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O conceito de representação social e a Teoria das

3.2 Teoria das Representações Sociais: história e contribuições

3.2.1 O conceito de representação social e a Teoria das

As representações sociais se caracterizam pela maneira como os grupos sociais elaboram, constroem e organizam significados sobre um determinado estímulo produzido pelo meio social. São, em si, uma ação que cria condições para a relação entre o sujeito ou grupo social e o objeto (Jodelet, 2001). Assim, a Teoria das Representações Sociais consiste em uma teoria científica que procura investigar os processos que permitem aos indivíduos construir e explicar objetos sociais por meio da interação social (Vala, 2006).

Para Moscovici (2012), o que não é familiar gera desequilíbrio e tensão, mobiliza emoções. Diante disso, é preciso que o conteúdo desconhecido seja associado com algum conteúdo que já faz parte do universo do indivíduo ou grupo. Assim, as representações sociais são concebidas como um processo cognitivo e emocional, e são formadas com o objetivo de tornar familiar o que é incomum. Elas conferem sentido ao meio social, relacionando esse desconhecido com outros objetos já conhecidos, tornando-o passível de interpretação e concreto.

As representações sociais correspondem a necessidades e práticas extremamente necessárias à vida social, assim como a técnica e a ciência são necessárias às práticas profissionais (Moscovici, 2012). Dessa forma, apesar de envolver operações mentais e não ser homogênea em uma determinada sociedade, para que uma representação seja social é necessário que ela tenha aspectos socialmente significativos e seja compartilhada por grupos sociais. Diante dessas características, só é possível a existência de representações sociais de objetos que tenham um significado social (Jodelet, 2001; Moscovici, 2012).

Moscovici (2012) indica alguns aspectos necessários para que uma representação seja considerada social: a) a produção e compartilhamento pelos membros dos grupos; b) a formação de comportamentos e visões de mundo e a orientação das comunicações que se estabelecem no meio social; c) a tradução de conflitos

normativos, materiais, sociais e do material científico para os grupos sociais; d) a facilitação da transposição de conceitos e teorias para o mundo cotidiano, imediato, transformando esses conceitos em instrumentos de comunicação; e) a atribuição de significado às interações sociais com base nos conceitos apropriados; e f) a adequação dos comportamentos ao contexto social. Diante dessas características, é possível observar que a representação social torna-se um fenômeno que contribui para a construção das relações sociais e da própria realidade, as quais não são nem concretas nem representadas, mas totalmente sobrepostas (Moscovici, 2012).

Ao discutir a transformação do pensamento científico em senso comum, questão central em sua teoria, Moscovici (1981) aponta a existência de dois universos contrastantes, que representam realidades e modos de conhecimento diferentes: o universo reificado e o universo consensual. No universo consensual o homem é concebido como a medida das coisas e a sociedade como um grupo composto por indivíduos iguais. É o espaço onde ocorrem as relações sociais que admitem as conversações, trocas mútuas de teorias e respostas sobre o mundo a partir de uma visão leiga. Essas conversações mantêm e consolidam o grupo, permitem a expressão das emoções. Dessa forma, o conhecimento é compartilhado livremente e se edifica a partir das representações sociais. No universo reificado a sociedade é determinada por categorias, papéis sociais e hierarquias que estabelecem saberes específicos aos indivíduos. Há comportamentos e informações apropriados para cada situação, sendo que a participação no meio social é determinada pela qualificação. Nesse caso, o conhecimento é difundido e produzido por especialistas, indicando a realidade física concebida a partir da ciência (Moscovici, 1981; 2012).

Quanto à sua composição, as representações sociais possuem três dimensões que se articulam, permitindo a compreensão de seu conteúdo e sentido. São elas: informação, campo ou imagem e atitude. A informação é apreendida de diversas fontes e está relacionada à forma como o grupo organiza os conhecimentos sobre o objeto social. O campo ou imagem, também nomeado campo de representação, consiste na imagem, no modelo social referente a um determinado aspecto do objeto e sugere uma hierarquização dos elementos da representação. Por fim, a atitude compreende a orientação global com relação ao objeto (Moscovici, 2012).

A investigação dessas dimensões permite uma compreensão mais global do grupo. É possível apontar suas características em função da visão de mundo e compreender a relação do grupo com o objeto e sua

valorização social. Essa diferenciação entre grupos a partir de suas representações sociais distintas, presentes ou ausentes acerca do objeto, confere às representações um caráter coletivo (Moscovici, 2012).

Estudar representações sociais implica, também, conhecer e compreender seu processo de formação. Por meio de operações mentais, os processos de percepção e de pensamento conceitual, o objeto é apropriado pelo sujeito e, posteriormente, transformado em um símbolo que se manterá mesmo na sua ausência (Jodelet, 2001; Moscovici, 2012).

