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DADOS GERAIS

4.2 Percepções dos idosos quanto às mudanças geradas em torno da eletrificação rural

4.2.5 Nível de consumo

Na procura pelo crescimento sempre está presente o sentimento de que o bom é quando se tem mais, não importando a qualidade desse acréscimo. Nesse sentido, são consideradas desenvolvidas as sociedades capazes de produzir continuamente. É por isso que as nações perseguem o desenvolvimento (este como sinônimo de crescimento econômico) com o objetivo de acumular cada vez mais bens, sem, no entanto, se preocupar com os efeitos dessa acumulação desenfreada (CASTORIADIS, 1987).

Na visão de Harvey (1996), o capitalismo, para manter seus mercados, se viu forçado a produzir desejos e estimular sensibilidades individuais para criar uma nova estética que superasse e se opusesse às formas tradicionais de alta cultura. Ele percebe a propaganda como a arte oficial do capitalismo, pois além de mediar a relação entre a cultura e a economia, atua de maneira crucial na construção dos valores e hábitos de vida, como o individualismo e o consumismo.

49De acordo com a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (Resolução CNAS38 n.° 109/2009) os

mesmo se configuram como um serviço realizado em grupos, organizado a partir de percursos, de modo a garantir aquisições progressivas aos seus usuários, de acordo com o seu ciclo de vida, a fim de complementar o trabalho social com famílias e prevenir a ocorrência de situações de

risco social.

50Segundo a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, são considerados Serviços de Convivência e

Fortalecimento de Vínculos, o serviço para crianças até 6 anos, o serviço para crianças e adolescentes de 6 a 15 anos, o serviço para adolescentes e jovens de 15 a 17 anos (Projovem Adolescente) e o serviço para idosos (Resolução CNAS n.° 109/2009).

Mesmo com tanta controvérsia, o crescimento econômico, apesar de não ser condição suficiente para o desenvolvimento, para alguns é um requisito para superação da pobreza e para construção de um padrão digno de vida.

Procuramos entender, através do questionamento aos entrevistados sobre o nível de consumo após a eletrificação, se o mesmo aumentou e a percepção dos idosos sobre necessidades materiais. A rede de distribuição de energia elétrica oficial incentiva a aquisição de eletrodomésticos e influencia na aquisição de equipamentos com maior eficiência energética. Quando os entrevistados são questionados sobre existência do maior consumo de eletricidade após a instalação do padrão, as respostas são afirmativas e podem ser identificadas com o maior consumo de equipamentos eletrodomésticos e eletroeletrônicos.

Na comunidade do Maranhão, os idosos apontam que, após a eletrificação rural, passaram a consumir sobremaneira equipamentos eletroeletrônicos e eletrodomésticos (produtos ligados ao entretenimento e conforto).

Quadro 32 - Principais produtos adquiridos pós-eletrificação rural e “necessidades” de consumo elencados pelos entrevistados – Comunidade do Maranhão.

Categorias elaboradas e a partir da análise de

conteúdo Transcrição de trechos das narrativas dos entrevistados

Produtos ligados ao entretenimento e

conforto

Compramos televisão, liquidificador, ventilador, freezer, rádio, um ‘sonzinho’ e uma caixa de som. Tenho desejo de comprar uma caixa de som bem grande, uma máquina de lavar, um ferro de passar, que não tem. (Idoso 1 e 2)

Adquirimos geladeira, televisão, aparelhinho de som, um ferro só, mas ainda não foi usado nenhuma vez [...], liquidificador, ventilador, mas é difícil a gente usar. (Idoso 4 e 5)

Televisão, depois foi a geladeira. Ainda quero comprar um ventilador, porque no tempo do verão é muito quente e uma antena parabólica pra ver bem nítido, tipo espelho, a imagem. (Idoso 7 e 8)

Primeiro foi uma televisão, nós já tínhamos essa televisão antes de chegar o Luz para Todos. Depois minha mulher se agradou de uma grande. Depois eu comprei uma geladeira, comprei não, as minhas filhas que perguntaram: "Papai, já tem energia aí?" Eu disse: Já! E elas: "Dá pra aguentar noite e o dia?". Eu disse: Dá! Tá bom. "Então deixa, não se preocupe". Quando foi no outro, mês mandaram uma geladeira.

