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Novas estruturas mentais x inteligência artificial

A laboridade e o trabalhador do conhecimento

6.2 Novas estruturas mentais x inteligência artificial

Para que possamos analisar o desenvolvimento social e o sur-gimento de novos padrões individuais no mercado de trabalho, é importante salientarmos o papel que as estruturas mentais – as quais possibilitam a aquisição de conhecimento, sobretudo o pensamento e a inteligência – desempenham na vida do trabalhador atual.

138 Psicologia das organizações: desafios da gestão contemporânea As estruturas mentais, ou esquemas, são padrões que permitem ao sujeito formas organizadas de elaboração do pensamento. Wadsworth (1996 apud TAFNER, 2019) define os esquemas (operação, assimilação e acomodação, segundo a teoria de Jean Piaget) “como estruturas mentais, ou cognitivas, pelas quais os indivíduos intelectualmente se adaptam e organizam o meio”. Conforme explica Pulaski (1986 apud TAFNER, 2019):

esquema é uma estrutura cognitiva, ou padrão de compor- tamento ou pensamento, que emerge da integração de unidades mais simples e primitivas em um todo mais am-plo, mais organizado e mais complexo. Dessa forma, temos a definição de que os esquemas não são fixos, mas mudam continuamente ou tornam-se mais refinados.

À medida que nos desenvolvemos, esses esquemas vão se tornando mais complexos. Aprendemos, por exemplo, a processar e a diferenciar estímulos, refinando nossas ações cotidianas. Em uma sociedade na qual a velocidade da informação e o uso constante de mecanismos digitais permeiam nossos relacionamentos, a inteligência passou a ser uma estrutura mental determinante.

Essa capacidade de resolver problemas é um dos grandes dife-renciais do trabalhador do conhecimento. É preciso saber resolver problemas e, mais do que isso, oferecer à organização respostas diferentes a eles. Estamos diante de uma revolução dentro e fora das empresas, onde as capacidades humanas passam a ser o grande ponto de diferenciação entre as empresas, e não mais somente os atributos tecnológicos.

Dessa forma, consideramos como novas estruturas mentais o pensamento sistêmico e a inteligência emocional, variantes das estruturas tradicionais propostas pela psicologia cognitivista e adaptadas às mudanças da Sociedade do Conhecimento. Não bas-ta mecanizar ou automatizar; precisamos de pessoas preparadas para operar, de forma inteligente, as máquinas, e garantir sustenta- bilidade nos processos relacionais que envolvem as organizações.

A laboridade e o trabalhador do conhecimento 139 Vale, então, conceituar essas novas estruturas mentais, como se demonstra a seguir.

Pensamento sistêmico: pensar de forma sistêmica é ter a visão integral da organização. O estudo da administração de empresas, contudo, com a Revolução Industrial do século XIX, nasceu voltado à área de produção. É apenas no século XX, com as dificuldades e limitações da ciência tradicional, que o conceito do pensamento sistêmico passa a ter importân-cia. A relevância em entender o pensamento sistêmico como uma das novas estruturas mentais exigidas pela sociedade contemporânea está na forma como resolvemos os problemas a partir da ótica sistêmica. Como apontam os autores Dolci, Bergamaschi e Vargas (2013, p. 40), “os novos desafios que os administradores passam a enfrentar são ‘sistemas de pro-blemas’ ou problemas organizacionais, imersos em contextos problemáticos, que não podem ser tratados separadamente”.

A capacidade, portanto, de relacionar as variáveis dos pro-blemas organizacionais atuais e analisar suas consequências com foco no sistema vivenciado pela empresa cotidianamente é, sem dúvida, um determinante de sucesso. Isso comprova a relação direta entre a gestão do conhecimento e o pensa-mento sistêmico, fundamentando a importância desse último como estrutura mental decisiva no indivíduo que integra esse modelo de gestão.

Inteligência emocional: até a década de 1990 acreditava-se que mensurar o coeficiente de inteligência intelectual (QI) era o suficiente para entender e avaliar o comportamento humano.