Moscovici (2012) apresenta, com base na Psicologia Clássica, a percepção e a formulação de conceitos como processos sensoriais e intelectuais, respectivamente. Estes permitem a transformação do objeto percebido, a partir dos sentidos, em um objeto conceituado, por meio da esfera cognitiva. A representação constitui-se como um terceiro processo por meio do qual ocorre o intercâmbio entre o conceito e a percepção. Esse intercâmbio permite a elaboração de uma representação mental do objeto pelo sujeito, e a posterior assimilação de suas características, transformando ou construindo este objeto. Dessa forma, Moscovici (2012) indica que as representações sociais se caracterizam como construções simbólicas da realidade em forma e conteúdo, elas “fazem com que o mundo seja o que [se pensa] que é ou deva ser” (p. 55), reiterando a ideia de que as representações não são cópias exatas dos objetos a que se referem, mas sim, (re) apresentações destes objetos a partir de construções coletivas.

As representações sociais podem ser entendidas como produto ou como processo. Os produtos ou conteúdos representativos das representações sociais são, por exemplo, crenças, valores e imagens. A partir disso, procura-se entender os elementos organizadores desses conteúdos, como a história de um determinado grupo social e os elementos sociais e culturais que o organizam. Na investigação das representações sociais enquanto processo, busca-se entender como acontece a elaboração cognitiva, com a finalidade de explicar de que forma esse sujeito dá sentido a sua existência social e como ela é determinada (Moscovici, 1981). Nesse caso, Moscovici (2012) identifica dois processos principais, que ocorrem simultaneamente: ancoragem e objetificação.

Ancorar significa interpretar o novo objeto de acordo com o contexto, ou seja, o novo conhecimento será amparado pelos conhecimentos já assimilados pelo sujeito. O novo objeto será integrado

à rede de categorias já existente, cujo teor está relacionado a transformações históricas e culturais já vivenciadas (Moscovici, 1981). Para que isso ocorra, a ancoragem implica em dois momentos: a classificação e a nomeação. Na classificação ocorrerá a categorização propriamente dita do objeto, por meio da qual será imposto um conjunto de comportamentos e regras a ele. Na nomeação, haverá a aproximação com o objeto e a consequente atribuição de significado a ele, estabelecendo uma relação positiva ou negativa com algo que não tinha sentido no universo consensual (Moscovici, 2012).

O processo de objetificação consiste na transformação do novo objeto, que é abstrato, em algo concreto por meio de imagens ou ideias (Moscovici, 1981; Vala, 2006). Para compreendê-lo, o sujeito irá formar imagens e estruturas sobre ele, levando à sua cristalização e provável modificação das condutas e relações sociais. A objetificação envolve três momentos: construção seletiva, esquematização e naturalização.

A construção seletiva compreende a seleção de informações, crenças e ideias sobre o novo objeto a partir do contexto do indivíduo. Assim, considerando o caráter pragmático das representações, o objeto será absorvido com base nos interesses e valores grupais, formando um todo coerente para o grupo. A esquematização indica a organização dos elementos da representação, formando um esquema simplificador sobre o objeto. Determina um padrão de organização da informação e de relações estruturadas, comportando a materialização do conceito. Por fim, na naturalização, os conceitos são concretizados através de sua expressão em imagens e metáforas. Cada palavra passa a corresponder a um objeto, cada imagem passa a ter sua contrapartida na realidade (Vala, 2006). Assim, após os processos de ancoragem e objetificação, a apreensão do novo objeto se concretiza. Por meio da sua transferência ao esquema de referências do indivíduo, para comparação, interpretação e posterior reprodução do pensamento, eles levam ao objetivo final: a familiarização com o desconhecido (Moscovici, 1981).

O processo de apropriação e de construção de uma representação social implica em uma conversação por meio da qual o indivíduo ou grupo se aproxima e interioriza os temas e objetos de seu mundo, busca diversos indícios, comunica-os e verifica-os, para posteriormente, opinar sobre o objeto em questão. O objetivo, ao final desse processo, é estar informado e permanecer no círculo social a que se pertence (Moscovici, 2012). Diante disso, pode-se definir que as representações sociais como um conhecimento elaborado e compartilhado por um determinado grupo, caracterizando-se como a significação de um determinado objeto ou fato. Essa significação é

estabelecida, portanto, por um conjunto de conhecimentos e crenças que surgem principalmente da comunicação entre indivíduos e entre grupos, e direcionam a ação dos sujeitos no meio social, além de atribuir significado à realidade cotidiana vivenciada por estes (Jodelet, 2001; Moscovici, 2012).

A partir dessa definição pode-se conceber que a representação social é estruturada pelo social, influencia o pensamento das pessoas e consequentemente, dita a forma como elas se relacionam com o mundo. Portanto, seu estudo permite a aproximação com esses processos, com a elaboração e construção do conhecimento do senso comum e, por fim, com a construção da realidade social.