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Para Severino, a "moral é uma experiência comum à humanidade. A sensibilidade moral possibilita que os sujeitos avaliem suas ações, geralmente como boas ou más, lícitas ou ilícitas, corretas ou incorretas." (2001, p. 91)

A palavra moral tem sua origem no latim, no adjetivo moralis, que advêm do substantivo mos: regra, costume, morada; ou aos costumes que vivem e realizam na morada. Assim esse termo congrega, concomitantemente, substância e qualidade para expressar e conduzir a maneira do comportamento

humano. Já a palavra ética tem sua origem no grego ethos, substantivo que também serve para designar costume. Para Abbagnano, ética é a "ciência da conduta". (2007, p. 380)

No decorrer da história, o convívio entre as pessoas vem sendo regulado por princípios, normas e regras focadas em diferentes questões e princípios, seguindo costumes e valores culturalmente construídos, mas que também se modificam. Para Marilena Chauí:

Diferentes formações sociais e culturais instituíram conjuntos de valores éticos como padrões de conduta, de relações intersubjetivas e interpessoais, de comportamentos sociais que pudessem garantir a integridade física e psíquica de seus membros e a conservação do grupo social. (2000, p.432)

Abbagnano aponta, em seu Dicionário de Filosofia, a identidade do termo moral com a ética: "o mesmo que ética" e "objeto da ética". (2007. p. 682)

Levando-se em consideração o aspecto etimológico, Ademar Heemann afirma que os dois termos "guardam analogia, [referem-se] ao comportamento humano estabelecido pelo hábito, pelos costumes (...) possuindo, portanto significados semelhantes". (1989, p. 11)

Por outro lado, ainda Chauí adverte que:

Em grego, existem duas vogais para pronunciar e grafar nossa vogal e: uma vogal breve, chamada épsilon, e uma vogal longa, chamada eta. Ethos, escrita com a vogal longa (ethos com eta), significa costume; porém, escrita com a vogal breve (ethos com epsilon), significa caráter, índole natural, temperamento, conjunto das disposições físicas e psíquicas de uma pessoa. Nesse segundo sentido, ethos se refere às características pessoais de cada um que determinam quais virtudes e quais vícios cada um é capaz de praticar. Refere-se, portanto, ao senso moral e à consciência ética individuais57. (2000, p. 437)

Durante a Idade Média, no mundo ocidental, predominaram as concepções difundidas por Santo Agostinho (século IV) e São Tomas de Aquino (século XIII), em que os fundamentos da vida humana, da ética, e dos princípios sobre o bem e o mal são a obediência a Deus. (TESSER, 2001, p.75).

Já na Idade Moderna, sob a influência do racionalismo e do iluminismo, a concepção de moral é explorada e difundida por Kant (1724-1804). Segundo

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o Dicionário de Filosofia, de Japiassu/Marcondes, para Kant a moral "pertence à esfera da razão prática que responde à pergunta: O que devemos fazer?" (2001, p.134)

Na obra A Fundamentação da metafísica dos costumes, Kant explicita que

todos os conceitos morais tem sua sede (Sitz) e origem (Ursprung) completamente a priori, na razão, e isso, tanto na razão mais vulgar quanto na mais altamente especulativa; que não podem ser abstraídos de nenhum conhecimento empírico; se encontrarão simplesmente em conceitos racionais e não em qualquer outra parte. (APUD: GALEFFI, 1986, p. 46)

Assim para esse filósofo, é a razão que determina a vontade humana. Ainda partindo deste pressuposto, a autonomia passa a ser o princípio supremo da moralidade e a liberdade é a condição que possibilita e viabiliza a autonomia. "(...) o que constitui o valor particular de uma vontade absolutamente boa, valor superior a todo o preço, é que o princípio da ação seja livre de todas as influências (...)" (Ibid, 1986, p. 65)

É o filósofo Romano Galeffi quem distingue com clareza os conceitos de autonomia e heteronomia da ação moral apresentados por Kant:

Quem quer que seja que cumpra uma ação para obedecer a outra pessoa ou a uma lei que provém de fora, pode achar-se perante estas duas alternativas: ou, obedecendo, ele é consciente de seguir a voz da própria razão independentemente de toda finalidade extrínseca, e, neste caso, ele obedece substancialmente à sua própria lei interior, e a sua ação é moral; ou então, ele, obedece – por simples obséquio – à autoridade, sem razão ou contra o próprio juízo da razão, isto é, por puro espírito servil, subjugado pelo medo de um castigo ou estimulado pela esperança de um prêmio, e, então, não se pode dizer que ele age moralmente embora a sua ação possa objetivamente ser incluída entre aquelas conformes a um reto agir e julgada exteriormente por todos como uma ‘boa ação’. (1986, p. 160)

