• Nenhum resultado encontrado

São Paulo teve sua expansão urbana deflagrada no final do Império e nos primeiros anos da República Velha, associada ao crescimento da economia cafeeira. Ligada ao Porto de Santos por uma rede ferroviária que se estendeu rapidamente, consolidou-se como grande centro capitalista e exportador, atraindo indústrias estrangeiras, mercados e serviços e aglutinando grande contingente de imigrantes e colonos excedentes das lavouras do interior paulista

e mineiro, bem como de escravos recém-libertos. Dados do IBGE16 apontam que

mais da metade dos habitantes da cidade, em meados da década de 1890, era formada por imigrantes, na maioria italianos, adensada pelas ondas migratórias do início do século, que trouxeram espanhóis, portugueses e japoneses. De acordo com Soller e Matos (2000), em 1872, em pleno “surto cafeeiro” a população de São Paulo era de 31.385 pessoas. Este número subiu para 579.0033 habitantes em apenas cinco décadas (1920).

Soller e Matos afirmam que tamanho crescimento, em ritmo acelerado e em curto espaço de tempo, revelou graves questões urbanas, sendo que a primeira delas, foi a questão “higiênico-sanitarista”

Os “miasmas” empesteavam o ar e água, sendo a sujeira veículo de contaminação. As autoridades higiênicas de São Paulo alertavam que as mulheres que recolhiam roupa para lavar em tinas comunitárias nos cortiços misturavam as roupas e contaminavam as famílias, reforçando a ideia corrente de que o pobre contaminava o rico [...] Essa função passou a ser realizada prioritariamente nos domicílios dos patrões, onde as lavadeiras trabalhariam como mensalistas ou diaristas [...] essa prática se corporifica no ditado “roupa suja se lava em casa”. (SOLLER; MATOS, 2000, p. 148-149)

Os espaços públicos foram considerados negativos, perigosos, enquanto o privado tornou-se lugar de refúgio seguro. Outras questões urbanas foram eclodindo quase que concomitantemente.

A questão da moradia e ocupação do solo surgiu na medida em que o espaço urbano passou a ser disputado entre as classes detentoras do poder e a grande massa de trabalhadores. Instalou-se a especulação imobiliária, a valorização diferenciada dos terrenos, legitimada por uma Câmara que representava os interesses públicos apenas quando estes coincidissem com os interesses privados, empurrando a população mais pobre para as áreas baixas, de várzea, alagadiças.

O problema se agravou a partir do final da década de 1940, com o chamado padrão periférico de crescimento que, “[...] longe de representar ausência de planejamento, responde a uma estratégia de máxima acumulação

16Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - Cidades: São Paulo - São Paulo. Disponível em: <http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=355030&search=sao-paulo|sao-paulo> Acesso em 08nov2015.

capitalista [...] e reduz ao mínimo a necessidade de investimentos em moradia e infraestrutura, seja pelo poder público, seja pelo setor privado” (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 77). Baseado no sistema de transporte coletivo, o padrão incentivava a ocupação de áreas distantes do centro.

O crescimento da construção civil e viária e a instalação das primeiras indústrias automobilísticas, a partir de 1956, atraíram brasileiros de vários Estados, principalmente do Nordeste do país e o assentamento de amplos contingentes populacionais nos distantes loteamentos se intensificou. Eram edificações construídas pelos próprios moradores, em terrenos com maior declividade e mais vulneráveis à erosão, deslizamentos e enchentes, problemas bastante recorrentes atualmente. O esgotamento desse modelo, somado ao achatamento salarial, favoreceu a favelização. Tal como nas grandes cidades da América Latina, da Ásia, da África e do leste Europeu, São Paulo tem “mais de 80% de edificações ilegais, construídas sem licença, em terrenos que raramente pertencem aos ocupantes dessas benfeitorias” (SIRKIS, 2003, p. 220).

Em tempos de “milagre econômico”, o Banco Nacional da Habitação (BNH), com o discurso de ordenar o crescimento da cidade, privilegiou o financiamento de moradias para as classes média e alta. A Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (COHAB), destinada ao financiamento e à produção de moradias para a população de até cinco salários mínimos, por sua vez, produziu, em vinte cinco anos, parcas 100 mil unidades habitacionais (algumas mal construídas, em terrenos impróprios, sem infraestrutura) gerando um déficit habitacional praticamente incorrigível até os dias de hoje.

