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O MUNICIPIO NO CONTEXTO INTERESCALAR: A IMPORTÂNCIA DA ESCALA GEOGRÁFICA

2. ELEMENTOS TEÓRICO-CONCEITUAIS PARA COMPREENDER A DIMENSÃO GEOGRÁFICA DA EMANCIPAÇÃO MUNICIPAL NO BRASIL

2.3. O MUNICIPIO NO CONTEXTO INTERESCALAR: A IMPORTÂNCIA DA ESCALA GEOGRÁFICA

O município é uma parte institucionalizada do espaço geográfico onde é possível se desenvolver múltiplas relações, desde a escala local,regional nacional e mundial. Nesse sentido, o município pode representar um elo de uma rede de interações e de relações entre o que acontece localmente e os demais entes federados, a União e o Estado. Desse modo,

A lógica territorial também deve ser desvendada como resultado de mecanismo endógeno – relações que acontecem nos lugares entre agentes conectados pelos laços de proximidade espacial - e mecanismos exógenos – que fazem com que um mesmo lugar participe de várias escalas de organização espacial (DIAS, 2007, p. 20).

A ligação entre os entes federados nacionais e subnacionais, União, Estado, Distrito Federal e Município, pode ser entendida como uma rede de interações que se articulam numa perspectiva socioespacial e política, principalmente por se tratar de arranjos institucionais, que se expressam nas práticas espaciais cotidianas e também em um plano mais político de organização do espaço. Aqui, cabe fazer referência entre os fenômenos que se apresentam no lugar, mas, que estão relacionados a uma esfera nacional.

Para Castro (2005), a escala geográfica contribui para expressar e representar os modos de percepção e de concepções do real localizado. A compreensão de que existe uma rede de interação que se intensifica em decorrência da política de globalização do capital e do desenvolvimento técnico-científico- informacional não pode ser entendida como se não existisse a especificidade e a particularidade dos lugares, principalmente, quando se pensa na dimensão tempo- espaço abordado por Massey (2003). De acordo com a autora, existe uma diferenciação na forma de as pessoas se apropriarem dos fluxos de interação que faz do lugar o nó de uma rede globalizada. Assim,

Diferentes grupos sociais têm relacionamentos distintos com essa mobilidade diferenciada: algumas pessoas responsabilizam-se mais por elas do que outras; algumas dão início aos fluxos e movimentos, outras não; algumas ficam mais em sua extremidade receptoras do que outras; algumas são efetivamente aprisionadas por ela ( MASSEY, 2003, p. 179).

Assim, é importante compreender que o fenômeno local pode ter conexões com eventos empreendidos por sujeitos posicionados próximos e também distantes numa perspectivas transescalar, o que inevitavelmente leva o pesquisador a compreender a inseparabilidade entre o tamanho e o fenômeno. Nesse sentido, Harvey (2004) acrescenta que a formação da União Europeia é um longo histórico de transformações de territorialidades entre diversas escalas, mas as mudanças que ocorrem nessa escala têm implicações em outros lugares do mundo. Os espaços passam por transformações tanto no plano microescalar quanto macroescalar. Harvey (2004) aponta que:

Há um debate na França sobre como conceber os governos locais. Há uma cisão política entre uma concepção que adota ―localidades [municípios], departamentos [equivalentes a estados], nação-estados‖ (com todos os seus fortes atrativos tradicionais) e uma concepção que adota ―coletividade, regiões, Europa‖ (que refletem as novas realidades que estão sendo forjadas no nível da União Européia) O resultado dessa luta política terá importantes implicações para os modos de as pessoas organizarem sua vida comunitária (HARVEY, 2004, p. 109).

Ainda segundo a lógica mencionada por Harvey (2004) sobre a espacialidade dos processos em diferentes escalas e a conexão desses processos, para explicar a totalidade dos eventos é importante mencionar que a análise do mundo em qualquer escala, em particular, revela uma série de efeitos e processos que produzem diferenças geográficas, tanto no modo de vida, quanto nas relações políticas e culturais. Castro (1995) argumenta que a escala deve ser escolhida pelo pesquisador para melhor compreender o fenômeno, mensurá-lo. Portanto,

[...] sua contribuição é evidente, pois indica a espacialidade do processo decisório em diferentes escalas, não sendo, portanto, inferir o domínio sobre fatos de uma escala para outra. Estas perspectivas têm conseqüências imediatas quando o objeto do estudo é a territorialidade do poder e aponta a necessidade de diferenciar suas características em escalas diferentes, ou seja, a pertinência da medida deve ser mais que nunca, considerada‖ (CASTRO, 1995, p.128).

De acordo com Castro (1995), não há escalas mais ou menos válidas; a realidade, a concretude do real está contida em todas elas. Outro argumento destacado pela autora é que a escala da percepção está sempre presente no local onde se verifica o fenômeno. Portanto, ―[...] a escala é um artifício analítico que dá visibilidade ao real‖ (CASTRO, 1995, p.133). Para a autora:

Quando o tamanho muda as coisas mudam, o que não é pouco, pois tão importante quanto saber que as coisas mudam com o tamanho, é saber como elas mudam, quais os novos conteúdos nas novas dimensões. Esta é afinal uma problemática geográfica essencial (CASTRO, 1995, p.137).

É nessa perspectiva que se busca entender o município enquanto recorte espacial/local sem perder de vista as interferências provenientes de sujeitos que operam em outras escalas geográficas, no lugar, na região, no país e fora dele. Carlos (2007) argumenta que é no lugar que se vive, que se realizam as ações cotidianas e é ai que o mundo se expressa, é no lugar que as dimensões globais redefinem o seu conteúdo. Após a promulgação da Constituição Federal brasileira de 1988 e da tendência para a descentralização política, os municípios passaram a receber maior volume de atribuições e recursos em função da sua nova institucionalidade. Entende-se então, que, nesse contexto, se estabelece uma relação entre os novos encargos dos municípios e a política de reconstrução do Estado que se apresenta transferindo parte de suas funções para os seus entes federados, impulsionadas por uma ordem política mundial.