Nos séculos XIX e XX, a moral e os estudos sobre a ética passaram a ser objeto de estudo científico e diversos autores apresentaram importantes reflexões sobre a moral, em que se destacam: Hegel, Schopenhaver, Nietzche, Durkheim, Kierkegaard, Habermas, Piaget, Kohlberg, Feyerabend, Tugendhat, Puig. Para este estudo serão particularmente evidenciadas as contribuições de Durkheim, Piaget e Puig, cujos pressupostos esclarecem melhor a prática educativa das aulas de Moral Cristã na Ação Social Nossa Senhora de Fátima.

maneiras de agir e linguagem que já foram estabelecidas pela sociedade e assim os que nascem são condicionados a internalizarem esses "fatos sociais". Carlos Lucena esclarece que, para Durkheim, a educação moral é a via mais eficaz para a sobrevivência da própria sociedade:

A educação é para a sociedade o meio pela qual ela prepara as condições essenciais da própria existência. É a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontrem ainda preparadas para a vida social, tendo por objetivo suscitar e desenvolver, certo número de talentos físicos, intelectuais e morais. (...)

A educação consiste em habituar os indivíduos a uma disciplina (...). Formar os indivíduos, tendo em vista a integração na sociedade, é torná-las conscientes das normas que devem orientar a conduta de cada um e do valor imanente e transcendente das coletividades que cada homem pertence ou deverá pertencer. (2010, p. 302-303)

Sob este aspecto, pode-se afirmar que, no sentido kantiano, a formação moral para Durkheim, ocorre de maneira heterônoma, embora ele próprio considere que a autonomia moral ocorra "pela sujeição voluntária às normas sociais" (LIMA, 2003, p. 36).

Ao pensar e preparar as aulas de Moral Cristã, Frei Xavier intenta despertar a consciência dos jovens e favorecer o seu amadurecimento. Neste processo também busca valorizar a vida, elemento que segundo Araújo “fornece a base para a construção da identidade e do auto-conceito do sujeito.” (2007, p. 5).

Ainda para FreiXavier, “se ela [pessoa] não dá valor a sua própria vida, ou se dá valor ao que não é o bem, ele está desvalorizando a própria vida, a si própria, e a sua dignidade. Sem dignidade você não é uma pessoa.” 58

Termo que também se tornou relevante neste estudo sobre moral, é a

dignidade. De origem na língua latina, dignitas é um substantivo que significa "o que tem valor, compatível com os propósitos, mérito e indicava um cargo

honorífico no Estado". (COMPARATO, s.d.: p. 1259). Também há o adjetivo

dignus, que tem o sentido de "conveniente ou apropriado". (idem p.11)

O termo (dignitas, - tatis), ainda para Comparato, significa “qualidade moral que infunde respeito, consciência de valor, honra, autoridade, nobreza, respeito aos sentimentos, valores, o que é digno. Qualidade do que é digno e merece respeito ou reverência”. (ibid. id)

58 Trecho da entrevista concedida em abril de 2012 para a autora desta dissertação, que está

Para Kant, a dignidade reside no fato de que a humanidade, diferente dos demais seres da natureza ou dos objetos, não pode ser valorada no sentido comercial, nem tampouco utilizada como um meio para atingir determinado fim, uma vez que o homem é um fim em si mesmo. A dignidade humana é inerente ao homem:

[...] no reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode por-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade... Esta apreciação dá, pois a conhecer como dignidade o valor de uma tal disposição de espírito e põe- na infinitamente acima de todo o preço. Nunca ela pode ser posta em cálculo ou confronto com qualquer coisa que tivesse um preço, sem de qualquer modo ferir a sua santidade. (KANt apud SARLET. 2008. p. 34)

Leonardo Boff considera que “dignidade é um valor. E todo valor comporta (...) uma atitude de fascinação em face do outro.” (2004, p. 52) Para o teólogo, “a atitude de fascinação” consiste na percepção do outro, na admiração pela sua humanidade, que leva tanto à amizade, como também à admiração e, ao (re)conhecimento da sua dor e das suas necessidades de maneira incondicional. Ou seja, independente da raça, povo, confissão religiosa, condição social ou financeira.

Consiste no fato de que alguém está aí, vivo e presente. Toda vida, particularmente a humana, constitui uma realidade indisponível, não descartável e, de certa forma, irredutível. Vida é algo que nós não produzimos, mas acolhemos. (id.ibidem)

Para Severino, "a dignidade do humano é o lastro da moralidade" (2001, p. 94). Saber viver bem é uma disposição humana diversificada, em que a convivência demanda o compromisso consigo, com o outro, com a sociedade e com o planeta.