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CAPÍTULO 1: DO QUE ESTÁ DADO NO MUNDO

1.1 Narrativas audiovisuais do contato improvisação

Steve Paxton comenta Magnésio (2008)29, sua primeira obra pública de contato

improvisação, em um pequeno filme disponível no Canal Youtube, Steve Paxton discussing 29Transcrição em inglês

Steve Paxton discussing Magnesium

CI36 - Juniata College, June, 2008

Magnesium actually happened because of an opportunity for it to happen. I’d been working on a solo which was

sort of… I guess it’d come out of aikido dreams. I’d studied aikido and I just wanted to be able to leave the planet and not worry about the reentry, in other words, get up into the air at any crazy position and somehow have the skill to come back down without damage. So I had practiced on various lawns and mats and things like that, on water, and had come to some conclusions and some… But anyway, (I) saw very clearly that the aikido had treated the body in such a way that you could reenter, you could come down as long as you could get one of your four limbs kind of underneath you, or get a roll going, or somehow change the (clap) landing into a… you know, where you’re not going perpendicular to the surface, to the floor, but instead that you’re taking that and bending your shape so that at the moment you’re hitting the shape is going and then suddenly you’re working on that… in that dimension.

So I was playing with this and then here came Oberlin College wanting three weeks of classes and… There were a number of young men in their early twenties and I thought there should be a men’s class and then I thought… yeah, the solo could be part of that material. I could teach them a little bit about how to do that. So in addition to dance training… John Faichney, who happens to be here, who was in that group remembered that we did do a certain amount of traditional dance technique but then we went on to move the space further, and by moving that space on… I feel like Contact improvisation treats space spherically, so you do not have the horizontal with sky above and floor below. Reality, you have another reality where from the visual point of view everything’s moving around you. Any, any… That’s what I mean by spherical. I mean the senses themselves are experiencing this space as a sphere, instead of as a (gesture)… I guess it’s more two dimensionally, really the dimensions kind of blend into one another as you go on talking about them but… So contracting from sphere to horizontal or even to stage which is sort of plain on in its actual effect, because you see plainly, you start to observe distance by comparing sizes of things beyond… About forty feet I think it is that we see three dimensionally. Anyway, so I started working with them, working on rolls, working on disorientation, working on colliding and collapsing into the collision, like a soft collision, falling together, falling rolling together. So they got used to all of that and watching their senses, watching their faces, watching their eyes, seeing if… how often their eyes were… If you get disoriented and the body needs to shut down the brain, it can do it like that (finger snap), and then back on like that (finger snap), and you don’t even know what happened. It’s a little bit like blinking, right? And blinking… you’re not aware of it unless you become… unless you start to really study blinking. You don’t notice that you do it all the time. So the blinks can last a little bit longer if you’re rolling and you’re disoriented. You know… You remember the fear, perhaps, that you felt but you don’t remember that your body shut your brain down so that the body could do what it knew would help you survive the roll. So things like that… Looking at their senses as they were learning and I was expanding them bit by bit into more and more spherical, more and more interactions, making sure that everybody could interact with everybody. And then, as it happened, a young filmmaker named… her video maker really named Steve Christiansen from Antioch College was there and shot the event. So the event was eventually a lot of crashing around on a mat, followed by a lift of a randomly chosen sacrifice… (giggles) One of the guys was lifted up by all the other guys and put way up in the air and… he came back down and there was a little bit

Magnesium (2008)30, realizado pela publicação CI36, em comemoração aos 36 anos de

desenvolvimento do contato improvisação no mundo.

