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BRASILEIRA E SUA ÓTICA COMPARADA EM RELAÇÃO A PORTUGAL E AOS ESTADOS UNIDOS.

4.5. A DETERMINAÇÃO EX-ANTE DA PMS NAS TELECOMUNICAÇÕES.

4.5.2. NA UNIÃO EUROPEIA.

No âmbito da União Europeia, a Comissão Europeia é o órgão encarregado de atuar na defesa da concorrência, mas sua atuação depende da existência de restrições da concorrência que afetam parte significativa da atividade econômica do mercado europeu. Ou seja, os problemas concorrenciais surgidos em cada território nacional dos Estados-Membros da UE são resolvidos pelas respectivas legislações nacionais, que não necessariamente são iguais às normas europeias ou iguais entre si, conferindo-se aos artigos 101 e 102 da TFUE o caráter de normas complementares às legislações nacionais.

Nesta toada, a Recomendação da Comissão Europeia 2007/879/CE, de 17 de dezembro de 2007 - referente aos mercados relevantes de produtos e serviços no setor das telecomunicações -, em consonância com a Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu (PE) e do Conselho, foi publicada a 28 de dezembro de 2007, e substituiu a Recomendação da Comissão 2003/311/CE, de 11 de fevereiro de 2003, em vista da evolução dos mercados verificada ao longo dos últimos anos, em observância ao princípio da revisão periódica mencionado no tópico 4.1 retro.

A regulamentação da Comissão Europeia é uma conhecida referência quando o assunto é regulação ex-ante no setor de telecomunicações283, em grande parte porque a Comissão

282GUTHRIE, Graeme; SMALL, John; WRIGHT, Julian. Pricing access: Forward-looking versus backward-

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Europeia tem progredido de forma sistemática no aperfeiçoamento de mecanismos de regulação ex-ante.284-285-286 Deve ser ressaltado que a Europa iniciou o processo de regulação

ex-ante em 1998287, tendo publicado a primeira recomendação de mercados relevantes em 2003288. Quatro anos mais tarde, em 2007, foi realizada a primeira revisão. Portanto, trata-se de processo que exige amadurecimento.

De forma semelhante ao CADE, e distinta da ANATEL, a abordagem adotada pela União Europeia também é seqüencial. Isso quer dizer que se definem inicialmente os mercados relevantes varejistas – retalhistas – e depois os mercados relevantes por atacado – grossista – correlacionados. Nos mercados por atacado, impõem-se regulações ex-ante naqueles em que isso se demonstrar necessário289, isto é, naqueles em que o respectivo mercado de varejo apresenta problemas de competição. Se as medidas impostas nos mercados de atacado não forem suficientes para garantir a competição nos mercados varejistas correlacionados, então também são impostas medidas assimétricas290nestes últimos. Caso se entenda que as obrigações ex-ante impostas nos mercados por atacado por si só já corrigem as falhas de mercado existentes no varejo, não cabe a designação de PMS291 a estes últimos e, portanto, não se devem impor obrigações ex-ante neste momento.

283

MORAES, Ricardo Leal de. (2012), p. 32-39.

284ROTHBERG, Danilo; KERBAUY, Maria Teresa Miceli. “Lei de Telecomunicações e órgão regulador no

Brasil: desafios e obstáculos à luz da experiência britânica e européia”. Estudos de Sociologia, v. 13, n. 24,

p.10-18, 2008.

285

GILSON, Ronald J.; SCHWARTZ, Alan. “Constraints on Private Benefits of Control: Ex Ante Control Mechanisms versus Ex Post Transaction Review.” Journal of Institutional and Theoretical Economics JITE, v. 169, n. 1, p. 160-183, 2013.

286Para mais, DE VISSER, Maartje. “The Reform of EU Electronic Communications Law: Revolution or

Evolution?”.(2013). In: National Legal Systems and Globalization. TMC Asser Press.. p. 155-181.

287Veja-se ALABAU, Antonio; GUIJARRO, Luís. "The electronic communications policy of the European

Union". (2011), p.110. Valência: Universitat Politécnica de Valência. ISBN 978-84-8363-642-8

288Recomendação da Comissão, de 11 de Fevereiro de 2003, relativa aos mercados relevantes de produtos e

serviços no sector das comunicações electrónicas susceptíveis de regulamentação ex ante, em conformidade com o disposto na Diretiva 2002/2I/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações.

