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O Desafio Estratégico das Multinacionais Emergentes

2.2 A Importância das Competências Organizacionais para as Multinacionais

2.2.2 O Desafio Estratégico das Multinacionais Emergentes

O foco de análise da Teoria da Vantagem das Pioneiras de Mercado é a dimensão temporal, ou seja, o momento de entrada de cada empresa no mercado em relação as demais competidoras. Lieberman e Montgomery (1988) reuniram a literatura teórica e empírica que descrevem as vantagens e desvantagens dos primeiros entrantes.

Três categorias representam as formas de obter vantagem competitiva por ser um primeiro entrante:

1. Liderança tecnológica em produto e processo 2. Aquisição primária de bens escassos

3. Desenvolvimento de custos ao comprador caso queira trocar de fornecedor.

A liderança tecnológica pode ser obtida por meio da curva de aprendizagem, que representa a capacidade de produzir maior quantidade de bens com menos recursos. Também pode ser obtida por meio de patentes ou vantagens tecnológicas. A indústria farmacêutica é um exemplo de vantagens obtidas por meio de patentes, características de um primeiro entrante.

A empresa primeira entrante também pode obter vantagens competitivas ao adquirir bens escassos antes de todos os competidores. Esses bens incluem fatores de produção, como os recursos naturais, empregados, fornecedores e distribuidores, características do produto e

localização geográfica, além dos investimentos em plantas industriais e equipamentos. Essas vantagens competitivas são evidentes quando os concorrentes avaliam como inviável, ou muito difícil, entrar num mercado, em razão da escassez desses bens.

A terceira vantagem pode advir do grau de dependência que o primeiro entrante estabelece com a cadeia produtiva (fornecedor e comprador) (HAX; WILDE II, 2001). A empresa primeira entrante beneficia-se de quatro formas: quando os compradores realizam investimentos iniciais altos para adaptar-se ao produto comprado; quando identifica mais claramente as necessidades desses compradores, isto é, aprende a agregar valor a eles; quando há contratos que inviabilizam sua descontinuidade; ou quando há assimetria de informações e os compradores são fiéis à marca do primeiro fornecedor, com receio de substituir o produto comprado e obter um bem de qualidade inferior (LIEBERMAN; MONTGOMERY, 1988).

Apesar das vantagens as empresas primeiras entrantes têm suas desvantagens. Lieberman e Montgomery (1988, 1998) descreveram três categorias de desvantagens:

1. Impossibilidade de aprendizagem com acertos e erros de uma outra empresa. A empresa primeira entrante não tem outras empresas nas quais se espelhar e com as quais realizar benchmarking.

2. Incertezas de mercado e tecnológicas, ou seja, necessidade de ser a primeira afetada pelas mudanças tecnológicas ou pelas necessidades dos consumidores.

3. Tendência à inércia ou resposta lenta em razão da posição estabelecida (incumbent inertia). A firma pode ficar presa a um conjunto específico de bens e se tornar relutante em canibalizar linhas de produtos existentes; ou pode se tornar gerencialmente inflexível.

Considerando-se as vantagens e desvantagens das empresas primeiras entrantes, no caso as multinacionais tradicionais, questiona-se o desafio estratégico das últimas entrantes, ou seja, as multinacionais emergentes.

Utilizando como exemplo a Ranbaxy, uma indústria indiana do setor farmacêutico, Bartlett e Ghoshal (2000) sugerem estratégias diferenciadas para que uma empresa última entrante seja bem sucedida na competição global.

Ao tratarem de estratégias diferenciadoras, os autores identificam duas formas de obtê-la: benchmarking e futura diferenciação ou confronto e disputa.

Na primeira forma, o último entrante inicia copiando líderes globais e, posteriormente, explora nichos inexplorados. Um exemplo é a Jolibee, uma rede de fast-food das Filipinas que sofreu concorrência do McDonald´s, aprendeu com seu processo de produção e, posteriormente, inovou focando as preferências e gostos da região de atuação.

Na segunda forma, mais radical, novos modelos de negócio são introduzidos, o que pode ser efetivo em oligopólios estabilizados. A BRL Hardy, uma empresa de vinhos australiana, mudou as regras do jogo e deteve o controle total das vendas, distribuição e marketing para poder posicionar-se como uma marca global. A empresa também passou a comprar vinhos de várias partes do mundo e conseguiu obter escala suficiente para ter força na negociação com lojas de revenda.

Shankar, Carpenter e Krishnamurthi (1998), ao estudarem empresas da indústria farmacêutica, identificaram vantagens competitivas das multinacionais emergentes comparadas com as tradicionais. As multinacionais emergentes que atuaram focadas em inovação obtiveram vantagem competitiva sustentável por terem um potencial de mercado maior. Melhor que investir recursos em atividades de marketing, as multinacionais emergentes devotaram seus esforços a redefinir o “jogo” para beneficiá-las e poderem utilizar a inovação para auxiliar na redefinição do mercado.

Kim e Mauborgne (2004) também sugerem que para obter sucesso em um ambiente competitivo as empresas devem procurar criar oceanos azuis, isto é, redefinir as fronteiras do mercado e fazer negócios onde não há adversários. Devem ser evitados oceanos vermelhos, isto é, setores onde a comoditização de produtos e serviços encolheu as margens de lucro.

Sull e Escobari (2004) estudaram empresas latino-americanas e suas dificuldades para se globalizarem. Nos últimos 15 anos houve a abertura comercial da América Latina, e a falta de liquidez e altos custos de capital, conjuntamente com o esgotamento das oportunidades nos mercados locais, fizeram com que as empresas voltassem seu foco para o exterior. Para os autores, contudo, o “custo latino” dificulta esta internacionalização, como a alta carga

tributária, a escassez e o elevado custo de capital, a corrupção, a dificuldade de investir em P&D, a desvantagem tecnológica, o câmbio volátil e as taxas altas de juros, e a inflação. Os autores afirmam que mesmo com essas dificuldades empresas latino-americanas alcançaram liderança em seus setores e indicam três passos para obter sucesso na internacionalização: comprometer-se com uma mentalidade global, empreender ações ousadas para tornar irreversível tal compromisso e realinhar toda a organização para competir em escala global.

Em resumo, as empresas multinacionais emergentes, para competir frente a frente com os grandes players do mercado global, precisam quebrar as regras do jogo, ou seja, inovar o desenvolvimento em nichos de mercado ou inovar radicalmente em mercados maduros. Outra saída seria a constante busca por alta flexibilidade, alinhada a empreendimentos ousados (inovadores), para conseguir sobreviver em mercados turbulentos e fortemente competitivos.

Portanto, as multinacionais emergentes são dependentes de inovações estratégicas de processos e de produto, em ritmo e de maneira diferente que as multinacionais tradicionais. Logo, perante esse desafio estratégico com que se deparam as multinacionais emergentes, observa-se que:

As multinacionais emergentes precisam competir de forma diferenciada das multinacionais tradicionais.

Uma das formas diferenciadas de competição proposta nesta tese é a necessidade de as multinacionais emergentes percorrerem um caminho diferente da trajetória das multinacionais tradicionais. Em outras palavras, as multinacionais emergentes não podem utilizar-se das mesmas estratégias de transferência de competências da matriz para as subsidiárias e de exploração de mercado (DUNNING, 1993) praticada pelas multinacionais tradicionais no início de seu processo de internacionalização. A conjuntura dos mercados e a posição de última entrante das multinacionais emergentes requerem uma estratégia diferenciada quanto às fontes de vantagem competitiva e à localização em mercados estrangeiros.