Tradução para português

Magnésio na verdade aconteceu por causa de uma oportunidade para que ele acontecesse. Eu estava trabalhando em um solo que era um tipo de... Acredito ter surgido a partir de sonhos que tive com aikido. Eu havia estudado aikido e eu só queria ser capaz de deixar o planeta e não me preocupar com a reentrada, em outras palavras, subir aos ares em qualquer posição esquisita e de alguma forma ter a habilidade de voltar à terra sem dano. Então eu havia praticado em diversos gramados e tatames e coisas do tipo, na água, e havia chegado a certas conclusões e certas... Enfim, (eu) vi muito claramente que o aikido havia tratado meu corpo de tal forma que eu poderia reentrar, eu poderia regressar se conseguisse posicionar um de meus braços ou pernas por baixo do corpo, ou encaixar um rolamento, ou de alguma forma transformar a (palma) aterrissagem em uma... quero dizer, onde você não vá perpendicularmente à superfície, ao solo, mas, ao contrário, você toma isso e vai curvando a sua forma de maneira que no momento em que você esteja tocando (o solo) sua forma vai indo e então de repente você está... se resolvendo nessa dimensão. Então eu estava brincando com isso e eis que vem o Oberlin College querendo três semanas de aulas e... Eram vários rapazes nos seus 20 anos e eu pensei que aquela deveria ser uma aula para homens e então pensei..., sim, o solo poderia ser parte desse material. Eu poderia ensiná-los um pouco como se fazer aquilo. Então além do treinamento de dança... John Faichney, que está aqui, que estava naquele grupo, lembrou que realmente trabalhamos certa quantidade de técnicas da dança tradicional, mas aí tomamos outra direção, no sentido de expandir os espaços, e ao expandir esse espaço... Eu sinto que o contato improvisação trata o espaço esfericamente, então não existe a horizontal com céu acima e solo abaixo. A realidade..., existe outra realidade na qual, do ponto de vista visual, tudo está se movendo ao redor. Qualquer, qualquer... É isso que eu quero dizer com esférico. Os próprios sentidos experimentam esse espaço como uma esfera ao invés de (gesto)... Acho que é mais duo dimensional. Na realidade as dimensões meio que se fundem umas às outras à medida que você vai falando sobre elas, mas... Então contraindo de esfera para a horizontal, ou mesmo para o palco que é plano em seu efeito real, porque vemos de modo plano, começamos a observar a distância ao comparar o tamanho das coisas que estão mais além. A partir de uns 10 ou 12 metros, eu acho, é que vemos em três dimensões. Enfim... então comecei a trabalhar com eles, trabalhar rolamentos, trabalhar a desorientação, trabalhar a colisão, o entregar-se para a colisão, como uma colisão suave, cair juntos, cair e rolar juntos. Então eles se acostumaram a tudo isso e ao observar os seus sentidos, observar seus rostos, observar seus olhos, olhar se... como seus olhos estavam... Se você ficar desorientado e seu corpo necessitar desligar seu cérebro, ele pode fazê-lo num estalar de dedos e então religá-lo do mesmo modo (estalar de dedos), e você nem sequer saberá o que aconteceu. É um pouco como o piscar de olhos, não é? E o piscar de olhos... você não é consciente dele a não ser que..., a não ser que você realmente comece a estudá- lo. Você não percebe que o faz o tempo todo. Então esse piscar pode durar um

more activity and then there was a five-minute stand. So after… out of all that chaos came… I don’t know if it would be called order, but quiet, you know. So that was Magnesium. (Transcrito por Marcelo Batistella, 15 de outubro de 2018)

pouco mais se você estiver rolando e estiver desorientado. É... Você se lembra do medo, talvez, que sentiu, mas não se lembra de seu corpo ter desligado seu cérebro para que o corpo pudesse fazer o que ele sabia que lhe ajudaria a sobreviver ao rolamento. E coisas assim... Observava os seus sentidos ao passo que eles iam aprendendo, e eu ia expandindo-os pouco a pouco até uma forma cada vez mais esférica, cada vez mais interações, tendo a certeza de que todos pudessem interagir com todos. E então, como veio a acontecer, um jovem cinegrafista chamado... o cinegrafista chamado Steve Christiansen do Antioch College estava lá e filmou o evento. Então o evento envolveu essencialmente muita queda sobre um tatame, seguido de o levantamento de uma cobaia escolhida aleatoriamente (risos)... Um dos rapazes era erguido por todos os demais e arremessado para o alto... ele voltava ao solo e havia um pouco mais de atividade e então eles ficavam em pé por cinco minutos. Então depois... a partir de todo aquele caos veio... Eu não sei se seria chamado de ordem, mas quietude. E isso foi o Magnésio. (Traduzido por Marcelo Batistella, 15 de outubro de 2018).

Observa-se, nessa narrativa de Paxton, a busca de um sentido maior para o movimento, algum sentido que fosse além de todas as experiências que ele tivera até então. Como narrador do filme, ele toma para si o papel daquele que comunica uma experiência que vivenciou, como especificou Walter Benjamin. E, como professor que foi convidado por uma universidade para oferecer aulas de dança, torna-se também aquele que proporciona a própria experiência para seu interlocutor, aquele que proporciona uma série de experiências de movimento que transformam e transportam os alunos para outras esferas de narrativas.

