideais para medição dos restantes biomarcadores estão, ainda, em estudo (Gallay-Lepoutre et al., 2016)

Conclui-se que todos os métodos de monitorização exigem testes de base, para que seja possível aferir acerca da evolução do animal. Nenhum método para a deteção de cardiotoxicidade induzida pela DOX tem sido infalível, sendo necessária a combinação de vários exames complementares, por forma a detetá-la precocemente (Steinherz et al., 1992; Ratterree et al., 2012; Gallay-Lepoutre et al., 2016).

Assim, depreende-se que os cardiologistas e os oncologistas devem continuar a trabalhar em conjunto, por forma a identificar animais de alto risco e aqueles com maior sensibilidade ao fármaco, antes de a função sistólica apresentar alterações significativas, ou

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