• Nenhum resultado encontrado

2. CAPÍTULO I As águas do rio Doce enquanto formas de construir conhecimento

2.3. O banco de dados – previsões sobre as condições das águas

O trabalho no banco de dados teve início com a recuperação das postagens feitas, no sentido de que o meio de armazenar que estava sendo utilizado era o compartilhamento da matéria na própria timeline. Após esse período passamos a concentrar as postagens em grupos secretos no Facebook que poderiam ser alimentados pelos membros do GEPPEDES. A quantidade de postagens se tornou um desafio, no sentido de que não sabíamos como organizar a quantidade de material levantado, e passamos a trabalhar com o armazenamento das postagens em formato pdf e que estavam relacionadas à circulação em veículos de comunicação e grande mídia, e mantendo os links com comentários e discussões ainda armazenados nos grupos. Opção que se deveu à preocupação sobre a gestão de dados nas redes sociais online, de modo a evitar a exposição excessiva de pessoas e dados específicos.

As postagens reuniam conteúdos de várias ordens, como perfis dos afetados, comentários em postagens nas páginas oficiais das empresas rés, páginas criadas para denunciar os crimes associados ao rompimento da barragem, fotos e vídeos sobre as condições das vidas dos atingidos (a falta de água, de trabalho, de comida, os peixes mortos e a vegetação comprometida e até morta com o passar do tempo). Esse material circula junto a matérias de jornais e blogs, publicações de páginas e sites oficiais do governo e prefeituras, em que passamos a observar as posturas em que estavam mais presentes as discussões sobre as considerações científicas sobre o desastre, no sentido de que nos jornais e blogs eram veiculadas entrevistas com os profissionais ligados às áreas de estudo que teriam condições de falar sobre o desastre com algum tipo de autoridade e/ou reconhecimento tecnocientífico. Essas narrativas são um pouco mais difusas e controversas, uma vez que podemos encontrar posturas em que o desastre foi tratado como acidente; como no início do período de especulação, em que abalos sísmicos eram apontados como causas do rompimento da barragem de rejeitos de mineração na região de Mariana-MG.

Outras posturas mais difusas foram observadas em relação à contaminação da água e à proibição da pesca, em que observamos indicações sobre os usos e o consumo serem incentivados, como no caso emblemático em que prefeito de Colatina no ano do

rompimento da barragem de rejeitos de mineração, Leonardo Deptulski14 apareceu no jornal local tomando um copo de água coletado do rio Doce logo após a passagem dos rejeitos pela cidade15.

Figura 6. Manchete do Jornal A Tribuna. 26 /11/2016.

Fonte: Jornal A Tribuna. Novembro de 2015.

Essa postura causou várias discussões sobre os laudos, a importância de transparência nos processos de levantamento dos dados sobre as águas, uma vez que houve questionamentos sobre as empresas responsáveis pelos laudos estarem vinculadas à empresa ré. Esses casos de incentivo e desencorajamento dos usos das águas fazem parte de uma grande discussão, mas no limitamos aqui a apontar os processos que observamos durante o trabalho no banco de dados, que tiveram desdobramentos em audiências públicas, nos trabalhos de campo e em algumas reuniões que acompanhamos. Observar essa quantidade de discussões, narrativas, demandas, controvérsias e conflitos, via banco de dados, foi parte importante para determinar o trabalho a partir desse material. De modo que as posturas dos afetados foram priorizadas a partir do trabalho de campo, e a identificação das demandas tecnocientíficas, a partir do levantamento dos arquivos armazenados pelo grupo. Com isso, nas matérias e entrevistas, passamos a mapear os profissionais que tinham mais repercussão nos meios de

14A Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh) tem novo presidente. Leonardo Deptulski assumiu a

presidência do órgão nesta terça-feira (01). Natural do município de São Roque do Canaã, Deptulski é formado em Engenharia Industrial Mecânica e Ciências Contábeis, foi prefeito de Colatina por dois mandatos, é servidor efetivo da Secretaria de Fazenda do Espírito Santo e presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Doce. Disponível em: https://agerh.es.gov.br/Not%C3%ADcia/leonardo-deptulski- assume-presidencia-da-agerh. Acesso: 13/03/2018.

15 Disponível em: http://www.tribunaonline.com.br/prefeito-de-colatina-bebe-agua-do-rio/. Último

acesso: 04/09/2016. O acesso antigo se justifica pela busca atualizada não dar acesso à matéria, para ilustrar acionamos a imagem da manchete na figura 6.

comunicação e nas redes sociais, e procurar suas declarações junto aos veículos de comunicação, buscando também acompanhar os trabalhos realizados por esses atores.

Os trabalhos desenvolvidos por eles foram: relatórios, laudos, notas técnicas, artigos, entrevistas, bem como a participação em eventos nos quais falaram sobre as condições das águas, uma vez que a triagem sobre as águas havia sido definida durante os trabalhos de campo. Levantamos uma quantidade significativa de material técnico, que compõe nossas fontes secundárias, que inclui também documentos liberados pela empresa ré. Chegamos também a entrevistar alguns dos cientistas ligados à Universidade Federal do Espírito Santo e profissionais ligados a órgãos ambientais do estado.

Organizamos os materiais em três tabelas que serão apresentadas no segundo capítulo da dissertação, para gerar melhor visualização do material analisado e também construímos um acompanhamento do levantamento online desse tipo de documentos; no sentido de que durante as investigações observamos que era frequente a mudança de endereços eletrônicos para encontrar os mesmos, portanto, a tabela e a forma de acesso são entendidas também como ferramentas para evidenciar que os processos de busca não são controlados, e que passam por momentos em que não encontramos os documentos nos mesmos endereços, ou nos mesmos formatos, causando certa dificuldade em lidar com esse meio de divulgação e armazenamento de documentos.