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4. O ESTADO PLANEJADOR: O PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO

5.2. O novo modelo de concessões

Se quanto a seus objetivos o PIL pouco inova em relação ao PAC e ao PNLT, no que diz respeito à estratégia de atuação do Estado sobre o setor ferroviário o modelo de concessões propugnado representa, em tese, um novo paradigma. Nele, o Estado empresário emerge com uma força equiparável somente aos tempos de RFFSA, mas com a diferença de que as funções de regulador e de planejador se acumulam, criando um cenário em que múltiplas estratégias buscam se complementar, num grau de ativismo estatal não encontrado em nenhum outro setor regulado. A figura a seguir tenta sintetizar essas múltiplas estratégias e sua intensidade, ao longo do tempo, tomando como marco inicial a inclusão da RFFSA no PND.

84 Figura 10 – Evolução dos arranjos institucionais para atuação do Estado no setor

ferroviário

Fonte: o autor

Inicialmente, o trecho Açailândia (MA) a Porto de Vila do Conde (PA) foi selecionado para marcar o lançamento do chamado “novo modelo de concessão” do governo federal. Em 27 de fevereiro de 2013, por meio de uma Nota Técnica, a ANTT propôs “um modelo de outorga de forma a afastar o risco de demanda do concessionário na tentativa de ampliar a participação de capital privado em projetos de infraestrutura ferroviária” e, por outro lado, eliminar “o risco de engenharia do governo ao delegar a construção de ferrovias ao setor privado” (ANTT, 2013). A concessão, pelo prazo de 35 anos, contempla ferrovias de bitola larga (1.600 mm), com alta capacidade de carga e traçado geométrico otimizado que permita maiores velocidades (80 km/h).

A estrutura do modelo de concessão proposto tem quatro características centrais: (1) a concessionária detém o direito de exploração da ferrovia; (2) a Valec compra a totalidade da capacidade da ferrovia, remunerando a concessionária por uma

85 tarifa (a chamada Tarifa pela Disponibilidade da Capacidade Operacional); (3) a Valec subcede, a título oneroso, partes do direito de uso aos usuários e (4) a concessionária presta serviços de operação diretamente aos usuários, que a remunera através de outra tarifa (a Tarifa de Fruição), na medida da utilização da ferrovia.155

Além disso, com vistas a reduzir o risco do investidor, a Valec comprará, anualmente, toda a capacidade operacional da ferrovia e fará ofertas públicas da capacidade adquirida, garantindo-se o direito de passagem na circulação de trens ao longo de toda a malha. A capacidade será ofertada a embarcadores, operadores ferroviários independentes e a concessionários ferroviários (desde que de outros trechos ferroviários).

O modelo de concessão proposto prevê também a realização de investimentos durante os primeiros cinco anos de contrato, sendo que os bancos públicos brasileiros poderão financiar até 70% do valor do investimento com uma taxa de juros de 1,0% mais a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). A Valec, por sua vez, ainda antecipará receitas pela disponibilidade da capacidade operacional durante o período de obras, em valor equivalente a 15% do capital expenditure (CAPEX) total de referência, a serem abatidas linearmente durante os anos operacionais da remuneração ordinária, desde que o concessionário cumpra o cronograma de execução física.

A proposta do governo federal, porém, tem encontrado dificuldades para se firmar. Em 15 de fevereiro de 2013 o Ministério dos Transportes aprovou o Plano de Outorga do Trecho Açailândia (MA) – Barcarena (PA) apresentado pela ANTT, prevendo a publicação do edital em meados de outubro de 2013. Após consultas públicas, os estudos de concessão foram enviados para apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU) que advertiu o governo da inviabilidade em se aprovar o leilão da primeira ferrovia do PIL156 (RITTNER e VELOSO:2013). Segundo uma leitura inicial

do TCU, o modelo não estaria nem no âmbito da Lei de Concessões (Lei nº

155Disponível em: http://www.logisticabrasil.gov.br/ferrovias2 [20/11/2013].

156 Disponível em: http://www.revistaferroviaria.com.br/index.asp?InCdEditoria=2&InCdMateria=20060

86 8.987/1995), nem no âmbito da Lei de PPPs (Lei nº 11.079/2004) (RITTNER e VELOSO:2013).

Visando superar falta de embasamento legal apontada pelo TCU, em 23 de outubro de 2013 foi editado o Decreto nº 8.129 que instituiu a política de livre acesso ao Subsistema Ferroviário Federal, estipulando que cabe à Valec a compra e a venda do direito de movimentação de cargas das ferrovias que serão concedidas (art.3º, II). Além disso, para recuperar a imagem da Valec, vista como fonte de insegurança, foi editado o Decreto nº 8.134/2013 que (1) remodelou a estrutura de governança da empresa obrigando-a a adotar padrões similares aos da BM&FBovespa, o que inclui a divulgação de fluxo de caixa e a adoção do padrão internacional de contabilidade (artigo 4º) e (2) dotou-a de um capital social de mais de R$ 8 bilhões (artigo 7º).

Entre as resistências apontadas pelo TCU para aprovação do modelo e a institucionalização da política de livre acesso (Decreto nº 8.129/2013) e a submissão da Valec a rígidos padrões de governança corporativa (Decreto nº 8.134/2013), o governo federal decidiu priorizar o trecho da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico) que vai de Lucas do Rio Verde (MT) a Campinorte (GO). Segundo o atual Ministro dos Transportes, César Borges, o trecho já conta com um Projeto Básico com mais detalhes e qualidade que o trecho Açailândia (MA) – Barcarena (PA) (WARTH:2013). Assim, em 16 de dezembro de 2013 o TCU aprovou, com ressalvas, os estudos de concessão para a construção de 883 km de ferrovias entre Lucas do Rio Verde (MT) e Campinorte (GO).

Entre as condicionalidades para aprovação do projeto vale destacar a realização de ajustes no projeto para redução de R$ 1,3 bilhão no custo total do projeto e que a ANTT e o Ministério dos Transportes apresentem, em um ano, estudos sobre o real impacto financeiro dessa concessão para a Valec (WARTH:ibidem). Uma vez cumpridas estas condicionalidades, o governo poderá publicar o edital de licitação para o trecho de ferrovia discutido. No entanto, a tendência é que a decisão do TCU seja contestada já que, segundo César Borges "[a redução de R$ 1,7 bilhão] torna o empreendimento totalmente inviável para o mercado" (WARTH:ibidem).

87 Os ministros determinaram também que, para as próximas concessões de ferrovias, será exigida a apresentação de um projeto básico dentro dos estudos que são apresentados ao TCU. Uma das consequências mais claras dessa determinação é o fato de que o governo não poderá publicar o edital do trecho entre Açailândia (MA) e Barcarena (PA), que embora esteja sob análise do TCU há mais tempo, não possui estudos baseados em projetos básicos de engenharia. Assim, tudo indica que o trecho entre os municípios de Lucas do Rio Verde e Campinorte será o único que o governo poderá leiloar no curto prazo (WARTH:ibidem).