• Nenhum resultado encontrado

O movimento krausista na Espanha

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 119-143)

II. LA REGENTA: O RETRATO DE UMA SOCIEDADE LEITORA

2.2. As figuras da leitura e do leitor em La Regenta

2.2.2. As leituras de Ana Ozores e as quatro fases correspondentes à educação da personagem

2.2.2.2. O movimento krausista na Espanha

O introdutor do movimento Krausista na Espanha foi Julián Sanz del Río que, em 1843, é nomeado professor interino de Filosofia da Universidad

Central de Madrid, sob a condição expressa de aperfeiçoar seus

conhecimentos pedagógicos na Alemanha. Em território alemão, Sanz del Río entra em contato com o ambiente intelectual, demonstrando um grande interesse, sobretudo, pela filosofia de Karl Christian Friedrich Krause (1781-

1832). Sánz encontrou em Krause o que nenhum dos outros filósofos oferecia a um espírito tão inquieto e profundamente religioso como o seu: a conciliação da religião com a ciência. O krausismo na Espanha passa a adquirir vida própria, adaptando-se “às necessidades intelectuais de seus protagonistas e, sobretudo, ao impulso religioso que o anima, assim como a tentativa de conciliação do mesmo com o avanço científico” (VIVES, 1999. Tradução nossa)55, o que nos evidencia a retomada de algumas das principais diretrizes de Krause, reformuladas e redirecionadas às novas propostas krausistas.

A partir desta identificação, podemos dizer que o racionalismo harmônico e o panteísmo krausista apareceram para Sánz como uma resposta para todas as suas dúvidas, contribuindo, assim, para a implantação do movimento krausista na Espanha. Plantadas as sementes krausistas no terreno da educação, os professores da Universidad Central de

Madrid, Francisco Giner de los Ríos, Canalejas e Salmerón, com o objetivo

de disseminar a filosofia krausista, fundam, em 1876, a Institución Libre de

Enseñanza, a maior conquista do movimento. É válido comentar que, pelo

Real Decreto de 25 de fevereiro de 1875, todos os professores deveriam apresentar às autoridades competentes seus planos de estudo e livros didáticos, o que, indubitavelmente, consistia numa grande violação do princípio de liberdade do ensino, uma das principais propostas do movimento krausista. No ano seguinte, amparados pela Constituição de 1876 que previa

55 “a las necesidades intelectuales de sus protagonistas y, sobre todo, al impulso religioso que lo anima, así como el intento de conciliación del mismo con el avance científico”.

o reconhecimento da liberdade do ensino, os respectivos professores krausistas, com o objetivo de introduzir uma moderna pedagogia racionalista e, assim, promover uma verdadeira renovação didática, fundam a instituição, que inicia suas atividades em outubro deste mesmo ano, sob a coordenção de Giner de los Ríos.

Baseada nos princípios krausistas a Institución Libre de Enseñanza se opunha à educação clerical predominante. Propuseram uma educação liberal e científica, permitindo o desenvolvimento das potencialidades dos indivíduos que, através de desafios, eram levados a pensar e a refletir sobre determinados assuntos ou pontos de vista. Incentivaram um novo estilo na relação entre professores e alunos, o que, conseqüentemente, acarretou a formação de um espírito altamente crítico e reflexivo, fato que, sem dúvida alguma, muito motivou e incentivou os aprendizes a construírem o conhecimento, não através de métodos defasados e ineficazes, mas sim por meio de uma lógica que priorizava, acima de tudo, o raciocínio e o senso crítico.

Com relação a sua filosofia de vida, os krausistas acreditavam que todas as religiões tinham algo de bom e de verdadeiro, e que o homem deveria fazer uso de sua razão para escolher a melhor, apelando, em casos de dúvida, para sua consciência como juízo final. Assim, não existiria dogma nem rito que não devesse ser submetido ao espírito crítico, questionador. O princípio do livre arbítrio era fundamental no sistema krausista, e, naturalmente, provocou um antagonismo absoluto por parte dos conservadores, que, a todo instante, procuravam conter as grandiosas

conquistas de um ensino laico e liberal. É importante afirmar que o livre arbítrio na filosofia krausista não se limitou somente à religião; este pôde se estender à filosofia, à política e a todas as manifestações da vida, fato que muito preocupou os setores mais tradicionalistas da época, aliados à Igreja Católica, que viam no movimento uma grande ameaça ao equilíbrio e à hegemonia do sistema monárquico vigente na Espanha. No capítulo IV de La

