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O diálogo e a humanização do parto numa perspectiva da educação intercultural

A Panorâmica do Povo e a Sociedade da Uma-Lulik Timor-Leste é um país de encantamento e alguém que quer

1. O diálogo e a humanização do parto numa perspectiva da educação intercultural

Tendo por base o modelo de funcionamento adoptado para “Saberes em Diálogo” (MATOS, COSTA & ARAÚJO, 2011), nomeadamente no que diz respeito ao diálogo e à humanização do parto na perspectiva da educação intercultural em Timor-Leste. Podemos dizer que “saber dialogar” ou “fazer diálogo” é uma forma de contribuir para a edificação dos novos marcos conceptuais, analíticos, teóricos, capazes de auxiliar na adoção e disseminação de novos conceitos, novas categorias, novas noções, sob a égide da interculturalidade e da compreensão da alteridade epistêmica, e que neste caso se aplicou à fórmula: onde, como e a quem compete “fazer nascer” em Timor-Leste.

Numa dada circunstância, todo o processo de “dialogicidade” é sujeito a uma avaliação de iniciativas que permite extrair várias conclusões, colocando desta forma, os diversos saberes tradicionais e modernos em diálogo que, numa lógica de complementaridade, pode ajudar as parteiras na humanização do parto. Reconhecemos que o leque de acadêmicos e profissionais de saúde acabou por basear o seu discurso nas suas convicções pessoais, ignorando, por exemplo, as práticas profissionais de classe prevalecentes sobre como “fazer nascer” uma vida humana. Por exemplo, teria sido interessante ter mais médicos obstetras em Timor-Leste com posicionamentos e formas de atuação distintas nos serviços das parteiras. No entanto, assumimos que a escolha dos atores intervenientes se baseou no critério da diversidade de representantes de diferentes saberes sobre as questões em estudo já clarificadas nos dois capítulos anteriores.

A articulação com a vida no sentido de existência implica, fundamentalmente, uma responsabilidade moral na justiça humana. A educação intercultural apresenta-nos novos desafios em que a crise de valores invade a consciência social, dando à vida diversos comportamentos desviantes que recusam qualquer identidade comunitária. Esta marginalidade crescente atinge a própria instituição familiar e social, provocando uma crescente desagregação nos serviços sociais, como a assistência dos serviços de parteiras às parturientes.

Perante esta situação urge encontrar uma resposta à questão básica: como se pode ministrar nos nossos dias uma educação integral e intercultural que tenha em vista os valores? Kohlberg e Gilligan, citado em Cabral (1997) afirmam que a justiça é o valor que leva as pessoas a pensar moralmente e, por isso, é urgente que se construa uma ação educativa ética dentro e fora da escola.

De fato, a educação é um processo dinâmico que envolve toda a comunidade na construção de uma sociedade justa e humana através do diálogo e da ação orientada pelos valores éticos. A escola e a família têm uma responsabilidade comum no ensino, respondendo à vontade de aprender, manifestada nas crianças desde a idade pré-escolar. Nesta linha, o professor tem um impacto considerável na criança, na medida em que deve motivá-la para o desenvolvimento de atitudes responsáveis e justas, concertadas no “princípio de uma alteração paradigmática do campo de reflexão teórica e de ação” para perceber a “complexidade da interdependência em que se jogam os processos educativos da construção da Pessoa, das Sociedades e da História” (AMBRÓSIO, 2001, p.7). Neste contexto, na educação formal e intercultural, relativamente às questões em estudo (no caso das práticas culturais nos serviços de parteiras), salientamos que ensinar significa “exigir a criticidade” no devir histórico-cultural e conhecimento adquirido como uma “superação dos valores éticos”. Isto é, “ao criticar-se” significa rigorizar a epistemologia da análise ao objeto observado com a maior exatidão (FREIRE, 2003).

A pessoa – situada na sociedade ‘em rede’ e imersa no devir histórico – sobreleva no cidadão e na educação, um processo complexamente relacional com o valor estratégico no desenvolvimento. A necessidade de equacionar educação e desenvolvimento indica já que se deve confrontar a inércia da educação com a reflexão, pois, “a educação é uma função essencialmente social” (DURKHEIM, 2011, p.61) que, no caso concreto da educação intercultural e dialógica aplicada ao sistema de “humanizar o parto”, ela deve ser equacionada na ação “salvar a vida”.

O pensamento educativo, por não se dever apenas a limitar e regular, tem de ser reinventado. Neste sentido dever-se-á entender que, quer a proposta de total revisão crítica dos “fundamentos e os fins do sistema escolar” (AMBRÓSIO, 2001, p.15), quer a defesa de um projeto promotor de uma comunidade educativa forte, de uma comunidade vinculada às novas exigências de desenvolvimento pessoal e social,

associam-se ao processo de tecnização do saberes tradicionais e modernos. Para tal impõe-se que o pensamento educativo se nutra da investigação e se comprometa na formação continuada de uma cidadania ativa.

O tema da educação intercultural e dialógica na humanização do parto é sempre abordado e desenvolvido na investigação, formação e intervenção. Só assim se ganha nova ênfase em correlação com “um pensamento que justifique adequadamente os objetivos e a teleologia da educação nos nossos dias e que dê um sentido estratégico à decisão no âmbito dos múltiplos lugares, processos e percursos educativos que estão à nossa disposição” (AMBRÓSIO, 2001, p.44) com um estilo mais qualitativo, mais holístico, mais dinâmico, mais humano, mais aberto ao futuro “cheio de risco e incerteza” (idem, p.45).

Na perspectiva da educação intercultural, o diálogo e a humanização do parto não são uma mudança calculada mentalmente, mas uma aposta a um imperativo ético de ordem relacional. Isto é, procurar ativamente a compreensão mútua e de corresponsabilização nas tomadas de decisão política baseada no exercício técnico e político, procurando também adotar estratégias participativas cujas coordenadas criteriológicas são a justiça e a equidade, a universalidade e a diversidade. É tanto mais necessário afirmar desde já que “há uma natureza humana, cujas formas e propriedades são determináveis de uma vez por todas, e o problema pedagógico consistia em procurar de que a ação educativa deve ser exercida sobre a natureza humana assim definida. Ninguém terá pensado alguma vez que o homem seja de imediato, desde que entra na vida, tudo o que pode e deve ser. É evidentemente manifesto, no decurso de um lento movimento progressivo que começa à nascença e apenas termina na maturidade” (DURKHEIM, 2011, p.97).