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CONDIÇÕES BÁSICAS

3.2. Critérios usuais na análise de eficiências

3.2.1. O critério do excedente total

WILLIAMSON chegou à divisão antitruste do departamento de justiça norte- americano (DoJ) em 1966, e logo questionou a política vigente à época. Argumentou que não fazia sentido como problema econômico, uma vez que desconsiderava o uso da eficiência na defesa da ilegalidade e que a imposição de medidas em favor da desconcentração acabava por tutelar a pequena empresa, sem de fato proteger a concorrência.52 Nesse sentido, WILLIAMSON apontou a necessidade de um tratamento racional para essa questão, que requeria um esforço para estabelecer implicações

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As decisões da Suprema Corte nos casos Brown Shoe (1962) e Procter & Gamble (1967) são evidências de como a política antitruste era então conduzida.

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alocativas de economias de escala e poder de mercado associados aos atos de concentração. A questão básica apresentada pelo autor era (2003, p. 64):

“The question was, how should a merger that would simultaneously yield both efficiencies and market power be evaluated? I discovered to my surprise that the allocative efficiency consequences of such a merger had never been worked out. The prevailing intuition, however, was that any increase in market power, however small, would trump the benefits of any cost saving. Was that intuition correct?”

Para responder a essa pergunta, WILLIAMSON (1968) desenvolveu um modelo, que denominou de “naïve tradeoff model” (modelo de trade-off ingênuo), para avaliar fusões que, simultaneamente, aumentavam o poder de mercado e geravam economias, formalizando a ideia de que as eficiências poderiam – e deveriam – ser incorporadas na análise dos atos de concentração na defesa da ilegalidade como elemento pró-competitividade.53 O insight do modelo de WILLIAMSON é bastante simples: para que um ato possa ser autorizado, o aumento do excedente econômico trazido pelas eficiências deve superar a perda de excedente proveniente do poder de mercado. Em outras palavras, um ato deverá ser autorizado caso o aumento do excedente do produtor em decorrência da redução de custos for considerado de magnitude superior à perda de excedente do consumidor trazida pelo aumento de preços, trazendo benefícios líquidos para o mercado. Os efeitos na alocação de recursos de uma fusão que proporcione economias, mas aumente o poder de mercado,

podem ser investigados a partir de um modelo simples de equilíbrio parcial, como mostra o gráfico a seguir.

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Embora o modelo de WILLIAMSON tenha sido desenvolvido exclusivamente para o tratamento da concentração horizontal, o argumento pode ser ampliado a outros problemas que envolvem o trade-off entre poder de mercado e eficiência, como fusões e aquisições conglomeradas, integração vertical, etc.

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A

A

P P1 B A Demanda P2 c1 C c2 RMg q2 q1 Q

Gráfico 1 – O modelo de Williamson: trade-off entre eficiência e poder de mercado

Fonte: Elaboração própria com base em WILLIAMSON (1968).

Para avaliar os efeitos líquidos da concentração, WILLIAMSON examina a passagem de um mercado competitivo para uma posição monopolista – na qual a nova firma originada com a operação pratica preços de monopólio e reduz a quantidade ofertada, mas é geradora de eficiências –, comparando ambas as situações por meio da correspondente variação no excedente agregado. Na situação inicial, o preço é dado por p1 e a quantidade por q1. O grau de competição é suficiente para forçar o preço para o nível dos custos unitários (supostos constantes por simplificação), p1 = c1. Supondo que o mercado sofre um processo de concentração, o preço aumenta para p2 e a quantidade reduz para q2, que maximizam o lucro no curto prazo, tal que a receita marginal iguala o custo marginal (RMg = c2). Por sua vez, supõe-se que a concentração também proporcione eficiências para as empresas, onde os custos unitários de produção são reduzidos de c1 para c2.

Os efeitos da concentração são representados (aproximadamente) pelas áreas hachuradas. A área A designa o peso-morto que resultaria se o preço fosse elevado de p1 para p2, assumindo o custo constante. Mas como se presume que os custos unitários sejam reduzidos com a concentração, a área C – que representa a economia de custos – também deve ser levada em consideração. Assim, o excedente do produtor aumenta o equivalente à área B, devido ao ganho de receita provocado

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pelo aumento do preço cobrado e C, devido às economias de custos resultantes da concentração. Analogamente, o excedente do consumidor diminui em B, pois passam a obter as unidades que compravam anteriormente a um preço maior e, ainda, em A – o “peso morto” –, que representa a quantidade total perdida que os consumidores estariam dispostos a pagar. Como a área B representa apenas uma transferência do consumidor para o produtor, tal concentração deverá ser aprovada se, e somente se, o efeito líquido for tal que

Assim, de acordo com essa perspectiva, basta que a concentração produza um aumento líquido de eficiência (C, que representa maior eficiência produtiva, maior que A, que representa ineficiência alocativa) para que a mesma seja aprovada, ainda que implique no aumento significativo de preços para os consumidores. Como conclusão, WILLIAMSON aponta que uma redução de custos relativamente modesta é normalmente suficiente para compensar aumentos relativamente grandes, caso a elasticidade da demanda seja alta.54

Há de se notar, contudo, que as visões de WILLIAMSON e dos representantes de Chicago acerca da utilização das eficiências na defesa da ilegalidade apresentavam algumas divergências. Embora os autores de Chicago também concordassem que as eficiências eram uma importante conseqüência da maioria das concentrações, defendiam o uso da eficiência sob uma visão mais rigorosa. Segundo eles, era difícil estimar a magnitude dos efeitos líquidos de uma concentração apropriadamente devido às inúmeras possibilidades que poderiam se apresentar as curvas de demanda e custo marginal e, portanto, de realizar o balanço entre retângulos

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WILLAMSON empregou o método de HARBERGER (1954) para quantificar os ganhos e perdas de bem-estar associados à concentração. Para comentários técnicos sobre os procedimentos de mensuração envolvidos nesse método, ver POSSAS (2002, p. 220-228).

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e triângulos. Assim, os autores de Chicago defendiam uma abordagem para eficiência através de regras mais claras, e não por meio de um exame caso a caso.55

A política amparada pela abordagem da eficiência como defesa, pela análise de WILLIMANSON ou Chicago, é guiada pela proposição de que o objetivo único a ser perseguido seria a eficiência alocativa dos mercados. Basta que os ganhos dos produtores superem as perdas dos consumidores para que uma concentração seja aprovada. Dito de outra forma, basta que o excedente total aumente, isto é, que a soma de bem-estar dos consumidores e produtores seja superior que na situação anterior à operação. Nesse sentido, os impactos redistributivos provocados pelo aumento de preços (área B) são ignorados a partir da hipótese de que os perdedores (consumidores) são compensados pelos ganhadores (produtores). É a partir dessa ideia que se organizou a principal crítica a essa abordagem.