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O combate à corrupção nas Constituições Brasileiras.

CAPÍTULO I BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA BRASILEIRO

1. O combate à corrupção nas Constituições Brasileiras.

Não há dúvidas entre todos os estudiosos quanto à graves consequências

advindas do fenômeno da corrupção

43

, dentre as quais destacamos a falta de

legitimidade social dos políticos, a violação omissiva permanente e crescente

dos direitos fundamentais, bem como o enfraquecimento do Estado de Direito,

inclusive, com a captura de parte dos agentes públicos ocupantes dos mais altos

cargos pelo crime organizado.

Diante disso e no afã de uma resposta estatal mais eficiente ao problema

da corrupção no Brasil, percebe-se claramente uma proeminência teórica do

estudo da corrupção apenas no Direito Penal e no Direito Administrativo

Sancionador

44

, o que reflete no recrudescimento legislativo do assunto quase

que exclusivamente nessas duas áreas jurídicas.

43 “Dentro do Estado Democrático de Direito, a questão da corrupção se torna ainda mais grave.

Primeiramente, a própria ideia de democracia se constrói a partir de um modelo ideal elevado, para cujo funcionamento se reclama do homem a virtude. De fato, a honestidade do agente público é inerente ao conceito de Estado Democrático de Direito, em que o povo elege seus representantes, para que esses governem em seu nome, tendo por finalidade o interesse público e não seu interesse privado. A apropriação da coisa pública por particulares vai contra a própria essência do regime democrático. A corrupção, além dos males a ela inerentes (aumento dos preços públicos, baixa qualidade dos serviços públicos etc), leva ao descrédito das instituições tanto pela população em geral, quanto pelos investidores internos e externos. Em consequência, há a geração de crises políticas e econômicas que prejudicam o desenvolvimento do país como um todo. (DA COSTA, Susana Henrique. O Processo Coletivo na Tutela do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa.São Paulo: Atlas, 2ª edição, 2015, p.8).

44 “Em termos estritamente dogmático-penais, afere-se o alargamento horizontal e vertical, isto

Ocorre que essa é uma visão míope do assunto, uma vez que a corrupção

afeta as estruturas básicas de conformação do Estado de Direito, que estão

presentes, sobretudo, no Direito Constitucional, no Direito Administrativo e no

Direito Eleitoral.

Não obstante isso, a doutrina pouco - ou quase nunca – fala de corrupção

quando se propõe a apresentar o estudo sistematizado dessas disciplinas,

deixando de contribuir para uma formação mais holística dos profissionais do

Direito, que não se atentam para esse detalhe.

Nesse tocante, gastam-se montanhas de páginas para a exposição dos

elementos dogmáticos de cada uma daquelas disciplinas dentro de uma

perspectiva romântica ou estritamente teórica, como se não houvesse uma

correlação lógica entre determinados assuntos desses ramos jurídicos com a

prevenção e a repressão à corrupção.

Tal metodologia precisa ser urgentemente “revista, uma vez que não se

pode olvidar que todos os desvios de verbas públicas ultimados por conta da

corrupção afetam sensivelmente a força normativa de qualquer Constituição.

Aliás, exatamente por conta desse déficit de efetividade do Texto

Supremo advindo da falta de recursos desviados pela corrupção é que começa

a surgir a tese de um novo direito fundamental: o de uma gestão pública livre da

corrupção ou um ‘direito anticorrupção’

45

.

sancionatório de diversas das já existentes. Curiosamente, sem que houvesse qualquer racionalização na seara penal, o que seria de se esperar, visto que imbuída esta do princípio fundamental da ultima ratio, o Direito Administrativo, com viés sancionador, incisivamente após o marco constitucional de 1988, em geral, sobrepôs a diversas situações lesivas ao interesse público inúmeros e significativos mecanismos repressores, como, emblematicamente, deu-se com a improbidade administrativa (Lei n°8.429/1992) ou, mais recentemente, com a Lei Anticorrupção (Lei n°12.846/2013).” (DE SOUZA, Luciano Anderson. Crimes contra a Administração Pública. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p.28).

