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2.1 - Natureza da pesquisa

2.1.1 - O Problema

O consumo de drogas entre adolescentes em nossa sociedade é um fenômeno bastante antigo, ele sempre existiu em várias culturas. No Brasil o consumo de drogas por parte de jovens matriculados em instituições educacionais públicas nas grandes capitais, em cidades de médio porte e no Distrito Federal, se tornou um dos grandes problemas sociais e culturais desse novo milênio. Para Schenker & Minayo (2003) a adolescência constitui-se em um período crucial no ciclo vital para o início do uso de drogas, seja como experimentação, seja como consumo ocasional, indevido ou abusivo.

A literatura (SCHENKER & MINAYO, 2003; MARQUES & CRUZ, 2000; CALDEIRA, 1999; GRYNBERG & KALINA, 2002) entende a adolescência como uma fase conflituosa devido às transformações biológicas ou psicológicas. Emergem as curiosidades, os questionamentos, a vontade de experimentar o novo, o sentimento de ser capaz de tomar as suas próprias decisões, não aceitando orientações e, mesmo dentro do ambiente familiar, o adolescente geralmente apresenta um sentimento básico de solidão, uma sensação de vazio. O jovem tende a apresentar comportamentos tão diferenciados que são confundidos, às vezes, com transtornos mentais. O afastamento familiar pode fazer com que se aproxime do grupo de iguais. Segundo Marques & Cruz (2000), se este grupo estiver consumindo drogas, provavelmente o adolescente sentir- se-á pressionado a usar também, acreditando estar dando provas de sua autonomia, auto-

45 suficiência e lealdade. Segundo Nery Filho e Torres (2002), a droga aparece na adolescência como uma afinidade que admite a aplicação de laços sociais, favorecendo o indivíduo a fazer parte de um determinado grupo de iguais, ao mesmo tempo em que busca novos ideais e novos vínculos, bem diferentes dos princípios do seu grupo familiar. Segundo Grynberg e Kalina (2002), há na adolescência uma crise em que os jovens se defrontam com o meio social em que vivem e sua história individual, por isso usam drogas. Para esses autores, esse comportamento representa um protesto à sua imaturidade ou impotência de lidar com a própria realidade, criando dentro de si a ilusão de um sentimento de onipotência. Nesse sentido, pode-se compreender, o fato de o adolescente não temer nenhum risco, se julgar sempre vencedor, acreditar que no momento em que decidir parar com o uso de drogas irá conseguir. É como se a linha imaginária entre o prazer que a droga oferece e a sua dependência fosse imperceptível. E a literatura aponta que entre as diversas instituições que formam a rede de apoio capaz de prevenir o envolvimento do adolescente com as drogas estão a família e a escola (HOPPE & KOLLER, 1997).

A família compreendida como um fator dependente do contexto, mesmo sendo considerada um dos fatores relevantes, necessita ser combinada com outros, pois a adaptação a determinadas situações depende da interação de seus esforços com as demandas do ambiente. Pertencer a uma família pode ser considerado um fator de proteção ou de risco (HAWLEY & DeHAAN, 1996), de qualquer modo, os padrões de comportamento dos pais e as interações familiares são em grande parte responsáveis pelas atitudes dos filhos (CHOR, 1996).

A escola pode ser compreendida como agente socializador, um fator fundamental na potencialização de resiliência, pois excede o limite físico de ambiente familiar e tem forte efeito e de longa duração para o ajustamento do comportamento.

46 Para isso precisa oferecer experiências como desafios e não como ameaças (PINHEIRO, 2004). A escola pode agir como contexto de valorização para o desenvolvimento, mas também pode ser compreendida como agente propiciador, pois ninguém desconhece que a escola possui espaços propícios para encontros e interações entre jovens usuários de drogas, fatores esses que agindo de forma combinada transformam a instituição escola em um imponente fator de risco.

No contexto da argumentação acima, o objetivo deste trabalho é pesquisar a percepção de jovens em situação de risco psicossocial, que se declararam usuários de drogas, estabelecendo confronto com os jovens que se declararam não usuários de drogas, sobre o sentido da família e da escola em suas vidas, identificando perspectivas, relacionamento com a família e com a escola.

2.1.2 - Justificativa

Se a adolescência é própria do ser humano, representando a transição entre a puberdade e o estado adulto (DRUMMOND & DRUMMOND FILHO, 1998), e é encarada como uma etapa crucial do processo de crescimento e desenvolvimento, na qual o adolescente se torna vulnerável a diversos distúrbios, entre eles o consumo de drogas, então, porque alguns adolescentes apresentam invulnerabilidade para administrar esses distúrbios ou essas situações estressantes? Conseguem se adaptar diante de dificuldades e enfrentam com sucesso as demandas do seu desenvolvimento, adolescentes que estiverem próximos de uma rede de apoio (família, escola e outros), que ofereçam aos adolescentes o necessário para lidar com essas situações e proporcionando ambientes adequados ao desenvolvimento seguro e saudável exercendo assim um importante fator de proteção. Mas é necessário considerar quese essa rede de apoio (família, escola e outros) não estiver exercendo o seu papel, essa será considerada