289HENTEN, Anders. “The telecom reform process in Europe and the upcoming challenges: overview of the

issues and papers in this special edition”. (2013). Info, v. 15, n. 2, p. 3-13.

290É importante ressaltar que o europeus são cautelosos em relação a aplicação de medidas assimétricas, senão

vejamos o teor do art. 16° da Framework Directive (Directive 2002/21/EC):

“Where a national regulatory authority concludes that the market is effectively competitive, it shall not impose

or maintain any of the specific regulatory obligations (...) In cases where sector specific regulatory obligations already exist, it shall withdraw such obligations placed on undertakings in that relevant market "

291CAWLEY, Richard A. “EU regulation and the development of mobile and broadband services”. (2013). Info,

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No que se refere à verificação da existência de PMS por parte de determinada empresa, atualmente292 o modelo europeu baseia sua análise antitruste no conceito de posição dominante293-294, muito embora o Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE) não traga um conceito claro do que seja posição dominante, nem esclareça o que seja seu abuso, exemplificando, por outro lado, quando se as configura.295-296 Deve-se deixar de logo claro que ter posição dominante não é ilegal, todavia, seu abuso sim297. A dificuldade de se delinear o que seja abuso advém da fluidez de seu conceito, de sorte que só haverá abuso se a conduta em questão diferir do comportamento normal esperado298. Exemplos de abuso são: distribuição exclusiva, venda casada, preços predatórios e "esmagamento de margem"299. É necessário verificar também se tais condutas trazem danos aos competidores e à concorrência.300 Neste sentido, as agências reguladoras europeias301 observam a participação de mercado dos “players” no mercado relevante previamente definido, com os seguintes limites: (i) até 25% de participação no mercado relevante, não é considerado como tendo posição dominante; (ii) acima de 40% de participação no mercado relevante, suspeita de que a

292Nem sempre foi assim. Para mais, veja-se MORAES, Ricardo Leal. (2012).

293JAEGER, JUNIOR, Augusto. "Liberdade de concorrência na União Europeia e no Mercosul". São Paulo:

LTr, 2006, p. 30-36. ISBN: 8536107650

294

GUENSTER, Andrea; KLEIN, Gordon J. “Enforcement of European Competition Policy-Impact on

Competition and Efficiency”.(2012), p.6-8. Disponível em http://tinyurl.com/b7luold. Acesso em 26/04/2013.

295As cortes Europeias tem definido posição dominante como sendo “uma posição de poder económico detida

por uma empresa que lhe permite afastar a manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em causa e lhe possiblita comportar-se, em medida apreciável, de modo independente em relação aos seus concorrentes, aos seus clientes e, finalmente, aos consumidores”, a exemplo do que se observou no caso United Brands

(processo 27/26 de 14 de fevereiro de 1978, conforme se colhe no sítio

http://www.europarl.europa.eu/factsheets/3_3_2_pt.htm

296

Também se colhe que o PMS, quando aplicado em um contexto de regulação ex-ante, apresenta o seguinte significado: “(...) in an ex-ante environment, market power is essentially measured by reference of the power of

the undertaking concerned to raise prices by restricting output without incurring a significant loss of sales or revenues" (Directive 2002/C165/03, Pag. 15)

297

LAUREANO, Abel; RENTO, Altina. "Considerações actuais sobre o conceito de abuso de posição

dominante no Direito da Concorrência da União Europeia" (2012), p.22-27. Cadernos da Escola de Direito e

Relações Internacionais, v. 1, n. 17.

298Tradução livre da expressão “it differs from normal competitive behaviour”contida em Bishop, S. and Walker,

M. op. cit.

299Tais abusos consistem, como colocam BISHOP e WALKER (2010, p.223): “a) Directly or indirectly

imposing unfair purchase or selling prices or unfair trading conditions; b) Limiting production, markets or technical development to the prejudica of consumers; c) Applying dissimilar conditions to equivalent transactions with other trading parties, thereby placing them at a competitive disadvantage; d) Making the conclusion of contracts subject to acceptance by the other parties of supplementary obligations which, by their nature ar according to commercial usage, have no connection with the subject of such contracts.". in “The economics of EC Competition Law: Concepts, Application and Measurement”. London, Thomson Reuters,

2010, 3º ed.

300Idem ibidem.

