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CAPÍTULO I UMA DISCUSSÃO EM TORNO DAS ATITUDES

1.4 Mudanças de atitudes

Podemos considerar que as mudanças ocorridas em algumas das componentes das atitudes podem levar a mudanças nas demais. Isso porque as dimensões das atitudes são interdependentes. Por exemplo, Deutsche e Collins (1951) mostraram como uma mudança no componente cognitivo pode gerar modificações afetivas e comportamentais nos sujeitos. Alguns estudos focalizam os componentes cognitivos ou mesmo no afetivo, porém, na literatura, conseguimos encontrar uma vasta discussão sobre o componente comportamental das atitudes e suas mudanças.

Isso pode ter relação com a tradição dos estudos acerca das atitudes em querer contribuir para predizer comportamentos sociais. Está no cerne dos estudos de Psicologia Social, a busca por explicar como as atitudes se desenvolvem e se modificam ao longo do tempo ou a partir de uma situação persuasiva, a fim de contribuir na compreensão de como estes elementos impactam no comportamento dos sujeitos (Freedman, Carlsmith & Sears, 1970).

19 De acordo com Rodrigues, Assmar e Jablonski (2000) as atitudes envolvem não apenas o que as pessoas pensam e sentem sobre os objetos atitudinais, mas também como gostariam de se comportar em relação a eles. Esses autores discutem que o comportamento é também determinado pelas normas sociais, pelos hábitos e pelas consequências esperadas do seu comportamento.

Portanto, parece não ser fácil determinar com exatidão qual fator estaria trabalhando para a mudança de uma atitude, uma vez que, o comportamento pode ser considerado uma resultante de várias atitudes.

Pela grande variedade de elementos que se relacionam com as mudanças de atitudes, a relação entre as atitudes e o comportamento tem sido alvo de diversos estudos (por exemplo, Festinger, 1957; Ajzen, 1991). As pesquisas que buscam discutir a relação entre esses dois elementos estão, sobretudo preocupadas em explicar as causas das mudanças de atitudes e/ou o quão resistentes elas podem apresentar-se.

Podemos dizer que a discussão relativa a esse tema sempre foi uma preocupação da Psicologia Social. Thomas e Znanieck (1918 apud Rose, 2008) ao escreverem pela primeira vez sobre esse construto, ressaltaram:

É teoricamente possível saber quais influências sociais devem ser aplicadas a certas atitudes já existentes, com o objetivo de criar novas atitudes, e quais atitudes devem ser desenvolvidas levando em consideração certos valores sociais já existentes, com o objetivo de fazer o indivíduo ou o grupo produzir novos valores sociais. Não existe um único fenômeno em toda a esfera da vida humana que o controle consciente não consiga alcançar mais cedo ou mais tarde. (p. 160)

Nesse sentido, já percebia-se a busca dos autores em conhecer formas para controlar a conduta social humana. Mais tarde, Thurstone (1928) intitulou sugestivamente o seu artigo no American Journal of Sociology como “Attitudes can be measured” afirmando que as atitudes poderiam, a partir de então, ser controladas.

Há de se considerar também que os estudos relativos ao consumo e a persuasão ofereceram grandes contribuições para pensar como as atitudes podem ser modificadas.

Uma clássica investigação a esse respeito foi desenvolvida por LaPiere (1934). Entre os anos de 1930 e 1931, esse investigador visitou 64 hotéis e 184 restaurantes e cafés dos EUA com um jovem casal chinês. Em se tratando de um período de forte intolerância dos americanos com os orientais, o pesquisador esperava que os chineses não fossem bem recebidos nesses ambientes. Porém, ao contrário do que se poderia imaginar,

20 de todos os lugares visitados, apenas em um caso os serviços foram negados aos chineses em função da sua etnia.

Seis meses após a experiência, LaPiere enviou questionários a todos os estabelecimentos visitados indagando se os mesmos aceitariam membros da raça chinesa como convidados em seu estabelecimento. Os resultados obtidos mostraram que 90% dos locais indicaram inequivocamente que não aceitariam prestar serviços para clientes chineses. A principal conclusão de LaPiere foi que as ações sociais das pessoas não predizem suas atitudes sociais. De outro modo, aquilo que as pessoas dizem, nem sempre é o que elas fazem.

A clássica pesquisa de LaPiere nos convida a pensar que o comportamento humano não apresenta uma relação simples e direta com as atitudes, ou, como destaca Torres e Neiva (2011), “um único comportamento é tipicamente influenciado por vários outros fatores, além das atitudes” (p. 180).