Com a evolução da ciência e, sobretudo, da psicologia, percebeu-se que existiam outros fatores que impactavam de forma decisiva o comportamento humano. Os elementos descritos nesse conceito fundamentam a inteligência emocional (IE) como uma nova estrutura mental, ou seja, o destaque

140 Psicologia das organizações: desafios da gestão contemporânea na motivação, na persistência, no controle de impulsos, na resiliência e na empatia. Esses são itens determinantes no perfil do novo trabalhador na sociedade atual.

Conforme destacamos, mecanizar empresas não garante com-petitividade. Ao contrário, é o elemento humano de alto nível de qualificação – o qual possui as novas estruturas mentais para operar e determinar a análise qualitativa do que a máquina faz – que trará a liderança às empresas.

Nesse contexto de mudança e avanço tecnológico, um dos assun-tos de maior discussão é a entrada cada vez mais intensa da inteli-gência artificial (IA) no mercado de trabalho. Nota-se uma miopia de análise quando se supõe que essa tecnologia substituirá postos de trabalho ou garantirá maior eficiência nas empresas somente por sua existência.

A IA, uma tecnologia contemporânea, criada na década de 1940 e marcada pela Segunda Guerra Mundial, é uma ciência multidisciplinar (LIMA; PINHEIRO; SANTOS, 2014). Os primeiros estudos sobre inteligência artificial, considerando o contexto histórico, voltaram-se à necessidade de desenvolver métodos tecnológicos para análise balística, quebra de códigos e cálculos para projetos de armas nucleares. É uma nova ciência que se serve de conceitos da computação e da psicologia cognitiva para tentar traduzir atividades humanas em máquinas.

Dessa forma, surgiram as primeiras pesquisas direcionadas à construção de computadores com o objetivo de realizar processa-mentos matemáticos. Sobre isso, Cassiano Maschio (2018) nos traz alguns números:

no Brasil, existem cerca de 17 mil bots, que registram um tráfego mensal de 800 milhões de mensagens, segundo o Mapa do Ecossistema Brasileiro de Bots, produzido pelo Mobile Time. Estudos apontam que 50% da força de tra-balho será substituída até 2050; as empresas reduzirão

A laboridade e o trabalhador do conhecimento 141 cerca de U$ 8 bi em seus custos anuais até 2022; haverá aumento da produtividade; será a revolução no mercado de trabalho.

A inteligência artificial e suas aplicações, segundo podemos observar, irão otimizar, flexibilizar e customizar as organizações nos próximos anos. Vale considerar, porém, que nesse cenário surgem as novas atividades profissionais embaladas pela tecnologia e pelas novas estruturas mentais (pensamento e inteligência).

Por trás de um chatbot (ferramenta de IA para atendimento), por exemplo, existem inúmeros profissionais que operam na funciona-lidade para deixá-la mais eficiente. Outro elemento fundamental é que robôs, programados com IA, não incorporam valores humanos.

A construção desses valores ocorre a partir da experiência indivi-dual e social, não podendo ser aprendida mecanicamente. Isso nos garante singularidade nesse processo.

A inteligência artificial e suas aplicações estão revolucionando nossas vidas, mas podemos afirmar que as competências humanas, a exemplo das estruturas mentais descritas nesta seção, fazem a diferença no contexto do trabalho. Nesse sentido, devemos ter

“medo” de perder o emprego pela robotização se estivermos, na verdade, perdendo a nossa “humanidade”. Nas próximas décadas, muita coisa será desenvolvida pela inteligência artificial e pela engenharia aplicada, como carros autônomos, veículos voadores, drones para entregas, pré-atendimento ao cliente, mundos virtuais, aplicativos de compra etc. A parte do trabalho correspondente ao que nos torna diferentes e insubstituíveis, ou seja, o pensamento, será de nossa competência.

Como Maschio (2018) também afirma, é muito difícil que os robôs sejam capazes de entender nossas emoções e idiossincrasias (características peculiares). Será necessário, então, que estejamos prontos para conviver com as facilidades e limitações que encontra-remos neles.

142 Psicologia das organizações: desafios da gestão contemporânea Novos cenários surgirão, novas tecnologias assumirão postos de trabalho, novas oportunidades de trabalho nascerão. O futuro será a soma de pessoas, processos e sistemas inteligentes, focados em resultados rápidos e confiáveis.