Regenta, há uma cena em que podemos ver claramente a aparição desta

defesa do livre arbítrio, presente no discurso de dom Carlos, o que vem a corroborar o quão o movimento krausista tornou-se fundamental à estrutura narrativa da obra, em especial, à construção do respectivo personagem, defensor dos ideais liberais. Citamos:

Sólo aquello que el rubor más elemental manda que se tape, era lo que ocultaba don Carlos a su hija. Todo lo demás podía y debía conocerlo. ¿Por qué no? Y con multitud de citas explicaba y recomendaba Ozores la educación omnilateral y armónica, como la entendía él.

- Yo quiero- concluía- que mi hija sepa el bien y el mal para que libremente escoja el bien; porque si no ¿qué mérito tendrán sus obras?. (ALAS, 1997, p.142-143).

Por isso, nos pareceu de extrema pertinência realizar um breve comentário sobre o movimento krausista na Espanha, resgatando a memória de seus precursores que muito se empenharam, assim como os primeiros historiadores nacionais da literatura espanhola, em “desenhar uma tradição literária capaz de proporcionar fundamento à Espanha liberal, e com seu núcleo central compartilhado pelo Quixote e pelo teatro <<nacional>>”

(tradução nossa)56, tal como apresenta Oleza (2003) em “Lecturas y lectores de Clarín”.

Com base nos moldes da educação krausista, vimos que Anita, no período em que esteve orientada pelo pai, entra em contato com diversos tipos de leitura, ampliando seus horizontes e enriquecendo o seu conhecimento. Carlos Ozores, um personagem instruído em várias matérias, amava a literatura com ardor, e, ao longo de sua vida, pôde reunir uma expressiva biblioteca, a qual continha, dentre muitas obras, livros condenados pelo Índice. Dado ao fácil acesso à biblioteca, Ana, talvez pelo fato de invejar os deuses de Homero, que viviam como ela havia sonhado que se deveria viver, ao ar livre, com muita luz e muitas aventuras, lê várias obras clássicas, adquirindo, assim, um grande interesse pela mitologia grega: “(...) sabía mucha Mitología, con velos y sin ellos” (ALAS, 1997, p.142).

Despertado o desejo pela leitura, Ana Ozores começa buscar novos livros, e nessa busca incessante pela leitura, a jovem, que limpava as estantes da biblioteca de dom Carlos, se depara como um volume em francês das Confesiones de San Agustín. No mesmo instante, sentiu-se tomada por um impulso irresistível e decidiu, imediatamente, iniciar a leitura do livro. Ana o lia com a alma agarrada às letras e quando concluía uma página, seu espírito já estava lendo a outra, e, e devido a esta fascinação, vimos que a leitura da obra provoca em Ana Ozores o surgimento do primeiro impulso místico. Vejamos:

56 “diseñar una tradición literaria capaz de proporcionar fundamento a la España liberal, y con su núcleo central compartido por el Quijote y el teatro <<nacional>>”.

(...) seguía leyendo; aún estaba aturdida, casi espantada por aquella voz que oyera dentro de sí, cuando llegó al pasaje en donde el santo refiere que, paseándose él también por un jardín, oyó una voz que le decía "Tolle, lege", y corrió al texto sagrado y leyó un versículo de la Biblia... Ana gritó, sintió un temblor por toda la piel de su cuerpo y en la raíz de los cabellos como un soplo que los erizó y los dejó erizados muchos segundos. Tuvo miedo de lo sobrenatural; creyó que iba a aparecérsele algo... Pero aquel pánico pasó, y la pobre niña sin madre sintió dulce corriente que le suavizaba el pecho al subir a las fuentes de los ojos. Las lágrimas agolpándose en ellos le quitaban la vista. (Ibidem, p.147).