A gente vai comprando: Ferro, ventilador, rádio também. Agora estou com vontade de comprar um freezer, embora que não seja grande, porque a luz estando boa, dá pra aguentar até quatro dias. (Idoso 6)

Fonte: Pesquisa de campo, 2015.

Na comunidade São Benedito, os idosos apontam que o consumo dos seguintes produtos: ligados ao entretenimento e conforto (geladeira, televisão, máquina de lavar roupa);

alguns apontam a necessidade de compra de equipamentos para atividade laborativa (máquina de costura) e os demais destacam que os produtos já adquiridos já suprem suas necessidades.

Quadro 33 - Principais produtos adquiridos pós-eletrificação rural e “necessidades” de consumo elencados pelos entrevistados – Comunidade São Benedito.

Categorias elaboradas e a partir da análise de

conteúdo Transcrição de trechos das narrativas dos entrevistados

Produtos ligados ao entretenimento e

conforto

Eu só tinha mesmo o rádio de pilha, agora já tenho geladeira, a televisão, quer dizer que, depois que a luz chegou já tenho essas coisas. Tenho ferro elétrico, batedeira, máquina de lavar roupa. Então quer dizer que isso melhorou muito. (Idoso 14)

Produtos de entretenimento/ conforto e necessidade de compra de equipamentos para atividade laborativa

No tempo que veio a luz, agora, depois de eu me aposentar, já comprei um aparelho de som pra me divertir, televisão, geladeira, fogão, cama, cômoda, ventilador e máquina de costura. Era a minha vontade, não era hoje não. Eu disse: "só se nunca um dia eu passar sem dinheiro não comprar uma máquina de costura elétrica". Eu tinha muita vontade de ter máquina. (Idoso 17)

Produtos adquiridos já suprem e satisfazem

suas necessidades

Compramos geladeira, freezer, ventilador, liquidificador. Máquina não tem porque escangalhou (danificou), a gente tá[sic] lavando na mão. Máquina de costura tem duas. Uma é elétrica e outra manual. O que já tem, a gente tá se dando bem. Geladeira, uma freezer, televisão, rádio, liquidificador, máquina de lavar. Não. Satisfeita com que já comprei. (Idoso 13)

Comprei uma geladeira, um freezer, televisão, ventilador e liquidificador. Eu acho que a necessidade não dá mais pra tá comprando assim. (Idoso 6)

Fonte: Pesquisa de campo, 2015.

Na comunidade Santa Tereza, os idosos relataram que o seu consumo está ligado a compra de equipamentos de linha branca e de informação/entretenimento. Alguns idosos também demonstraram que o consumo de máquinas de costura (para a produção de vestuário) e geladeira (produção de picolés) possibilitaram a geração de renda extra para a família A presença de equipamentos da linha branca nas residências incorporadas ao sistema de distribuição de energia elétrica aponta a presença do rural nesta indústria e reconstrói a dinâmica da geografia do consumo destes equipamentos no país.

Quadro 34 - Principais produtos adquiridos pós-eletrificação rural e “necessidades” de consumo elencados pelos entrevistados – Comunidade Santa Tereza.

Categorias elaboradas e a partir da análise de

conteúdo

Transcrição de trechos das narrativas dos entrevistados

Produtos ligados ao entretenimento e

conforto

Compramos uma geladeira. Eu queria comprar era um fogão novo. (Idoso 18)

Geladeira, rádio, televisão, um aparelhozinho, liquidificador, ferro elétrico. Até que a vontade de comprar tenho, mas o negócio é que não tenho dinheiro. (Idoso 19)

Produtos ligados ao entretenimento e conforto e produtos ligados a produção de roupas e alimento

Compramos uma máquina de costura. Quando eu quero costurar uma camisa, uma blusa, uma calcinha, short, pra vender, eu uso na minha máquina. (Idoso 20)

Eu comprei geladeira, um freezer, liquidificador, ventilador. Se Deus quiser, vou comprar uma máquina de lavar, eu queria comprar uma máquina de costura também, mas ainda não deu, agora eu quero comprar se Deus quiser. (Idoso 21 e 22)

O que nós compramos primeiro foi uma geladeira, depois uma televisão. Geladeira que ‘nós faz’ um bocado de flal (picolé em sacola) todo dia sai muito (vende). Se Deus quiser, vou comprar um freezer. (Idoso 23)

Fonte: Pesquisa de campo, 2015.