Ele já fora aluno de ginástica, de dança clássica, de dança moderna e, como se verá no capítulo seguinte, naquele momento não sentia mais entusiasmo pela dança moderna. Por essa razão, passou a dedicar-se ao estudo do aikido para se habilitar a um movimento muito específico e ainda desconhecido, nas suas próprias palavras, “eu só queria ser capaz de deixar o planeta e não me preocupar com a reentrada, em outras palavras, subir aos ares em qualquer posição esquisita e de alguma forma ter a habilidade de voltar à terra, sem danos” (Anexo A, a, minuto 00:23).

Ainda na narrativa, ele conta que teve sonhos com o aikido, o que considera tê-lo influenciado a optar por oferecer, no curso no Oberlin College, exatamente aquilo que tanto o intrigava como bailarino e pesquisador do movimento. Então ele compartilhou seu estudo de movimento como uma ideia cultural, que ainda estava em construção e, para a qual também buscava modos de realizar uma verificação científica.

Sua investigação sobre como “subir aos ares em qualquer posição esquisita e de alguma forma ter a habilidade de voltar à terra sem danos” (Anexo A, a, minuto 00:23) teve oportunidade de ser levada a cabo, em sala de aula, o que proporcionou novas experiências para os outros ao redor, para suas mentalidades, gerando novas perspectivas sobre o movimento da

queda. Naquele momento, ele confiou sua escolha e compreensão do rolamento do aikido aos seus interlocutores. No próximo capítulo, aborda-se sua explicação do porquê de ter escolhido o rolamento do aikido e não de outra arte marcial.

Assim, aproveitou a oportunidade do espaço disponibilizado para as aulas para proporcionar a experiência para si e seus interlocutores, de poder dar vazão a muitos tipos de quedas, dando continuidade ao seu questionamento sobre a dimensão da queda e o que nela pode ser voluntário ou involuntário, do que se pode ou não fazer no minúsculo momento em que se inicia uma trajetória de queda. Então ele afirma, “vi muito claramente que o aikido havia tratado meu corpo de tal forma que eu poderia reentrar, eu poderia regressar se conseguisse posicionar um de meus braços ou pernas por baixo do corpo, ou encaixar um rolamento, ou de alguma forma transformar a (palma) aterrissagem em uma...” curva. Ele explica: “onde você não vá perpendicularmente à superfície, ao solo, mas, ao contrário, você toma isso e vai curvando a sua forma” (Anexo A, a., minuto 00:52).

A.1. Espaço esférico

Aqui é possível identificar um dos princípios de sua ideia cultural que se tornou a chave da performance do contato improvisação, que é o aproveitamento maior da gravidade, essa força inestimável disponível, mas também a negação da gravidade, ou melhor, a negação de que o espaço movido por ela seja perpendicular. Assim, o espaço no contato improvisação é trabalhado esfericamente, como reflete Paxton:

Aí tomamos outra direção, no sentido de expandir os espaços, e ao expandir esse espaço... Eu sinto que o contato improvisação trata o espaço esfericamente, então não existe a horizontal com céu acima e solo abaixo. A realidade..., existe outra realidade na qual, do ponto de vista visual, tudo está se movendo ao redor. Qualquer, qualquer... É isso que eu quero dizer com esférico. Os próprios sentidos experimentam esse espaço como uma esfera (PAXTON, Anexo A.a., minuto 02:48).

Esta é uma evidência de que a expansão é uma chave em sua busca, narrada por ele como uma busca por algo considerado desconhecido ou incerto, também se pode observar em sua narrativa uma visão nítida das potências físicas do movimento, o tempo todo atuantes no jogo de cair, em que ele inclui todos os lados, sem exceção, ação e reação da gravidade, numa lógica englobante também do outro e do espaço, como a lógica do Tao.

Então estabeleceu com o outro, pelo peso do corpo, uma realidade inegável da perspectiva da gravidade, uma relação dialógica por meio do movimento dos pesos de cada

corpo, tomando o espaço como um meio de interlocução para essa espécie de comunicação espacial entre dois corpos na mesma frequência.

A lógica do Tao é a lógica da unidade, em que tudo se move e cada movimento influencia todos os elementos e seres presentes. Seguindo essa lógica, o contato improvisação lida com o espaço esfericamente, não conforme a lógica cartesiana, ou perpendicular, mas como a lógica da esfera em movimento espiral, em que as forças no movimento circular realizam trajetórias curvas, para realizar com o corpo, em relação ao corpo do outro, o movimento no design esférico expresso também na trajetória realizada pela Terra, atraída pela gravidade do Sol, seguindo em espiral pelo espaço sideral.