Ao entrar em contato com a literatura religiosa, a personagem muito se emociona, pois as leituras de Confesiones de San Agustín fizeram-na lembrar da falta que a presença materna fazia em sua vida. Muitas foram as noites em que a pobre menina passara chorando e lamentando a ausência das carícias e dos abraços aconchegantes da mãe que, por uma obstinação do destino, não conhecera. Ao encontrar, então, nas santas palavras de Agustín a paz e a luz que tanto buscava para suprir o vazio proveniente da falta do amor materno, notamos que Ana muito se identifica com a literatura mística, passando a ler, neste importante período de formação, obras como as poesias religiosas de Fray Luis de León: “Si queres, como algum dia,/ adorar cabelos louros,/ adora os de Maria,/ mais dourados e mais belos,/ que o sol claro ao meio-dia” (Ibidem, p.149) e o Cantar de los Cantares, na versão poética de San Juan de la Cruz. É importante comentar que estas obras foram fundamentais para a manifestação do langor místico que envolverá a personagem ao longo de sua trajetória como leitora. Foram estes acessos de religiosidade, que ela acreditara ter sido uma revelação providencial de uma vocação verdadeira, que determinaram as violentas

crises de histeria e enfermidades que puseram, por inúmeras vezes, sua vida em risco.

A partir da leitura desses livros, Ana Ozores consegue manifestar suas tendências e aspirações pessoais, comprovando como essa atividade pode interferir no comportamento e na formação do indivíduo leitor. Para enfatizar este pensamento, citamos um fragmento no qual a personagem, após ter lido o Cantar de los Cantares, de San Juan de la Cruz, sente-se inspirada e tenta compor versos dedicados à Mãe Celestial, revelando-nos, assim, os efeitos da leitura em sua vida:

(...) Abrió un libro de memorias, lo puso en sus rodillas, y escribió con lápiz en la primera página: << A la Virgen >>. Meditó, esperando la inspiración sagrada. Antes de escribir dejo hablar el pensamiento. Cuando el lápiz trazó el primer verso, ya estaba terminada, dentro del alma, la primera estancia. Siguió el lápiz corriendo sobre el papel, pero siempre el alma iba más de prisa; los versos engendraban los versos, como un beso provoca ciento; de cada concepto amoroso y rítmico brotan enjambres de ideas poéticas, que nacían vestidas con todos los colores y perfumes de aquel decir poético, sencillo, noble, apasionado. (Ibidem, p. 152).

Com a morte de dom Carlos, a jovem Ozores acaba ficando sob tutela de suas duas tias solteironas e beatas, Águeda e Anuncia, regressando novamente ao período de escuridão e repressão, e é nesta fase que a personagem, segundo Vives (2000), volta a manifestar, mais intensamente, sua vocação literária. O espírito de Ana almejava algo muito maior: ser ao mesmo tempo criadora e fruidora da literatura religiosa que tanto a fascinava. A jovem, que já não se contentava somente com as leituras, queria produzir, transferir para o papel (um caderno de versos) a expressão dos seus mais íntimos pensamentos e reflexões sobre a vida, porém, quando dona Anuncia

se depara com o caderno de versos de Ana Ozores, surge a primeira surpresa: “Una Ozores Literata”:

Cuando doña Anuncia topó en la mesilla de noche de Ana con un cuaderno de versos, un tintero y una pluma, manifestó igual asombro que si hubiese visto un revólver, una baraja o una botella de aguardiente. Aquello era cosa hombruna, un vicio de hombres vulgares, plebeyos. Si hubiera fumado, no hubiera sido mayor la estupefacción de aquellas señoras. ¡Una Ozores literata!. (ALAS, 1997, p.172).

O desejo de se tornar escritora, de escrever um livro: “salió sola, con el proyecto de empezar a escribir un libro, allá arriba, en la hondonada de los pinos que ella conocía bien; era una obra que días antes había imaginado, una colección de poesías << A la Virgen>>” (Ibidem, p.150), não condizia com a mesquinha realidade provinciana que a rodeava: “Tan general y viva fue la protesta del gran mundo de Vetusta contra los conatos literarios de Ana, que ella mismo se creyó en ridículo y engañada por la vanidad” (Ibidem, p.173). A partir deste fragmento, notamos que a atividade literária era tida como algo completamente abominável, um vício de homens vulgares e perdidos, não podendo se estender às mulheres burguesas que ainda eram educadas em função de um dado modelo de feminilidade, e, ao fazermos referências a este modelo, nos pareceu oportuno resgatar a figura do filósofo Rousseau que, em Émile (publicado em 1762), descreve com muita clareza os fundamentos do modelo de feminilidade que prevaleceu na Europa do século XIX, principalmente nos países católicos.

