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Números racionais no Currículo de Matemática

CAPÍTULO 2 - ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.2. Ensino da Matemática em Portugal

2.2.2. Números racionais no Currículo de Matemática

De acordo com Godinho (2004), o conceito de número racional positivo foi-se construindo ao longo dos séculos e a sua definição esteve ligada a contextos de

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partilha e de medida. Inicialmente, os conceitos de fração e de razão eram independentes e, foram convergindo ao longo do tempo, dando origem ao conceito de número racional positivo e, anos mais tarde, ao conceito mais abrangente de número racional.

Ainda de acordo com este autor, os números racionais são o primeiro conjunto numérico que os alunos aprendem que não se baseia no processo de contagem pois não há um número racional que preceda um número racional dado.

Assim, existem muitos problemas que não podem ser resolvidos com a utilização dos processos de contagem e que exigem a introdução dos números racionais.

A complexidade associada ao conceito de número racional decorre, principalmente: a) dos seus diferentes significados (relação parte-todo, medida, quociente, operador, razão) que necessitam ser compreendidos de uma forma individual e em relação às representações que estes números podem assumir; b) da comparação de quantidades através das diferentes representações; e c) do facto de, muitas vezes, este tema não ser abordado com os alunos segundo um modelo adequado (Moss, 2005).

No entanto, a flexibilidade dos alunos para lidar com as várias representações de um número racional depende largamente do ensino que lhes é proporcionado, uma vez que o simples contacto com um grande número de representações externas não resulta necessariamente numa reestruturação da sua compreensão. Esta apenas se desenvolve através da articulação entre as diferentes representações internas (Barmby, Harries, Higgins & Suggate, 2009).

Um aspeto realçado por diversos autores é o importante papel dos contextos que permitam visualizar e compreender estas relações (Huinker, 2002), facilitando o desenvolvimento de uma compreensão gradual mas sustentada dos números racionais (Confrey, 2009).

Devem também ser dadas oportunidades para estabelecer ligações entre as situações do quotidiano e os modelos (pictóricos, físicos, esquemáticos e representações simbólicas) para favorecer o estabelecimento de conexões entre representações (Fosnot & Dolk, 2002).

Os números racionais ocupam um lugar destacado no currículo, sendo amplamente reconhecida a sua importância na aprendizagem da matemática, assim como as dificuldades que lhes estão associadas. Em muitos países, a abordagem de ensino destes números que tem prevalecido é o tratamento isolado

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das suas várias representações, o que tem contribuído para uma visão compartimentada por parte dos alunos (Moseley, 2005).

Nas orientações curriculares do NCTM (2007) começam, então, a referir a importância de encorajar os alunos a trabalhar as diversas representações de um número racional e de serem dadas oportunidades para estabelecer conexões entre elas.

As Metas Curriculares (2012) e o atual Programa de Matemática do Ensino Básico (2013) reforçam o estatuto preponderante do Domínio de Números e Operações no que concerne aos números Racionais não negativos, numa vertente formal nunca antes consignada no ensino de matemática no 1º CEB. Por conseguinte, consignam, de forma explícita, orientações metodológicas para o estudo de números racionais. Estas orientações baseiam-se numa perspetiva de construção do conceito, partindo da exploração intuitiva de situações de partilha para a múltipla representação da quantidade. Estes documentos oficiais recomendam que os temas em estudo sejam introduzidos de forma progressiva, começando por um tratamento experimental e concreto e caminhando-se faseadamente para uma conceção mais abstrata.

No Programa de Matemática de Ensino Básico, homologado a 17 de junho de 2013 (GAVE, 2013), o principal objetivo é guiar os professores para que fique claro “os conhecimentos e as capacidades fundamentais que os alunos devem adquirir e desenvolver” (p. 1) e promover uma aprendizagem progressiva “na qual se caminha etapa a etapa, respeitando a estrutura própria de uma disciplina cumulativa como a Matemática” (p. 1), contudo, a abstração também tem um papel fundamental na atividade Matemática. É de salientar que a aprendizagem da Matemática, nos anos iniciais, deve partir do concreto, sendo a passagem do concreto ao abstrato realizada de forma gradual, “respeitando os tempos próprios dos alunos e promovendo assim o gosto por esta ciência e pelo rigor que lhe é característico”. Porém, é importante chegar às motivações dos alunos, mas é um exagero dizer-se que devia existir uma matemática para cada aluno, pois sendo assim não há objetivos nem conteúdos curriculares porque cada aluno avança por si pretendendo-se apenas o desenvolvimento dos seus interesses (Crato, 2006).

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Em relação aos objetivos propostos pelo Programa de Matemática do Ensino Básico, para 1º ciclo do Ensino Básico, eram, especificamente (p. 3):

1) Identificar/designar: O aluno deve utilizar corretamente a designação referida, não se exigindo que enuncie formalmente as definições indicadas (salvo nas situações mais simples), mas antes que reconheça os diferentes objetos e conceitos em exemplos concretos, desenhos, etc.

2) Estender: O aluno deve utilizar corretamente a designação referida, reconhecendo que se trata de uma generalização.

3) Reconhecer: O aluno deve reconhecer intuitivamente a veracidade do enunciado em causa em exemplos concretos. Em casos muito simples, poderá apresentar argumentos que envolvam outros resultados já estudados e que expliquem a validade do enunciado.

4) Saber: O aluno deve conhecer o resultado, mas sem que lhe seja exigida qualquer justificação ou verificação concreta.

Não obstante, “o presente Programa reconhece e valoriza a autonomia dos professores e das escolas, não impondo portanto metodologias específicas. Sem constituir ingerência no trabalho das escolas e dos professores, nota-se que a aprendizagem matemática é estruturada em patamares de crescente complexidade, pelo que na prática letiva deverá ter-se em atenção a progressão dos alunos, sendo muito importante proceder-se a revisões frequentes de passos anteriores com vista à sua consolidação.” (p.28)

Hélia Pinto (2011) refere que, para desenvolver especificamente o sentido do número racional, é de extrema importância trabalhar gradualmente os diferentes significados que estes podem assumir. Num estudo que realizou, sugere que existem grandes dificuldades na transição do conjunto dos números inteiros para o conjunto dos números racionais e das representações na forma decimal para as representações em forma de fração. Integrada no Projeto Desenvolvendo o Sentido do Número: perspetivas e exigências curriculares (2003-2007), estudou o sentido do número nos alunos dos 5 aos 12 anos. Acrescenta ainda, que a correta construção de significados relativos ao conceito de números racionais pelos alunos revela-se de fundamental importância para uma sólida construção do sentido de número, para o sucesso no prosseguimento dos estudos e para resolver os problemas do dia-a-dia da vida moderna. Portanto, a inadequada apropriação e aplicação deste conceito por parte dos alunos torna-se, cada vez mais, problemática.

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