A demanda por abastecimento de água também se mostrou uma questão urgente no início do século e que ainda permanece sem solução. Em nome do “conforto urbano” dos bairros residenciais da burguesia, o uso das águas dos caudalosos rios que poderiam abastecer a cidade ficou comprometido. Eles recebiam e ainda recebem toda sorte de efluentes, lançados diretamente nos cursos d’água. “As dificuldades de adução de fontes mais distantes já eram conhecidas no final do século, quando começou a funcionar o reservatório Cantareira” (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 75).

O abastecimento de água ainda sofre perdas de mais de 50% em muitas grandes cidades, na fase de transporte e distribuição. O desperdício do que sobra para o consumo é considerável, fruto de uma cultura da abundância, entranhada num país que detém 13% do 1,5% das águas aproveitáveis do planeta, estas cada vez mais escassas. Mas o pior problema é a poluição de redes pluviais, rios, canais, lagoas, bacias e oceanos pelos efluentes líquidos não tratados, industriais e domésticos. Mais de 70% das nossas internações hospitalares continua vinculada a algum tipo de infecção de veiculação hídrica, e o maior problema de saúde pública continua sendo a água contaminada. (SIRKIS, 2003, p. 226)

A precariedade do saneamento básico e da gestão dos resíduos sólidos acompanham a história de São Paulo. Somente na década de 1970 foi resolvida a questão, se bem que por pouco tempo, pois a proposta de baixo custo, baseada em sistemas de aterro sanitário, não considerava o esgotamento rápido de áreas disponíveis para a destinação final do lixo. (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 78)

Nas inundações e desabamentos, o problema dos resíduos sólidos torna-se particularmente dramático. A vulnerabilidade climática e topográfica é exacerbada pela impermeabilização de imensas superfícies urbanizadas, com escassos pontos de absorção de águas na enorme manta de concreto e asfalto. A retificação e a canalização de rios e canais acelera a velocidade das águas, que, retiradas mais rapidamente de um ponto, vão se represar em outro, mais adiante, com maior intensidade. O entupimento desses condutos por grandes quantidades de resíduos sólidos, sobretudo plásticos, costuma ser a gota d’água das tragédias (SIRKIS, 2003, p. 226).

Em 1920, as ruas do centro de São Paulo

[...] já se apresentavam congestionadas pelos 2 mil automóveis existentes; os modestos largos e praças transformados em estacionamento [...] o Plano de Avenidas, idealizado por Prestes Maia em 1930 [...] visando abrir espaços para o automóvel e para a própria indústria automobilística [...] implicará a não aceitação do primeiro projeto de metrô para São Paulo, elaborado pela Light em 1927, e adiará por 40 anos o início da instalação desse sistema de transporte, determinando graves comprometimentos para o meio ambiente urbano (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 75-76)

O modelo de transporte rodoviário, altamente poluidor e principal causa de engarrafamentos, que incentiva a aquisição de automóveis por meio da redução de impostos, em detrimento de maiores investimentos no transporte coletivo, elevou o número de veículos de 306 mil em 1965 para 4,5 milhões em

1989 (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 77). O serviço de transporte coletivo, um dos mais lucrativos, por ter mercado garantido e remuneração imediata, por sua vez, encontra-se nas mãos de empresas privadas terceirizadas.

A poluição do ar produzida pela queima de combustíveis é um dos problemas mais graves da cidade. Quando medidos, os níveis de monóxido de carbono, em algumas regiões da metrópole, excedem, em muito, os patamares aceitáveis. Tal condição, associada à impermeabilização do solo, à carência de áreas verdes e à atividade intensa, dão origem ao “clima urbano”, caracterizado pelo aumento de temperatura no centro da mancha, [...] de nevoeiro, [...] de chuvas torrenciais, diminuição de ventos, [...] da umidade relativa do ar e aumento da concentração de poluentes.” (SÃO PAULO, [1989-1992], p. 78).

Como se pode observar, São Paulo, com uma população atual estimada em quase 12 milhões de habitantes17, se constituiu, nesses pouco mais de 100

anos de urbanização, como o epicentro do avanço do capitalismo no Brasil e exemplo máximo de suas sequelas: consumismo, desperdício, violência, aguda crise econômica e social. O cenário está desenhado. O caos precisa ser revertido. A educação e as/os pedagogas/os paulistanas/os têm muito que discutir.