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O descortinar de possibilidades de vida escolar

2 Projetos: uma ação que necessita de reflexões e avaliações

2.2 O descortinar de possibilidades de vida escolar

Mostraremos os jardineiros a laborar neste fundo comum, para fazerem vicejar as plantas e desabrochar as flores, para fazerem amadurecer os frutos saborosos que terão conservados as características de solo onde cresceram, a sua variedade e a perfeição. Não formamos um homem pré- fabricado, mas homens vivos e dinâmicos (FREINET, 1976, p. 52).

Imaginemos um jardim com potencial de produzir lindas flores ou até mesmo frutos saborosos. Mas onde estão os trabalhadores que possam semear, regar e adubar a terra? Como obtermos frutos sem que perca suas características próprias, sua essência?

A colocação de Freinet leva-nos a pensar em nossas escolas como jardins, onde podemos ser os jardineiros na vida de nossos alunos, apontando caminhos para essa semente germinar e desabrochar, com o cuidado de não formamos homens sem iniciativa e sim homens que exalem vida e transformem o mundo em que vivem. Como vimos, o pedagogo francês Freinet, impactou a Europa no século XX com seus pensamentos pedagógicos e ações propondo uma pedagogia de vivência.

Freinet em sua prática pedagógica adotou o hábito de anotar o desenvolvimento individual dos alunos na escola, com o objetivo de encontrar melhores métodos educacionais por meio de suas constatações, ou seja, os fracassos e os sucessos, interesses e problemas de personalidade davam pistas para traçar caminhos para proporcionar a cada aluno um aprendizado que pudesse contemplar sua singularidade.

A fim de proporcionar aulas para onde estava voltado o interesse de seus alunos implementou as chamadas aulas-passeios, tornando-se práticas diárias cuidadosamente planejadas. Sobre essas ações Freinet (1976, p.23) diz:

A aula-passeio constituía para mim uma tábua de salvação. Em vez de me postar, sonolento diante de um quadro de leitura, no começo da aula da tarde, partia com as crianças, pelos campos que circundavam a aldeia. Ao atravessarmos as ruas, parávamos para admirar o ferreiro, o marceneiro, ou o tecelão, cujos gestos metódicos e seguros nos inspiravam o desejo de os imitar. Observávamos o campo nas diversas estações: no Inverno, víamos os grandes lençóis estendidos sob as oliveiras para receber as azeitonas varejadas; na Primavera, as flores de laranjeira em todo o seu encanto, as quais pareciam oferecer-se às nossas mãos; já não examinávamos, como professor e alunos, em torno de nós, a flor ou inseto, a pedra ou o regato. Sentíamo-los com todo nosso ser, não só objetivamente, mas com toda nossa sensibilidade natural.

Essa ação pedagógica, aula-passeio, é percebida no Japão, onde os professores levam seus alunos para caminhar pelas montanhas situadas próximas a escola, para realizarem o reconhecimento da fauna e da flora da região, fazendo registros e desenhos, ou dos templos existentes a fim de manter viva a cultura e a religião do país. Similarmente, elaboramos uma saída pedagógica para cidade de Paranapiacaba, com objetivo dos alunos fazerem estudo do meio, vivenciando a história e a natureza da região, ao percorrerem pelas trilhas da cidade, assim como outros aspectos.

Nas aulas-passeio, os interesses demonstrados pelas crianças foram se transformando em textos dentro da pedagogia de Freinet, visando o aprendizado da gramática, redação, matemática, geografia entre outras áreas da ciência que ia sendo introduzida de acordo com o interesse demonstrado pelas crianças.

Freinet (1976, p.25) iniciou a prática da produção de textos livres, motivando seus alunos a escreverem suas impressões captadas em cada aula, dando a liberdade de expressarem suas dúvidas e sentimentos.

Os alunos apaixonaram-se pela composição e pela impressão, coisas que não eram todavia simples com o material ainda rudimentar de que dispúnhamos. Eles deixaram-se prender pelas novas tarefas, não porque a ordenação dos caracteres nos componentes puder ser atraente, mas sobretudo porque tínhamos descoberto um processo normal e natural da cultura; a observação, o pensamento, a expressão natural torna-se texto perfeito. Esse texto tinha sido vazado no metal, depois impresso. E todos os espectadores, o autor em primeiro lugar, sentiam realizado o trabalho, uma profunda emoção perante o espetáculo do texto enaltecido, que se revestia agora de valor de testemunho.

Na possibilidade dos alunos se expressarem nos textos, Freinet despertou o interesse das crianças pela leitura e pela escrita e valorizou o trabalho do alunado inserido de significado. Ao trabalhar com a imprensa na escola despertou também o interesse de outros educadores, surgiu á correspondência escolar, possibilitando a troca cultural, já que os textos exprimiam o modo de vida de cada aluno, da escola e da região. Criaram também o jornal escolar que também era enviado para as outras escolas de toda parte da França.

Com o olhar na leitura e na escrita, buscamos também introduzir nossos alunos nesse universo do jornal, levando-os a reconhecerem as partes dos jornais e o despertar do olhar crítico, realizando a leitura, a interpretação dos artigos, a socialização e a discussão das temáticas levantadas no projeto O que é notícia, cientes de que foi somente uma ação inicial para um despertar de novas ações e possibilidades.

Quando Freinet valorizou a escrita das crianças automaticamente houve o despertar das mesmas para o mundo das letras, já que seu texto ia ser lido por alguém, e por outro viés, quando outra criança lê o que outra criança escreveu gera uma provável significância. Foi criada a revista O Ramalhete, com textos, poemas e desenhos produzidos pelas crianças, além de boletins que circulavam por toda França entre os educadores e educandos.

Devido o crescimento de vários interessados na pedagogia desenvolvida por Freinet, foi criada a Cooperativa do Ensino Leigo, com o objetivo de auxiliar as necessidades iniciais dessas pessoas, tornando posteriormente uma organização internacional, responsável pela produção e distribuição do material produzido para as pessoas filiadas pelo mundo.

Em ocasião de estar preso, por ter sido injustamente acusado de escrever panfletos terroristas, aproveitava os textos escritos à mão por seus companheiros de prisão, elaborando um jornal assim como grupos de expressão artística. Ensinou também escrever cartas e escreveu peças para que fossem representadas por eles, além de iniciar a escrita do livro Conselhos para os pais. Dentro dos trabalhos desenvolvidos por Freinet, percebe-se claramente que há uma intencionalidade, passos foram dados para chegar a um objetivo. Segundo as óticas de Hernández e Freinet poderemos seguir os passos a serem percorridos para caminhar em projetos.