45 “Esses dados pondo à nu os multi-perversos efeitos da corrupção sobre a ordem política e

econômica tem dado espaço para que alguns juristas comecem a enxergar um direito humano autônomo, o direito a um poder público livre da corrupção. O primeiro a mencionar esse direito não como decorrência de vulnerações de outros direitos humanos já reconhecidos foi Kofele- Kale. O autor argui que em relação aos grandes esquemas de corrupção, em especial em países em desenvolvimento, em que o ato de corruto representa graves prejuízos para a população e sua riqueza, causando sérias dificuldades para o gozo de inúmeros direitos humanos, haveria, em razão da disseminada prática internacional de não aceitação da corrupção, da existência de inúmeros instrumentos internacionais registrando a preocupação da comunidade internacional

Trata-se de sedutora tese, da qual não nos ocuparemos agora

46

, embora

reafirmemos a necessidade de uma revisão metodológica no estudo tradicional

daquelas disciplinas jurídicas para fazer inserir o estudo conectado dos seus

institutos tradicionais com a corrupção

47

. É preciso, pois, avançar para debater

o assunto vivamente ao longo de todo o estudo das matérias, já que existem

inúmeros episódios trazidos pela prática que ainda não encontram consenso

exatamente pela insipiência do assunto. Cito exemplo caricato da política

nacional: uma norma jurídica aprovada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo

Chefe do Poder Executivo por conta do pagamento de suborno ou financiamento

ilícito de campanhas (casos “Mensalão” e “Lava-Jato” do Brasil,

respectivamente) são, ao nosso ver, motivos para a declaração de

inconstitucionalidade da mesma por violação ao princípio republicano e ao dever

de honestidade inerente aos agentes públicos em geral? Cremos que sim

48

, mas

com o fenômeno e da colocação em risco dos valores mais elevados da comunidade internacional, a possibilidade de serem tais atos de corrupção enquadrados como crimes internacionais. Ele entende que o modo mais efetivo de se combater a corrupção é elevando sua prática à esfera de crime de interesse universal, de acordo com as normas internacionais, registrando que já há suficiente prática estatal para reclamar a existência de norma consuetudinária universal proibindo a corrupção em todas sociedades, sendo que haveria já o direito fundamental a uma sociedade livre de corrupção, que poderia ser componente do direito à autodeterminação e desenvolvimento ou até mesmo como direito autônomo. Assevera que o direito a uma sociedade livre de corrupção é inerentemente um direito humano porque a vida, a dignidade e outros importantes valores humanos dependem desse direito. Nessa esteira, veio Kumar (2003) em trabalho que, além de explorar as interfaces entre direitos humanos e o problema da corrupção, prega a necessidade do estabelecimento, como direito fundamental positivado na Constituição indiana, de um direito fundamental de um serviço público livre de corrupção, o que geraria o empoderamento da cidadania com a colocação do grave problema no centro do debate político, potencialmente transformando o sistema de governança e fortalecendo a democracia.” (FILHO, André Pimentel. (Uma) Teoria da Corrupção – Corrupção, Estado de Direito e Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p.110-111).

46 Esse assunto será abordado no Capítulo 3, ao tratarmos dos “mandados constitucionais

anticorrupção”.

47 No Direito Eleitoral e no Direito Administrativo, o tema “corrupção” encontra um pouco de

espaço para abordagens mais modernas, diante de institutos que possuem íntima correlação, tais como os princípios estruturantes, as figuras do abuso de poder, os atos de improbidade administrativa etc.

48 Nesse mesmo sentido: “Em nosso entender, sem dúvida, o comprovado esquema de compra

e venda de votos para se conseguir apoio político enseja o por nós denominado vício de decoro parlamentar a caracterizar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, pois que maculados a essência do voto e o conceito de representatividade popular.” (PEDRO LENZA. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 20ª edição, 2016, p.298).

a hipótese é raramente tratada pelos estudiosos do Direito Constitucional

clássico

49

.

Assim, como dito, urge que se adote um novo viés metodológico, para,

em seguida, realizar uma correlação direta entre normas e determinados

institutos constitucionais tradicionais e o fenômeno da corrupção, como é o caso,

por exemplo, de alguns princípios constitucionais (Separação dos Poderes,

Republicano, Proporcionalidade

50

e da Administração Pública), bem como de

outras regras específicas (crimes de responsabilidade, imunidades

parlamentares, impeachment etc).”