Essas experiências de movimento foram paulatinamente decodificadas pela insistência na investigação por meio da experimentação corporal e propiciou ao contato improvisação desencadear uma percepção própria, espacial, sentida e desenvolvida quando se dança contato improvisação, como menciona Steve Paxton:

Do ponto de vista visual, tudo está se movendo ao redor. Qualquer, qualquer... É isso que eu quero dizer com esférico. Os próprios sentidos experimentam esse espaço como uma esfera ao invés de (gesto)... Acho que é mais duo dimensional. Na realidade as dimensões meio que se fundem umas às outras à medida que você vai falando sobre elas, mas... Então contraindo de esfera para a horizontal, ou mesmo para o palco que é plano em seu efeito real, porque vemos de modo plano, começamos a observar a distância ao comparar o tamanho das coisas que estão mais além. A partir de uns 10 ou 12 metros, eu acho, é que vemos em três dimensões (PAXTON, 2008, Anexo A.a., minuto 03:10).

Ao considerar que tudo está se movendo ao redor, focado nas sensações experimentadas pelo corpo, em sua investigação artística, Paxton pluraliza a dimensão da queda incorporando o sentido esférico internamente. Isso gerou novas formas de ver e sentir o movimento, novas experiências e novos significados para a queda, de forma que no contato improvisação uma queda poderia ser vertical ou até horizontal porque ela não seria mais perpendicular ao chão, ela seria uma passagem, praticamente uma não-queda, uma curvatura, ela seria uma espiral.

Quando, durante a oficina, ele decidiu tomar a direção de expandir os espaços, sentiu que não existia “horizontal com o céu em cima e a terra embaixo”. Assim ele transformou, e também transportou, o significado da aterrissagem de seu corpo no planeta em uma passagem, e, algumas vezes, em um voo. Uma relação de toque e escuta do seu corpo, em movimento, com o corpo da Terra. Ele incorporou à sua técnica de movimento a dimensão esférica do próprio planeta e acabou por propor um movimento estético corporal por meio dos rolamentos.

Desse modo, quando se está dançando contato improvisação, compreende-se que é possível experimentar o espaço esfericamente pela óptica do corpo, sujeito do movimento na dança. Esse é um dos princípios dos rolamentos de Material for the spine; a dimensão esférica experimentada no movimento, no diálogo espacial, torna-se preponderante na improvisação, torna-se o canal em que ambos os bailarinos entram em sintonia um com o outro. E incorporá- la demanda treino e dedicação.

B. In A non-wimpy way, Steve Paxton on contact improvisation and war (2013)31

Dirigido por Bojana Cvejic e Lenhart Laberenz, o filme foi realizado em 2013, no estúdio de Steve Paxton, em Vermont, EUA, e faz parte da coleção Danse Guerre, do Centro

31Transcrição em inglês

In a non-wimpy way, Steve Paxton on Contact improvisation and war

I’m here in this idyllic country setting, but I don’t think there’s any disengagement. I think I’m just as angry as I was in the sixties. And here is where I cultivate my pessimism.

We had, in the fifties and early sixties, a very conventional and sort of stupid culture. As I think… I’ve heard often happens after a devastating period of war, where everybody just wants to be safe and have security and be warm and be happy and build life in a kind of idealistic way. Leading almost nowhere because we still contained… ah, you know, racial prejudice, still contained sexual prejudice, still contained… ah, the power divisions that had set everything up for… So… the counterculture had a lot on its plaguing to complain about and the way it was doing it was, of course, sort of demonstrating its complaint. And I… And that just seems so shallow somehow, you know. Anyway, there was plenty of sex, there was plenty of sports, there was plenty of dance, as far as I could see, and I wanted to make something that was outside.

Well, Magnesium came first. It was in Oberlin College in seventy… early 72. And… er… was a man’s class, at Oberlin, and Grand Union was there, we were all teaching various classes and so. And so for these young men who weren’t dancers, you know they were athletes, some of them, I thought it would be interesting to explore that side of them, as opposed to… ah… I think if it’d been a class of women I would never have presumed, you know, that sort of rough form.

It was a gymnasium, it had a running track where the audience stood looking down into the pit, like… er… like the Roman audience looking down into the… at the gladiators. Made a 15-minute piece, ten minutes of which was fairly rough… ah… colliding in the air, falling to the mat, we had a big mat, wrestling mat. Ah… rolling, ah… encountering each other in a very much like… wolf puppies playing or something. And then a 5-minute stand, just standing.

I’d done a lot of aikido and I’d gotten the idea that really you could just jump off the planet and not worry about

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