301LEMSTRA, Wolter; VAN GORP, Nicolai. “Telecommunications reform and the internal market in Europe”.

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empresa sozinha exerce posição dominante; (iii) acima de 50% de participação no mercado relevante, forte evidência de que a empresa sozinha exerce uma posição dominante. Portanto, ao contrário dos tradicionais 20% estabelecidos pelo SBDC – percentual que poderia ser revisto a fim de se adequar à experiência aqui mencionada - os europeus são mais tolerantes desde o início de sua análise, o que parece ser correto, se levarmos em consideração que as telecomunicações são um setor com custos fixos consideráveis302, bem como conta com a presença de economias de escopo e de rede. Deste modo, não se deve esperar que a estrutura de oferta dos mercados de telecomunicações seja muito pulverizada303. Na verdade, o grau de competição advém mais da rivalidade entre as empresas estabelecidas do que de um grande número de competidores que desejam ingressar no mercado, em razão da existência de barreiras à entrada. Assim, uma participação inferior a 25% indicaria pouca probabilidade de que uma empresa venha a usufruir de uma posição dominante no mercado em questão – como dito acima, sendo que no Brasil apenas 20% já é suficiente para poder se atribuir posição dominante. Ademais, a Comissão Europeia e o Judiciário têm levado em consideração o

market share da empresa, de maneira que quando ela possui mais de 50% do mercado,

presume-se a dominação, embora outros fatores possam alterar tal presunção304. Ao avaliar os

market share dos “players”, uma atenção especial é dada à posição daqueles que competem

com a empresa dominante, pois quanto menor forem os seus market share, maior é a probabilidade de confirmar a posição dominante da grande empresa concorrente.305

Na Europa ainda é analisada a evolução histórica das participações dos “players” no mercado relevante306. Um market share estável ou crescente representa uma possível evidência de posição dominante. De outro lado, um market share instável ou decrescente representa uma forte evidência de competição no mercado. Ademais, a análise realizada pelas agências europeias, além da participação de mercado, baseia-se em uma série de critérios auxiliares que servem de norte, tais como tamanho geral da empresa, economias de escala,

302POSNER, Richard. "The Social Costs of Monopoly and Regulation". The Journal of Political Economy. v. 83.

n.4. 08/1975. p. 807-828. Disponível em http://wwww.jstor.org/stable/1830401. Acesso em 20/04/2013.

303PEREIRA, Edgard; LAGROTERIA, Eleni. "O marco regulatório brasiLeiro para o setor de

telecomunicações e a competição no mercado de telefonia fixa de longa distância". Revista do IBRAC. v. 11.

n.3. São Paulo: IBRAC, 2004. p. 127-164

304WHALLEY, Jason; CURWEN, Peter. “Incumbency and market share within European mobile

telecommunication networks”. Telecommunications Policy, v. 36, n. 3, p. 222-236, 2012.

305

BISMUT, Sophie. “Competition in European telecom markets”. Communications & Strategies, n. 64, p. 17, 2006. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=994249>. Acesso em: 28 de março de 2013.

306MONTOLIO, Daniel; TRILLAS, Francesc; TRUJILLO-BAUTE, Elisa. “Regulatory Environment and Firms

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econômicas de escopo, integrações verticais, dentre outros.307-308 Nada disso foi realmente considerado na análise concorrencial setorial brasileira, o que, se fosse feito, poderia promover um exame mais acurado pela ANATEL.

Deve ser tido em conta também a influência da dinâmica tecnológica no setor de telecomunicações que é tão forte que a análise dessas participações toma-se vazia sem avaliar a estabilidade ou volatilidade de tais indicadores309. Participações de mercado flutuantes ao longo do tempo, especialmente em função de mudanças tecnológicas, podem indicar uma ausência de PMS, mesmo em se verificando participações elevadas em determinados períodos. Desta forma, uma participação de mercado superior a 50% poderia ser um indício mais forte de PMS quando esta se mantiver estável ao longo do tempo. Por outro lado, se uma empresa que está tendo reduzida gradualmente sua participação de mercado, tal fato pode ser traduzido como um indicativo de que o mercado está se tomando mais concorrencial.310 Aliás, mesmo nas situações em que a participação de mercado é elevada, não é possível de logo concluir que há probabilidade de exercício de poder de mercado. Com efeito, a análise antitruste demonstra que não se pode desprezar a importância das condições de entrada311-312 ou de rivalidade313 como fatores inibidores do exercício de poder de mercado de um operador que detenha parcela expressiva das vendas do mercado relevante. Na experiência estrangeira, a União Europeia, p.ex., reconhece as dificuldades práticas de se implementar o art. 102 da TFUE justamente por ser necessário definir "dominação" e "abuso", o que não é feito pela legislação314, conforme adiantamos acima. Mas parece correto concluir que o conceito de “dominação” está relacionado à capacidade da empresa de se comportar independente da ação de seus competidores e consumidores.