51

O presente trabalho seguirá essa linha. Tanto que o primeiro tema a ser

abordado será o histórico constitucional brasileiro na perspectiva do combate à

corrupção, fugindo da tradicional análise operada pela doutrina, que só fala da

questão dos direitos fundamentais, do controle de constitucionalidade e dos

regimes de governo e político.

Dito isso, já adiantamos que, ao longo da experiência constitucional

brasileira, verifica-se, sem exceção (inclusive, na imperial de 1824), previsões

normativas voltadas para o combate à corrupção dos agentes públicos, em

49 Fazendo um humilde juízo de “mea-culpa” inerente aos grandes sábios, é digno de nota a

referência feita pelo jurista português José Joaquim Gomes Canotilho, em prefácio de obra jurídica sobre corrupção, in verbis: “Há uns bons pares de anos, abeirou-se de nós um aluno do 1º ano da licenciatura em direito. O lugar era uma sala da Faculdade de Direito de Coimbra. A razão da conversa residia no facto de termos dado a última aula, desejando o maior êxito pessoal e académico aos meus alunos. Este aluno que nos procurou no fim da aula nunca mais saiu da minha memória. Confessou ter apreciado o nosso curso, mas era seu dever aproveitar a ocasião para fazer uma crítica. Na sua opinião, eu teria esgotado a dogmática das inconstitucionalidades, das ilegalidades, das jusfundamentalidades e das normatividades, mas havia cometido alguns pecados por omissão. Nunca me referi, por exemplo, ao problema da corrupção. Registrei a omissão”. (LOPES, José Mouraz. O Espectro da Corrupção. Coimbra: Almedina, 2011, p.7).

50 Sobre a proporcionalidade, destacamos o importante papel que as vertentes da proibição do

excesso e da proteção deficiente podem desempenhar: a primeira vedando uma punição demasiadamente excessiva em comparação com outras sanções imputáveis por outros ramos jurídicos ao mesmo fato e a segunda pela obrigação do legislador prever medidas que punam adequadamente os atos de corrupção, inibam novas transgressões (função de prevenção geral e especial das penas), mas, sobretudo, que se abstenha de realizar a redução de penalidades aos atos de corrupção, de uma forma tal a torná-las ineficazes para aqueles fins.

51 Trecho extraído do nosso relatório final da disciplina de História do Estado, no curso de

Doutoramento em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, intitulado “O Princípio da Moralidade Administrativa na Prevenção e Repressão à Corrupção: A Atualidade do Contraponto Filosófico entre Maquiavel e Erasmo de Rotterdam”.

especial no que diz respeito ao abuso de poder, ao suborno, a peita, a

concussão, ou ao enriquecimento ilícito, cuja regulamentação deu-se,

essencialmente, por leis de natureza penal ou cível, como veremos na

sequência.

2. A CONSTITUIÇÃO IMPERIAL DE 1824.

A forma de surgimento da Carta Imperial de 1824 (outorgada por D. Pedro

I

52

) é bastante indicativa da sua baixa adesão aos pressupostos básicos de um

regime preocupado em combater a corrupção, o que vem a se confirmar com a

leitura detida desse documento.

De início, cumpre destacar a previsão do “Poder Moderador”, que, à luz

do artigo 98 desse Texto Supremo, era “a chave de toda a organização política”,

que, em síntese, legitimava a intervenção do Imperador na autonomia e

independência dos demais Poderes

53

.

Tal fato mostra que, no sistema jurídico-político instaurado a partir de

1824, não havia a possibilidade de um efetivo combate à corrupção, o que fica

reforçado com a previsão da expressa irresponsabilidade do Imperador pelos

seus atos e palavras (artigo 99), bem como a imunidade da regência e do regente

(artigo 129)

54

.

52 “Após ter declarado a independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, Dom Pedro I

convoca, em 1823, uma Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, com ideais marcadamente liberais, que, contudo, vem a ser dissolvida, arbitrariamente, tendo em vista a existência de divergências com os seus ideais e pretensões autoritários. Em substituição (da Assembleia Constituinte), D. Pedro I cria um conselho de Estado para tratar dos ‘negócios de maior monta’ e elaborar um novo projeto em total consonância com a sua vontade de ‘Majestade Imperial’. (LENZA, Pedro. Direito Constitucional (...), p.127).

