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ARTIGO 2 – CONHECENDO E RECONHECENDO A EDUCAÇÃO EM

5.3 Museu velho e museu novo, o objetivo é modernizar?

Ao visitar museus, é possível perceber que existe uma expressiva diferença de temas, arquitetura, recursos, dentre outros fatores que fazem os espaços museais únicos. Por vezes, há a impressão que alguns são “velhos” e outros “novos”. No caso dos museus de ciências, centros de ciências e museus de história natural, é importante enfatizar que existem algumas semelhanças entre ambos, porém, suas diferenças são marcantes. Cada um tem suas preocupações centrais, especificidade quanto à obtenção e organização dos acervos e também à investigação científica, o que deve ser esclarecido para que não ocorra o favorecimento de um tipo de museu em detrimento de outro.

Os Museus de História Natural descenderam dos Gabinetes de Curiosidades. A passagem daquele para esse ocorreu numa época em que a sociedade demandava mais explicações sobre natureza, seus fenômenos, sua organização, sua diversidade e as relações entre o mundo vivo e não vivo. Nesse período, a maior contribuição para as Ciências Naturais, neste aspecto, não coube as universidades, mas sim aos museus, que eram autênticas instituições de investigação científica (MARANDINO, 2009). Portanto, a educação voltada para o público não era sua principal meta, mas o crescimento do conhecimento científico por meio da pesquisa (CAZELLI et al., 1999). Esse objetivo se refletia na exposição das coleções, as quais eram tidas como santuários de objetos e organizadas de acordo com as disciplinas científicas (a partir de uma classificação e de forma repetida) (MCMANUS, 1992). Desta maneira, esses museus promoviam um certo distanciamento entre as coleções e os visitantes, principalmente, devido a sua linguagem e informações contidas na exposição.

Antigamente, esses museus eram administrados por curadores, que além de serem nomes renomados da pesquisa nas universidades também eram responsáveis pela elaboração da exposição. Outros profissionais, tidos como inferiores, como educadores, guias ou designers eram contratados para exercer determinadas funções (MCMANUS, 1992). Assim, o curador (detentor do conhecimento) selecionava e etiquetava os objetos e o designer organizava-os em câmaras de vidro ou dioramas.

Este tipo de museu, McManus (1992) classifica como “museu de primeira geração”. A autora ainda divide esse museu em dois estágios. O primeiro equivale aos museus descendentes dos Gabinetes de Curiosidades, que visa a pesquisa científica e que apresenta suas coleções de forma sistemática e de acordo com o desenvolvimento da

ciência. Nesses museus, são utilizados móveis de madeira maciça com portas de vidro, muitas amostras por estante e uma tendência contemplativa dos objetos (FIGURA 7).

Figura 7 - Saguão dos ossos do Museu Nacional dos Estados Unidos no início do século XX.

Fonte: https://naturalhistory.si.edu/exhibits/bone-hall/

Já o segundo estágio dos museus de primeira geração ocorre a partir de certas insatisfações quanto ao processo de difusão de conhecimento. Apesar da organização classificatória utilizada pelos curadores, as coleções ainda eram uma barreira de comunicação científica ao público. As pessoas tinham dificuldades de compreender as informações dos objetos, pois a linguagem científica era difícil. Então, as equipes museológicas passam a alterar a disposição taxonômica das coleções para um arranjo de objetos que explicassem algumas ideias científicas, como a evolução, os sistemas ecológicos e a energia nuclear (MCMANUS, 1992).

Outra mudança ocorrida na época foi a alteração dos enfoques científicos e educacionais desses museus; com o advento da especialização de áreas do conhecimento e também a demanda de outros meios para promover a educação (que não fosse a escola), ocorre o deslocamento da pesquisa científica para outras instituições, como as universidades, e o investimento no âmbito educacional dos museus (VALENTE, 2005). Os museus passam a ser colaboradores ou complementadores dos conteúdos escolares, uma vez que a educação nas escolas se restringia apenas até os oito anos de idade e depois disso a maioria das pessoas não continuava seus estudos, pois o ensino não era obrigatório (MCMANUS, 2013).

No intuito de aproximar o público do conteúdo exposto, foram introduzidos aparatos interativos a museografia, principalmente, nos museus do Canadá, Estados

Unidos e Inglaterra (MCMANUS, 1992). A mesma autora considera que esses empreendimentos revolucionários abriram as portas para novos profissionais dentro dos museus, tornando a setor educacional mais sofisticado e melhor equipado.

Ao contrário do que se possa imaginar, os museus de segunda geração não são uma transformação dos museus de primeira geração. Eles surgiram no final do século XVIII, acompanhando a revolução industrial. Nessa geração, a preservação de coleções antigas não é sua preocupação, seu principal foco é a ciência aplicada e a indústria. Portanto, seu objetivo é treinar pessoas, colecionar, conservar e pesquisar para atender os avanços tecnológicos (MCMANUS, 1992). Nesse sentido, as coleções são vistas como materiais didáticos de caráter demonstrativo, utilizados para treinar artesãos e outros profissionais a operarem máquinas.

O primeiro museu industrial foi o “Conservatoire des Arts et Métiers” (FIGURA 8), que foi inaugurado em Paris em 1794.

Figura 8 - A sala ferroviária, inaugurada em junho de 1944, no piso térreo do museu “Conservatoire des Arts et Métiers”.

Fonte: Photographie extraite de la brochure Le Conservatoire national des arts et métiers, Paris, La Documentation française illustrée, n° 60, décembre 1951.

O segundo estágio dos museus de segunda geração ocorreu no final do século XIX e foi muito influenciado pelos grandes espetáculos; esses museus investiram

enormemente no entretenimento, inserindo diversos aparatos interativos na exposição (MCMANUS, 1992). Dessa maneira, esses museus buscaram estimular não somente a transmissão de conhecimento científico, mas também a diversão. Esses aspectos cognitivos marcaram a transitoriedade das coleções, de enciclopédicas para espaços de comunicação.

Diferentemente dos museus de primeira e segunda geração, em que o foco está no objeto, os museus de terceira geração são voltados as ideias (MCMANUS, 1992). Esses museus se preocupam com a transmissão de conceitos científicos ao invés da contemplação de objetos ou a história do desenvolvimento científico. A ênfase desses museus está, geralmente, na ciência contemporânea ou tecnologia, sendo utilizados exibições interativas que requerem a manipulação do visitante como veículo de comunicação.

McManus (1992) aponta como uma das principais vertentes da terceira geração, os atuais Centros de Ciência, a exemplo do “Lawrence Hall of Science” (FIGURA 9) e o “Exploratorium”, ambos nos Estados Unidos.

Figura 9 - Planetário do Lawrence Hall of Science.

Fonte: Oleg Alexandrov; Wikimedia Common.

Nessas instituições, a preservação, gestão e difusão da história, produtos e influências socioculturais da ciência não estão presentes como nos museus de primeira geração.

O fato é que nos dias atuais são encontrados museus de todas essas gerações ao redor do mundo. Diferenças que dependem da história do museu, de seus objetivos, da administração, do tema, dos recursos e de sua base ideológica. Contudo, em um processo de musealização, é fundamental a consciência sobre essas gerações, a história e seus fundamentos, compreendendo que não há uma condição evolutiva entre os museus, quer dizer, o museu de primeira geração não tem o objetivo de se tornar um museu de terceira geração. A clareza desse conhecimento possibilita o desenvolvimento de propostas mais coerentes com o espaço. Nesse sentido, a concepção de função ou objetivo também é fundamental e deve ser refletida e discutida historicamente.