Nesse sentido, é completamente possível que, hipoteticamente, dois sujeitos apresentem reações diferentes frente a um convite para responder questões de Estatística, mesmo tendo as mesmas pontuações numa escala de atitudes face à Estatística. Ou mesmo quando apresentando igual pontuação numa escala de atitudes, um participante tenha hesitado e refletido mais nas respostas do que o outro. Na perspectiva de Ajzen (2001) a explicação para isso consiste no fato de que determinadas atitudes são mais fortemente mantidas pelos indivíduos que outras.

Sobre isso, há diferentes perspectivas, teorias e modelos que buscam discutir sobre a consistência da relação entre as atitudes e o comportamento. Uma das teorias mais conhecidas nesse âmbito refere-se ao fenômeno da dissonância cognitiva. A dissonância cognitiva acontece quando dois elementos cognitivos tais como os conhecimentos, as opiniões ou as crenças que um sujeito mantêm não são coerentes com o objeto de atitudes. Assim, quando alguém apresenta um comportamento que não é consistente com o que pensa a cerca de determinado objeto de atitude, dizemos que existe uma dissonância.

Festinger (1957) investigou a dissonância cognitiva em pacientes com amnésia e em pacientes saudáveis. Os pacientes com amnésia não possuíam memória para apresentar um comportamento conflituoso com suas atitudes anteriores. Apesar disso, os pacientes mudaram suas atitudes para estarem mais adequados com o comportamento saldável. Para o autor, mesmo quando os indivíduos não têm memória de atitudes anteriores e comportamentos inconsistentes, processos implícitos ainda trabalham para realizar uma mudança de atitude.

21 A teoria da dissonância cognitiva é especialmente relevante para analisarmos situações que envolve a resolução de problemas, pois busca esclarecer o que se segue, psicologicamente, ao tomarmos uma decisão. Os experimentos de Festinger (Idem) evidenciam que após ponderar suas escolhas, o indivíduo apresenta uma tendência em valorizar a alternativa escolhida e a desvalorizar a alternativa que foi rejeitada como uma forma de afastar a dissonância.

Mais recentemente, a partir do avanço das tecnologias utilizadas em pesquisas neurais, podemos encontrar novas explicações que reforçam as evidências encontradas em estudos anteriores para as mudanças nas atitudes.

Sharot de Martino e Dolan (2009), ao discutirem sobre o processo de recompensa pós-decisional, perceberam que a resposta neural dos sujeitos da sua pesquisa era alterada pelo grau de comprometimento que os mesmos possuíam em relação ao objeto de atitude. Essa evidência parece estar em conformidade com a ideia de que atitudes menos consistentes poderiam ser mais facilmente modificadas. Assim, é possível que se um indivíduo sustenta baixo sentimento ou informação acerca de um objeto, mais fácil ele tenderá a mudar de atitude em relação a este objeto.

O fator maturacional também parece ter um papel importante para explicar as mudanças de atitudes, isso porque as atitudes podem passar por modificações ao longo do nosso desenvolvimento. Segundo Bastos (2007), as atitudes que formamos ao longo de nossas vivências sociais, sofrem influência, mais predominantemente, de elementos da ordem afetiva e relacional em sujeitos mais jovens, e de elementos de ordem cognitiva em indivíduos mais velhos.

Está particularmente presente no nosso senso comum que pessoas mais velhas tendem a mudar menos de opinião se comparadas às pessoas mais jovens. Isso pode estar relacionado a eventual ideia de que por terem tido menos experiências de vida, as crianças poderiam modificar facilmente suas opiniões. Acreditamos, portanto, que por nos deparamos com novas informações e situações, poderemos modificar nossas atitudes.

Essa concepção tem sentido no que alguns estudos acerca da formação das atitudes apresentam. Parece ser consensual que as mudanças de atitudes ocorrem, sobretudo, em função das novas informações, sensações e experiências a que o sujeito tem acesso ao longo da vida.

De uma maneira geral, ao longo do processo de socialização e desenvolvimento, são aprendidas atitudes a partir do contexto familiar, que posteriormente, passam a ser

22 advindas da influência dos amigos ou de outros tipos de experiência ao qual o sujeito entrará naturalmente em contato.

Nesse sentido, conforme o crescimento da criança, vai-se incorporando em seu repertório, valores, crenças e sentimentos que colaboram para a formação de atitudes sobre diferentes aspectos da vida. De outra maneira, podemos dizer que o aprendizado e a cultura conferem significados às experiências e sentimentos da criança, que a partir das suas interações poderá modificar ou manter suas atitudes.

Pode-se considerar, no entanto, que a estrutura das atitudes é relativamente estável. De acordo com Rosenberg e Hovland (1960 Apud Cacioppo; Petty & Geen, 1988), os indivíduos tendem a organizar os diferentes componentes de uma resposta acerca do objeto de atitude de forma coerente e harmoniosa ao longo da vida, tendendo a preferir situações de congruência entre os diferentes tipos de resposta que oferece.