53 “Assim, na prática, parece que a tradução ‘chave’ refletiu a constante interferência do Poder

Moderador sobre os demais Poderes e o significado de Imperador, que recebeu os títulos de ‘Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil’, tendo o tratamento de ‘Majestade Imperial’ e sendo a sua pessoa inviolável e sagrada, não sujeita a irresponsabilidade alguma (irresponsabilidade total do Estado – ‘the king can do no wrong’- ‘o rei não erra’). O Imperador, que exercia o Poder Moderador, no âmbito do Legislativo, nomeava os Senadores, convocava a Assembleia Geral extraordinariamente, sancionava e vetava proposições do Legislativo, dissolvia a Câmara dos Deputados, convocando outra, que a substituía. No âmbito do Executivo, nomeava e demitia livremente os Ministros de Estado. E, por fim, no âmbito do Judiciário, suspendia os Magistrados.” (LENZA, Pedro. Direito Constitucional (...), p.129).

54 Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade

alguma. Art. 129. Nem a Regencia, nem o Regente será responsavel. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm e acessado em 23/04/2019,

Essa imunidade absoluta do Chefe de Estado e de Governo é algo

inadmissível nos dias de pleno vigor do Estado de Direito e na atual ordem

constitucional, que, em seu artigo 51, I, diz competir privativamente à Câmara

dos Deputados autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de

processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros

de Estado;

Além disso, deve-se destacar também, que vigorava à época o sistema

de completa irresponsabilidade civil do Estado decorrente dos danos causados

pelo seu “chefe maior”

55

, muito embora o artigo 179, XXIX, tenha consagrado

que “os empregados publicos são strictamente responsaveis pelos abusos, e

omissões praticadas no exercicio das suas funcções, e por não fazerem

effectivamente responsaveis aos seus subalternos.”

Pois bem, corroborando o espírito pouco comprometido com a punição

dos ocupantes das mais altas funções políticas do país, destacamos ainda

outras previsões do Texto Imperial:

I - Admitia-se a prisão de Deputados e Senadores apenas por força de ordem escrita da respectiva Casa Legislativa, salvo no caso de flagrante de crime com pena de morte (artigo 27)56. Na atual Constituição Federal, houve um avanço parcial no tema, pois só poderá ocorrer a suspensão da ação penal no caso do crime ter sido cometido após a diplomação e mediante votação da maioria dos seus membros (artigo 53, §3°), ficando, em caso positivo, suspensa também a prescrição enquanto durar o mandato (artigo 53, §5°).

às 10:39 horas.

55 “Essa teoria não prevaleceu por muito tempo em vários países. A noção de que o Estado era

o ente todo-poderoso confundida com a velha teoria da intangibilidade do soberano e que o tornava insuscetível de causar danos e ser responsável foi substituída pela do Estado de Direito, segundo a qual deveriam ser a ele atribuídos os direitos e deveres comuns às pessoas jurídicas.” (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 32ª edição, 2018, p.594).

56 Art. 27. Nenhum Senador, ou Deputado, durante a sua deputação, póde ser preso por

Autoridade alguma, salvo por ordem da sua respectiva Camara, menos em flagrante delicto de pena capital. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm e acessado em 23/04/2019, às 10:39 horas.

II - Uma vez pronunciado qualquer parlamentar (isto é, recebida a acusação contra ele), o juiz deveria suspender o processo e dar ciência à Casa Legislativa, que deliberaria sobre a continuidade ou não do mesmo, bem como o eventual afastamento das funções parlamentares (artigo 28)57. Na atual quadra, essa medida já foi superada, uma vez, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), todos os agentes políticos, à exceção do Presidente da República, estão submetidos à Lei de Improbidade Administrativa (Lei n°8.429/1992)58, que, em seu artigo 20, parágrafo único, permite o afastamento das funções em caso de necessidade comprovada da investigação59 . Além disso, ainda existe a possibilidade da cominação de medida cautelar penal referente ao afastamento da função pública como medida alternativa à prisão preventiva para fazer cessar eventual atividade criminosa (artigo 319, do Código de Processo Penal)60.