47 fator de risco, pois dificultará o desenvolvimento. Para Paludo & Koller (2005), esses fatores de risco podem ser ambientais (vulnerabilidade socioeconômica, famílias numerosas, violência intrafamiliar, abuso e ausência de apoio social afetivo, isolamento, desemprego e baixa escolaridade), ou individuais (variáveis de personalidade, problemas genéticos, habilidades intelectuais e sociais pobres, baixa auto-estima, e autoeficácia, deficiência física ou intelectual). Então ser resiliente é ser resistente a dificuldades? Ao compreender crenças e significados, bem como o sentido que a vida possui para os jovens, este trabalho poderá ajudar na orientação de políticas públicas mais adequadas.

2.1.3 - Objetivos Geral

Investigar a percepção de jovens em situação de risco psicossocial que se declararam usuários de drogas (maconha, cocaína, crack e outros), e comparar com a percepção de jovens que se declararam não usuários de drogas, sobre o sentido da escola e da família em suas vidas.

Específicos

• Identificar perspectivas da família e da escola de adolescentes que se declararam usuários ou não de drogas.

• Investigar como adolescentes que se declararam usuários ou não de drogas se relacionam com a família e com a escola.

48 2.2 - Metodologia

Esta é uma pesquisa de abordagem quantitativa exploratória que utilizou a base de dados da Pesquisa Nacional sobre Fatores de Risco e Proteção da Juventude Brasileira (KOLLER, CERQUEIRA-SANTOS, MORAIS & RIBEIRO, 2005), realizada em seis capitais brasileiras (Belo Horizonte, Campo Grande, Manaus, Porto Alegre, Recife e São Paulo), em três cidades brasileiras de médio porte (Arcos - MG, Maués – AM e Presidente Prudente – SP) e em quatro cidades satélites do Distrito Federal (Brazlândia, Paranoá, Planaltina e Samambaia).

2.2.1 - Participantes

Os participantes dessa pesquisa compõem um grupo de 7316 alunos do ensino médio de escolas públicas das cinco regiões do Brasil e do Distrito Federal, divididos nas seguintes cidades: Arcos (6,0%, n=440), Belo Horizonte (9,4%, n=685), Campo Grande (13,0%, n=954), Manaus (2,2%, n=162), Maués (1,6%, n=115), Porto Alegre (13,4%, n=980), Presidente Prudente (13,3%, n=975), Recife (15,4%, n=1126), São Paulo (14,0%, n=1024) e Distrito Federal (11,7%, n=855). As idades dos participantes estão entre 14 e 24 anos, sendo que 96,7% da amostra concentra-se a faixa etária de 14 a 19 anos (média de 16 anos). Com relação ao gênero, 45,6% são do sexo masculino e 54,3% são do sexo feminino. Destes, 38,1% declararam ser brancos, 15,8% negros, 36,6% pardos, 3,9% amarelos e 3,4% indígenas. O arrimo de família foi atribuído ao pai com 61% e à mãe com 60,4%, sendo que 88% dos jovens responderam não sustentar a casa. Analisando a renda salarial familiar mensal (salário mínimo em 2005 ano da pesquisa era de R$ 300,00), observa-se que esta variou de menos de um salário até mais de quatro salários, sendo que 18,2% dos participantes tinham rendimentos até um salário mínimo; 30,8% entre mais de um até dois salários mínimos; 22,8% entre mais de

49 dois até três salários mínimos e 28,3% declaram rendimentos acima de três salários mínimos. Com relação à constituição familiar, dos 7316 participantes, 85,7% indicaram ter o pai vivo, e 95,8% a mãe. Um montante de 59,2% tinham o pai habitando o mesmo lar, enquanto que 88,1% tinham a mãe habitando o mesmo lar e 78,8% tinham irmãos presentes no domicílio. A pesquisa também revelou a presença de padrastos (9,7%), madrastas (1,9%), filhos (4,6%), avôs (5,6%) e avós (9,6%) no ambiente familiar. Aproximadamente metade dos pais é oriunda do interior do próprio estado ou do interior de outro estado. A maioria, 84,2% dos jovens recebe ajuda assistencial do governo, como bolsa escola, bolsa alimentação e outros. Sobre a orientação sexual, 96,1% se declarou heterossexual. Com relação a trabalho remunerado atual ou nos últimos doze meses, 51,9% se declararam estar exercendo ou já ter tido alguma atividade. O estado civil predominante na amostra foi de solteiros (91,7%).

2.2.2 – Instrumento

Esta pesquisa consistiu da análise de uma base de dados desenvolvida a partir de um questionário para levantamento de fatores de risco e proteção produzido para o estudo “Juventude Brasileira” (KOLLER, CERQUEIRA-SANTOS, MORAIS & RIBEIRO, 2005). O instrumento consta de 109 questões ou aplicações de múltipla escolha, com o formato de autopreenchimento, baseadas em escalas preexistentes como: Escala de Auto-Estima de Rosemberg (1989), Afeto Positivo e Negativo para Crianças - PANAS-C (LAURENT, CATANZARO, JOINER, RUDOLPH, POTTER, LAMBERT, OSBORNE & GATHRIGHT, 1999) adaptada para o Brasil (GIACOMONI, 2002), Escala de Satisfação com a Vida (DIENER, EMMONS, LARSEN & GRIFFIN, 1985), Escala de Resiliência (WAGNILD & YOUNG, 1993), também adaptada para o Brasil (PESCE, ASSIS, SANTOS & OLIVEIRA, 2004). Foi aplicado em salas com 30 a 35

50 alunos, acompanhados por três a quatro membros da equipe de pesquisa. Jovens portadores de deficiências que não soubessem ou não pudessem ler tinham a possibilidade de acessar alguém da equipe ou responder ao questionário em sala separada. O tempo médio para responder ao questionário foi de duas horas.

O instrumento utilizou questões do tipo Verdadeiro ou Falso, para serem respondidas a partir de uma escala Likert de cinco pontos de frequência e intensidade, e investigaram aspectos sobre a caracterização bio-sócio-demográfica dos participantes, assim como sobre as temáticas de educação, saúde (incluindo drogas e sexualidade), trabalho, violência, lazer, religiosidade, rede de apoio, auto-estima e auto-eficácia. A seleção do subgrupo para comparação resultou em um total de 245 jovens respondentes do questionário sobre Juventude Brasileira que se declararam usuários de drogas (maconha, cocaína, crack etc) no último mês anterior à data da aplicação, e foi determinada a partir de uma adaptação da questão 70 do questionário:

“Questão 70 - De um mês pra cá, quantos dias você fez uso das drogas abaixo? Marque com X: Tipo de droga Todos ou quase todos os dias

(20 dias ou mais) Alguns dias (4 a 19 dias) Poucos dias (1 a 3 dias) Não Usou a. Bebida alcoólica ( ) ( ) ( ) ( ) b. Cigarro comun ( ) ( ) ( ) ( ) c. Drogas ilícitas ( ) ( ) ( ) ( )

Drogas ilícitas (maconha, cocaína, crack, etc.)”

Como o objetivo era avaliar aspectos em função do uso ou não de drogas ilícitas (maconha, cocaína, crack etc), a análise dos dados desconsiderou ou não analisou os itens “a” (consumo de bebida alcoólica) e “b” (cigarro comum), que podem ser analisados em outra pesquisa. Considerou-se apenas o item “c”, que perguntou sobre o uso de drogas ilícitas (maconha, cocaína, crack etc). A partir disso, contemplou-se os respondentes das três primeiras alternativas: “Todos ou quase todos os dias (20 dias ou

51 mais)”;”Alguns dias (4 a 19 dias)”; “Poucos dias (1 a 3 dias)” como usuários declarados de drogas no último mês, e os que responderam “não usou” como declarados não usuários de drogas no último mês. A tabela 1 mostra um resultado descritivo obtido com as respostas das frequências dos respondentes às alternativas desse item:

Tabela 1: Frequência dos jovens que se declararam e não se declararam usuários de drogas

FREQUÊNCIA PORCENTAGEM Usou drogas no

último mês

245 4,4 Não usou drogas no

último mês

5339 95,6

A partir dessa informação, definimos a amostra para o nosso estudo, ou seja, separamos para investigar e comparar com os que se declararam não usuários de drogas, os 245 jovens brasileiros ou 4,4% dos respondentes que se declararam usuários de drogas no mês anterior à aplicação do questionário nas escolas. Desses, 35,9% dos jovens já tentaram parar de usar drogas (maconha, cocaína, crack, etc), e 32,6% já se envolveram com o tráfico de drogas.

2.2.3 – Procedimentos de análise

Em um primeiro momento, a análise foi feita por meio da estatística descritiva, ou seja, uma observação nos resultados das freqüências absolutas e relativas dos dados. Num segundo momento correlacionou-se os jovens usuários de drogas no último mês, a sua motivação, o seu relacionamento com o ambiente familiar e escolar, com jovens que se declararam não usuários de drogas. Analisamos neste tópico diferenças estatísticas

52 entre as freqüências observadas (O) e as freqüências esperadas (E). Para essa análise, utilizamos os testes Qui-quadrado e o teste t de Student. O teste Qui-quadrado (X2) para aferir a frequência com que os elementos de uma amostra que se repartem pelas classes de uma variável nominal categorizada são ou não idênticos. O test t de Student para verificar se uma determinada diferença encontrada entre medidas de dois grupos é estatisticamente significante (TRIOLA, 1999).

A hipótese (H

0) dessa pesquisa é de que jovens que se declararam usuários de drogas têm problemas de relacionamento com a escola e com a família.

A estatística de teste (X2) tem distribuição qui-quadrado com (L-1)*(C-1) graus de liberdade onde L é o número de linhas e C o número de colunas. A hipótese nula é rejeitada para um nível de confiança de 95% quando o p<0,05. Os dados foram analisados com o auxílio do software estatístico SPSS, versão 15.

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