O acesso à energia trouxe, como percebido, o fomento do mercado relacionado com a compra de eletrodomésticos e eletroeletrônicos, nesse caso, 100% dos entrevistados das comunidades pesquisadas afirmaram ter adquirido esses equipamentos na sede dos municípios das comunidades pesquisadas.

Cumpre destacar que os apelos diários da mídia comercial divulgando propagandas chamativas incitaram o aumento da compra de bens duráveis, trazendo um estilo de vida que requer o uso de determinados equipamentos facilitadores do cotidiano, ampliando o tempo disponível para o lazer, ócio, capacitação/qualificação etc. Entretanto, o aumento do consumo da energia elétrica para as mais diferentes atividades exige o entendimento do comportamento e das formas de consumo da sociedade, para posterior orientação do consumidor final quanto à importância de saber utilizar eficientemente a energia.

Acredita-se que a política de universalização da energia elétrica pelo modo como vem sendo implantada, em especial na Região Amazônica, segue esse viés, não favorecendo a melhoria das condições de vida dos indivíduos, mas a inclusão desses na esfera do mercado de consumo. Isso porque não são dinamizadas estratégias favorecedoras da permanência dos cidadãos no mercado internacionalizado de modo independente, restringindo os indivíduos de sua autonomia, massificando-os e abstraindo-os de suas necessidades. As ações empreendidas acabam perdendo a conotação político-transformadora, produzindo uma proteção social frágil e incapaz de emancipar os indivíduos e retirá-los da situação de vulnerabilidade social a que estão expostos.

Figura 23: Residência (cozinha na parte interna) de um idoso na comunidade Santa Tereza

Fonte: Pesquisa de campo, 2015.

No contexto da sociedade contemporânea, a noção de estilo de vida está muito arraigada com o abastecimento energético, pois a sociedade de consumo é alimentada por sistemas técnicos altamente requisitantes de energia para o seu funcionamento. O número crescente de aparelhos eletroeletrônicos e as facilidades de compra desses equipamentos no mercado têm contribuído para o aumento explosivo da demanda da sociedade por energia elétrica nos seus diversos setores (residencial, industrial e de serviço).

Essa realidade apoia-se na maneira como a lógica cultural, expressa pelo pós-modernismo, contribuiu para a consolidação do regime de acumulação flexível e fortaleceu o capitalismo financeiro. A contribuição se deu por duas formas: A primeira se desenvolveu na esfera da produção e do consumo, a partir da inauguração da produção de bens cujo tempo de vida útil é curto, ou seja, caracterizam-se por serem descartáveis e de consumo instantâneo. E a outra forma se deu pela necessidade dar vazão a produção acelerada, a partir dos estímulos para esse consumo, com a criação de uma vultuosa indústria da propaganda, que cria necessidades em torno de determinados produtos.

De acordo com Harvey, uma estética cultural que “celebra a diferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação de formas culturais” (HARVEY, 1996, p. 148) é utilizada para potencializar o consumo. Essa circularidade do tempo do modo de produção e consumo acelerado, gera aumento da lucratividade.

É perceptível nesse estudo, o reduzido número de beneficiados interessados na geração de renda. São poucos os idosos que utilizam o acesso à energia elétrica para aumentar a renda familiar. Em geral, a energia elétrica é para o rádio, a iluminação, a refrigeração, o entretenimento.

Outro aspecto da demanda econômica é a dinamização de determinados setores econômicos após iniciar universalização do acesso à energia elétrica.

Se, por um lado, o PLpT pode ser instrumento para dinamizar a renda da família rural, por outro lado, a política de universalização tem contribuído com a dinamização de alguns setores industriais. A indústria de postes, transformadores e cabos de energia são fornecedores da infraestrutura prima para implementação do PLpT; e a indústria de equipamentos linha branca atende aos anseios familiares referentes ao consumo de eletrodomésticos e eletroeletrônicos.

E para os idosos residentes em áreas rurais? O que de fato a energia elétrica modificou em seu cotidiano? Quais aspectos do envelhecimento estão presentes nas alterações promovidas pela inserção e implementação do PLpT nas comunidades pesquisadas. É o que se pretende discutir no tópico a seguir.