57 Art. 28. Se algum Senador, ou Deputado fòr pronunciado, o Juiz, suspendendo todo o ulterior

procedimento, dará conta á sua respectiva Camara, a qual decidirá, se o processo deva continuar, e o Membro ser, ou não suspenso no exercicio das suas funcções. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm e acessado em 23/04/2019, às 10:39 horas.

58 Direito Constitucional. Agravo Regimental em Petição. Sujeição dos Agentes Políticos a Duplo

Regime Sancionatório em Matéria de Improbidade. Impossibilidade de Extensão do Foro por Prerrogativa de Função à Ação de Improbidade Administrativa. 1. Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa, quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade. Não há qualquer impedimento à concorrência de esferas de responsabilização distintas, de modo que carece de fundamento constitucional a tentativa de imunizar os agentes políticos das sanções da ação de improbidade administrativa, a pretexto de que estas seriam absorvidas pelo crime de responsabilidade. A única exceção ao duplo regime sancionatório em matéria de improbidade se refere aos atos praticados pelo Presidente da República, conforme previsão do art. 85, V, da Constituição. (Pet 3240 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2018).

59 Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o

trânsito em julgado da sentença condenatória. Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

60 “Também aos Governadores são aplicáveis as medidas cautelares diversas da prisão previstas

no art. 319 do Código de Processo Penal, entre elas ‘a suspensão do exercício de função pública’, e outras que se mostrarem necessárias e cujo fundamento decorre do poder geral de cautela conferido pelo ordenamento jurídico brasileiro aos juízes.” (STF, ADI 4362, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09/08/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 05-02-2018 PUBLIC 06-02-2018).

III - Uma medida inusitada para os atual contexto e que podia levar ao fomento de práticas corruptas, ou ao seu acobertamento, estava prevista no artigo 29, da Constituição Imperial, segundo o qual os Deputados e Senadores poderiam ocupar os cargos de Ministro ou Conselheiro de Estado, sendo que os primeiros deveriam deixar o assento parlamentar, que seria ocupado mediante nova eleição em que o ausente poderia concorrer e, se eleito, cumular o posto executivo com o parlamentar. Já os Senadores podiam acumular as funções automaticamente.

Tal disposição ia de encontro à necessária independência que deve ter o Parlamento em relação ao Poder Executivo, dada a função fiscalizatória daquele em relação a esse. Exatamente por entender que permissões dessa natureza não eram morais e saudáveis, a Constituição Francesa, de 3 de setembro de 1791 (anterior, portanto ao texto em estudo), proibiu esse tipo de cooptação dos membros do Poder Legislativo61, o que, infelizmente, não se repetiu também no atual Texto Supremo de 1988 (artigo 56)62.

IV - Também merece nota a questão da composição do Senado, cujos membros tinham mandato vitalício (artigo 4063) e eram escolhidos pelo Imperador após a formação de uma lista tríplice (artigo 4364). Isso quando

61 “Com o objetivo de moralizar as instituições, após longos debates, decidiu-se que o rei não

poderia escolher seus ministros no seio da Assembleia, o que evitaria o risco de corrupção dos deputados pelos atrativos das funções de ministro, culminando em comprometer a idoneidade de suas atividades.” (GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. (...) p.259).

62 Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador: I - investido no cargo de Ministro de

Estado, Governador de Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplomática temporária; II - licenciado pela respectiva Casa por motivo de doença, ou para tratar, sem remuneração, de interesse particular, desde que, neste caso, o afastamento não ultrapasse cento e vinte dias por sessão legislativa. §1º O suplente será convocado nos casos de vaga, de investidura em funções previstas neste artigo ou de licença superior a cento e vinte dias. §2º Ocorrendo vaga e não havendo suplente, far-se- á eleição para preenchê-la se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato. § 3º Na hipótese do inciso I, o Deputado ou Senador poderá optar pela remuneração do mandato.

63 Art. 40. 0 Senado é composto de Membros vitalícios, e será organizado por eleição Provincial. 64 Art. 43. As eleições serão feitas pela mesma maneira, que as dos Deputados, mas em listas

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