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Às reflexões de Gary Becker nos anos sessenta se somaram as de outros teóricos do capital humano que constituíram a escola da Nova Economia Doméstica. Seu principal enfoque se caracterizava pela aplicação de conceitos neoclássicos a modelos de produção doméstica; e utilizava a análise da distribuição do tempo para explicar a divisão sexual do trabalho em casa e as decisões dos membros da família em relação à sua incorporação à força de trabalho.

A aplicação dos trabalhos de Becker se estendeu para novos temas, como a utilização da teoria do capital humano, para analisar as diferenças de gênero nos níveis de

membros do domicílio e do número de adultos tende a aumentar o salário de reserva da mulher, levando a uma menor possibilidade de sua participação no mercado de trabalho.

educação, nos estudos sobre rendimentos e diferenciais de salários, capacitação e os determinantes do desemprego. Em termos metodológicos, estes modelos neoclássicos seguiram fundamentalmente o que Harding (1987) denominou como “agregue mujeres y mezcle” sem alterar o fundamental dos modelos.

Estes modelos, dentro de uma perspectiva feminista, apresentavam muitas limitações, impostas por um marco analítico ortodoxo, uma vez que não reuniam características que permitissem interrogar, muito menos responder, às questões que o movimento de mulheres colocava sobre a socialização, a desigualdade de gênero e as relações assimétricas de poder.

A aplicação da teoria das vantagens comparativas e dos modelos de capital humano e, consequentemente, a análise da especialização no âmbito doméstico, era intrinsicamente uma análise estática, uma vez que considerava a distribuição dos recursos entre os membros da família igual às suas habilidades de gênero. Essa aquisição e distribuição era precisamente o que questionavam as feministas. Além disso, tais enfoques omitiam o processo de realização pelo qual têm lugar tais aquisições, não questionando sua incidência na autonomia, no poder e na capacidade de maximizar o bem-estar dos integrantes da família.

Por todos estes aspectos, pode-se afirmar que essa análise não constituía um instrumento transformador, uma vez que: a) não questionava o androcentrismo dos modelos ortodoxos; b) não incorporava os fatores não econômicos que intervêm na construção do gênero; e c) não considerava as soluções propostas pelas feministas.

O enfoque de Becker era distinto das abordagens construtivistas da teoria feminista e do trabalho empírico das ciências sociais e da economia feminista. Becker atribuiu a divisão do trabalho doméstico a supostas diferenças biológicas, em parte, e às diferenças de investimentos com a educação.

Há necessidade de incorporar uma análise mais holística sobre as verdadeiras causas da presença das mulheres no mercado de trabalho, que supere uma visão puramente econômica com os custos de oportunidade. Para Friedan (1971), era necessário analisar aspectos como a dominação masculina, baixo nível de autonomia e de confiança em si mesmas.

Para Pujol (1998), todas as tentativas, nestas duas últimas décadas, de incluir o tema nas análises econômicas não obtiveram êxito, uma vez que a economia é a ciência social mais dominada pelos homens; situação que é pior quando se configura tendo a escola neoclássica como dominante. Entre os paradigmas alternativos há um melhor tratamento do tema; no

entanto, estão completamente marginalizados pelo pensamento econômico dominante (FERBER, 1981).

A economia é fortemente dominada por um paradigma altamente conservador e pró-capitalista. Com a hegemonia neoclássica tornou-se extremamente difícil conseguir respostas para as questões feministas (MCDONALD,1982:169). A economia neoclássica foca as relações de troca e exclui as atividades não monetárias, ignorando o comportamento econômico das mulheres (COHEN,1982:90). A economia neoclássica simplifica e estereotipa a natureza da vida das mulheres, as relações sociais e as motivações econômicas. Neste sentido, as mulheres tendem a ser vistas como esposas e mães, membros de uma família nuclear onde são economicamente dependentes de um provedor masculino. E a família é vista como uma entidade harmoniosa. A prevalência do padrão neoclássico de uma estrutura de mercado competitivo perfeito serve para ofuscar a natureza dos problemas das mulheres no mercado de trabalho.

Finalmente, os indivíduos são assumidos como homens e o ponto de vista masculino é o único considerado, e as mulheres são vistas como objeto de estudo por meio de seus papéis como donas de casa e esposas.

Para Sen, desde a década de 1970, vem se desenvolvendo uma crítica abrangente a um dos principiais princípios da teoria econômica tradicional: o pressuposto de que os agentes se orientam apenas pela busca de autointeresse. O autor afirma que “a natureza da economia moderna foi substancialmente empobrecida pelo distanciamento crescente entre economia e ética”. (SEN,1999:23)

Por isso as economistas feministas se deparam com uma difícil tarefa, que é ao mesmo tempo intelectual e política, mas também tensionada com o perigo da censura acadêmica, o ostracismo universitário e o falecimento profissional. A despeito das condições adversas apresentadas pela natureza metodológica e pela construção ideológica da disciplina, a crítica feminista à economia e o surgimento de uma economia feminista ainda estão em processo de construção. Isso, inicialmente, assume forma nas tentativas de integrar uma análise de gênero e a contribuição econômica das mulheres dentro de paradigmas existentes. Mas tais tentativas levaram à percepção de que “encaixar (as mulheres) na análise existente não funciona” (COHEN,1982:99).

Para Vandelac, uma reconstrução feminista de categorias econômicas, tal como trabalho, precisa necessariamente fazer uma transcendência epistemológica das fronteiras da disciplina existente (1986:18apudPUJOL,1998).