307Para mais, USERO, Belen; ASIMAKOPOULOS, Grigorios. “Productivity change and its determinants among

leading mobile operators in Europe”. Applied Economics, v. 45, n. 20, p. 2915-2925, 2013.

308Ou ainda DASSLER, Thoralf; PARKER, David; SAAL, David S. “Economic Performance in European

Telecommunications, 1978-1998: a comparative study.European Business Review”, v. 14, n. 3, p. 194-209,

2002.

309HECKER, Achim; GANTER, Alois. “The Influence of Product Market Competition on Technological and

Management Innovation: Firm Level Evidence from a Large Scale Survey”. European Management Review, v.

10, n. 1, p. 17-33, 2013.

310Idem ibidem.

311Segundo o Guia SEAE/SDE, a avaliação da condição de entrada deve ser feita sob três perspectivas: se a

entrada é "provável", "tempestiva" e "suficiente".

312

Para mais, ler PRIEST, George L., “O Direito da Concorrência na Era das Indústrias de Rede”, in http://tinyurl.com/cevmmxq. Acesso em 09/05/2013.

313FAGUNDES, Jorge. Op. cit. (1997), p. 40-47.

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Uma solução que a ANATEL poderia dar para fazer uma avaliação concorrencial mais escorreita de poder de mercado seria a adoção pela Lei brasileira de procedimento semelhante ao dos europeus, em que inicialmente busca-se a definição do mercado relevante estudado, e, depois, se determina se haveria concorrência - ou não – neste mercado relevante através de elementos como a análise do market share, considerando a situação presente, a evolução histórica e as perspectivas futuras do mercado em questão. Além disso, à semelhança do que ocorre com o procedimento de determinação de PMS, o exercício de delimitação de mercados relevantes deveria igualmente assumir um caráter seqüencial, em que se definiriam inicialmente os mercados de varejo e, em seguida, os mercados de atacado. Se, após a imposição de regulação ex-ante dos mercados de atacado inicialmente designados remanescer PMS nos mercados seguintes, então se avalia a imposição de regulação ex-ante sobre estes últimos.315-316

Pode-se concluir que, confrontados o modelo do CADE e o adotado na Europa, tem-se que eles são semelhantes, pois ambos são seqüenciados em etapas.317-318 Em contraposição, a

315Destaca-se que, embora a separação entre mercados atacadistas (que envolvem relações entre prestadoras de

telecomunicações) e mercados de varejo (que envolvem relações entre um prestador de telecomunicações e o usuário final) seja bastante difundida no setor de telecomunicações, na verdade, os mercados atacadistas e varejistas são duas faces de uma mesma "moeda": ambos refletem o uso de uma infraestrutura em rede para prestar serviços aos usuários finais. Contudo, as partes desta infraestrutura são frequentemente detidas por empresas distintas, o que confere à configuração em rede uma característica peculiar: os vários componentes da rede guardem estreita relação de complementaridade entre si. Em decorrência disto, as relações entre os ofertantes que detêm partes da infraestrutura da rede são mais complexas, pois envolvem tanto relações de complementaridade quanto de substituição, na medida em que os vários serviços de telecomunicações prestados a partir da rede também são substitutos entre si. Por esta razão, as relações entre prestadoras são tratados em um contexto à parte. Não obstante, como prova da estreita associação entre mercados varejistas e de atacado, é usual que as participações de mercado nos mercados atacadistas sejam mensuradas em termos de unidades comercializadas nos mercados varejistas.

316“In general, the market to be analysed first is the one that is most upstream in the vertical supply chain.

