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Nascente coletiva e contrato

4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DA PESQUISA

4.5. Nascente coletiva e contrato

O grupo de professores realizou diversas rodas de conversas, que ocorriam muitas vezes nos encontros de coordenação coletiva da escola. Essas rodas arquitetaram muitas ações para serem executadas pelo próprio grupo responsável pela elaboração dessas ações. Esse aspecto é extremamente relevante, dado que o grupo podia executar aquilo que ele mesmo havia planejado. A riqueza estava exatamente no retorno, ou seja, o grupo planejava, executava e voltava para refletir acerca de cada ação empreendida, num movimento em espiral.

Nesse ímpeto de planejamento coletivo, o grupo incluiu fazer uma visita à sub-bacia Hidrográfica do Ribeirão Sobradinho. Como se tratava da primeira experiência dessa natureza já realizada pela escola, então, o grupo avaliou estratégico que nessa primeira visita comparecesse apenas o corpo docente. Mais detalhadamente, o grupo programou conhecer as imediações da ponte do Ribeirão localizada a aproximadamente 600 metros da escola.

A essa altura dos acontecimentos, as ideias planejadas pelo grupo começaram a ganhar movimento à medida que as execuções foram ganhando materialidade e se tornando realidade. Esse conjunto integrado pelo pesquisador e pelos professores, que planejava coletivamente ações com o propósito de desenvolver a transformação da realidade e a produção do conhecimento.

As reuniões de planejamento coletivo ocorreram de forma bastante frutíferas, principalmente a partir do instante em que houve a contratualização estabelecendo pactos e acordos que assegurassem o movimento e o desenvolvimento das ações por parte dos integrantes. Por meio do contrato, os fatos dificilmente ficam desamarrados e soltos, pois são sujeitos implicados e impregnados da vontade de agir e, dessa forma, cada ação que causa

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impulso e traz a devolutiva no instante da reflexão, no processo recursivo e dialético, próprios da dinâmica em espiral.

Quando o pesquisador coletivo planejou visitar pela primeira vez o Ribeirão Sobradinho, previamente as atividades foram levantadas e combinadas: quais os participantes da visita, como seria o deslocamento, qual o melhor dia, o melhor horário, o que seria observado, o motivo da observação, o registro do observado e os desdobramentos do observado pelo grupo. O exercício da pesquisa-ação como investigação formativa e emancipatória, requer a dinâmica da ação comunicativa. Segundo Habermas (1984, p. 285), a ação comunicativa se desenvolve:

[...] sempre que as ações dos agentes envolvidos são coordenadas, não através de cálculos egocêntricos de sucesso, mas através de atos de alcançar o entendimento. Na ação comunicativa, os participantes não estão orientados primeiramente para o seu próprio sucesso individual, eles buscam seus objetivos individuais respeitando a condição de que podem harmonizar seus planos de ação sobre as bases de uma definição comum de situação. Assim, a negociação da definição de situação é um elemento essencial do complemento interpretativo requerido pela ação comunicativa.

Por mais que cada participante realize, por força dos acordos, determinada ação, esta não será voltada para si, mas sim para o interesse coletivo, pois se trata de uma ação dialógica, cuja necessidade emergiu no coração das vivencias do grupo. O processo de conquista da confiança uns dos outros é primordial para o estabelecimento de uma negociação, um acordo, um contrato, ou seja, uma contratualização, de forma que todos trabalhem a partir de um entendimento comum, buscando um consenso em torno das ações que fortalecem a pesquisa. Esses acordos, decorrentes da negociação, são definidos por Barbier (2007, p. 120) da seguinte maneira:

O contrato precisa as funções de cada um, o sistema de reciprocidades, as finalidades da ação, os encargos financeiros, a temporalidade, as fronteiras físicas e simbólicas, as zonas de transgressão e o código de ética da pesquisa. [...] deve estar aberto em todas suas dimensões, tanto na problemática, na análise das necessidades, na definição dos problemas, nos questionamentos, quanto na metodologia, incluindo a construção de instrumentos de coleta de dados e a revisão da informação concernente aos significados das ações.

A reunião de planejamento coletivo ocorrida após as primeiras visitas à sub-bacia trouxe importantes reflexões para o pesquisador coletivo, pois, quando cada participante olhava para o retrovisor das práticas pedagógicas desenvolvidas antes das visitas, a maioria

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revelava que existiam lacunas primordiais relacionadas à ecologia e à sustentabilidade jamais preenchidas por ações pedagógicas que, no entanto, após a formação sobre bacia hidrográfica e o trabalho de campo planejado e realizado pelo grupo, propiciaram mudanças de atitudes, principalmente por ter sido desvelado, pelo exercício da prática, as bases do potencial formativo da Educação Ambiental.

Quando se está imerso na práxis, no trabalho coletivo, a primeira percepção de mudança é captada pelo olhar, de forma que essa percepção busca outras possibilidades se desvencilhando daquilo que foi ultrapassado. Para Ghedin e Franco (2011, p. 243), “esse novo olhar, advindo de um sujeito consciente das transformações existenciais e pessoais, questiona a necessidade de novos cenários”. As espirais têm a intenção de objetivá-lo, para que dele surjam novas necessidades que implicam novas práticas. Essa mesma visão de Ghedin é reforçada pela posição de Morin (2008, p. 60), de que a ciência deve ser considerada como um processo recursivo auto-ecoprodutor:

Isso quer dizer que a cientificidade se constrói, se desconstrói e se reconstrói sem cessar, já que existe um movimento ininterrupto. A ciência se autoproduz nesse processo, porém, quando digo “ela se autoproduz” , também quero dizer que ela não se autoproduz entre quatro paredes: ela se auto-ecoproduz, já que sua ecologia é a cultura, é a sociedade, é o mundo.

O sujeito estabelece relações com o novo na produção da vida, reestruturando o seu próprio organismo. As novas situações vinculam-se à cultura, às experiências anteriores, reestruturando e propiciando a aprendizagem do sentido das coisas. Isso se constrói em um processo progressivo, dialógico, espiralar e recursivo, em que o sujeito aprende na interação com a multiplicidade de vivências e experiências da cotidianidade.

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