Para Rousseau (1995), a mulher no seu “puro estado da natureza” deveria ser domesticada para que seus desejos não prejudicassem, ou até

mesmo destruíssem a ordem social e a familiar. Valores como recato, pudor e vergonha deveriam ser cuidadosamente cultivados com o objetivo de conter todos aqueles desejos e componentes excessivos da natureza feminina, ameaçadores para a sociedade, o que torna compreensível o motivo pelo qual a Igreja Católica passa a predicar o modelo do filósofo iluminista.

As mulheres, segundo Rousseau, teriam de ostentar virtudes próprias da feminilidade como a docilidade e uma receptividade passiva em relação aos desejos e necessidade dos homens. Era fundamental que elas fossem educadas na timidez, em nome do equilíbrio das relações conjugais. Tornar- se-iam, desta maneira, recatadas, submissas e modestas para melhor poder governar a casa e a família, garantindo, assim, a tão almejada harmonia do lar, do espaço privado.

Educadas em função desse modelo de feminilidade que, segundo Stendhal57, inutilizava algumas das faculdades mais brilhantes capazes de propiciar felicidade tanto a elas quanto a seus companheiros, notamos que muitas das qualidades, idéias e ambições femininas permaneciam esmagadas por uma educação que as condenava à ignorância e à infantilidade, e, levando em consideração o fato de que “(...) las mujeres deben ocuparse en más dulces tareas; las musas no escriben, inspiran” (ALAS, 1997, p.173), vimos que Ana se vê obrigada a renunciar a essa primeira vocação, a literária, a fim de evitar não só um grande escândalo,

57 Ver Stendhal (Henry Beyle). “De l’Education des Femmes”, em De L’Amor. Paris: Calmann- Lévy, 1998.

como também a completa desmoralização dos Ozores na conservadora cidade. Citamos:

Tan general y viva fue la protesta del gran mundo de Vetusta contra los conatos literarios de Ana, que ella misma se creyó en ridículo y engañada por la vanidad. A solas en la alcoba algunas noches en que la tristeza la atormentaba, volvía a escribir versos, pero los rasgaba enseguida y arrojaba el papel por el balcón para que sus tías no tropezasen con el cuerpo del delito. (...) tuvo que renunciar en absoluto a la pluma; se juró a sí misma no ser la "literata" (Ibidem, p.173).

Fracassada a tentativa de se tornar uma escritora, não foi menor a oposição que encontrou em suas manifestações místicas, influenciadas pelas leituras religiosas. Nesta ocasião, a personagem, para se livrar de suas tias e da enfadonha vida que vivia no casarão dos Ozores, pensa em ir para um convento, tornar-se freira, mas foi o seu primeiro confessor, dom Cayetano, quem se opôs severamente a essa idéia improvisada e sem fundamento. Ana Ozores foi novamente obrigada a renunciar, desistindo da possibilidade de se tornar esposa de Jesús. Como exemplo, citamos um fragmento em que dom Cayetano a faz desistir do sacrifício, fazendo-a acreditar que tudo aquilo (insônias, exaltações nervosas, visões místicas, intuições poderosas da fé, enternecimentos repentinos e delírios) não passava de “coisas da idade”:

(...) procuró convencer a su amiguita de que su piedad, si era suficiente para una mujer honrada en el mundo, no bastaba para los sacrificios del claustro.

<<Todo aquello de haber llorado de amor leyendo a San Agustín y a San Juan de la Cruz no valía nada, había sido cosa de la edad crítica que atravesaba entonces. En cuanto a Chateaubriand, no había que hacer caso de él. Todo eso de hacerse monja sin vocación, estaba bien para el teatro, pero en el mundo no había Manriques ni Tenorios que escalasen conventos, a Dios gracias. La verdadera piedad consistía en

hacer feliz a tan cumplido y enamorado caballero como el señor Quintanar, su paisano y amigo.>>

Ana renunció poco a poco a la idea de ser monja. (Ibidem, p.180).