Taking into account the ex ante regulation imposed on that market (if any), an assessment should be made as to whether there is still SMP on a forward-looking basis on the related downstream market(s). This methodology has become known as the ‘modified greenfield approach’. Thus the NRA should work its way along the vertical supply chain until it reaches the stage of the retail market(s). A downstream market should only be subject to direct regulation if competition on that market still exhibits SMP in the presence ofwholesale regulation on the related upstream market(s).” - EXPLANATORY NOTE - Accompanying

document to the Commission Recommendation on Relevant Product and Service Markets within the electronic communications sector susceptible to ex ante regulation in accordance with Directive 2002/21/EC of the European Parliament and of the Council on a common regulatory framework for electronic communications networks and services.

317O guia europeu para definição de mercado relevante e determinação de PMS (Commission guidelines on

market analysis and the assessment of significant market power under the Community regulatory framework for electronic communications networks and services) assim prevê: “It is important to stress that the existence of a dominant position cannot be established on the sole basis of large market shares. As mentioned above, the existence of high market shares simply mean.s' that the operator concerned might be in a dominant position. Therefore, NRAs should undertake a thorough and overall analysis of the economic characteristics of the relevant market before coming to a conclusion as to the existence of significant market power. In that regard, the

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metodologia aplicada pela ANATEL não observa uma sequência na avaliação dos critérios, pois todos são tratados como se estivessem no mesmo nível, sem que haja qualquer supremacia de um sobre os demais. Não há, portanto, por parte da ANATEL, uma análise seqüencial e estruturada propriamente dita, com cada etapa posterior complementando a anterior319. Ademais, isso pode levar à conclusão de que a abordagem seqüencial europeia é mais cuidadosa, tornando mais racional à análise de mercado, de sorte que evita o desperdício de recursos e tempo dos reguladores, já que não é preciso avaliar todos os critérios elencados.

É lícito concluir, ainda, que a experiência europeia enfrentou as dificuldades e desafios na construção de um arcabouço regulatório com base no conceito de PMS320. No caso brasileiro, há dificuldades adicionais, pois a realidade socioeconômica é bastante diversa da europeia e as restrições de demanda, por exemplo, podem ser mais conclusivas para explicar a evolução de certos mercados no Brasil. Os objetivos das políticas públicas também são distintos, levando a imposição de obrigações distintas por parte das empresas (como as de universalização, v.g)321. Apesar de sua importância como referência em regulação ex-ante, a mera transposição da metodologia europeia, em particular da definição de mercados relevantes, para o Brasil poderia resultar em graves prejuízos à evolução do setor no país, ante as diferenças econômicas e culturais verificadas. 322

Além disso, os percentuais utilizados pela UE para atribuição de poder de mercado poderiam servir de parâmetro para o legislador brasileiro, ante o alto grau de rivalidade encontrado no setor, aliado à jurisprudência nacional, de sorte que poderia ser utilizado como filtro inicial para avaliação de poder de mercado o patamar de 40%323. Nesse contexto, a relação entre participação de mercado e posição dominante ou PMS no Brasil pode seguir de

following criteria can also be used to measure the power of an undertaking to behave to an appreciable extent independently of its competitors and customers.”.

318MONTI, Mario. "Telecommunications and antitrust: introduction”. In: BUIGUES, Pierre; REY, Patrick. "The

economics of antitrust and regulation in telecommunication:perspectives for the new European framework".

Chelteham: Edward Elgar, (2004). p. 03-08, ISBN-10: 1843765101

319

SALGADO, Lúcia Helena e MOTTA, Ronaldo Seroa da. (2005), p. 24-29.

320Para mais, vide SOMBRIO, João de Oliveira. In “Regulação Econômica no setor de telecomunicações –

Evolução do arcabouço regulatório em face da convergência de tecnologias e serviços”. Disponível em http://tcc.bu.ufsc.br/Economia291565 . Acesso em 09/05/2013.

321

FARACO, Alexandre Ditzel. Concorrência e universalização nas telecomunicações: evoluções recentes no direito brasiLeiro. Revista de Direito Público da Economia, Belo Horizonte, v. 2, n. 8, out. 2004, p. 4-12.

322MORAES, Ricardo Leal de. "Implementação da concorrência no setor de telecomunicações e

desenvolvimento: uma análise da experiência Comunitária". In: BARRAL, Welber; BACELLAR FILHO,

Romeu Felipe (orgs). Integração Regional e Desenvolvimento. Florianópolis: Boiteux, 2007. p. 237-250. ISBN: