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CAPÍTULO I Unidade nacional e a bola

CAPÍTULO 2 Racionalidade ou carisma?

3. Normas e regulamentos do nacional de 1973

De modo geral, as grandes equipes mostravam-se refratárias à expansão do campeonato nacional devido aos argumentos já relacionados neste trabalho, sobretudo o caráter deficitário das rendas dos jogos de longa distância e de pouco apelo para o público. Visando conter tais descontentamentos a CBD dispunha de algumas normas e dispositivos para aplacar tais críticas. As quatro grandes equipes de São Paulo e Rio de Janeiro (Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos; Flamengo, Fluminense, Vasco da Gama e Botafogo), mais as duplas de gaúchos e mineiros (respectivamente, Internacional e Grêmio; Atlético Mineiro e Cruzeiro) forma alçados a um status superior, e assim nos confrontos

fora de seus domínios, contra equipes de menor expressão, receberiam uma cota maior. Tal iniciativa não era válida para os jogos entre essas equipes, ou seja, não se aplicava quando da disputa os “clássicos”.

Na décima-segunda rodada, os oito primeiros colocados teriam um acréscimo em suas cotas de participação. A CBD pretendia premiar em dinheiro os quatro primeiros colocados no campeonato, a equipe que marcasse o maior número de gols na fase classificatória e subseqüentes, as equipes que obtivessem o maior número de vitórias ao término de cada fase.

Uma norma colocada já posta em prática em 1972 seria mantida e dizia respeito às equipes menores, que deveriam manter uma média de renda para que pudessem retornar no próximo nacional. Nota-se, portanto, o caráter precário na conquista da vaga, configurando uma nítida situação de favor (clientelista), mais do que propriamente méritos. Além do mais, o objetivo da CBD era assegurar às grandes equipes em um determinado status, dando-lhes cotas maiores e assim eliminar qualquer tentativa de crítica à entidade e seu mandatário, João Havellange.

Definidos os 40 participantes, faltava a divulgação da fórmula do torneio, que, mais uma vez, mostrava-se complexa e confusa. Ao todo o campeonato teria 656 jogos, disputados entre 26 de agosto de 1973 a 20 de fevereiro de 1974 (Placar, 12/06/73). Para uma equipe conseguir o título de campeã, seriam necessários disputar 40 jogos.

Primeiramente, as 40 equipes seriam divididas em 2 grupos com 20 cada, as equipes jogaram entre si dentro dos seus respectivos grupos, perfazendo um total de 380 jogos nesta fase. Na segunda fase, as equipes foram reagrupadas em 4 grupos com 10 cada, obedecendo ao critério de regionalização, nesta fase foram mais 180 jogos. Para a semifinal classificaram-se os 20 primeiros colocados, independentemente do grupo que pertenciam, ou seja, os pontos obtidos nas 2 primeiras fases foram somados para poder apurar as 20 melhores equipes de forma global, portanto, não havia preocupação com a classificação dentro do grupo.

Os 20 classificados foram divididos em 2 grupos com jogos dentro das chaves, soma-se nesta fase mais 90 jogos. Nesta fase, as duas melhores equipes por grupo

disputaram o título nacional em um quadrangular de turno único, fazendo os últimos 6 jogos do nacional - 73.

Observa-se uma grande quantidade de jogos disputados em curto espaço de tempo, acompanhados de longas viagens, pouco tempo para treinamento e recuperação de lesões, e assim repetiam-se os mesmos problemas dos nacionais anteriores. Com relação à fórmula do campeonato, o objetivo era garantir a presença das grandes equipes fora do eixo tradicional, e, em definido o calendário, era impossível um confronto entre todas as equipes. Por outro lado, fica dificultado às pequenas equipes receberem a visita de todos as grandes, principalmente após a fórmula apresentada. Quando do reagrupamento das equipes a finalidade era provocar um maior número de clássicos, prevalecendo a rivalidade regional e assim as equipes economizariam em viagens63.

Simultaneamente às disputas do nacional-73, foram apresentadas algumas sugestões para o campeonato seguinte, que estava previsto para começar em março, um mês após as finais do torneio anterior. O calendário futebolístico de 1974 era considerado atípico, pois em junho estava prevista a realização do décimo campeonato mundial na Alemanha, portanto a CBD estaria com toda a sua atenção voltada para os preparativos do selecionado brasileiro. Em 1970, como já destacado no capítulo anterior, os clubes ficaram livres para disputar amistosos e realizar excursões, pois as disputas dos regionais estavam marcadas para começarem logo após a Copa do Mundo. Quatro anos mais tarde a CBD marcaria o início do Campeonato Nacional mesmo com as ausências dos principais jogadores dos grandes clubes.

As tensões entre os propósitos nacionalizantes do futebol, capitaneados pela CBD, e os interesses locais dos clubes e federações estaduais ganharia ainda os contornos de uma galhofa na imprensa numa matéria intitulada “O banquete vira boca-livre” (Placar, Maio de 1973), que deixava evidente que a CBD não estava atualizada em relação aos acontecimentos regionais do futebol brasileiro, muito voltada para a própria campanha de Havellange à FIFA.

63 Neste nacional registrou-se o primeiro caso de doping, no jogo Atlético (MG) e Vasco da Gama, e o jogador envolvido foi o centro-avante atleticano Campos, que foi punido por uso de substâncias proibidas.

A CBD convidou um clube que havia paralisado suas atividades profissionais em dezembro de 1972. Esta equipe era o Cruzeiro de Porto Alegre, que devia duzentos mil cruzeiros e não tinha condições de saldar essa dívida. Além disso, não possuía rendas e nem torcida e assim seus dirigentes transformaram seu campo em um cemitério, dividido em 13.600 covas, vendidas a 5.000 cruzeiros cada pagáveis em 5 anos. Esse negócio possibilitou que o clube saneasse suas finanças e planejasse a sua volta ao futebol em 1975. Porém, o convite da CBD faz com que seus diretores começassem a planejar a montagem de uma equipe. Por fim, a reportagem apontava uma questão óbvia: como um time pode participar de um campeonato brasileiro sem time, sem campo e sem jogadores?

O provável convite ao Cruzeiro de Porto Alegre provocou uma polêmica entre os dirigentes gaúchos, pois Hoffmeister, presidente da federação, afirmava que o convite não estava garantido e ainda através de um relatório provaria que o clube não teria condições de participar do nacional e, assim, caberia a ele indicar o terceiro representante do Estado, em 1974. É bom lembrar que, desde 1971, Hoffmeister vinha brigando para conseguir uma terceira vaga para o Estado. O Esporte Clube Caxias tinha a preferência do presidente da federação, mas as questões de infra-estrutura impediam a indicação e, além do mais, Antonio do Passo, diretor da CBD, declarava que os clubes do interior não teriam chances de serem convidados. O que não se confirmaria, pois ao divulgarem a lista dos convidados de 1974, observava-se a presença do Treze de Campina Grande (não era um time da capital) e o Itabaiana (preterindo qualquer outro clube de Aracaju).

Segunda parte: João Havellange