Preocupado com os excessos místicos que, muitas vezes, levavam a personagem a terríveis crises emocionais e a enfermidades gravíssimas, o confessor aconselhou Anita, aos dezenove anos de idade, a se casar. O pretendente era Víctor Quintanar, que, logo após ter se casado com Ana, torna-se o respeitado Regente de Audiência. Ao se casar com dom Víctor, a jovem, segundo Vives (2000), deixa de ser aquela pobre e desprotegida menina, da qual ainda se lembra com ternura, e se transforma em La

Regenta, a mulher mais bela e cobiçada da cidade. Para isso, vimos que a

personagem teve de renunciar todas as suas aspirações e vocações (literárias e religiosas), ajustando-se aos planos que suas tias e toda a sociedade de Vetusta tinham estabelecido: nem escritora nem mística, mas sim mulher do Regente, fato que também evidencia a presença do determinismo na obra, já que a protagonista, produto do meio, da realidade que a cerca, teve de seguir um caminho que não havia escolhido.

Muito mais que uma atividade voltada para o entretenimento, a leitura era tida também, em especial, pela Igreja Católica, como uma prática moralizante. O novo confessor de Ana Ozores, Fermín de Pas, el Magistral, percebendo a incipiente atração da jovem por Álvaro Mesía, chefe do partido liberal, seu maior adversário político, recomenda-lhe uma série de leituras santas, livros edificantes, com o propósito de orientá-la e alertá-la sobre os perigos da vida. El Magistral, leitor de revistas científicas, publicadas por

jesuítas, e autor de vários sermões e outros trabalhos literários, dentre eles a obra Historia de la Diócesis de Vetusta, tenta convencer Ana de que a melhor solução para evitar o surgimento de pensamentos impróprios, que pudessem levá-la ao caminho da perdição, ou seja, a consumação do adultério, seria a ocupação religiosa. Sua proposta era transformá-la beata, pois, assim, dedicaria sua vida à religião e não ao amor proibido. Citamos:

Más habló el Magistral para exponer el plan de vida devota a que había de entregarse en cuerpo y alma su amiga desde el día siguiente, y terminó tratando con detenimiento especial la cuestión de las lecturas.

Recomendó particularmente la vida de algunos santos y las obras de Santa Teresa y algunos místicos.

- Basta con leer la vida de la Santa Doctora y la de María de Chantal, Santa Juana Francisca, por supuesto, sabiendo leer entre líneas, para perfeccionarse, no al principio, sino más adelante. (ALAS, 1997, p.532).

No entanto, as leituras religiosas recomendadas por Fermín, nesta quarta fase relativa à educação da personagem, não produziram nenhum efeito em Ana, pelo contrário, só contribuíram para o agravamento da situação, pois cada vez que ela os lia, a personagem sentia-se muito mais entediada. Estes livros piedosos “la hacían caer en somnolencia melancólica o en una especie de marasmo intelectual que parecía estupidez” (Ibidem, p.547), e essa nítida insatisfação pôde ser percebida em uma cena de La

Regenta em que o próprio Magistral presencia o desprezo de Ozores, que,

depois de ter lido quase cinco minutos do livro que ele lhe havia presenteado, joga-o sobre um banco com desdém. Vejamos: “Había visto a la Regenta en el parque pasear, leyendo un libro que debía ser la historia de Santa Juana Francisca, que él mismo le había regalado. Pues bien, Ana,

después de leer cinco minutos, había arrojado el libro con desdén sobre un banco” (Ibidem, p.555).

Cada vez mais persistente em sua grande missão, convertê-la beata, o ambicioso clérigo continua direcioná-la à doutrina cristã, e é a partir da leitura da autobiografia de Santa Teresa que o confessor conseguirá os primeiros resultados, o que vem a corroborar não só os efeitos da leitura na vida da personagem leitora, mas também a ocorrência de uma educação moralizante feita por meio de livros santos.

Amar a Deus por intermédio da Santa, sua adorada heroína de tantas façanhas de espírito, de tantas vitórias sobre a carne, foi seu maior objetivo. Nesta nova fase, Ana Ozores, apesar da má assistência e de uma educação conturbada, dava estranhas formas à piedade sincera, ou seja, a distorcia, chegando a ponto de desejar encontrar semelhanças entre sua vida e a da religiosa, o que nos faz pensar na existência de um espírito de imitação que

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 119-143)

Documentos relacionados